Diário Eletrônico

PODER JUDICIÁRIO

TRIBUNAL REGIONAL FEDERAL DA 3ª REGIÃO

D.E.

Publicado em 28/02/2018
APELAÇÃO CRIMINAL Nº 0001999-42.2005.4.03.6127/SP
2005.61.27.001999-5/SP
RELATOR : Desembargador Federal HÉLIO NOGUEIRA
APELANTE : MILTON ALAOR BARALDI
ADVOGADO : SP113649 CARLOS MARCILIO
APELADO(A) : Justica Publica
EXTINTA A PUNIBILIDADE : JURACI NOGUEIRA COBRA falecido(a)
No. ORIG. : 00019994220054036127 1 Vr SAO JOAO DA BOA VISTA/SP

EMENTA

PENAL. APELAÇÃO CRIMINAL. APROPRIAÇÃO INDÉBITA PREVIDENCIÁRIA. SONEGAÇÃO DE CONTRIBUIÇÃO PREVIDENCIÁRIA. PRESCRIÇÃO DA PRETENSÃO PUNITIVA RETROATIVA. NÃO OCORRÊNCIA. TERMO A QUO DA CONTAGEM DO PRAZO PRESCRICIONAL. CONSTITUIÇÃO DEFINITIVA DO CRÉDITO TRIBUTÁRIO. MATERIALIDADE. CONTRIBUIÇÕES SÓCIAS PREVIDENCIÁRIAS E NÃO-PREVIDENCIÁRIAS. CONCURSO FORMAL ENTRE OS DELITOS DO ARTIGO 337-A DO CP E DO ARTIGO 1º DA LEI BN. 8.137/90 NÃO APLICADO PELA AUSÊNCIA DE RECURSO DA ACUSAÇÃO. AUTORIA COMPROVADA. DOLO GENÉRICO. DOSIMETRIA. CABÍVEL O CONCURSO MATERIAL ENTRE OS DELITOS DO ARTIGO 337-A E 168-A AMBOS DO CP. MANTIDA CONTINUIDADE À FALTA DE RECURSO DA ACUSAÇÃO. PENA BASE REDUZIDA. MONTANTE DO CRÉDITO TRIBUTÁRIO APURADO SEM CONSECTÁRIOS CIVIS. APTIDÃO PARA RECRUDESCIMENTO DA PENA-BASE. RECURSO DA DEFESA PARCIALMENTE PROVIDO.
1. Apelação da Defesa contra a sentença que condenou réu como incurso no artigo 168-A, §1º, I e artigo 337-A, I, c.c. o artigo 71, todos do Código Penal.
2. Prescrição da pretensão punitiva retroativa. Inocorrência. A jurisprudência sedimentou-se no sentido da aplicação da Súmula Vinculante nº 24 do Supremo Tribunal Federal aos crimes de apropriação indébita previdenciária e sonegação de contribuição previdenciária, reconhecendo a natureza material das infrações e, consequentemente, a consumação com a constituição definitiva do crédito tributário, bem como a necessidade do prévio exaurimento do procedimento administrativo fiscal como condição de procedibilidade para deflagração da ação penal. Termo a quo da contagem do prazo prescricional. Constituição definitiva do crédito tributário. Precedentes desta Corte Regional.
3. Materialidade demonstrada. No que refere à supressão e redução de contribuições, a NFLD em questão cuida de dois tipos de contribuições: as contribuições previdenciárias e as contribuições sociais não-previdenciárias destinadas a terceiros. Presentes, portanto, o tipo descrito no artigo 337-A do Código Penal, que cuida expressamente das contribuições sociais previdenciárias (Art. 337-A. Suprimir ou reduzir contribuição social previdenciária e qualquer acessório, mediante as seguintes condutas:) e as elementares do delito do artigo 1º da Lei n. 8.137/90, no que tange à omissão e/ou redução das contribuições destinadas a terceiros. Tal entendimento encontra esteio no princípio da especialidade. Hipótese que consubstancia a prática dos delitos previstos nos artigos 337-A, I, do Código Penal e do artigo 1º, I, da Lei nº 8.137/90, em concurso formal. O caso dos autos também não permite uma nova capitulação jurídica com agravamento da situação do réu como solução, porquanto não houve recurso do Ministério Público Federal. Nos exatos limites da matéria devolvida, subsistem, em relação à NFLD, apenas as condutas delitivas atinentes às contribuições incidentes sobre a remuneração dos empregados e contribuintes individuais, às destinadas ao financiamento de benefícios decorrentes de incapacidade laborativa (RAT) e as devidas pelos segurados empregados, não retidas, vale dizer, das contribuições previdenciárias propriamente ditas e que correspondem à figura delitiva do artigo 337-A, I, do Código Penal. LDC referente ao não repasse das contribuições descontadas dos empregados contribuintes e contribuintes individuais.
4. Autoria comprovada pelo conjunto probatório coligido.
5. Os delitos de apropriação indébita previdenciária e sonegação de contribuição previdenciária não exigem dolo específico. Precedentes dos Tribunais Superiores.
6. Decreto condenatório mantido.
7. Dosimetria. Possibilidade de concurso material entre os delitos de apropriação indébita previdenciária e sonegação de contribuição previdenciária. Condutas plurais correspondentes a dois delitos distintos e independentes. Concurso material não aplicado e mantida a continuidade delitiva entre os delitos à falta de recurso da acusação. Pena-base reduzida ao mínimo legal. O valor do crédito tributário a ser examinado tanto para aferição da aplicação do princípio da insignificância quanto para fins de fixação da dosimetria da pena não deve contemplar multa e juros, pois estes são consectários civis do não recolhimento do tributo, consoante jurisprudência firmada pelo Superior Tribunal de Justiça e seguida por esta Colenda Primeira Turma (HC 195372/SP, Rel. Ministro JORGE MUSSI, QUINTA TURMA, julgado em 12/06/2012, DJe 18/06/2012; TRF 3ª Região, PRIMEIRA TURMA, ACR - APELAÇÃO CRIMINAL - 56509 - 0004718-25.2012.4.03.6103, Rel. DESEMBARGADOR FEDERAL HÉLIO NOGUEIRA, julgado em 06/12/2016, e-DJF3 Judicial 1 DATA:13/12/2016; ACR 00042348720064036113, DESEMBARGADOR FEDERAL LUIZ STEFANINI, TRF3 - PRIMEIRA TURMA, e-DJF3 Judicial 1 DATA:12/06/2015). Vultosas quantias, frise-se, o valor principal do crédito tributário excluídos juros e multa, podem caracterizar graves consequências do delito e são aptas a ensejar o recrudescimento da pena na primeira fase da dosimetria. In casu, pena base reduzida ao mínimo legal para evitar qualquer prejuízo ao réu, devido a ocorrência de pagamento parcial, bem como pelo fato da NFLD n. 35.646.179-3 abranger as contribuições sociais não-previdenciárias, cujo valor não foi possível destacar, sendo que os valores principais inicialmente apurados (LDC n. 35.646.178-5: R$ 35.946,78 - fl. 29; NFLD n. 35.646.179-3: R$ 137.364,08 - fl. 77) não espelham aqueles que realmente devam ser considerados para fixação da reprimenda. Mantidas a atenuante genérica apontada na r.sentença (intenção de reparação do dano representada pela formalização de parcelamento em duas oportunidades), mas não aplicada a teor da Súmula n. 231 do Superior Tribunal de Justiça e a razão de aumento referente à continuidade delitiva. Pena reduzida para 02 (dois) anos, 04 (quatro) meses e 24 (vinte e quatro) dias e pagamento de 12 (doze) dias multa.
8. Recurso da defesa provido em parte.


ACÓRDÃO

Vistos e relatados estes autos em que são partes as acima indicadas, decide a Egrégia Primeira Turma do Tribunal Regional Federal da 3ª Região, por unanimidade, dar parcial provimento ao recurso da defesa, apenas, para reduzir a pena base ao mínimo legal, nos termos do relatório e voto que ficam fazendo parte integrante do presente julgado.


São Paulo, 20 de fevereiro de 2018.
HÉLIO NOGUEIRA
Desembargador Federal


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APELAÇÃO CRIMINAL Nº 0001999-42.2005.4.03.6127/SP
2005.61.27.001999-5/SP
RELATOR : Desembargador Federal HÉLIO NOGUEIRA
APELANTE : MILTON ALAOR BARALDI
ADVOGADO : SP113649 CARLOS MARCILIO
APELADO(A) : Justica Publica
EXTINTA A PUNIBILIDADE : JURACI NOGUEIRA COBRA falecido(a)
No. ORIG. : 00019994220054036127 1 Vr SAO JOAO DA BOA VISTA/SP

RELATÓRIO

O EXCELENTÍSSIMO SENHOR DESEMBARGADOR FEDERAL HÉLIO NOGUEIRA:

Trata-se de Apelação Criminal interposta por MILTON ALAOR BARALDI, contra a sentença de fls. 735/740, proferida pelo Juízo da 1ª Vara Federal de São João da Boa Vista/SP, que o condenou à pena de 03 (três) anos de reclusão, a ser cumprida em regime inicial aberto e pagamento de 14 (quatorze) dias-multa, no valor unitário mínimo legal, substituída por duas penas restritivas de direitos, pela prática dos delitos previstos no artigo 168-A, §1º, II e artigo 337-A, incisos I e II , c.c artigo 71, todos do Código Penal e declarou extinta a punibilidade de JURACI NOGUEIRA COBRA, nos termos do artigo 107, I, do Código Penal.

Consta da denúncia (fls. 396/398):

(...) De acordo com procedimento administrativo n. 35436.003227/2004-11, da Secretaria da Receita Previdenciária em São João da Boa Vista/SP, os presidentes dos Sindicato dos Trabalhadores nas Indústrias Metalúrgicas, Mecânicas e de material elétrico de espírito Santo do pinhal, inscrito no CNPJ n. 54.231.287/0001-90, sediado na Rua Marquês do Herval, 316, Centro, em Espírito Santo do Pinhal/SP, deixaram de repassar à Previdência Social, no prazo legal, as contribuições previdenciárias descontadas dos salários dos empregados e contribuintes individuais, bem como do encargo patronal e de segurados empregados (fls. 2-15 e 76.
A expedição do LDC n. 35.646.178-5 se deu em razão da retenção de contribuições devidas à seguridade social, descontadas dos salários dos empregados e contribuintes individuais, no período de março de 1998 a maio de 2004 e encontra-se na fase de "citação do devedor", cujo valor em abril de 2007 era de R$ 62.276,39 (sessenta e dois mil, duzentos e setenta e seis reais e trinta e nove centavos) (fl. 322).
Os débitos decorrentes das retenções devidas ao INSS relacionados aos encargos patronais e de segurados empregados ensejaram a expedição de Notificação Fiscal de Lançamento de Débito n. 35.646.179-3, referente ao período de janeiro de 1994 a maio de 2004 (fl. 322) e atualmente encontra-se na fase de Impugnação aos Embargos, cujo valor em agosto era de R$ 353.775,98 (trezentos e cinquenta e três mil, setecentos e setenta e cinco reais e noventa e oito centavos ( fl. 386).
A materialidade delitiva está, portanto, comprovada.
Outrossim, há indícios suficientes de autoria em relação aos acusados.
As atas de passe da Diretoria do sindicato (fls. 16-21) demonstram que JUARACI NOGUEIRA COBRA foi presidente do sindicato no período e dezembro/93 a janeiro/95 e MILTON ALAOR BARALDI é o atual presidente, desde janeiro/95, consequentemente responsáveis pessoa jurídica nos respectivos períodos.
Em suas declarações (fls. 281/282) JURACI NOGUEIRA COBRA reconhece que era responsável pelo recolhimento das contribuições previdenciárias na época em que atuou como presidente, e que os débitos com o INSS estão em processo de parcelamento.
MILTON ALAOR BARALDI, ouvido em termos de declarações (fl. 284) afirmou que é presidente do sindicato desde 1995 e que os débitos com o INSS foram parcelados.
Marcos Barbosa, em suas declarações (fl. 375) reconhece ser o contador responsável pela pessoa jurídica, afirmando que tentou efetuar o parcelamento dos débitos, que não foi possível.
A Delegacia da Receita Federal informa (fl. 386) que apenas a NFLD n. 35.646.179-3 foi incluída em parcelamento, o qual foi rescindido em 1º de fevereiro de 2005 e incluído em Dívida Ativa.(...)

A denúncia foi recebida em 08/01/2009 (fls. 400/403) e a sentença condenatória, publicada em 08/03/2013 (fl. 740).

Nas razões de fls. 760/770, a Defesa de MILTON ALAOR BARALDI pugna, preliminarmente, pelo reconhecimento da prescrição da pretensão punitiva retroativa, entre as datas dos fatos e o recebimento da denúncia. No mérito, pretende a redução da pena, aduzindo que o montante do crédito tributário, incluindo juros e multa, não pode ensejar grave consequência do delito autorizando o aumento da pena-base.

Contrarrazões do Ministério Público Federal às fls. 784/790.

A Procuradoria Regional da República, por seu ilustre representante, Dr. Álvaro Luiz de Mattos Stipp, à fl. 793, ratificou manifestação constante às fls. 7741/778, da lavra do Dr. Sérgio Monteiro Ribeiro, no qual opinou pelo reconhecimento da prescrição retroativa parcial e pelo desprovimento do recurso.

É o relatório.

À revisão.

HÉLIO NOGUEIRA
Desembargador Federal Relator


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APELAÇÃO CRIMINAL Nº 0001999-42.2005.4.03.6127/SP
2005.61.27.001999-5/SP
RELATOR : Desembargador Federal HÉLIO NOGUEIRA
APELANTE : MILTON ALAOR BARALDI
ADVOGADO : SP113649 CARLOS MARCILIO
APELADO(A) : Justica Publica
EXTINTA A PUNIBILIDADE : JURACI NOGUEIRA COBRA falecido(a)
No. ORIG. : 00019994220054036127 1 Vr SAO JOAO DA BOA VISTA/SP

VOTO

O EXCELENTÍSSIMO SENHOR DESEMBARGADOR FEDERAL HÉLIO NOGUEIRA (Relator):

MILTON ALAOR BARALDI foi denunciado junto com JURACI NOGUEIRA COBRA (fls. 396/399) como incursos nas sanções do artigo 168-A, § 1º, II e artigo 337-A, I e II, ambos c.c artigo 71 e artigo 69, todos do Código Penal, pois, na qualidade de presidentes, cada qual em determinado período, do Sindicato dos Trabalhadores nas Indústrias Metalúrgicas e Mecânicas e de Material Elétrico de Espírito Santo do Pinhal, deixaram de repassar à Previdência Social, no prazo legal, as contribuições previdenciárias descontadas dos salários dos empregados e contribuintes individuais, bem como de encargo patronal e de segurados empregados, entre janeiro de 1994 e maio 2004.

A denúncia foi recebida em 08/01/2009 (fls. 400/403) e a sentença condenatória, publicada em 08/03/2013 (fl. 740).

Da prescrição da pretensão punitiva estatal

A defesa aduz a ocorrência da prescrição da pretensão punitiva parcial, na modalidade retroativa, entre a data dos fatos e do recebimento da denúncia ocorrido em 08/01/2005,

Sustenta que em relação à NFLD n. 35.646.179-3, as condutas relativas às competências de 01/1994 a 01/2000 estariam todas prescritas pela pena in concreto e no tocante ao LDC n. 35.646.378-5, afirma que prescritas aquelas compreendidas entre 03/1998 e 01/2001.

Não lhe assiste razão.

De início, cumpre anotar que, como consabido, a jurisprudência sedimentou-se no sentido da aplicação da Súmula Vinculante nº 24 do Supremo Tribunal Federal aos crimes de apropriação indébita previdenciária e sonegação de contribuição previdenciária, reconhecendo a natureza material das infrações e, consequentemente, a consumação com a constituição definitiva do crédito tributário, bem como a necessidade do prévio exaurimento do procedimento administrativo fiscal como condição de procedibilidade para deflagração da ação penal.

Nessa ordem de ideias, o termo a quo para a contagem da prescrição é constituição definitiva do crédito tributário, regra esta que se aplica, também, em relação ao delito previsto no artigo 168-A do Código Penal, não mais se computando o lapso prescricional das datas dos efetivos não repasses das contribuições descontadas em cada competência, vale dizer, mês a mês.

Deste modo, já decidiu o Órgão Especial desta Corte Regional:

PENAL E PROCESSUAL PENAL. AÇÃO PENAL. PRESCRIÇÃO. NÃO CONFIGURAÇÃO. INÉPCIA DA INICIAL. INEXISTÊNCIA. ARTIGOS 337-A, INCISO II, E 168-A, §1º, INCISO I, DO CÓDIGO PENAL. CRIMES COMUNS. PREFEITO COMO AUTOR DE TAIS CRIMES. ADMISSIBILIDADE. CONDUTAS PRATICADAS EM PERÍODO ANTERIOR À EDIÇÃO DA MEDIDA PROVISÓRIA Nº 83, DE 12/12/2002. ATIPICIDADE QUANTO AS RELACIONADAS AO CONTRIBUINTE INDIVIDUAL. AUSÊNCIA DE LANÇAMENTO DEFINITIVO DO CRÉDITO TRIBUTÁRIO. CRIMES NÃO CONSUMADOS. ATIPICIDADE DAS CONDUTAS. APLICAÇÃO DA SÚMULA VINCULANTE Nº 24 DO STF. AÇÃO IMPROCEDENTE. ACUSADO ABSOLVIDO COM FULCRO NO ARTIGO 386, INCISO III, DO CPP.
1. A acusação ministerial imputa a Diogo Robalinho de Queiroz a violação dos artigos 337-A, inciso II, e 168-A, §1º, inciso I, ambos do Código Penal.
2. Os crimes pelos quais o acusado foi denunciado (artigos 337-A, inciso II, e 168-A, §1º, inciso I, ambos do Código Penal) somente se consumam com o lançamento definitivo do crédito tributário/previdenciário (Súmula vinculante nº 24). À vista da notícia de que os créditos inscritos nas NFLD em questão ainda estão em discussão em processo administrativo, descabido falar-se em consumação, o que impede o cômputo do prazo prescricional, que ainda não se iniciou.
(...)
7. Nos termos da Súmula vinculante nº 24 do STF: Não se tipifica crime material contra a ordem tributária, previsto no art. 1º, incisos I a IV, da Lei nº 8.137/90, antes do lançamento definitivo do tributo.
8. Na esteira desse enunciado, a jurisprudência de nossas cortes superiores tem considerado que a espécie de delito mencionada somente se consuma com o lançamento definitivo do crédito tributário/previdenciário. Assim, nesses casos, inexistiria justa causa para a instauração de inquérito policial ou a ação penal.
9. O artigo 337-A revogou tacitamente o artigo 1º, I e II, da Lei nº 8.137/90 no que se refere às contribuições previdenciárias e acessórios. Porém, à vista da identidade entre as condutas descritas nessas normas, indubitavelmente a citada súmula se estende a esse delito previdenciário.
10. Ressalte-se que referido entendimento se aplica também ao delito do artigo 168-A do CP. Conforme remansosa jurisprudência da corte superior, a analogia é possível à vista de que o bem jurídico tutelado pela norma prevista no artigo 168-A do Código Penal é o patrimônio da seguridade social e sua finalidade, conforme destaca a Ministra relatora Maria Tereza de Assis Moura no voto que proferiu ao julgar o REsp nº 1.172.001 - SP, é "propiciar a arrecadação de um tributo, qual seja, a contribuição previdenciária, de forma a beneficiar uma coletividade, em nome do princípio da solidariedade, que rege toda a matéria previdenciária. 'Deixar de repassar' aqui é, portanto, axiologicamente, o mesmo que 'deixar de recolher'. Tanto isso é verdade, que, a exemplo do que acontece com os crimes previstos na Lei nº 8.137/90, também se extingue a punibilidade com o pagamento da contribuição previdenciária, por força do artigo 9º, § 2º, da Lei nº 10.684/03, que assim dispõe: 'Art. 9º É suspensa a pretensão punitiva do Estado, referente aos crimes previstos nos arts. 1º e 2º da Lei nº 8.137, de 27 de dezembro de 1990, e nos arts. 168-A e 337-A do Decreto-Lei no 2.848, de 7 de dezembro de 1940 - Código Penal, durante o período em que a pessoa jurídica relacionada com o agente dos aludidos crimes estiver incluída no regime de parcelamento. § 1º A prescrição criminal não corre durante o período de suspensão da pretensão punitiva. § 2º Extingue-se a punibilidade dos crimes referidos neste artigo quando a pessoa jurídica relacionada com o agente efetuar o pagamento integral dos débitos oriundos de tributos e contribuições sociais, inclusive acessórios'.
11. Para a consumação do crime de apropriação indébita previdenciária, exige-se ocorrência de resultado consubstanciado em dano à Previdência Social. Portanto, enquanto a contribuição não é reconhecidamente "devida", não é possível considerar que ocorreu a consumação.
12. A Delegacia da Receita Federal do Brasil em Campo Grande informou, por meio de ofício, que as Notificações Fiscais de Lançamento - NFLD de nº 35.686.163-5 e 35.686.164-3 estão em fase de contencioso administrativo que tramita no Conselho Administrativo de Recursos Fiscais, bem como que o crédito de nº 35.686.166-0, foi baixado em 22.06.2007, por decisão da Junta de Julgamento da Delegacia da Receita Federal de Julgamento em Campo Grande/MS. Assim, de acordo com o entendimento jurisprudencial citado, os fatos descritos na peça acusatória não constituem infração penal, diante da ausência de lançamento definitivo dos débitos previdenciários em questão.
13. Ação penal julgada improcedente. Diogo Robalinho de Queiroz absolvido da imputação de violação dos artigos 337-A, inciso II, e 168-A, § 1º, inciso I, ambos do CP, com fulcro no artigo 386, inciso III, do CPP.
(TRF 3ª Região, ORGÃO ESPECIAL, APN - AÇÃO PENAL - 405 - 0000767-76.2005.4.03.6003, Rel. DESEMBARGADOR FEDERAL ANDRE NABARRETE, julgado em 10/07/2013, e-DJF3 Judicial 1 DATA:30/07/2013 )

Nesse sentido, ainda, a jurisprudência do Superior Tribunal de Justiça:

AGRAVO REGIMENTAL NO RECURSO ESPECIAL. ART. 168-A, § 1º, DO CP.
CRIME MATERIAL. PRESCRIÇÃO. NÃO OCORRÊNCIA. RECURSO DESPROVIDO.
1. Na linha da jurisprudência deste Tribunal Superior, o crime de apropriação indébita previdenciária, previsto no art. 168-A, ostenta natureza de delito material. Portanto, o momento consumativo do delito em tela corresponde à data da constituição definitiva do crédito tributário, com o exaurimento da via administrativa (ut, (RHC 36.704/SC, Rel. Ministro FELIX FISCHER, Quinta Turma, DJe 26/02/2016). Nos termos do art. 111, I, do CP, este é o termo inicial da contagem do prazo prescricional.
2. In casu, a sentença condenou o recorrido à pena de 02 anos de reclusão (sem considerar o aumento de 1/3 da pena pela continuidade delitiva), de forma que o prazo prescricional há ser observado é de 04 anos, consoante o artigo 109, V, do Código Penal. 3. Assim, tendo em vista a data da constituição definitiva do crédito tributário (22/11/2007), não se verifica o transcurso do prazo prescricional de 4 (quatro) anos entre a constituição definitiva do crédito e os marcos interruptivos da prescrição, na espécie, pois a denúncia foi recebida em 22/03/2011 e a sentença condenatória publicada em 20/05/2014.
4. Agravo regimental não provido.
(AgRg no REsp 1644719/SP, Rel. Ministro REYNALDO SOARES DA FONSECA, QUINTA TURMA, julgado em 23/05/2017, DJe 31/05/2017)
PROCESSUAL PENAL. RECURSO ORDINÁRIO EM HABEAS CORPUS. APROPRIAÇÃO INDÉBITA PREVIDENCIÁRIA. CRIME MATERIAL. TRANCAMENTO DA AÇÃO PENAL.
OCORRÊNCIA. RECURSO PROVIDO.
I - Na linha da jurisprudência deste Tribunal Superior, o crime de apropriação indébita previdenciária, previsto no art. 168-A, ostenta natureza de delito material. Portanto, o momento consumativo do delito em tela corresponde à data da constituição definitiva do crédito tributário, com o exaurimento da via administrativa.
II - In casu, a constituição definitiva do tributo apenas ocorreu depois do oferecimento da denúncia, o que torna inviável o prosseguimento da ação penal.
Recurso ordinário provido para determinar o trancamento do Processo nº 2009.71.00.004841-7.
(RHC 36.704/SC, Rel. Ministro FELIX FISCHER, QUINTA TURMA, julgado em 18/02/2016, DJe 26/02/2016)

In casu, há informação nos autos que os créditos tributários foram definitivamente constituídos na esfera administrativa:

- NFLD n. 35.646.179-3: em 13/07/2004, conforme Ofício da Delegacia da Receita Federal em Limeira/SP (fls. 671);

- LDC n. 35.646.178-5: em 28/06/2004, data constante do próprio Lançamento de Débito Confessado à fl. 29 e conforme Ofício da Delegacia da Receita Federal em Limeira/SP (fls. 671);

A denúncia foi recebida em 08/01/2009 (fls. 401/403) e a sentença publicada em 08/03/2013 (fl. 740).

Consta, ainda, que em relação à NFLD n. 35.646.179-3 a empresa contribuinte permaneceu, antes do recebimento da denúncia, em programa de parcelamento especial entre 12/08/2004 a 01/02/2005 (Oficio DRF/SECAT n. 501/2008 - fl. 386).

Há, também, notícia que, após o recebimento da denúncia, em relação ao LDC e à NFLD acima citadas (agrupadas na Confissão de Dívida Fiscal n. 60.272.029-0), houve adesão ao parcelamento da Lei n. 11.941/2009, em 08/09/2009, porém, o contribuinte teve seu pedido cancelado em 29/12/2011, por não prestar informações necessárias à consolidação do débito (Ofícios n. 96 e n. 116 DRF/SECAT - fls. 642 e 649), pelo que nesse período permaneceu suspenso o transcurso do lapso prescricional.

In casu, a pena a ser analisada para efeito da prescrição é de 02 (dois) anos e 06 (seis) meses de reclusão imposta ao réu MILTON ALAOR, descontada a continuidade delitiva, cujo prazo prescricional é de 08 (oito) anos, nos termos do artigo 109, inciso IV, do Código Penal.

Assim, nos termos dos § 1º do artigo 110 do Código Penal (na redação anterior à Lei nº 12.234/2010), verifico que não decorreu lapso superior ao prescricional entre os marcos interruptivos acima descritos (data dos fatos: 28/06/2004 - recebimento da denúncia:08/01/2009 - publicação da sentença: 08/03/2013), descontando-se os períodos de permanência em programa de parcelamento.

Desta feita, afasto a preliminar suscitada.

Do mérito

Antes, porém, de adentrar no exame da materialidade e autoria, cumpre proceder às anotações seguintes.

MILTON ALAOR BARALDI foi denunciado por deixar de recolher contribuições descontadas de segurados empregados e contribuintes individuais à Previdência Social, bem como por ter suprimido e reduzido contribuições previdenciárias através da omissão total ou parcial de fatos geradores de contribuição, mediante ação dolosa e de forma consciente.

O Lançamento de Débito Confessado n. 35.646.178-5 refere-se às contribuições retidas na folha de pagamentos de funcionários a serviço da Entidade Sindical, prevista no artigo 20 da Lei n. 8.21/91 e declaradas em Guias de Recolhimento do FGTS e Informações à Previdência Social -GFIP, em decorrência do não recolhimento em épocas próprias, relativo às competências de 03/1998 a 05/2004 (fl. 72).

A Notificação Fiscal de Lançamento de Débito n. 35.646.179-3 refere-se ao não recolhimento integral das contribuições previdenciárias a cargo da entidade sindical (parte patronal e para o financiamento de benefícios concedidos em razão do grau de incidência de incapacidade laborativa decorrente de riscos ambientais do trabalho-RAT) e de contribuições a cargo da entidade e destinadas a terceiros, FNDE e INCRA, relativo às competências entre 01/1994 a 05/2004 (fls. 171/172).

No que refere à supressão e redução de contribuições, verifico que a NFLD n. 35.646.179-3 cuida de dois tipos de contribuições: as contribuições previdenciárias e as contribuições sociais não-previdenciárias destinadas a terceiros.

Deste modo, entendo que, além do tipo descrito no artigo 337-A do Código Penal, que cuida expressamente das contribuições sociais previdenciárias (Art. 337-A. Suprimir ou reduzir contribuição social previdenciária e qualquer acessório, mediante as seguintes condutas:), estão presentes, também, as elementares do delito do artigo 1º da Lei n. 8.137/90, no que tange à omissão e/ou redução das contribuições destinadas a terceiros. Tal entendimento encontra esteio no princípio da especialidade.

Por conseguinte, a hipótese da NFLD suprrarreferida consubstancia a prática dos delitos previstos nos artigos 337-A, I, do Código Penal e do artigo 1º , I, da Lei nº 8.137 /90, em concurso formal.

Nesse sentido, colaciono os seguintes julgados esta C. Corte Regional:

PENAL E PROCESSUAL PENAL. APELAÇÕES CRIMINAIS. ART. 168-A, §1º, I, CP. ART. 1º, I, DA LEI Nº 8.137/90. ART. 337-A, III, DO CÓDIGO PENAL. JUSTA CAUSA. SÚMULA VINCULANTE 24. CRIME DE APROPRIAÇÃO INDÉBITA PREVIDENCIÁRIA. ABOLITIO CRIMINIS. INOCORRÊNCIA. SUCESSÃO DE LEIS PENAIS. MATERIALIDADE DEMONSTRADA. PARCELA DOS ACUSADOS ABSOLVIDA POR INSUFICIÊNCIA DE PROVA DA AUTORIA DO DELITO. INEXIGIBILIDADE DE CONDUTA DIVERSA EXCLUDENTE DE CULPABILIDADE QUE NÃO SE APLICA AOS CRIMES DO ART. 337-A, III, DO CP, E DO ART. 1º, I, DA LEI Nº 8.137/90. DEMONSTRADA PARCIALMENTE A EXCLUDENTE QUANTO AO CRIME DO ART. 168-A, §1º, I, DO CÓDIGO PENAL. REDUÇÃO DE CONTRIBUIÇÃO AO SISTEMA "S". PRINCÍPIO DA ESPECIALIDADE. SUBSUNÇÃO À NORMA PENAL CONTIDA NO ART. 1º, DA LEI Nº 8.137/90. EMENDATIO LIBELLI. POSSIBILIDADE. DOLO GENÉRICO. CONCURSO DE CRIMES. DOSIMETRIA DA PENA. VALOR UNITÁRIO DA PENA DE MULTA. RECURSO DEFENSIVO DESPROVIDO. APELO MINISTERIAL PARCIALMENTE PROVIDO.
1- Nos termos da Súmula Vinculante nº 24, os crimes materiais contra a ordem tributária, previstos no art. 1º, I a IV, da Lei nº 8.137/90, não se tipificam antes do lançamento definitivo do tributo. Idêntico raciocínio se aplica ao delito do art. 337-A, do Código Penal, por se tratar, igualmente, de crime material que somente se configura após a constituição definitiva do crédito tributário na esfera administrativa.
2 - O crime do art. 168-A do Código Penal possui natureza formal e se consuma com a mera omissão no repasse das contribuições previdenciárias no prazo legalmente assinalado, não se lhe aplicando a Súmula Vinculante nº 24.
3- Crime de apropriação indébita previdenciária. Materialidade delitiva amplamente demonstrada pela prova documental produzida nos autos. Autoria do crime apenas parcialmente demonstrada.
4- O objeto material do delito de apropriação indébita previdenciária é o valor recolhido e não repassado aos cofres da Previdência e não o valor do débito tributário inscrito, já incluídos os juros de mora e a multa.
5- Foram praticadas apropriações indébitas previdenciárias em semelhantes condições de tempo, lugar e modo de execução, pelo que configurado o concurso de crimes na modalidade da continuidade delitiva.
6- Não há que se falar em abolitio criminis, decorrente da revogação do artigo 95 da Lei nº 8.212/91 (vigente na data do primeiro período de fatos), pois a conduta de omitir o repasse à previdência social das contribuições recolhidas dos contribuintes, no prazo e forma legal ou convencional permanece tipificada no art. 168-A do Código Penal.
7- A existência de dificuldades financeiras enfrentadas pela pessoa jurídica pode configurar causa de exclusão da culpabilidade, por inexigibilidade de conduta diversa. Para que caracterizem a excludente, as adversidades devem ser de tal ordem que coloquem em risco a própria existência do negócio e apenas a absoluta impossibilidade financeira devidamente comprovada nos autos pode justificar a omissão nos recolhimentos.
8- Hipótese em que houve demonstração robusta e suficiente, ao menos em relação a parcela dos fatos descritos na denúncia, acerca da inexigibilidade de conduta diversa alegada pela defesa.
9- Com relação a um dos acusados, que sucedeu os corréus na sociedade empresária, não há demonstração da excludente de culpabilidade. Competia à defesa o ônus de comprovar, não apenas as dificuldades econômicas da sociedade, mas a verdadeira impossibilidade de promover o repasse das contribuições previdenciárias descontadas dos segurados empregados, o que não ocorreu.
10- A norma prevista no art. 337-A, III, do Código Penal não se aplica à redução/supressão das contribuições sociais gerais, devidas a terceiros (sistema "S", salário-educação, INCRA, etc.), incidindo apenas para a tipificação da redução/supressão das contribuições de Seguridade Social (contribuições nominadas), previstas no art. 195, I a IV, da Constituição Federal, por força do princípio da especialidade.
11- Caso concreto em que o órgão acusatório, na exordial, embora tenha capitulado apenas o delito do art. 337-A, III, do CP, descreveu os crimes de sonegação de contribuição previdenciária e o delito do art. 1º, I, da Lei nº 8.137/90 (que abarca a sonegação de contribuições sociais).
12-A reclassificação é plenamente possível na recursal, pois não há vedação legal à aplicação do instituto da emendatio libelli no segundo grau de jurisdição, nos termos do artigo 383 do Código de Processo Penal, uma vez que o réu se defende de fatos e não da definição jurídica que lhes é atribuída.
13- Hipótese em que o Ministério Público Federal interpôs apelação requerendo a reclassificação de parcela dos fatos e a condenação autônoma do réu pela prática do crime do art. 1º da Lei nº 8.137/90, donde não há falar em indevida piora na situação do acusado.
14- Materialidade e autoria dos crimes do art. 337-A, III, do Código Penal, e do art. 1º, I, da Lei nº 8.137/90, suficientemente demonstradas.
15- O dolo dos tipos penais do art. 337-A do CP e do art. 1º da Lei nº 8.137/90 é genérico, bastando, para a tipicidade da conduta, que o sujeito queira não pagar, ou reduzir, tributos, consubstanciado o elemento subjetivo em uma ação ou omissão voltada a este propósito.
16- A tese defensiva de que, ao tempo dos fatos, a pessoa jurídica contribuinte enfrentava sérias dificuldades financeiras, o que teria impedido o regular adimplemento das obrigações tributárias não configura a causa supralegal excludente da culpabilidade da inexigibilidade de conduta diversa quanto aos crimes do art. 337-A, III, do Código Penal, e do art. 1º, da Lei nº 8.137/90. Com efeito, não é o caso de reconhecer a inexigibilidade de conduta diversa, pois as privações financeiras não desobrigam o acusado de prestar adequadamente informações acerca das remunerações creditadas em favor de seus segurados empregados, permitindo a constituição do crédito tributário, ainda que este restasse, posteriormente, inadimplido.
17- Concurso de crimes: reconhecida a continuidade delitiva para cada um dos delitos. Entre si, tem-se que o delito do art. 337-A, III, do Código Penal, foi praticado em concurso formal próprio (art. 70, primeira parte, do Estatuto Repressivo) com o delito do art. 1º, I, da ei nº 8.137/90, e ambos foram cometidos em concurso material com o delito do art. 168-A, §1º, I, do Código Penal, pois se tratou de conduta autônoma (omissão no repasse das contribuições descontadas dos pagamentos efetuados aos segurados empregados e contribuintes individuais).
18- Dosimetria. Valoração negativa das consequências do crime. Valores de tributos reduzidos e de contribuições apropriadas superiores ao ordinário.
19- Continuidade delitiva. Aumento previsto no art. 71 do Código Penal fixado em maior grau, considerando o período abarcado na denúncia e a posição desta E. Corte em casos semelhantes.
20 - Valor unitário do dia-multa aumentado a fim de guardar observância com a situação econômica do acusado.
21- Apelo defensivo desprovido.
22 - Recurso ministerial parcialmente provido.
(TRF 3ª Região, DÉCIMA PRIMEIRA TURMA, ACR - APELAÇÃO CRIMINAL - 67283 - 0003879-79.2003.4.03.6114, Rel. DESEMBARGADOR FEDERAL JOSÉ LUNARDELLI, julgado em 31/01/2017, e-DJF3 Judicial 1 DATA:09/02/2017 )

PENAL. PROCESSUAL PENAL. SONEGAÇÃO DE CONTRIBUIÇÃO PREVIDENCIÁRIA. CP, ART. 337-A, I. ART. 1º, I, DA LEI N. 8.137/90. PRELIMINARES. REJEIÇÃO. DOLO ESPECÍFICO. PRESCINDIBILIDADE. DIFICULDADES FINANCEIRAS. IMPROCEDÊNCIA. MATERIALIDADE E AUTORIA COMPROVADAS. DOSIMETRIA. PENA-BASE. CONSEQUÊNCIAS DO DELITO. CONCURSO FORMAL E CONTINUIDADE DELITIVA. DUPLO AUMENTO. BIS IN IDEM. REGIME INICIAL. SUBSTITUIÇÃO DA PENA PRIVATIVA DE LIBERDADE. CONCESSÃO. CP, ART. 44. PREQUESTIONAMENTO. APELAÇÃO PARCIALMENTE PROVIDA.
1. A ausência de contrarrazões, pela acusação, é mera irregularidade, não constituindo óbice ao julgamento do recurso.
2. Na hipótese de o agente não incluir remuneração paga em GFIP, caracteriza-se tanto o delito de sonegação de contribuições previdenciárias (CP, art. 337-A, III) quanto o de sonegação fiscal (Lei n. 8.137/90, art. 1º, II), pois mediante fraude é reduzido o valor devido a titulo de contribuições previdenciárias e também aquelas destinadas a terceiros, como SESC, SENAI etc. Portanto, há concurso formal (CP, art. 70), mas, em razão da reiteração da conduta, também há continuidade delitiva (CP, art. 71). Como as penas prescritas para ambos os delitos são iguais, não há falar em mais grave (CP, art. 70) para a determinação da sanção penal: para que não haja bis in idem (acréscimo pelo concurso formal e pela continuidade delitiva), aplica-se apenas o acréscimo referente à continuidade delitiva (TRF da 3ª Região, ACr n. 2008.61.26.005352-1, Rel. Des. Fed. Paulo Fontes, j. 31.03.14)
3. Não verificada nulidade nas questões preliminares arguidas pela defesa, relativas à inversão do ônus da prova, ofensa ao princípio do contraditório e ao art. 156 do Código de Processo Penal. Eram prescindíveis a instauração de inquérito policial e a realização de exame pericial. Ademais, a sentença não se baseou exclusivamente em elementos de convencimento extrajudiciais, fundamentando-se também na prova testemunhal e no interrogatório do réu, colhidos em Juízo.
4. Não verificada a prescrição da pretensão punitiva.
5. Comprovadas a materialidade e a autoria da conduta, com base no Procedimento Administrativo Fiscal e na prova oral produzida sob o crivo do contraditório.
6. A mera existência de dificuldades financeiras, as quais, por vezes, perpassam todo o corpo social, não configura ipso facto causa supralegal de exclusão de culpabilidade por inexigibilidade de conduta diversa quanto ao delito de não repasse de contribuições previdenciárias. O acusado tem o ônus de provar que, concretamente, não havia alternativa ao não repasse das contribuições. Precedentes do TRF da 3ª Região.
7. A fixação da pena-base acima do mínimo legal justifica-se pelas consequências do delito, que superam aquelas esperadas para o tipo penal.
8. Incidência da atenuante da confissão.
9. Reformulo meu entendimento para acompanhar a jurisprudência do Superior Tribunal de Justiça e desta Corte Regional no sentido de que, na concorrência entre o concurso formal e o crime continuado, aplica-se apenas o aumento de pena relativo à continuidade delitiva, sob pena de configurar indevido bis in idem (STJ, HC n. 201000299562, Rel. Min. Jorge Mussi, j. 01.10.13, HC n. 201001245660, Rel. Min. Laurita Vaz, j. 28.06.11, HC n. 200602486284, Rel. Min. Gilson Dipp, j. 24.04.07; TRF 3ª Região, ACR n. 00011829720114036181, Rel. Des. Fed. Paulo Fontes, j. 08.09.14 e ACR n. 00015842919994036108, Rel. Des. Fed. Cecilia Mello, j. 07.05.13).

(...)

13. Apelação criminal parcialmente provida.
(TRF 3ª Região, QUINTA TURMA, ACR - APELAÇÃO CRIMINAL - 64622 - 0002675-67.2013.4.03.6140, Rel. DESEMBARGADOR FEDERAL ANDRÉ NEKATSCHALOW, julgado em 09/05/2016, e-DJF3 Judicial 1 DATA:13/05/2016).

Contudo, destaco que a inicial acusatória refere-se a "retenções devidas ao INSS relacionados aos encargos patronais e de segurados empregados que ensejaram a expedição da Notificação Fiscal de Lançamento de Débito n. 35.646.179-3" como o prejuízo decorrente da prática do delito do artigo 337-A Código Penal.

Assim, poder-se-ia cogitar a possibilidade de emendatio libelli em segunda da instância, visto que a expressão genérica "retenções devidas ao INSS" poderia compreender a sonegação das contribuições sociais não previdenciárias. Entretanto, o caso dos autos também não permite uma nova capitulação jurídica com agravamento da situação do réu como solução, porquanto não houve recurso do Ministério Público Federal, sob pena de reformatio in pejus.

Desta feita, considerando os exatos limites da matéria devolvida, entendo que em relação NFLD n. 35.646.179-3 subsistem apenas as condutas delitivas atinentes às contribuições incidentes sobre a remuneração dos empregados e contribuintes individuais, às destinadas ao financiamento de benefícios decorrentes de incapacidade laborativa (RAT) e as devidas pelos segurados empregados, não retidas, vale dizer, das contribuições previdenciárias propriamente ditas e que correspondem à figura delitiva do artigo 337-A, I, do Código Penal, o que será devidamente quantificado quando da análise da materialidade.

Assentada tal proposição, volto à matéria devolvida.

Examino imputação do crime de apropriação indébita previdenciária e do delito de sonegação de contribuição previdenciária (com as ressalvas supra) de forma conjunta.

A materialidade delitiva de ambos os delitos restou fartamente demonstrada no Procedimento Administrativo Fiscal n. 35436.003227/2004-11 (Volumes de I e II), do qual constam:

- apropriação indébita previdenciária: a LDC n. 35.646.178-5 (fls. 29/76) referente ao não repasse das contribuições descontadas dos empregados contribuintes e contribuintes individuais, correspondente às competências de 03/1998 a 05/2004, cujo valor principal do crédito tributário, definitivamente constituído, excluídos juros e multa, somava o valor de R$ 35.946,78 (trinta e cinco mil, novecentos e quarenta e seis reais e setenta e oito centavos - fl. 29);

Em relação ao LDC n. 35.646.178-5 houve pagamento parcial no valor de R$ 14.767,23 (quatorze mil, setecentos e sessenta e sete reais e vinte e três centavos), em 31/07/2004, segundo a Delegacia da Receita Federal, suficiente para liquidação do período de 03/1998 a 04/2000 (fls. 296/297 e fls. 608/609).

- sonegação de contribuição previdenciária: NFLD n. 35.646.179-3 (fls. 77/185), referente às contribuições devidas à seguridade social (parte patronal e para o financiamento dos benefícios concedidos em razão do grau de incidência de incapacidade laborativa decorrente de riscos ambientais do trabalho-RAT), correspondente à parte dos segurados empregados, contribuintes individuais, inclusive dos cooperados, por serviços aprestados através de cooperativas de trabalho, declaradas ou não em GFIP, e contribuições patronais devida a terceiros (outras entidades e fundos), FNDE e INCRA, incidentes sobre as mesmas remunerações dos empregados segurados (artigo 94 da Lei n. 8.212/91), correspondente às competências de 01/1994 a 05/2004 (intermitente).

Para a NFLD n. 35.646.179-3, o valor principal do crédito tributário apurado, definitivamente constituído, excluídos juros e multa, somava o valor de R$ 137.364,08 (cento e trinta e sete mil, trezentos e sessenta e quatro reais e oito centavos), valor principal total, incluindo o montante da contribuição destinada a Terceiros - Salário Educação (FNDE) e INCRA (fls. 77 e fls. 163/164), o que será retomado quando da análise da dosimetria da pena.

A autoria do delito, ao que se depreende do conjunto probatório, restou devidamente comprovada.

Interrogado na fase inquisitiva (fl. 284), MILTON ALAOR confirmou que presidia a entidade desde 1995 e que havia débitos com a autarquia previdenciária. Alegou que "as despesas com administração não superaram a receita, motivo pelo qual a empresa ficou em débito com o INSS", mas que já havia acordo para parcelamento da dívida e que a contabilidade da entidade e a responsabilidade pelo recolhimento de tributos estavam a cargo de um escritório de contabilidade.

Em Juízo (fls. 568/569), MILTON ALAOR reafirmou que os compromissos previdenciários da entidade não foram cumpridos por questões financeiras, tendo em vista os investimentos realizados pelo sindicato e que os débitos foram incluídos em programa de parcelamento:

(...) desde a época dos fatos até a presente data o depoente exerce a presidência do sindicato e os fatos se deram porque o sindicato precisou investir na construção de consultório odontológico e na aquisição de material escolar para os associados, o que gerou o débito mencionado na denúncia, mas em relação a isso foi feito acordo judicial, parcelamento, o qual vem sendo cumprido religiosamente pelo sindicato (...) o que também contribui para gerar o débito foi o problema do não recolhimento de contribuições de prestadores de serviços ocasionais; os acordos mencionados acima forma feitos nos anos de 2004 e reenglobados no parcelamento de 2009 e em ações de execução fiscal(...)

O codenunciado JURACI NOGUEIRA, por sua vez, ao ser interrogado em Juízo (fls. 570/571), asseverou que não tinha conhecimento sobre o não repasse das contribuições descontadas dos empregados durante a sua gestão (de 1990 a 1994), ao mesmo tempo que admitiu que não havia recolhimento de contribuição previdenciária em relação aos prestadores de serviços ocasionais.

Deste modo, não há como afastar a responsabilidade do apelante pelo recolhimento dos tributos, à época dos fatos. A defesa não trouxe qualquer elemento de prova aos autos para corroborar o quanto alegado. Sequer o contador foi arrolado como testemunha, aliás, frise-se, a defesa não arrolou quaisquer testemunhas.

Quanto ao dolo, registro que o E. Superior Tribunal de Justiça pacificou o entendimento que, para ambos os delitos imputados a MILTON, apropriação indébita previdenciária e sonegação de contribuição previdenciária, prescindível é a demonstração do dolo específico.

Para o delito previsto no artigo 168-A do Código Penal, o dolo exigido, portanto, é a vontade livre e consciente de deixar de recolher, no prazo legal, contribuição descontada de pagamentos efetuados a segurados, dispensada a intenção de apropriar-se das importâncias descontadas, ou seja, não se exige o animus rem sibi habendi.

No tocante o delito capitulado no artigo 337-A do Código Penal, prescindível a intenção específica de fraudar a Previdência Social, sendo bastante a omissão voluntária.

Neste sentido, situa-se a jurisprudência do Superior Tribunal de Justiça, v.g.:

RECURSO ESPECIAL. APROPRIAÇÃO INDÉBITA PREVIDENCIÁRIA. ALEGAÇÃO DE INÉPCIA DA DENÚNCIA. SENTENÇA CONFIRMADA EM GRAU DE APELAÇÃO.
ESPECIAL FIM DE AGIR. PRESCINDIBILIDADE. PERDÃO JUDICIAL E EXTINÇÃO DA PUNIBILIDADE. SÚMULA N. 282 DO STF. FATOS IMPEDITIVOS, MODIFICATIVOS OU EXTINTIVOS DA PRETENSÃO ACUSATÓRIA. REGRA DO ONUS PROBANDI. ART. 156 DO CPP. PROVA SUFICIENTE DE QUE O IMPUTADO COMETEU O FATO A ELE ATRIBUÍDO. RECURSO PARCIALMENTE CONHECIDO E, NESTA EXTENSÃO, NÃO PROVIDO.
1. Se já houve pronunciamento sobre o mérito da persecução penal, denotando, ipso facto, a plena aptidão da inicial acusatória, fica prejudicado o exame da violação do art. 41 do CPP, principalmente quando evidenciado que o recorrente exerceu, com plenitude, o contraditório e a ampla defesa.
2. Para a configuração do crime previsto no art. 168-A do CP basta a vontade livre e consciente de não repassar à previdência social as contribuições recolhidas dos contribuintes, pois o tipo penal não exige especial fim de agir.
(...)
8. Recurso especial parcialmente conhecido e, nesta extensão, não provido.
(REsp 1359446/SP, Rel. Ministro ROGERIO SCHIETTI CRUZ, SEXTA TURMA, julgado em 19/04/2016, DJe 28/04/2016)
AGRAVO REGIMENTAL EM RECURSO ESPECIAL. PENAL. SONEGAÇÃO DE CONTRIBUIÇÃO PREVIDENCIÁRIA. ART. 337-A DO CP. DOLO ESPECÍFICO. PRESCINDIBILIDADE. SÚMULA 83/STJ. DOSIMETRIA. BIS IN IDEM. NÃO OCORRÊNCIA. CONFISSÃO ESPONTÂNEA. INAPLICABILIDADE.
1. Segundo a orientação desta Corte, para a consumação do crime sonegação de contribuições previdenciárias, é suficiente a constatação do dolo genérico.
2. Segundo precedente da Sexta Turma, por se tratar o crime continuado de uma ficção jurídica, na fixação da pena-base pode ser considerado o prejuízo total decorrente dos delitos cometidos em continuidade, sem que isso configure bis in idem.
3. Conforme entendimento do Superior Tribunal de Justiça, como a confissão extrajudicial não foi utilizada para justificar a condenação, não fazem os recorrentes jus à atenuante.
4. Agravo regimental improvido.
(AgRg no REsp 1552195/SP, Rel. Ministro SEBASTIÃO REIS JÚNIOR, SEXTA TURMA, julgado em 16/02/2016, DJe 25/02/2016)

O apelante afirmou em Juízo que passou a administrar a entidade a partir de 1995 e admitiu não ter havido o pagamento de contribuições previdenciárias em razão de investimentos para construção de um consultório odontológico e da aquisição de material escolar, bem como que o sindicato não recolhia as contribuições em relação aos prestadores de serviços ocasionais, do que se infere-se que as condutas perpetradas não se deram por absoluta impossibilidade, mas sim, ocorreram por opção gerencial pelo não recolhimento e não repasse das contribuições.

Por fim, anoto que para o reconhecimento de dificuldades financeiras acarretadoras de estado de necessidade (excludente de antijuridicidade) ou de inexigibilidade de conduta diversa (excludente de culpabilidade), segundo o disposto no artigo 156 do Código de Processo Penal, necessária a cabal demonstração de tal circunstância, devendo ser trazido aos autos elementos concretos, o que não se evidenciou in casu, não bastando para tanto meras alegações do increpado. Cumpria ao increpado juntar ao longo da instrução criminal provas documental ou pericial que demonstrasse, sem sombra de dúvida, que a existência do sindicato estaria definitivamente comprometida se as contribuições sociais fossem recolhidas, fato que não restou comprovado in casu.

Logo, comprovadas autoria e materialidade delitivas é de rigor a manutenção do decreto condenatório.

Passo à dosimetria da pena.

Pretende a defesa a redução da pena base ao mínimo legal, aduzindo que as circunstâncias judicias militam em favor do réu e que o valor do crédito tributário apurado não justifica o aumento da pena, mormente quando consideradas as parcelas prescritas. Alega que o montante apurado não pode ser considerado consequência do crime e que multas e juros são acréscimos da dívida fiscal e não devem ser considerados na dosimetria da pena.

Assiste-lhe razão em parte.

Vejamos.

De início, registro que o magistrado sentenciante considerou que os delitos de apropriação indébita previdenciária e sonegação previdenciária, embora alocados em tipos penais distintos, atingem o mesmo bem jurídico e, por isso, excluiu o concurso material entre os mesmos e aplicou a continuidade delitiva entre eles, nos seguintes termos:

(...) Passo à dosimetria da pena (art. 68 do Código Pe-nal), com observância da regra do artigo 71, "caput", do Código Penal:Art. 71 - Quando o agente, mediante mais de uma ação ou omissão, pratica dois ou mais crimes da mesma espécie e, pelas condições de tempo, lugar, maneira de execução e outras semelhantes, devem os subseqüentes ser havidos como continuação do primeiro, aplica-se-lhe a pena de um só dos crimes, se idênticas, ou a mais grave, se diversas, aumentada, em qualquer caso, de um sexto a dois terços. Isso porque, em que pese a tipificação das condutas perpetradas pelo réu estarem alojadas em tipos penais dispostos em capítulos distintos no Código Penal, eles atingem o mesmo bem jurídico, tem o mesmo sujeito passivo e estrutura muito próximas. Nesse sentido, já decidiu o E. Superior Tribunal de Justi-ça:"RECURSO ESPECIAL. PREVIDENCIÁRIO. ARTS. 71, 168-A E 337-A, III, DO CP. SUPRESSÃO OU REDUÇÃO DE CONTRIBUIÇÃO SOCIAL PREVIDENCIÁRIA. EMPRESAS PERTENCENTES AO MESMO GRUPO EMPRESARIAL. CONTINUIDADE DELITIVA. POSSIBILIDADE. INQUÉRITOS E AÇÕES PENAIS EM CURSO NÃO CONFIGURAM PERSONALIDADE NEGATIVA DO AGENTE. HABEAS CORPUS CONCEDIDO DE OFÍCIO. PRECEDENTES DO STJ E DO STF.1. Para o reconhecimento da continuidade delitiva, é necessária a prática sucessiva de ações criminosas de semelhante espécie que guardem, entre si, vínculos em relação ao tempo, ao lugar e à forma de execução, de modo a revelar homogeneidade de condutas típicas, evidenciando serem as últimas ações desdobramentos da primeira (art. 71 do CP).2. No caso, o réu responde por delitos descritos nos arts. 168-A e 337-A, ambos do Código Penal - em continuidade delitiva -, nas Apelações Criminais n. 2004.71.038480-8, 2003.71.00.042734-7 e 2004.71.00.021296-7.3. Em função da melhor hermenêutica, os crimes descritos nos arts. 168-A e 337-A, apesar de constarem em títulos diferentes no Código Penal e serem, por isso, topograficamente díspares, refletem delitos que guardam estreita relação entre si, portanto cabível o instituto da continuidade delitiva (art. 71 do CP).4. O agente cometeu delitos análogos, descritos nos arts. 168-A e 337-A do Código Penal, na administração de empresas diversas, mas de idêntico grupo empresarial, durante semelhante período, no mesmo espaço geográfico (cidade de Porto Alegre/RS) e mediante similar maneira de execução, portanto tem lugar a ficção jurídica do crime continuado (art. 71 do CP).5. Precedentes deste Tribunal e do Supremo Tribunal Federal.6. O acórdão regional firmou-se em sentido contrário à jurisprudência deste Tribunal ao considerar os inquéritos e as ações penais em andamento como aspectos desfavoráveis à personalidade do réu.7. Recurso especial improvido. De ofício, habeas corpus concedido para afastar a majoração da pena-base em razão do juízo negativo sobre a circunstância da personalidade do recorrido" - sublinhei.(Recurso Especial 1.212.911, 6ªTurma, rel. Min. Sebastião Reis Júnior, j. 20.03.2012, DJ-e 09.04.2012).
Desta forma, excluo a imputação de concurso material de crimes e reconheço a continuidade delitiva.(...)

Tal entendimento vai de encontro ao firmado por esta Corte Regional que admite o concurso material entre os delitos, confiram-se:

PENAL E PROCESSUAL PENAL. APELAÇÕES CRIMINAIS. ART. 168-A, §1º, I, CP. ART. 1º, I, DA LEI Nº 8.137/90. ART. 337-A, III, DO CÓDIGO PENAL. JUSTA CAUSA. SÚMULA VINCULANTE 24. CRIME DE APROPRIAÇÃO INDÉBITA PREVIDENCIÁRIA. ABOLITIO CRIMINIS. INOCORRÊNCIA. SUCESSÃO DE LEIS PENAIS. MATERIALIDADE DEMONSTRADA. PARCELA DOS ACUSADOS ABSOLVIDA POR INSUFICIÊNCIA DE PROVA DA AUTORIA DO DELITO. INEXIGIBILIDADE DE CONDUTA DIVERSA EXCLUDENTE DE CULPABILIDADE QUE NÃO SE APLICA AOS CRIMES DO ART. 337-A, III, DO CP, E DO ART. 1º, I, DA LEI Nº 8.137/90. DEMONSTRADA PARCIALMENTE A EXCLUDENTE QUANTO AO CRIME DO ART. 168-A, §1º, I, DO CÓDIGO PENAL. REDUÇÃO DE CONTRIBUIÇÃO AO SISTEMA "S". PRINCÍPIO DA ESPECIALIDADE. SUBSUNÇÃO À NORMA PENAL CONTIDA NO ART. 1º, DA LEI Nº 8.137/90. EMENDATIO LIBELLI. POSSIBILIDADE. DOLO GENÉRICO. CONCURSO DE CRIMES. DOSIMETRIA DA PENA. VALOR UNITÁRIO DA PENA DE MULTA. RECURSO DEFENSIVO DESPROVIDO. APELO MINISTERIAL PARCIALMENTE PROVIDO.
1- Nos termos da Súmula Vinculante nº 24, os crimes materiais contra a ordem tributária, previstos no art. 1º, I a IV, da Lei nº 8.137/90, não se tipificam antes do lançamento definitivo do tributo. Idêntico raciocínio se aplica ao delito do art. 337-A, do Código Penal, por se tratar, igualmente, de crime material que somente se configura após a constituição definitiva do crédito tributário na esfera administrativa.
2 - O crime do art. 168-A do Código Penal possui natureza formal e se consuma com a mera omissão no repasse das contribuições previdenciárias no prazo legalmente assinalado, não se lhe aplicando a Súmula Vinculante nº 24.
3- Crime de apropriação indébita previdenciária. Materialidade delitiva amplamente demonstrada pela prova documental produzida nos autos. Autoria do crime apenas parcialmente demonstrada.
4- O objeto material do delito de apropriação indébita previdenciária é o valor recolhido e não repassado aos cofres da Previdência e não o valor do débito tributário inscrito, já incluídos os juros de mora e a multa.
5- Foram praticadas apropriações indébitas previdenciárias em semelhantes condições de tempo, lugar e modo de execução, pelo que configurado o concurso de crimes na modalidade da continuidade delitiva.
6- Não há que se falar em abolitio criminis, decorrente da revogação do artigo 95 da Lei nº 8.212/91 (vigente na data do primeiro período de fatos), pois a conduta de omitir o repasse à previdência social das contribuições recolhidas dos contribuintes, no prazo e forma legal ou convencional permanece tipificada no art. 168-A do Código Penal.
(...)
10- A norma prevista no art. 337-A, III, do Código Penal não se aplica à redução/supressão das contribuições sociais gerais, devidas a terceiros (sistema "S", salário-educação, INCRA, etc.), incidindo apenas para a tipificação da redução/supressão das contribuições de Seguridade Social (contribuições nominadas), previstas no art. 195, I a IV, da Constituição Federal, por força do princípio da especialidade.
11- Caso concreto em que o órgão acusatório, na exordial, embora tenha capitulado apenas o delito do art. 337-A, III, do CP, descreveu os crimes de sonegação de contribuição previdenciária e o delito do art. 1º, I, da Lei nº 8.137/90 (que abarca a sonegação de contribuições sociais).
12-A reclassificação é plenamente possível na recursal, pois não há vedação legal à aplicação do instituto da emendatio libelli no segundo grau de jurisdição, nos termos do artigo 383 do Código de Processo Penal, uma vez que o réu se defende de fatos e não da definição jurídica que lhes é atribuída.
13- Hipótese em que o Ministério Público Federal interpôs apelação requerendo a reclassificação de parcela dos fatos e a condenação autônoma do réu pela prática do crime do art. 1º da Lei nº 8.137/90, donde não há falar em indevida piora na situação do acusado.
14- Materialidade e autoria dos crimes do art. 337-A, III, do Código Penal, e do art. 1º, I, da Lei nº 8.137/90, suficientemente demonstradas.
15- O dolo dos tipos penais do art. 337-A do CP e do art. 1º da Lei nº 8.137/90 é genérico, bastando, para a tipicidade da conduta, que o sujeito queira não pagar, ou reduzir, tributos, consubstanciado o elemento subjetivo em uma ação ou omissão voltada a este propósito.
(...)
17- Concurso de crimes: reconhecida a continuidade delitiva para cada um dos delitos. Entre si, tem-se que o delito do art. 337-A, III, do Código Penal, foi praticado em concurso formal próprio (art. 70, primeira parte, do Estatuto Repressivo) com o delito do art. 1º, I, da ei nº 8.137/90, e ambos foram cometidos em concurso material com o delito do art. 168-A, §1º, I, do Código Penal, pois se tratou de conduta autônoma (omissão no repasse das contribuições descontadas dos pagamentos efetuados aos segurados empregados e contribuintes individuais).
18- Dosimetria. Valoração negativa das consequências do crime. Valores de tributos reduzidos e de contribuições apropriadas superiores ao ordinário.
19- Continuidade delitiva. Aumento previsto no art. 71 do Código Penal fixado em maior grau, considerando o período abarcado na denúncia e a posição desta E. Corte em casos semelhantes.
20 - Valor unitário do dia-multa aumentado a fim de guardar observância com a situação econômica do acusado.
21- Apelo defensivo desprovido.
22 - Recurso ministerial parcialmente provido.
(TRF 3ª Região, DÉCIMA PRIMEIRA TURMA, ACR - APELAÇÃO CRIMINAL - 67283 - 0003879-79.2003.4.03.6114, Rel. DESEMBARGADOR FEDERAL JOSÉ LUNARDELLI, julgado em 31/01/2017, e-DJF3 Judicial 1 DATA:09/02/2017)
PENAL. APELAÇÃO CRIMINAL. APROPRIAÇÃO INDÉBITA PREVIDENCIÁRIA. SONEGAÇÃO DE CONTRIBUIÇÃO PREVIDENCIÁRIA MATERIALIDADE E AUTORIA COMPROVADAS.. DOLO GENÉRICO. INEXIGIBILIDADE DE CONDUTA DIVERSA NÃO CONFIGURADA. PENA-BASE REDUZIDA E CONFISSÃO RECONHECIDA DE OFÍCIO. SÚMULAS DO SUPERIOR TRIBUNAL. CONCURSO MATERIAL DE CRIMES mantido. RECURSO DESPROVIDO.
1. Apelação da Defesa contra a sentença que condenou o réu como incurso no artigo 168-A, §1º, I e artigo 337-A, I, c.c. o artigo 71 e 69, todos do Código Penal.
2. Materialidade demonstrada. Procedimento administrativo fiscal, além de revelara ocorrência de um ilícito administrativo, possui aptidão para demonstrar a materialidade dos tipos penais em questão.
3. Autoria comprovada pelo conjunto probatório coligido e interrogatório do réu.
4. Os delitos de apropriação indébita previdenciária e sonegação de contribuição previdenciária não exigem dolo específico. Precedentes dos Tribunais Superiores.
5. Não caracterizada a inexigibilidade de conduta diversa. Prova testemunhal não é suficiente para a demonstração de penúria econômica da empresa, cuja comprovação deve ser calcada em prova documental ou pericial. Dificuldades financeiras não comprovadas.
6. Decreto condenatório mantido.
7. De ofício, penas bases reduzidas com o afastamento da circunstância desfavorável da personalidade vocacionada para a prática de delitos, em observância à Súmula 44 do Superior Tribunal de Justiça, reconhecida a atenuante da confissão espontânea, mas não aplicada, nos termos das Súmulas n. 545 e 231 a Corte Superior e redimensionadas as penas de multa.
8. Mantido o concurso material de delitos. Não repasse de contribuições já descontadas dos segurados e a omissão informação visando à redução/supressão de contribuições previdenciárias constituem condutas plurais correspondentes a dois delitos distintos e independentes.
9. Apelação desprovida.
(TRF 3ª Região, PRIMEIRA TURMA, ACR - APELAÇÃO CRIMINAL - 39820 - 0000689-02.2008.4.03.6125, Rel. DESEMBARGADOR FEDERAL HÉLIO NOGUEIRA, julgado em 21/06/2016, e-DJF3 Judicial 1 DATA:01/07/2016 )
APELAÇÃO CRIMINAL. APROPRIAÇÃO INDÉBITA PREVIDENCIÁRIA. ARTIGO 168-A DO CÓDIGO PENAL. SONEGAÇÃO DE CONTRIBUIÇÕES PREVIDENCIÁRIAS. ARTIGO 337-A DO CÓDIGO PENAL. MATERIALIDADE E AUTORIA INCONTROVERSAS. DOSIMETRIA DA PENA. PENA BASE ACIMA DO MÍNIMO LEGAL. MAUS ANTECEDENTES. CONFISSÃO. ATENUANTE RECONHECIDA. REDUÇÃO ABAIXO DO MÍNIMO LEGAL. IMPOSSIBILIDADE. SÚMULA 231 DO STJ. ESTADO DE NECESSIDADE NÃO DEMONSTRADO. CAUSA DE DIMINUIÇÃO NÃO APLICADA. INCIDÊNCIA DO CONCURSO MATERIAL E CONTINUIDADE DELITIVA MANTIDOS. SUBSTITUIÇÃO DA PENA PRIVATIVA DE LIBERDADE POR RESTRITIVAS DE DIREITOS. RECURSO DA DEFESA PARCIALMENTE PROVIDO.
1. Apropriação indébita previdenciária. Artigo 168-A, § 1º, I, do Código Penal. Competências: 03/2003 a 12/2003, 04/2004 a 08/2004, 10/2004, 01/2005 a 07/2005, 09/2005 a 11/2005, 01/2006 a 03/2006, 05/2006 a 04/2007.
2. Sonegação de contribuições previdenciárias. Artigo 337-A, I, do Código Penal. Competências de 05/2002 a 04/2007.
3. Materialidade e autoria incontroversas.
4. Dosimetria da pena.
5. Pena-base fixada acima do mínimo legal.
6. Réu possui 1 condenação com trânsito em julgado. Crime tributário cometido em 28.03.2006, posterior ao início dos fatos apurados nesta ação penal. Incorreta valoração do fato na sentença - personalidade e conduta social - circunstâncias judiciais negativas. Fato considerado como maus antecedentes. Precedentes do STJ.
7. Manutenção da pena base acima do mínimo legal. Uma circunstância judicial negativa. Maus antecedentes: apenas um crime. Redução do quantum da majoração para 1/6: pena base de 2 anos e 4 meses de reclusão e 11 dias-multa. Pena igual para ambos os crimes.
8. Atenuante da confissão reconhecida. Redução de 1/6 - pena abaixo do mínimo legal. Impossibilidade. Súmula 231 do STJ. Pena reduzida ao mínimo legal: 2 anos de reclusão, e 10 dias-multa. Pena igual para ambos os crimes.
9. Crime do artigo 168-A do Código Penal reiterado por 28 vezes. Continuidade delitiva. Majoração em 1/5. Manutenção. Pena: 2 anos, 4 meses e 24 dias de reclusão, e 12 dias-multa.
10. Crime do artigo 337-A do Código Penal. Ausência de recolhimento perdurou de maio/2002 a abril/2007. Continuidade delitiva. Majoração em 1/4. Manutenção. Pena: 2 anos e 6 meses de reclusão, e 12 dias-multa.
11. Alegação de dificuldades financeiras. Inexistência de provas. Estado de necessidade não comprovado. Causa de diminuição -artigo 24, § 2º, do Código Penal. Não aplicada.
12. Tipos penais distintos. Condutas distintas e cometidos de maneira autônoma. Sequer os períodos são totalmente coincidentes. Concurso material mantido.
13. Pena definitiva: 4 anos, 10 meses e 24 dias de reclusão, e 24 dias-multa. Regime inicial semiaberto mantido.
14. Substituição da pena corporal por penas restritivas de direitos. Não cabimento. Requisitos previstos no artigo 44 do Código Penal não cumpridos.
15. Recurso da defesa parcialmente provido.
(TRF 3ª Região, QUINTA TURMA, ACR - APELAÇÃO CRIMINAL - 61939 - 0001683-14.2009.4.03.6119, Rel. DESEMBARGADOR FEDERAL PAULO FONTES, julgado em 07/12/2015, e-DJF3 Judicial 1 DATA:17/12/2015)

De fato, o réu não repassou contribuições já descontadas dos segurados e omitiu informação visando à redução/supressão de contribuição previdenciária, portanto, têm-se condutas plurais correspondentes a dois delitos distintos e independentes, o que configura, irrefutavelmente, concurso material de crimes.

Contudo, deixo de aplicar o concurso material de delitos à falta de recurso da acusação, que não se insurgiu contra a sentença.

Prossigo.

Na primeira fase de fixação da pena, o magistrado sentenciante ponderou sobre a primariedade técnica de MILTON ALAOR, nos termos da Súmula nº 444 do Superior Tribunal de Justiça e tomou por consequência grave do delito o montante total do crédito tributário apurado, ao reputá-lo elevado, fixando a pena base m 03 (três) anos de reclusão.

O MM Juiz considerou os valores atualizados até 06/2012 com juros e multas, conforme informado pela Receita Federal à fl. 671: R$ 72.067,08 (setenta e dois mil, sessenta e sete reais e oito centavos) para o LDC n. 35.646.178-5 e R$ 374.959,93 (trezentos e setenta e quatro mil, novecentos e cinquenta e nove reais e noventa e três centavos) para NFLD n. 35.646.179-3.

No ponto, assiste razão parcial a defesa.

O valor do crédito tributário a ser examinado tanto para aferição da aplicação do princípio da insignificância quanto para fins de fixação da dosimetria da pena não deve contemplar multa e juros, pois estes são consectários civis do não recolhimento do tributo, consoante jurisprudência firmada pelo Superior Tribunal de Justiça e seguida por esta Colenda Primeira Turma (HC 195372/SP, Rel. Ministro JORGE MUSSI, QUINTA TURMA, julgado em 12/06/2012, DJe 18/06/2012; TRF 3ª Região, PRIMEIRA TURMA, ACR - APELAÇÃO CRIMINAL - 56509 - 0004718-25.2012.4.03.6103, Rel. DESEMBARGADOR FEDERAL HÉLIO NOGUEIRA, julgado em 06/12/2016, e-DJF3 Judicial 1 DATA:13/12/2016; ACR 00042348720064036113, DESEMBARGADOR FEDERAL LUIZ STEFANINI, TRF3 - PRIMEIRA TURMA, e-DJF3 Judicial 1 DATA:12/06/2015).

Deste modo, é o valor principal do crédito em questão, apurado na data dos fatos, que deve servir de parâmetro para a fixação da reprimenda.

Nesta esteira, ainda, vultosas quantias, frise-se, o valor principal do crédito tributário excluídos juros e multa, caracterizam graves consequências do delito e são aptas a ensejar o recrudescimento da pena na primeira fase da dosimetria. Confiram-se os julgados nesse sentido:

AGRAVO REGIMENTAL. HABEAS CORPUS. SONEGAÇÃO DE CONTRIBUIÇÃO PREVIDENCIÁRIA. DOSIMETRIA. PENA-BASE. DESPROPORCIONALIDADE. INEXISTÊNCIA. DISCRICIONARIEDADE DO MAGISTRADO. REEXAME DA DOSIMETRIA JÁ OCORRIDO NESTA CORTE SUPERIOR QUANDO DO JULGAMENTO DO RECURSO ADEQUADO À ESPÉCIE. CONSTRANGIMENTO ILEGAL NÃO CONFIGURADO. AGRAVO REGIMENTAL IMPROVIDO.
1. A fixação da pena-base, com base nas circunstâncias judiciais do art. 59 do Código Penal, não se dá por critério puramente objetivo ou matemático, uma vez que é admissível certa discricionariedade do órgão julgador, desde que vinculada aos elementos concretos dos autos, o que de fato ocorreu quando o Tribunal de origem justificou o aumento, invocando expressamente a circunstância do elevado valor do prejuízo causado ao Instituto Nacional do Seguro Social - INSS, calculado, em 27/10/2008, em R$ 1.052.883,60 (um milhão, cinquenta e dois mil, oitocentos e oitenta e três reais e sessenta centavos), a título de consequências do delito.
2. O reexame da dosimetria da pena imposta ao paciente, nos autos da Ação Penal n. 00036185820134036181, já ocorreu nesta Corte Superior quando do julgamento do recurso adequado à espécie, no caso o REsp n. 1.552.195/SP. 3. Impossibilidade, nos autos de habeas corpus, de adentrar ao amplo exame do campo fático-probatório para a revisão da dosimetria da pena fixada na origem e mantida no julgamento do recurso especial. Ilegalidade flagrante não configurada na hipótese dos autos.
4. Agravo regimental improvido.
(AgRg no HC 397.628/SP, Rel. Ministro SEBASTIÃO REIS JÚNIOR, SEXTA TURMA, julgado em 27/06/2017, DJe 16/08/2017)
REGIMENTAL NO AGRAVO EM RECURSO ESPECIAL. SONEGAÇÃO DE CONTRIBUIÇÃO PREVIDENCIÁRIA. NOVOS FUNDAMENTOS NO ACÓRDÃO. REFORMATIO IN PEJUS. NÃO OCORRÊNCIA. SONEGAÇÃO PREVIDENCIÁRIA. DOLO GENÉRICO. ELEVADO VALOR DO PREJUÍZO. EXASPERAÇÃO DA PENA-BASE. POSSIBILIDADE. ACÓRDÃO ALINHADO À JURISPRUDÊNCIA DO STJ. INCIDÊNCIA DA SÚMULA N. 83/STJ.
INSURGÊNCIA DESPROVIDA.
1. Nos termos da orientação firmada neste Sodalício, "Segundo o princípio da ne reformatio in pejus, o juízo ad quem não está vinculado aos fundamentos adotados pelo juízo a quo, somente sendo obstado no que diz respeito ao agravamento da pena, inadmissível em face de recurso apenas da Defesa. Inteligência do art. 617 do Código de Processo Penal" (HC 142.443/SP, Rel. Ministra LAURITA VAZ, Quinta Turma, julgado em 15/12/2011, DJe 02/02/2012).
2. O crime de sonegação de contribuições previdenciárias não exige a configuração do dolo específico como elemento subjetivo do tipo.
3. O elevado prejuízo causado aos cofres públicos constitui fundamentação idônea para a exasperação da pena-base em razão da desfavorabilidade das consequências do delito.
4. Encontrando-se o acórdão a quo em consonância com a jurisprudência firmada neste Sodalício, é certo que a pretensão do agravante esbarra no óbice previsto no Enunciado nº 83 da Súmula deste Superior Tribunal de Justiça, também aplicável ao recurso especial interposto com fundamento na alínea "a" do permissivo constitucional.
5. Agravo regimental desprovido.
(AgRg no AREsp 840.609/SP, Rel. Ministro JORGE MUSSI, QUINTA TURMA, julgado em 14/03/2017, DJe 22/03/2017)

Contudo, no presente caso, em vista do pagamento parcial em relação ao LDC n. 35.646.178-5 noticiado nos autos e anteriormente referido (fl. 608), bem como o fato da NFLD n. 35.646.179-3 abranger as contribuições sociais não-previdenciárias, conforme referido anteriormente e cujo valor não foi possível aqui destacar, infere-se que o valores principais inicialmente apurados (LDC n. 35.646.178-5: R$ 35.946,78 - fl. 29; NFLD n. 35.646.179-3: R$ 137.364,08 - fl. 77) não espelham aqueles que realmente devam ser aqui considerados.

Assim sendo, para evitar qualquer espécie de prejuízo ao réu, imperioso afastar o aumento decorrente desta circunstância judicial e tornar a pena-base ao mínimo legal, 02 (dois) anos de reclusão.

Na segunda fase, mantenho a circunstância atenuante genérica apontada na sentença (intenção de reparação do dano representada pela formalização de parcelamento em duas oportunidades), porém deixo de aplicá-la a teor da Súmula n. 231 do Superior Tribunal de Justiça.

Na terceira fase, o MM Juiz a quo fez incidir a causa de aumento da continuidade delitiva á razão de 1/5 (um quinto).

Considerando que o delito de apropriação indébita previdenciária perpetrou-se por 47 (quarenta e sete) competências (fls. 32/43 - Vol. I), descontadas as parcelas liquidadas pelo pagamento parcial (03/1998 a 04/2000 - fl. 608) e o delito de sonegação previdência, por 125 competências, considerando que MILTON assumiu a presidência da entidade somente em 1995 (fls. 92/95 - Vol I), mantenho a referida fração de aumento, também, à falta de recurso da acusação, o que resulta a pena de 02 (dois) anos, 04 (quatro) meses e 24 (vinte e quatro) dias.

Aplico o idêntico critério de cálculo para pena de multa, o que totaliza 12 (doze) dias multa. Mantenho o valor unitário do dia-multa no mínimo legal.

Assim a pena resta definitiva para MILTON em 02 (dois) anos, 04 (quatro) meses e 24 (vinte e quatro) dias e 12 (doze) dias multa.

O regime inicial de cumprimento de pena é o aberto, em estrita observância ao artigo 33, §2º, "c", do Código Penal, o que fica mantido.

Por fim, irreparável a substituição da pena privativa de liberdade por duas restritivas de direitos consistentes em prestação pecuniária de 05 (cinco) salários-mínimos em favor da União e prestação de serviços à comunidade ou a entidades públicas, a ser especificada pelo Juízo da Execução.

Mantidos os demais termos da sentença.

Por estes fundamentos, dou parcial provimento ao recurso da defesa, apenas, para reduzir a pena-base ao mínimo legal, o que resultou na pena total de 02 (dois) anos, 04 (quatro) meses e 24 (vinte e quatro) dias e 12 (doze) dias multa.

Eventual ocorrência da prescrição da pretensão punitiva será declarada após o trânsito em julgado.

É o voto.

HÉLIO NOGUEIRA
Desembargador Federal


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