D.E. Publicado em 14/03/2018 |
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EMENTA
ACÓRDÃO
Vistos e relatados estes autos em que são partes as acima indicadas, decide a Egrégia Quinta Turma do Tribunal Regional Federal da 3ª Região, por unanimidade, negar provimento às apelações interpostas por Maria Aparecida da Silva e Auxiliadora Aparecida da Silva, nos termos do relatório e voto que ficam fazendo parte integrante do presente julgado.
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RELATÓRIO
Trata-se de ação de usucapião especial de imóvel urbano ajuizada por Maria Aparecida da Silva em face de Auxiliadora Aparecida da Silva e Empresa Gestora de Ativos - EMGEA, objetivando a declaração de aquisição, por usucapião, do imóvel situado na Rua Clodomiro Ferreira da Silva, nº 980, Jardim Paulistano II, Franca/SP.
A parte autora alega, em síntese, a ocupação do referido imóvel há dezoito anos, sendo que este foi adquirido por sua irmã, ora corré, e que passou a residir no imóvel juntamente com sua mãe, pagando as parcelas do financiamento, além de impostos e demais despesas. Entende que possui justo título, consistente em uma sentença judicial transitada em julgado, para sua manutenção na posse do imóvel, obtida em ação de reintegração de posse.
Às fls. 158/162, a CEF sustentou ilegitimidade passiva, eis que cedeu os créditos a EMGEA. No mérito, salientou que a garantia hipotecária não pode ser extinta pela possível consumação da usucapião. Posicionamento ratificado pela EMGEA à fl. 277.
A r. sentença julgou improcedente o pedido da autora e extinguiu o processo com resolução do mérito nos termos preconizados pelo artigo 269, inciso I do CPC/73, bem como julgou extinta a reconvenção apresentada, sem apreciação do mérito, conforme o artigo 267, VI do CPC/73. Sem condenação em verba honorária por ser a parte autora beneficiária da assistência judiciária gratuita. Custas "ex lege" (fls. 279/283).
Inconformada, a autora interpôs apelação (fls. 285/289), alegando, intempestividade na apresentação da contestação e da reconvenção por parte da corré Auxiliadora Aparecida da Silva, no mérito, sustenta que preencheu todos os requisitos previstos no artigo 183 da Constituição Federal e do artigo 9º da Lei 10.257/01, portanto, por ser proprietária é necessária a mudança do nome no contrato de financiamento perante EMGEA.
Já a corré Auxiliadora Aparecida da Silva, às fls. 291/316, novamente alega falta de interesse de agir da autora e impossibilidade jurídica do pedido. No mérito, sustenta pela procedência da reconvenção para procedente reparação dos danos materiais, uma vez que arcou com o pagamento de prestações do financiamento do imóvel, além de taxas e benfeitorias realizadas, além de reparação por danos morais no valor de R$ 5.000,00 em razão da litigância de má-fé.
Sem contrarrazões, subiram os autos a este E. Tribunal.
Em parecer, o Ministério Público Federal informa que deixou de opinar por não existir litígio coletivo pela posse de terra rural ou urbana, manifestando-se tão somente pelo prosseguimento do feito (fls. 322).
É o relatório.
VOTO
Primeiro ponto, a contestação e reconvenção às fls. 219/323 e 235/247, respectivamente, foram tempestivamente apresentados aos autos.
O prazo para contestação é de quinze dias, fluindo a partir da juntada do mandado de citação cumprido aos autos, nos termos do art. 241, II, do CPC/73, o que foi observado no caso dos autos.
Segundo, as alegações de falta de interesse de agir e impossibilidade jurídica do pedido confundem-se com o mérito e com ele devem ser analisadas.
No mérito, não assiste razão à parte autora.
O presente caso versa sobre usucapião, prevista nos artigos 183 da Constituição Federal e no art. 1.240 do Código Civil, que dispõe:
"Art. 183. Aquele que possuir como sua área urbana de até duzentos e cinquenta metros quadrados, por cinco anos, ininterruptamente e sem oposição, utilizando-a para sua moradia ou de sua família, adquirir-lhe-á o domínio, desde que não seja proprietário de outro imóvel urbano ou rural. |
§ 1º O título de domínio e a concessão de uso serão conferidos ao homem ou à mulher, ou a ambos, independentemente do estado civil. |
§ 2º Esse direito não será reconhecido ao mesmo possuidor mais de uma vez. |
§ 3º Os imóveis públicos não serão adquiridos por usucapião". |
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"Art. 1.240. Aquele que possuir, como sua, área urbana de até duzentos e cinqüenta metros quadrados, por cinco anos ininterruptamente e sem oposição, utilizando-a para sua moradia ou de sua família, adquirir-lhe-á o domínio, desde que não seja proprietário de outro imóvel urbano ou rural. |
§ 1º O título de domínio e a concessão de uso serão conferidos ao homem ou à mulher, ou a ambos, independentemente do estado civil. |
§ 2º O direito previsto no parágrafo antecedente não será reconhecido ao mesmo possuidor mais de uma vez". |
A posse do imóvel objeto desta ação, entretanto, foi adquirida pela corré Auxiliadora Aparecida da Silva através de Instrumento Particular de Compra e Venda e Mútuo com Obrigações e Hipoteca, com força de escritura pública, firmado em 22.07.1988 (fls. 09/10), em que figura como agente financeiro a Caixa Econômica Federal, com hipoteca em favor da referida instituição financeira.
Assim, o imóvel em questão foi financiado com recursos do Sistema Financeiro da Habitação. Assim, os recursos do SFH possuem caráter público e social, pois são originários do FGTS e do orçamento da União Federal.
Por conseguinte, não há possibilidade de aquisição, por meio de usucapião, de imóvel inserido no âmbito do Sistema Financeiro da Habitação, porque possui a finalidade de atender à política habitacional do Governo Federal.
Nessas condições, fica descaracterizado o animus domini, um dos pressupostos da usucapião postulada. Esse é o entendimento desta Corte:
"CONSTITUCIONAL. ADMINISTRATIVO. USUCAPIÃO ESPECIAL. IMÓVEL URBANO FINANCIADO PELO SFH E COM GARANTIA HIPOTECÁRIA. REQUISITOS LEGAIS À AQUISIÇÃO DA PROPRIEDADE. INEXISTÊNCIA. MANUTENÇÃO DA SENTENÇA RECORRIDA. |
(...) |
III - O posicionamento adotado na sentença recorrida está em perfeita consonância com os precedentes desta Corte, acerca da matéria, no sentido de que, encontrando-se o imóvel hipotecado submetido ao Sistema Financeiro de Habitação, inexiste o animus domini, suficiente para ensejar a usucapião sobre um imóvel. (TRF 3ª Região, 2ª Turma, AC 200461020116981, REl. Juiz Convocado Silva Neto, j. em 09/11/2010, DJF3 CJ1 18/11/2010, p. 450. Grifei). |
IV - Agravo legal não provido". (TRF 3ª Região, Segunda Turma, AC - Apelação Cível 1529956 - 0011519-09.2007.4.03.6110, Rel. Des. Federal Antônio Cedenho, julgado em 20/01/2015, e-DJF3 Judicial 1 DATA:29/01/2015) |
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"CIVIL. USUCAPIÃO. NÃO COMPROVADA. AUSÊNCIA DE ANIMUS DOMINI. APELAÇÃO IMPROVIDA. |
1. Verifica-se dos autos que a parte autora, de fato, não logrou demonstrar a posse mansa, tranquila e com animus domini capaz de acarretar a aquisição do imóvel por usucapião. Com efeito, já na inicial a autora trouxe a informação de que se tratava de imóvel adquirido, originalmente, através de contrato vinculado ao SFH. |
2. O imóvel usucapiendo encontra-se registrado em nome da Cooperativa Habitacional de Araras e hipotecado em favor da CEF que, posteriormente, transferiu os direitos hipotecários à EMGEA. |
3. Conforme depreende-se dos autos, a parte autora sabia que o imóvel estava hipotecado pela CEF, de forma que não apenas detinha a posse do imóvel, mas também, o ônus de arcar com o pagamento das obrigações contraídas. |
4. Assim, a ocupação do imóvel pela autora não pode ser considerada como posse mansa e pacífica capaz de lhe conferir justo título à aquisição do bem. Por óbvio, a parte autora sabia da necessidade de entregar o imóvel ao credor, restando descaracterizado assim, o animus domini. |
5. As jurisprudências do Superior Tribunal de Justiça e desta Corte seguem no mesmo sentido, de exigir a demonstração de que não se trata de posse precária, como no caso dos autos. |
6. Ressalto in casu também, não haver possibilidade, a teor do artigo 9º da Lei 5.741/71, de aquisição por meio de usucapião de imóveis inseridos no âmbito do Sistema Financeiro da Habitação, porque possui a finalidade de atender à política habitacional do Governo Federal. |
7. Assim, comprovado nos autos que se trata de imóvel pertencente à terceiro e objeto de financiamento, com recursos oriundos do Sistema Financeiro de Habitação, precária a posse da parte autora, tornando-se inviável o usucapião. |
8. Apelação improvida". (TRF 3ª Região, Quinta Turma, AC - Apelação Cível - 1375919 - 0007205-40.2004.4.03.6105, Rel. Des. Federal Paulo Fontes, julgado em 24/04/2017, e-DJF3 Judicial 1 DATA:02/05/2017 - grifos nossos) |
Dessa forma, há patrimônio público meramente administrado pela CEF. O financiamento do imóvel pelo Sistema Financeiro da Habitação atrai sobre ele o regime de direito público, sendo aplicável a exceção contida nos arts. 183, § 3º, da Constituição Federal e 102 do Código Civil, que prevê que os imóveis públicos não serão adquiridos por usucapião.
Essa é a orientação contida na Súmula nº 340 do Supremo Tribunal Federal:
"Desde a vigência do Código Civil, os bens dominicais, como os demais bens públicos, não podem ser adquiridos por usucapião". |
Assim, a requerente não teve a posse mansa e pacífica do bem, pois o imóvel foi adquirido através de contrato vinculado ao SFH, com hipoteca do bem à CEF para garantia da dívida.
Por conseguinte, a ocupação do imóvel pela parte autora pode ser considerada posse precária, incapaz de lhe conferir justo título à aquisição do bem, restando descaracterizado assim, o animus domini.
Ademais, como bem salientado na sentença, é incompatível com a postura de senhorio do bem a conduta da parte autora em pagar as parcelas do financiamento, uma vez que tal conduta admite-se que o bem pertence a outrem.
Da mesma sorte é o mérito da apelação interposta por Auxiliadora Aparecida da Silva.
Na reconvenção, a reconvinte postula pretensão de danos materiais e morais, ou seja, busca recuperar a posse que se perdeu por ato injusto de outrem, o que é incompatível com a ação de usucapião ora ajuizada.
O Art. 941 e seguintes do Código de Processo Civil/73 disciplina o rito da ação de usucapião, demanda de procedimento especial que não admite a reconvenção nos termos em que proposta, por sua manifesta incompatibilidade.
Ante o exposto, nego provimento às apelações interpostas por Maria Aparecida da Silva e Auxiliadora Aparecida da Silva.
É como voto.
Documento eletrônico assinado digitalmente conforme MP nº 2.200-2/2001 de 24/08/2001, que instituiu a Infra-estrutura de Chaves Públicas Brasileira - ICP-Brasil, por: | |
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Data e Hora: | 08/03/2018 11:21:29 |