D.E. Publicado em 20/02/2018 |
|
|
|
|
|
|
|
|
EMENTA
ACÓRDÃO
Vistos e relatados estes autos em que são partes as acima indicadas, decide a Egrégia Quinta Turma do Tribunal Regional Federal da 3ª Região, por maioria, dar provimento ao recurso em sentido estrito do Ministério Público Federal para anular a decisão que rejeitou a denúncia e determinar o retorno dos autos à Vara de origem para o prosseguimento da ação penal contra os recorridos, nos termos do relatório e voto condutor que ficam fazendo parte integrante do presente julgado.
Documento eletrônico assinado digitalmente conforme MP nº 2.200-2/2001 de 24/08/2001, que instituiu a Infra-estrutura de Chaves Públicas Brasileira - ICP-Brasil, por: | |
Signatário (a): | ANDRE CUSTODIO NEKATSCHALOW:10050 |
Nº de Série do Certificado: | 11A21704266A748F |
Data e Hora: | 14/02/2018 18:38:15 |
|
|
|
|
|
|
|
|
VOTO CONDUTOR
Trata-se de recurso em sentido estrito interposto pelo Ministério Público Federal contra a decisão (fls. 779/783) que rejeitou a denúncia oferecida contra Daniel Ivan Daroz e José Luiz Daroz pela prática do delito do art. 1º, I e II, da Lei n. 8.137/90 c. c. os arts. 29 e 71, ambos do Código Penal, por ausência de justa causa para o exercício da ação penal (CPP, art. 395, III).
Em suas razões recursais, o Ministério Público Federal aduz, em síntese:
Foram apresentadas contrarrazões (fls. 797/804).
O Juízo a quo manteve a decisão recorrida por seus próprios fundamentos (fl. 805).
O Ilustre Procurador Regional da República, Dr. João Francisco Bezerra de Carvalho, manifestou-se pelo conhecimento do recurso interposto como apelação, pois interposto contra sentença de absolvição sumária, tendo requerido seu provimento para a retomada da ação penal contra os acusados (fls. 806/812v.).
O Em. Relator, Des. Fed. Maurício Kato, negou provimento ao recurso, mantendo a decisão que rejeitou a denúncia.
Com a devida vênia, discordo do Em. Relator pelos motivos a seguir expostos.
Sigilo bancário. Processo administrativo. Quebra. Admissibilidade. A Primeira Seção do Superior Tribunal de Justiça, no julgamento do Recurso Especial Representativo de Controvérsia n. 1.134.665/SP, firmou o entendimento de que é lícito ao Fisco receber informações sobre a movimentação bancária dos contribuintes sem a necessidade de prévia autorização judicial, desde que seja resguardado o sigilo das informações, a teor do art. 1º, § 3º, VI, c. c. o art. 5º, caput, da Lei Complementar n. 105/01, c. c. o art. 11, §§ 2º e 3º, da Lei n. 9.311/96:
A controvérsia cinge-se ao emprego dessa prova para fins de instrução de processo-crime, pois há entendimento tanto no sentido de que para isso seria imprescindível decisão judicial para a quebra do sigilo bancário (STJ, HC n. 243.034, Rel. Min. Laurita Vaz, j. 26.08.14, AGRESP n. 201300982789, Rel. Min. Maria Thereza de Assis Moura, j. 19.08.14, RHC n. 201303405552, Rel. Min. Sebastião Reis Júnior, j. 11.02.14), quanto no sentido de que, tendo sido a prova produzida validamente no âmbito administrativo, não há como invalidá-la posteriormente. Filio-me a esse entendimento, dado não se conceber nulidade a posteriori: a autoridade fiscal tem o dever jurídico (vinculado) de, ao concluir o lançamento de crédito constituído em decorrência de crime fiscal, proceder à respectiva comunicação ao Ministério Público para a propositura de ação penal. Não se compreende como, ao assim fazer, acabe por inviabilizar a persecutio criminis:
Resta confirmada a validade da aplicação imediata da Lei Complementar n. 105/01 em relação a fatos ocorridos anteriormente a sua vigência, pois se trata de norma caráter procedimental:
Anoto que o Plenário do Supremo Tribunal Federal pronunciou-se sobre a constitucionalidade do referido procedimento no RE n. 601.314, com acórdão publicado em 16.09.16, bem como nas ADIs ns. 2390, 2859, 2397 e 2386, publicados os respectivos acórdãos em 21.10.16.
Do caso dos autos. Daniel Ivan Daroz e José Luiz Daroz foram denunciados pelo crime do art. 1º, I e II, da Lei n. 8.137/90, c. c. os arts. 29 e 71, ambos do Código Penal, porque, nos anos de 2002 a 2004, exercícios de 2003 a 2005, na condição de administradores da empresa Rigor Alimentos Ltda., de modo consciente e voluntário, suprimiram ou reduziram tributos e contribuições sociais, mediante omissão de informações às autoridades fazendárias e fraude em detrimento da fiscalização tributária.
De acordo com a denúncia (fls. 614/617), foram lavrados autos de infração (fls. 387, 407, 419 e 433) constitutivos de créditos tributários nos valores de R$ 17.042.867,56 (dezessete milhões, quarenta e dois mil, oitocentos e sessenta e sete reais e cinquenta e seis centavos), relativos ao IRPJ suprimido; R$ 3.327.119,64 (três milhões, trezentos e vinte e sete mil, cento e dezenove reais e sessenta e quatro centavos), relativos ao PIS; R$ 15.355.940,01 (quinze milhões, trezentos e cinquenta e cinco mil, novecentos e quarenta reais e um centavo), relativos à COFINS; e R$ 7.698.389,03 (sete milhões, seiscentos e noventa e oito mil, trezentos e oitenta e nove reais e três centavos), relativos à CSLL.
O parcelamento dos créditos tributários foi rescindido em 24.01.14 (cfr. fl. 539).
A denúncia foi recebida pela 1ª Vara da Justiça Federal em Bragança Paulista (SP) no dia 08.08.14 (fl. 620).
Os acusados opuseram exceção de incompetência (fls. 735/743), julgada procedente, tendo os autos sido remetidos ao Juízo Federal da 1ª Vara Criminal de São Paulo (SP) (cfr. fls. 748/749v., 751 e 757).
Considerando não haver impedimento na reconsideração da decisão que recebeu a denúncia pelo Juízo considerado incompetente, o Juiz a quo rejeitou a denúncia, por ausência de justa causa, com fundamento no art. 395, III, do Código de Processo Penal. Conforme o Juízo a quo, seria ilícita a prova produzida no curso do procedimento administrativo-fiscal dada a utilização dos dados bancários do contribuinte, obtidos sem que houvesse qualquer determinação do Poder Judiciário (cfr. fls. 779/783).
Merece provimento a irresignação do Parquet Federal.
No curso da ação fiscal, os acusados foram intimados da expedição de mandado de procedimento fiscal e do termo de início da ação fiscal para apresentarem, dentre outros documentos, extratos de contas bancárias e de aplicações financeiras.
Em 26.06.06, a empresa dos acusados apresentou a movimentação financeira de conta corrente mantida no Banco do Brasil em relação ao período requerido.
Contudo, por meio de Requisição de Informações sobre a Movimentação Financeira - RMF, a Receita Federal constatou que a empresa do acusado também movimentou contas correntes no Banco Rural, Banco Itaú e Banco BCN.
De posse dos extratos bancários, inclusive daqueles referentes aos bancos cujo relacionamento não havia sido informado, a Receita Federal apurou depósitos não contabilizados no valor de R$ 45.935.913,42 (quarenta e cinco milhões novecentos e trinta e cinco mil novecentos e treze reais e quarenta e dois centavos), no ano calendário de 2002, e de R$ 118.983.443,50 (cento e dezoito milhões novecentos e oitenta e três mil quatrocentos e quarenta e três reais e cinquenta centavos), nos anos calendários de 2003 e 2004, valores esses muito superiores e incompatíveis com a soma das receitas líquidas das atividades da empresa no mesmo período declaradas na DIPJ.
Como a empresa não comprovou a origem da movimentação financeira, concluiu-se que os acusados, na qualidade de administradores, omitiram informações das autoridades fazendárias relativas aos anos calendário de 2002 a 2004, bem como fraudaram a fiscalização tributária, omitindo operação de qualquer natureza em livro exigido pela lei fiscal.
Do mesmo modo que o sigilo é transferido, sem autorização judicial, da instituição financeira ao Fisco e deste à Advocacia-Geral da União, para cobrança do crédito tributário, também o é ao Ministério Público, sempre que, no curso de ação fiscal de que resulte lavratura de auto de infração de exigência de crédito de tributos e contribuições, constate-se fato que configure, em tese, crime contra a ordem tributária (Decreto n. 2.730, de 10.08.98, art. 1º e Lei n. 9.430/96, art. 83).
Assim, não se entrevê ilicitude no compartilhamento, com o Ministério Público Federal, dos dados protegidos pelo sigilo bancário que a Receita Federal obteve em conformidade com o art. 6º da Lei Complementar n. 105/01.
Ademais, a denúncia é apta e apresenta justa causa, demonstrada pela existência de indícios suficientes de autoria e materialidade delitivas. O crédito tributário foi definitivamente constituído em 30.06.11 (cfr. fl. 773).
Dessa forma, deve ser anulada a decisão recorrida, a fim de que a ação penal prossiga até seus ulteriores termos.
Ante o exposto, DOU PROVIMENTO ao recurso em sentido estrito do Ministério Público Federal para anular a decisão que rejeitou a denúncia e determinar o retorno dos autos à Vara de origem para o prosseguimento da ação penal contra os recorridos (divirjo do Relator).
É o voto.
Documento eletrônico assinado digitalmente conforme MP nº 2.200-2/2001 de 24/08/2001, que instituiu a Infra-estrutura de Chaves Públicas Brasileira - ICP-Brasil, por: | |
Signatário (a): | ANDRE CUSTODIO NEKATSCHALOW:10050 |
Nº de Série do Certificado: | 11A21704266A748F |
Data e Hora: | 14/02/2018 18:38:18 |
|
|
|
|
|
RELATÓRIO
Trata-se de recurso em sentido estrito interposto pelo Ministério Público Federal contra a decisão de fls. 779/783, que rejeitou a denúncia oferecida contra Daniel Ivan Daroz e José Luiz Daroz pela prática do delito do artigo 1°, incisos I e II, da Lei 8.137/90, c.c os artigos 29 e 71, ambos do Código Penal, por ausência de justa causa para o exercício da ação penal (artigo 395, inciso III, do Código de Processo Penal).
Em razões recursais de fls. 785/792, o órgão ministerial aduz que a Receita Federal possui poderes para solicitar a quebra do sigilo bancário, nos termos da Lei Complementar n. 105, de 10 de janeiro de 2001 e Decreto n. 3.724/2001.
Sustenta que a Constituição Federal de 1988 não previu expressamente a cláusula de reserva de jurisdição para os casos de quebra do sigilo bancário, razão pela qual, a Lei Complementar n. 105/2001 teria disciplinado adequadamente a matéria.
Ainda, alega que se fez necessária a investigação a respeito da movimentação financeira da empresa, não havendo que se falar em qualquer violação dos direitos de intimidade e privacidade do contribuinte, tratando-se de matéria vinculada à atuação da fiscalização e indispensável à elucidação da prática do delito.
Por fim, requer a reforma da sentença prolatada, reconhecendo-se a constitucionalidade da quebra do sigilo bancário realizado pela Receita Federal com fulcro na Lei Complementar n. 105/2001, bem como sua utilização nesta ação penal, determinando-se, por consequência, o regular processamento do feito, com a remessa dos autos à primeira instância para prosseguimento da ação penal instaurada em face dos acusados.
A defesa apresentou contrarrazões de recurso (fls. 797/804).
Em juízo de retratação, o Magistrado de primeiro grau manteve a decisão recorrida (fl. 805).
A Procuradoria Regional da República manifestou-se pelo conhecimento e provimento do recurso interposto, recebido, diante da fungibilidade recursal, como apelação contra a sentença de absolvição sumária, sendo retomada a ação penal (fls. 806/812-v°).
É o relatório.
Dispensada a revisão, a teor dos artigos 34 e 236, caput, do Regimento Interno desta Corte Regional.
VOTO
O recurso em sentido estrito não comporta provimento.
Consta dos autos que Daniel e José foram denunciados pelo cometimento do crime previsto no artigo 1°, incisos I e II, da Lei nº 8.137/90, c.c os artigos 29 e 71, ambos do Código Penal, porque, nos anos de 2002 a 2004, exercícios 2003 a 2005, na condição de administradores da empresa "Rigor Alimentos Ltda.", de modo consciente e voluntário, suprimiram ou reduziram tributos e contribuições sociais, mediante as condutas de omissão de informações às autoridades fazendárias e fraude na fiscalização tributária omitindo operação de qualquer natureza, em livro exigido pela lei fiscal (fls. 614/617).
De acordo com a acusação, foram lavrados os Autos de Infração às fls. 387, 407, 419 e 433, os quais perfazem créditos tributários no importe de R$ 17.042.867,56 (dezessete milhões, quarenta e dois mil, oitocentos e sessenta e sete reais e cinquenta e seis centavos), relativos ao IRPJ; R$ 3.327.119,64 (três milhões, trezentos e vinte e sete mil, cento e dezenove reais e sessenta e quatro centavos), relativos ao PIS; R$ 15.355.940,01 (quinze milhões, trezentos e cinquenta e cinco mil, novecentos e quarenta reais e um centavo), relativos à COFINS; e R$ 7.698.389,03 (sete milhões, seiscentos e noventa e oito mil, trezentos e oitenta e nove reais e três centavos), relativos à CSLL.
O débito tributário foi parcelado em 11.09.2009, sendo o referido parcelamento rescindido em 24.01.2014 (fl. 539).
A denúncia foi recebida pela 1ª Vara da Justiça Federal em Bragança Paulista em 8.8.2014 (fl. 620).
Resposta à acusação às fls. 655/683.
Foi interposta exceção de incompetência (fls. 735/743), a qual foi julgada procedente e os autos foram remetidos ao Juízo da 1° Vara Federal Criminal de São Paulo/SP.
Considerando não haver impedimento na reconsideração da decisão que recebeu a denúncia pelo Juízo considerado incompetente, o Juiz de primeiro grau rejeitou a denúncia, por ausência de justa causa, com fundamento no artigo 395, inciso III, do Código de Processo Penal. Consignou que a prova produzida em sede da atuação fiscal restou prejudicada diante da utilização dos dados bancários obtidos sem que houvesse qualquer determinação do Poder Judiciário.
A questão controvertida refere-se à verificação de justa causa para exercício da ação penal instaurada para apurar delito de crime contra a ordem tributária, previsto no artigo 1°, incisos I e II, da Lei nº 8.137/90.
De acordo com o artigo 41 do Código de Processo Penal, a peça acusatória deve conter a exposição do fato criminoso e suas circunstâncias, a indicação da qualificação do acusado (ou esclarecimentos pelos quais se possa identificá-lo), a classificação do crime e, quando necessário, o rol de testemunhas.
Busca-se, com isso, possibilitar o pleno exercício do contraditório e da ampla defesa, em observância ao artigo 5º, inciso LV, da Constituição Federal.
Por sua vez, o artigo 395, inciso III, do Código de Processo Penal estabelece que a denúncia será rejeitada quando faltar justa causa para a ação penal.
Presentes, no caso concreto, os elementos que demonstrem a existência de fundamento de direito e de fato para a instauração do processo, há justa causa para a ação penal.
O fundamento de direito está consubstanciado na subsunção da conduta descrita a um tipo penal.
Por outro lado, o fundamento de fato é identificado na acusação em conformidade com a prova, relacionada com a existência material de um fato típico e ilícito (materialidade), indícios suficientes de autoria e um mínimo de culpabilidade.
Nestes termos, a falta de prova da materialidade é causa de rejeição liminar da denúncia.
É esse o caso dos autos.
Com efeito, o cumprimento das exigências do artigo 41 do Código de Processo Penal não justifica, por si só, o recebimento da inicial acusatória. Ainda que preenchidos os requisitos legais, caso seja verificada qualquer uma das hipóteses do artigo 395 do Estatuto Processual Penal, a peça inicial será rejeitada liminarmente.
Aqui, o Ministério Público Federal consigna que não há qualquer inconstitucionalidade na utilização, como fundamento da inicial acusatória, da "quebra" de sigilo bancário realizada pela Receita Federal, em desfavor da empresa administrada pelos acusados.
No entanto, a análise de elementos de prova produzidos em sede administrativa é necessária para a verificação de existência ou não de justa causa. Não se trata, aqui, de exercício de cognição exauriente. Somente com a verificação das provas produzidas até o momento da formalização da acusação será possível aferir se há justa causa para o exercício da ação penal.
No particular, verifico que a ação penal foi baseada em provas que foram obtidas por bojo de procedimento administrativo fiscal, mediante requisição direta pela autoridade fazendária dos dados dos contribuintes junto às instituições financeiras e, portanto, sem prévia autorização judicial, razão pela qual, diante da ilicitude da prova, a ação penal deve ser anulada.
De fato, verifico que a comprovação dos fatos descritos na denúncia somente foi possível a partir da quebra de sigilo bancário de forma ilícita, qual seja, por autoridade administrativa, sem autorização judicial, como é possível depreender do procedimento fiscal nº 13839.005781/2007-17, fls. 1/11 do Volume I.
A inviolabilidade do sigilo de dados, inserta no artigo 5º, XII, da Constituição Federal correlaciona-se com as garantias fundamentais da intimidade e privacidade, insculpidas no inciso X, do mesmo artigo e, conquanto não se revistam de caráter absoluto, como consabido, constituem manifestações expressivas do direito da personalidade frente às intromissões de terceiros, mormente, de atos arbitrários por parte de qualquer órgão do Poder Público.
No particular, a Constituição Federal assim determina:
"Art. 5º Todos são iguais perante a lei, sem distinção de qualquer natureza, garantindo-se aos brasileiros e aos estrangeiros residentes no País a inviolabilidade do direito à vida, à liberdade, à igualdade, à segurança e à propriedade, nos termos seguintes: |
(...) |
X - são invioláveis a intimidade, a vida privada, a honra e a imagem das pessoas, assegurado o direito a indenização pelo dano material ou moral decorrente de sua violação; |
|
XI - a casa é asilo inviolável do indivíduo, ninguém nela podendo penetrar sem consentimento do morador, salvo em caso de flagrante delito ou desastre, ou para prestar socorro, ou, durante o dia, por determinação judicial; |
|
XII - é inviolável o sigilo da correspondência e das comunicações telegráficas, de dados e das comunicações telefônicas, salvo, no último caso, por ordem judicial, nas hipóteses e na forma que a lei estabelecer para fins de investigação criminal ou instrução processual penal". |
Neste contexto está excepcionalidade da quebra do sigilo de dados, em especial das informações bancárias, em casos de investigação criminal ou instrução processual penal, conforme se extrai do texto constitucional, a qual exige, sempre, a autorização judicial (excetuadas as determinações das Comissões Parlamentares de Inquérito, que por força de dispositivo constitucional despõem de poderes de investigação próprios das autoridades judiciais).
A inviolabilidade de dados assegurada no texto constitucional acima transcrito está clausulada de forma absolutamente explícita e somente admite exceção mediante atuação de autoridade judiciária e para fins de investigação criminal ou instrução processual penal.
E a quebra aqui tratada foi efetivada por autoridade administrativa fiscal que, evidentemente, não pode ser equiparada à autoridade judiciária e, ainda, não se destinou, na origem, à investigação criminal, mas exclusivamente a apuração de eventual ilícito administrativo.
Sobre o tema, o Supremo Tribunal Federal assim já se pronunciou:
E, ainda, em sua composição plenária:
Cabe lembrar, ainda, que mesmo nos casos em que tenha sido respeitada a reserva da jurisdição e o campo próprio de atuação (criminal), o sigilo só pode ser quebrado se houver elementos que indiciem de forma minimamente provável a existência de autoria e materialidade delitivas.
Tais elementos devem estar presentes em momento anterior à decretação da quebra do sigilo. Em outras palavras, a quebra do sigilo constitucionalmente assegurado, ainda quando autorizada por decisão judicial, não pode ter o caráter exploratório, mas objetivo de complementar provas anteriormente colhidas.
Esse é o entendimento consagrado pelo Supremo Tribunal Federal, tal como se observa do voto proferido pelo Ministro Celso de Melo, na Medida Cautelar em Ação Cautelar nº 33, senão vejamos:
"(...) Tenho enfatizado, por isso mesmo, que a quebra do sigilo bancário - ato que se reveste de extrema gravidade jurídica - só deve ser decretada, e sempre em caráter de absoluta excepcionalidade, quando existentes fundados elementos que justifiquem, a partir de um critério essencialmente apoiado na prevalência do interesse público, a necessidade da revelação dos dados pertinentes às operações financeiras ativas e passivas resultantes da atividade desenvolvida pelas instituições bancárias. |
A relevância do direito ao sigilo bancário impõe, por isso mesmo, cautela e prudência ao poder Judiciário na determinação da ruptura da esfera de privacidade individual que o ordenamento jurídico, em norma de salvaguarda, pretendeu submeter à clausula tutelar de reserva constitucional (CF, art.5º, X). |
(...) Contudo para que esta providência extraordinária, e sempre excepcional, que é a decretação da quebra de sigilo bancário seja autorizada, revela-se imprescindível a existência de causa provável, vale dizer de fundada suspeita quanto a ocorrência de fato cuja apuração resulte exigida pelo interesse público. |
Na realidade, sem causa provável, não se justifica, sob pena de inadmissível consagração do arbítrio estatal e de inaceitável opressão ao indivíduo pelo poder Público, a "disclosure" das contas bancárias, eis que a decretação da quebra do sigilo bancário não pode converter-se num instrumento de indiscriminada e ordinária devassa da vida financeira das pessoas em geral. |
(...) |
A exigência de preservação do sigilo bancário - enquanto meio expressivo de proteção ao valor constitucional da intimidade - impõe ao estado o dever de respeitar a esfera jurídica de cada pessoa. A ruptura desse círculo de imunidade só se justificará desde que ordenada por órgão estatal investido, nos termos do nosso estatuto constitucional, da competência jurídica para suspender, excepcional e motivadamente, a eficácia do princípio da reserva das informações bancárias. |
Em tema de ruptura do sigilo bancário, somente os órgãos do poder judiciário dispõem do poder de decretara esta medida extraordinária, sob pena da autoridade administrativa interferir, indevidamente, na esfera de privacidade constitucional assegurada às pessoas. Apenas o |Judiciário, ressalvada a competência das Comissões Parlamentares de Inquérito (CF, art.58,§3º) pode eximir as instituições financeiras do dever que lhes incumbe em tema de sigilo bancário. (...)" |
No caso dos autos, a autoridade fiscal, diante da omissão para apresentar documentação esclarecimentos quanto à origem de valores creditados nas contas correntes, incompatíveis com os dados declarados ao fisco, solicitou diretamente às instituições financeiras tais elementos e, de posse de tais informações bancárias, logrou apurar os dados que fundamentaram a constituição do crédito tributário.
Em momento posterior, o Fisco compartilhou com o Ministério Público Federal, dados e documentos protegidos por sigilo bancário, à revelia de autorização judicial competente.
Pontuo que a permissão de acesso a informações bancárias e financeiras assegurada pela Lei Complementar n. 105/2001 não contempla a possibilidade divulgação de tais dados pelo Fisco e, a bem verdade, nem poderia, pois estaria em frontal desacordo com a previsão constitucional do inciso XII, do artigo 5º.
Ademais, o dever legal de comunicação do Ministério Público da ocorrência de crime ou indícios de prática delitiva, acompanhados de documentos pertinentes à apuração ou comprovação dos fatos não abrange a entrega de elementos probatórios protegidos pelo sigilo.
E com base, exclusivamente, nestes elementos entregues pelo Fisco e obtidos pela acusação de forma ilícita, que a denúncia foi ofertada, de modo que, desconsideradas as provas de materialidade e autoria advindas de ilegal quebra de sigilo bancário, não restam outros dados a embasar a denúncia.
De se destacar, por oportuno, que o tema foi recentemente analisado pela Suprema Corte, no julgamento realizado em 24/02/2016 das ADI´s n. 2.386, 2.397 e 2.859 e do RE 601.314, com acórdãos publicados em 21/10/2016 e 16/09/2016, assim ementados:
Nesta oportunidade, o Supremo Tribunal Federal não tratou da possibilidade da Receita Federal compartilhar dados bancários por ela obtidos sem autorização judicial e mesmo que se possa reconhecer que o artigo 6.º, da Lei Complementar n. 105/2001, permita à autoridade fazendária acessar dados bancários de pessoa jurídica, esta autorização não configura a exigência do art. 5º, XII, da Constituição Federal, tal como noticiado no Informativo n. 815, in verbis:
Assim, com base, exclusivamente, em documentação proveniente de quebra de sigilo foi ofertada a denúncia e não foi carreado nos autos qualquer elemento probatório independente a fim de embasar a ação penal.
Portanto, entendo não estar presente um substrato mínimo de provas contra os recorridos, de forma a justificar a persecução penal, de modo que deve mantida a decisão de rejeição da denúncia.
Ante o exposto, nego provimento ao recurso em sentido estrito interposto pelo Ministério Público Federal.
É o voto.
Documento eletrônico assinado digitalmente conforme MP nº 2.200-2/2001 de 24/08/2001, que instituiu a Infra-estrutura de Chaves Públicas Brasileira - ICP-Brasil, por: | |
Signatário (a): | MAURICIO YUKIKAZU KATO:10061 |
Nº de Série do Certificado: | 5EA8542F3E456DC1 |
Data e Hora: | 26/01/2018 15:53:25 |