Diário Eletrônico

PODER JUDICIÁRIO

TRIBUNAL REGIONAL FEDERAL DA 3ª REGIÃO

D.E.

Publicado em 05/03/2018
APELAÇÃO CRIMINAL Nº 0000546-33.2015.4.03.6136/SP
2015.61.36.000546-2/SP
RELATOR : Desembargador Federal PAULO FONTES
APELANTE : Justica Publica
APELANTE : REGINALDO DE SOUZA
ADVOGADO : SP317256 THIAGO SILVA FALCÃO e outro(a)
APELADO(A) : OS MESMOS
No. ORIG. : 00005463320154036136 1 Vr CATANDUVA/SP

EMENTA

PENAL. APELAÇÃO CRIMINAL. CRIME CONTRA A FAUNA. PÁSSAROS SILVESTRES. USO INDEVIDO DE SÍMBOLO PÚBLICO. INAPLICABILIDADE DO PRINCÍPIO DA CONSUNÇÃO. ABSOLVIÇÃO REFORMADA. MATERIALIDADE, AUTORIA E DOLO DEMONSTRADOS. CONSCIÊNCIA DA ILICITUDE. ERRO DE PROIBIÇÃO NÃO CONFIGURADO. DOSIMETRIA DA PENA MANTIDA. SUBSTITUIÇÃO DA PENA, NOS TERMOS DO ART. 44 DO CP. RECURSO DA DEFESA NÃO PROVIDO. RECURSO DA ACUSAÇÃO PROVIDO.
1. No caso em tela, os delitos narrados na exordial, quais sejam, art. 296, § 1º, I, do Código Penal (uso de anilhas do IBAMA falsas ou adulteradas) e art. 29, § 1º, III, da Lei 9.605/98 (guarda irregular de pássaros silvestres, sem a devida permissão, licença ou autorização da autoridade competente), tutelam bens jurídicos distintos (o primeiro, a fé pública; o segundo, o meio ambiente ecologicamente equilibrado, destacadamente, a fauna silvestre), além de decorrerem de condutas diversas e autônomas, razão pela qual não se vislumbra, na presente hipótese, a incidência do princípio da consunção. Com efeito, não há que se falar em absorção de um delito por outro, isto é, a adulteração de anilhas não é crime meio para a consumação do delito de guarda ilegal de pássaros.
2. A materialidade dos crimes restou suficientemente comprovada pelos Boletim de Ocorrência Ambiental, Auto de Infração Ambiental, Termo de Apreensão, Termo de Embargo de Área e/ou Atividade, Termo de Destinação de Animais, Materiais e/ou Produtos Apreendidos, registro fotográfico, Exame de Constatação, Auto de Apreensão e Laudo Pericial, assim como pelos depoimentos das testemunhas e pelo interrogatório do réu.
3. A autoria dos delitos resta evidente pelas declarações testemunhais e oitiva do réu, tanto na fase do Inquérito Policial quanto em sede Judicial. Ademais, a apreensão se realizou na residência do acusado.
4. O apelante alega que não tinha conhecimento acerca da adulteração das anilhas. Ocorre que, sendo o réu um criador de pássaros , registrado no Sistema de Cadastro de Criadores Amadoristas de Passeriformes, há muitos anos, tem como dever conferir o número e a regularidade da anilha ao adquirir cada ave. Além disso, não é razoável que não tenha atentado para a situação das anilhas nos pássaros que estava adquirindo ou trocando, já que não se trata de pessoa leiga.
5. Obviamente que, somente por conta disso, não se pode concluir ser o réu o autor da falsificação, mas, por outro lado, não há como eximi-lo da prática do uso indevido das anilhas falsificadas, uma vez que tinha condições de aferir que as mesmas estavam adulteradas, bem como tinha a obrigação de notificar o órgão competente quanto a possíveis irregularidades encontradas.
6. Não há como se acolher a tese de erro de proibição do acusado, de modo a afastar o elemento subjetivo do tipo (o dolo), restando demonstrado pelas próprias circunstâncias fáticas e da alegada condição de criador de aves autorizado pelo IBAMA. Ao não averiguar a regularidade das anilhas dos seus pássaros, pode-se afirmar que, no mínimo, o réu assumiu o risco do resultado, ensejando a condenação, ainda que pela caracterização do dolo eventual.
7. Dosimetria da pena.
8. Do crime previsto no artigo 29, § 1º, III, da Lei 9.605/98. Não havendo irresignação da defesa quanto à fixação da pena-base e com relação às demais fases de fixação da pena privativa de liberdade, tenho que a mesma deve ser mantida, nos termos em que lançada, posto que observada a jurisprudência atual e os preceitos legais atinentes à matéria, não havendo necessidade de reformá-la.
9. Do crime previsto no artigo 296, § 1º, I e III, do Código Penal. Pena definitiva concretizada no mínimo legal.
10. Tratando-se de concurso formal de delitos, a pena do delito do artigo 296, por ser a mais grave, merece ser majorada em 1/6 (um sexto), do que resulta a pena definitiva de 02 (dois) anos e 04 (quatro) meses de reclusão, nos moldes previstos no artigo 70 do Código Penal, e 22 (vinte e dois) dias-multa, conforme previsto no artigo 72 do mesmo Diploma Legal.
11. O regime inicial de cumprimento da pena privativa de liberdade é o aberto, nos termos do art. 33, §2º, alínea "c", do Código Penal, e o valor unitário dos dias-multa em 1/30 do salário mínimo vigente à época dos fatos, corrigidos até a data do pagamento.
12. Nos termos do artigo 44 do Código Penal, é cabível a substituição da pena privativa de liberdade acima fixada por duas penas restritivas de direitos, consistentes na prestação de serviços à comunidade ou a entidades públicas, pelo prazo da pena substituída, e prestação pecuniária, no valor de 03 (três) salários-mínimos.
13. Recurso da defesa não provido.
14. Recurso da acusação provido.


ACÓRDÃO

Vistos e relatados estes autos em que são partes as acima indicadas, decide a Egrégia Quinta Turma do Tribunal Regional Federal da 3ª Região, por unanimidade, negar provimento ao recurso da defesa e dar provimento ao recurso da acusação, a fim de condenar Reginaldo de Souza pela prática do crime previsto no artigo 296, § 1º, I e III, do Código Penal, mantendo-se a condenação pela prática do delito previsto no artigo 29, § 1º, III, da Lei 9.605/98, restando a pena final concretizada em 02 (dois) anos e 04 (quatro) meses de reclusão, em regime aberto, e ao pagamento de 22 (vinte e dois) dias-multa, pena corporal substituída por duas penas restritivas de direitos, consistentes na prestação de serviços à comunidade ou a entidades públicas, pelo prazo da pena substituída, e prestação pecuniária, no valor de 03 (três) salários-mínimos, nos termos do relatório e voto que ficam fazendo parte integrante do presente julgado.


São Paulo, 19 de fevereiro de 2018.
PAULO FONTES
Desembargador Federal


Documento eletrônico assinado digitalmente conforme MP nº 2.200-2/2001 de 24/08/2001, que instituiu a Infra-estrutura de Chaves Públicas Brasileira - ICP-Brasil, por:
Signatário (a): PAULO GUSTAVO GUEDES FONTES:10067
Nº de Série do Certificado: 11A2170419468351
Data e Hora: 27/02/2018 17:19:09



APELAÇÃO CRIMINAL Nº 0000546-33.2015.4.03.6136/SP
2015.61.36.000546-2/SP
RELATOR : Desembargador Federal PAULO FONTES
APELANTE : Justica Publica
APELANTE : REGINALDO DE SOUZA
ADVOGADO : SP317256 THIAGO SILVA FALCÃO e outro(a)
APELADO(A) : OS MESMOS
No. ORIG. : 00005463320154036136 1 Vr CATANDUVA/SP

RELATÓRIO

Trata-se de APELAÇÕES CRIMINAIS interpostas pelo MINISTÉRIO PÚBLICO FEDERAL e por REGINALDO DE SOUZA em face da sentença de fls. 172/177, proferida pelo Juízo da 1ª Vara Federal de Catanduva/SP, que, julgando parcialmente procedente a denúncia, condenou o acusado pela prática do crime previsto no art. 29, §1º, inc. III, da Lei nº 9.605/98, à pena de 10 (dez) meses de detenção, em regime inicial aberto, e 12 (doze) dias-multa, no valor unitário de 1/30 (um trigésimo) do salário mínimo, e o absolveu da prática do delito previsto no art. 296, §1º, incisos I e III, do Código Penal, com fulcro no art. 386, inc. III, do Código de Processo Penal.
A pena privativa de liberdade foi substituída por uma pena restritiva de direitos, consistente em prestação de serviços à comunidade pelo prazo da pena substituída.
Em sede de razões recursais (fls. 185/189v), o Parquet requereu a condenação do acusado pela prática do crime previsto no art. 296, §1º, incisos I e III, do Código Penal, alegando que não é admissível que o crime de falsificação ou utilização de anilhas falsas seja absorvido pelo crime ambiental.
Por sua vez, a defesa, em suas razões (fls. 207/210), requereu a absolvição do réu. Sustentou, em síntese, que: o apelante é de boa índole e possui bons antecedentes; não houve conduta criminosa; apesar de comprovada a materialidade do crime, o réu comprou os pássaros de forma regular e não possuía interesse de agir criminalmente; e não restou demonstrado o dolo.
Contrarrazões da defesa e da acusação às fls. 207/210 e 212/215, respectivamente.
A Exma. Procuradora Regional da República, Inês Virgínia Prado, manifestou-se pelo provimento da apelação interposta pela acusação e pelo não provimento do recurso interposto pela defesa.
É O RELATÓRIO.
À revisão, nos termos regimentais.
PAULO FONTES
Desembargador Federal Relator


Documento eletrônico assinado digitalmente conforme MP nº 2.200-2/2001 de 24/08/2001, que instituiu a Infra-estrutura de Chaves Públicas Brasileira - ICP-Brasil, por:
Signatário (a): PAULO GUSTAVO GUEDES FONTES:10067
Nº de Série do Certificado: 11A2170419468351
Data e Hora: 13/12/2017 18:49:19



APELAÇÃO CRIMINAL Nº 0000546-33.2015.4.03.6136/SP
2015.61.36.000546-2/SP
RELATOR : Desembargador Federal PAULO FONTES
APELANTE : Justica Publica
APELANTE : REGINALDO DE SOUZA
ADVOGADO : SP317256 THIAGO SILVA FALCÃO e outro(a)
APELADO(A) : OS MESMOS
No. ORIG. : 00005463320154036136 1 Vr CATANDUVA/SP

VOTO

Do caso dos autos. REGINALDO DE SOUZA foi denunciado pela prática dos crimes previstos nos artigos 29, §1º, inc. III, da Lei nº 9.605/98, e 296, §1º, incisos I e III, do Código Penal.
Narra a denúncia (fls. 90/94) o que se segue:
"... Segundo restou apurado, no dia 04 de fevereiro de 2014, por volta das 10h30m, na Rua Platina, 180, Solo Sagrado II, na cidade de Catanduva/SP, durante patrulhamento ambiental rural e atendimento de denúncia anônima, policiais militares ambiental constataram que Reginaldo de Souza mantinha, em cativeiro, pássaros silvestres com anilhas de identificação do IBAMA adulteradas.
Na ocasião, o denunciado apresentou somente um comprovante de pagamento de taxa junto ao IBAMA, não apresentando qualquer outras autorização.
No local, foram encontrados e apreendidos 15 (quinze) pássaros, sendo que 14 (catorze) deles possuíam anilhas adulteradas, e 01 (um) estava sem anilha de identificação (folha 06 verso)...
Além das anilhas que estavam no tarso das aves, acima mencionadas, foram encontradas outras 05 (cinco) anilhas com as seguintes numerações: IBAMA 26174, 175730, 261900, 639851 e 154254.
Na ocasião foram apreendidos na residência diversos objetos usados para adulteração de anilhas, quais sejam, 01 (um) suporte para alargar anilha, 03 (três) pinos para alargar anilhas e 01 (um) anilhador.
Posteriormente, 09 (nove) das anilhas encontradas, o suporte e os pinos para alargar anilhas foram encaminhados para perícia (folhas 20/21).
O laudo de perícia criminal federal (folhas 39/48) atestou que 08 (oito) das 09 (nove) anilhas possuíam medidas divergentes das anilhas padrão IBAMA, apresentando, assim, vestígios de adulteração. Além disso, a anilha de numeração 154254 apresentava característica de gravação mecanizada, tratando-se, portanto, de anilha falsa.
Outrossim, o Exame e Constatação realizado pelos policiais e por médico veterinário concluiu que todas as anilhas encontradas no tarso das aves estavam com suas dimensões em desacordo com a Instrução Normativa IBAMA nº 10/2011 e 16/2011( conforme medições de folhas 11 e 16/18).
A informação de que as anilhas encontradas foram adulteradas é reforçada pelos petrechos encontrados na residência do acusado..."
Após a instrução criminal, sobreveio sentença de fls.172/177v, que, julgando parcialmente procedente a peça acusatória, condenou o acusado pela prática do crime previsto no art. 29, §1º, inc. III, da Lei nº 9.605/98, e o absolveu da prática do delito previsto no art. 296, §1º, incisos I e III, do Código Penal, com fulcro no art. 386, inc. III, do Código de Processo Penal, conforme a fundamentação a seguir:
"... deve responder pelo crime do art. 29, §1º, inc. III, da Lei nº 9.605/98, na medida em que, comprovadamente, manteve, em cativeiro, sem a devida permissão, licença ou autorização da autoridade competente, pássaros silvestres (v. Informativo STF 716 - MS 31736 somente em se tratando de desclassificação, e não absolvição, é que, em julgamento de crimes conexos, estaria obrigado o juiz a remeter os autos do processo ao competente, sob pena de ofensa ao princípio do Juiz Natural).
Por outro lado, o uso das anilhas falsas ou adulteradas, na hipótese discutida, tão somente serviu como meio para a prática do delito ambiental, sem maior potencial lesivo, ficando, desta forma, por ele absorvido.
Anoto, nesse passo, que a jurisprudência do E. STF admite, e a justiça do caso concreto assim o impõe, " ... que um crime de maior gravidade, assim considerado pela pena abstratamente cominada, possa ser absorvido, por força do princípio da consunção, por crime menos grave, quando utilizado como mero instrumento para a consecução deste último, sem mais potencialidade lesiva." (AgRg 1.365.49/RO, Ministro Moura Ribeiro, Quinta Turma, Dje 26/08/214). Além disso, as circunstâncias judiciais, inegavelmente desfavoráveis ao acusado, impedem a adoção de proceder outro que não a condenação, sem a possibilidade de eventual baixa dos autos para fins de oferecimento de proposta de transação penal." (fl. 176v)
Sem arguições preliminares, passa-se ao mérito recursal.
Da inaplicabilidade do princípio da consunção. No caso em tela, os delitos narrados na exordial, quais sejam, art. 296, § 1º, I, do Código Penal (uso de anilhas do IBAMA falsas ou adulteradas) e art. 29, § 1º, III, da Lei 9.605/98 (guarda irregular de pássaros silvestres, sem a devida permissão, licença ou autorização da autoridade competente), tutelam bens jurídicos distintos (o primeiro, a fé pública; o segundo, o meio ambiente ecologicamente equilibrado, destacadamente, a fauna silvestre), além de decorrerem de condutas diversas e autônomas, razão pela qual não se vislumbra, na presente hipótese, a incidência do princípio da consunção.
Confira-se a transcrição a seguir:
"Falsificação do selo ou sinal público
Art. 296 - Falsificar, fabricando-os ou alterando-os:
I - selo público destinado a autenticar atos oficiais da União, de Estado ou de Município;
II - selo ou sinal atribuído por lei a entidade de direito público, ou a autoridade, ou sinal público de tabelião:
Pena - reclusão, de dois a seis anos, e multa.
§ 1º - Incorre nas mesmas penas:
I - quem faz uso do selo ou sinal falsificado;
II - quem utiliza indevidamente o selo ou sinal verdadeiro em prejuízo de outrem ou em proveito próprio ou alheio.
III - quem altera, falsifica ou faz uso indevido de marcas, logotipos, siglas ou quaisquer outros símbolos utilizados ou identificadores de órgãos ou entidades da Administração Pública."
"Dos crimes contra a fauna
Art. 29. Matar, perseguir, caçar, apanhar, utilizar espécimes da fauna silvestre, nativos ou em rota migratória, sem a devida permissão, licença ou autorização da autoridade competente, ou em desacordo com a obtida:
Pena - detenção de seis meses a um ano, e multa.
§ 1º Incorre nas mesmas penas:
I - quem impede a procriação da fauna, sem licença, autorização ou em desacordo com a obtida;
II - quem modifica, danifica ou destrói ninho, abrigo ou criadouro natural;
III - quem vende, expõe à venda, exporta ou adquire, guarda, tem em cativeiro ou depósito, utiliza ou transporta ovos, larvas ou espécimes da fauna silvestre, nativa ou em rota migratória, bem como produtos e objetos dela oriundos, provenientes de criadouros não autorizados ou sem a devida permissão, licença ou autorização da autoridade competente."
Com efeito, não há que se falar em absorção de um delito por outro, isto é, a adulteração de anilhas não é crime meio para a consumação do delito de guarda ilegal de pássaros.
Nesse sentido, é o entendimento deste Egrégio Tribunal Regional Federal da 3ª Região:
"... PENAL. CRIMES AMBIENTAIS. FALSIDADE DE SELO OU SINAL PÚBLICO. CRIMES CONTRA A FAUNA. PASSÁROS SILVESTRES EM CATIVEIRO SEM A NECESSÁRIA LICENÇA E COM ANILHAS ADULTERADAS. PROVA DA MATERIALIDADE E AUTORIA. NULIDADE DA PERÍCIA TÉCNICA. INEXISTENTE. APLICAÇÃO DO PRINCÍPIO DA CONSUNÇÃO. DESCABIMENTO. DOLO CONFIGURADO. APELAÇÃO DO RÉU DESPROVIDA.
1. Policiais federais e agentes do IBAMA estiveram na residência do apelante e deram cumprimento a mandado de busca e apreensão, ali encontrando 12 pássaros da fauna silvestre nacional de diversas espécies com anilhas, em doze gaiolas, cinco das quais incompatíveis com as características dos pássaros que ali se encontravam. Além disso, encontraram um papagaio sem qualquer identificação.
2. No tocante a alegação de imprestabilidade da prova pericial, como bem ressalvado pelo eminente juízo de primeiro grau por ocasião da sentença, a acusação não é de falsificação das anilhas para identificação de aves, mas sim, do uso de anilhas falsificadas, e ainda, não obstante constar a ausência de lacre quando do recebimento do material a ser periciado, o fato é que não há divergência em relação às anilhas apreendidas na residência do réu.
3. De qualquer forma, a prova técnica se baseou na elaboração de laudo documentoscópico e foi objeto de impugnação posterior pela defesa do apelante no curso da ação penal, sendo que durante o exercício regular do contraditório nenhuma prova foi capaz de elidi-la, sendo descabida a pretensão recursal neste tópico.
4. O apelante detinha licença da autoridade competente para a guarda de aves, porém, tal licença expirou em 31 de julho de 2008, ou seja, mais de um ano antes da data dos fatos. Todas as aves, portanto, estavam em situação irregular. A autoria é inconteste, sendo certo que os pássaros foram encontrados na residência do réu, configurando situação de flagrante delito, e o apelante não logrou êxito em provar que os pássaros apreendidos já foram adquiridos com as respectivas anilhas. Observo que o ora apelante é criador de pássaros e possuía familiaridade com os trâmites e procedimentos para a regularização da guarda das aves perante o IBAMA, não restando dúvida quanto à sua responsabilização, restando devidamente demonstrado o elemento subjetivo do tipo (dolo).
5. O apelante invoca em seu favor a aplicação do princípio da consunção, sob o argumento de que o delito previsto no artigo 296, § 1º, inciso III, do CP, constitui meio para a consecução do crime previsto no artigo 29, § 1º, inciso III, da Lei nº 9.605/98. Contudo, não há que se falar em absorção de um delito por outro. Os crimes pelos quais o apelante foi condenado tutelam bens jurídicos diversos e decorrem de ações diversas. A adulteração de anilhas não é crime de passagem para a consumação do delito de guarda ilegal de pássaros. As condutas são autônomas, sendo, portanto, inaplicável o princípio da consunção ao caso concreto em exame.
6. Apelação do réu desprovida.
(ACR 0009303-19.2009.4.03.6106, 2ª Turma - TRF3, Rel. Juiz Convocado Fernão Pompêo, e-DJF3 Judicial 1 18/12/2013, g.n.)

Da materialidade. A materialidade dos crimes restou suficientemente comprovada pelos Boletim de Ocorrência Ambiental (fls. 05/07), Auto de Infração Ambiental (fl. 08), Termo de Apreensão (fl. 09), Termo de Embargo de Área e/ou Atividade (fl. 10), Termo de Destinação de Animais, Materiais e/ou Produtos Apreendidos (fls. 12/13), registro fotográfico (fl.14), Exame de Constatação (fls. 15/18), Auto de Apreensão (fl. 20) e Laudo Pericial (fls. 39/48), assim como pelos depoimentos das testemunhas e pelo interrogatório do réu (mídia de fl. 149).
Em relação ao crime previsto no art. 296, § 1º, I e III, do Código Penal, os documentos mencionados acima evidenciaram que as anilhas apreendidas e as que se encontravam no tarso das aves foram adulteradas, haja vista que apresentavam diâmetro interno superior ao permitido.
Da autoria e do dolo. No que tange à autoria, resta evidente pelas declarações testemunhais e oitiva do réu, tanto na fase do Inquérito Policial quanto em sede Judicial. Ademais, a apreensão se realizou na residência do acusado.
Tanto em sede policial quanto em Juízo, o acusado admitiu ser o proprietário das aves apreendidas à época dos fatos. Todavia, alegou que não tinha conhecimento de que as anilhas eram adulteradas e nem possuía meios para aferir a autenticidade destas. Sustentou que adquiriu as aves com as anilhas (fls. 54/55 e mídia de fl. 149).
As testemunhas de acusação, em Juízo, confirmaram o teor dos fatos narrados na denúncia (mídia de fl. 149).
Resta, pois, apenas avaliar o dolo.
Diante do conjunto probatório carreado nos autos e das circunstâncias do caso, não é possível dar guarida à versão defensiva, de que o réu não tinha ciência da adulteração das anilhas. Vejamos.
O apelante alega que não tinha conhecimento acerca da adulteração das anilhas.
Ocorre que, sendo o réu um criador de pássaros registrado no Sistema de Cadastro de Criadores Amadoristas de Passeriformes, há muitos anos, tem como dever conferir o número e a regularidade da anilha ao adquirir cada ave. Além disso, não é razoável que não tenha atentado para a situação das anilhas nos pássaros que estava adquirindo ou trocando, já que não se trata de pessoa leiga.
Obviamente que, somente por conta disso, não se pode concluir ser o réu o autor da falsificação, mas, por outro lado, não há como eximi-lo da prática do uso indevido das anilhas falsificadas, uma vez que tinha condições de aferir que as mesmas estavam adulteradas, bem como tinha a obrigação de notificar o órgão competente quanto a possíveis irregularidades encontradas.
Ademais, o réu tenta atribuir a responsabilidade pela adulteração das anilhas a terceiros sem, contudo, indicar os nomes destes ou juntar qualquer recibo ou nota de compra.
Outrossim, pesa em desfavor do réu, o fato de que, na data dos fatos, foram apreendidos na residência dele objetos destinados a adulteração de anilhas, a saber: 01 (um) suporte para alargar anilha; 03 (três) pinos para alargar anilhas; e 01 (um) anilhador.
Assim, não há como se acolher a tese de erro de proibição do acusado, de modo a afastar o elemento subjetivo do tipo (o dolo), restando demonstrado pelas próprias circunstâncias fáticas e da alegada condição de criador de aves autorizado pelo IBAMA.
Vale mencionar, ainda, que, ao não averiguar a regularidade das anilhas dos seus pássaro, pode-se afirmar que, no mínimo, o réu assumiu o risco do resultado, ensejando a condenação, ainda que pela caracterização do dolo eventual.
Desse modo, ao utilizar anilhas adulteradas, procedeu à guarda de espécimes da fauna silvestre em situação irregular.
Diante desse contexto, conclui-se que a prova acusatória é subsistente e hábil a comprovar a materialidade, a autoria e o dolo dos crimes, devendo ser reformada, em parte, a r. sentença, a fim de manter-se a condenação do réu pela prática do crime previsto no art. 29, § 1º, III, da Lei 9.605/98, e condená-lo pela prática do delito previsto no art. 296, § 1º, I e III, do Código Penal.
Da dosimetria da pena. A pena do acusado restou concretizada em 10 (dez) meses de detenção, em regime inicial aberto, e 12 (doze) dias-multa, no valor unitário de 1/30 (um trigésimo) do salário mínimo.
A pena privativa de liberdade foi substituída por uma pena restritiva de direitos, consistente em prestação de serviços à comunidade pelo prazo da pena substituída.

Do crime previsto no artigo 29, § 1º, III, da Lei 9.605/98. O juízo a quo fixou a pena para o crime do artigo 29, § 1º, inciso III, da Lei nº 9.605/98 em 10 (dez) meses de detenção e 12 (doze) dias-multa.
Na primeira fase da dosimetria, o Magistrado fixou a pena-base acima do mínimo legal em 08 (oito) meses de detenção.
Na segunda fase, ausentes atenuantes. Contudo, houve aumento da pena em razão da agravante prevista no art. 15, inc. II, "n", da Lei nº 9.605/98, do que resultou a pena de 10 (dez) meses de detenção.
Na terceira fase, inexistentes causas de diminuição ou de aumento, razão pela qual a pena definitiva restou concretizada em 10 (dez) meses de detenção e 12 (doze) dias-multa, no valor unitário de 1/30 (um trigésimo) do salário mínimo.
Não havendo irresignação da defesa quanto à fixação da pena-base e com relação às demais fases de fixação da pena privativa de liberdade, tenho que a mesma deve ser mantida, nos termos em que lançada, posto que observada a jurisprudência atual e os preceitos legais atinentes à matéria, não havendo necessidade de reformá-la.
Do crime previsto no artigo 296, § 1º, I e III, do Código Penal. Tendo em vista a reforma da r. sentença e a condenação do recorrente pela prática do delito de falsificação de selo ou sinal público, passa-se à dosimetria da pena, utilizando o procedimento trifásico previsto no art. 68, do Código de Penal.
Na primeira fase da dosimetria, observando as circunstâncias judiciais previstas no artigo 59 do Código Penal, nota-se que a culpabilidade do réu, os motivos, as circunstâncias e as consequências do crime não extrapolam o comum em crimes dessa natureza. Não há nos autos elementos disponíveis para que se avalie a conduta social do réu, bem como a sua personalidade. Não há que se falar em comportamento da vítima. Ademais, o réu não possui maus antecedentes.
Desta feita, a pena-base deve ser fixada no mínimo legal - 02 (dois) anos de reclusão e 10 (dez) dias-multa.
Na segunda fase, inexistem circunstâncias agravantes e atenuantes a serem consideradas.
Na terceira fase, não há causas de aumento ou de diminuição da pena, razão pela qual a pena definitiva resta concretizada em 02 (dois) anos de reclusão e 10 (dez) dias-multa.
Mantido o valor do dia-multa fixado na sentença, qual seja, 1/30 (um trigésimo) do salário mínimo.
Do concurso dos crimes. Cabe reconhecer o concurso formal de delitos.
Tratando-se de concurso formal de delitos, a pena do delito do artigo 296, por ser a mais grave, merece ser majorada em 1/6 (um sexto), do que resulta a pena definitiva de 02 (dois) anos e 04 (quatro) meses de reclusão, nos moldes previstos no artigo 70 do Código Penal, e 22 (vinte e dois) dias-multa, conforme previsto no artigo 72 do mesmo Diploma Legal.
O regime inicial de cumprimento da pena privativa de liberdade é o aberto, nos termos do art. 33, §2º, alínea "c", do Código Penal, e o valor unitário dos dias-multa em 1/30 do salário mínimo vigente à época dos fatos, corrigidos até a data do pagamento.
Por fim, nos termos do artigo 44 do Código Penal, é cabível a substituição da pena privativa de liberdade acima fixada por duas penas restritivas de direitos, consistentes na prestação de serviços à comunidade ou a entidades públicas, pelo prazo da pena substituída, e prestação pecuniária, no valor de 03 (três) salários-mínimos.
Ante o exposto, nego provimento ao recurso da defesa e dou provimento ao recurso da acusação, a fim de condenar Reginaldo Souza pela prática do crime previsto no artigo 296, § 1º, I e III, do Código Penal, mantendo-se a condenação pela prática do delito previsto no artigo 29, § 1º, III, da Lei 9.605/98, restando a pena final concretizada em 02 (dois) anos e 04 (quatro) meses de reclusão, em regime aberto, e ao pagamento de 22 (vinte e dois) dias-multa, pena corporal substituída por duas penas restritivas de direitos, consistentes na prestação de serviços à comunidade ou a entidades públicas, pelo prazo da pena substituída, e prestação pecuniária, no valor de 03 (três) salários-mínimos.

É COMO VOTO.

PAULO FONTES
Desembargador Federal


Documento eletrônico assinado digitalmente conforme MP nº 2.200-2/2001 de 24/08/2001, que instituiu a Infra-estrutura de Chaves Públicas Brasileira - ICP-Brasil, por:
Signatário (a): PAULO GUSTAVO GUEDES FONTES:10067
Nº de Série do Certificado: 11A2170419468351
Data e Hora: 15/02/2018 11:49:59