Diário Eletrônico

PODER JUDICIÁRIO

TRIBUNAL REGIONAL FEDERAL DA 3ª REGIÃO

D.E.

Publicado em 26/10/2018
EMBARGOS INFRINGENTES E DE NULIDADE Nº 0000378-77.2013.4.03.6111/SP
2013.61.11.000378-7/SP
RELATOR : Desembargador Federal PAULO FONTES
EMBARGANTE : JOAO CELSO ALVES
: CLEUZA BONIFACIO CORREA
ADVOGADO : SP096230 MICHEL JOSE NICOLAU MUSSI e outro(a)
EMBARGADO(A) : Justica Publica
NÃO OFERECIDA DENÚNCIA : RODRIGO CORREA ROZA
No. ORIG. : 00003787720134036111 1 Vr MARILIA/SP

EMENTA

PENAL. PROCESSUAL PENAL. EMBARGOS INFRINGENTES. PRESCRIÇÃO RECONHECIDA QUANTO AO CRIME DE FRAUDE PROCESSUAL. RECONHECIMENTO DO PRINCÍPIO DA CONSUNÇÃO. ABSOLVIÇÃO QUANTO AO DELITO DO ARTIGO 299 DO CP. RECURSO PROVIDO.
1. Prescrição reconhecida quanto ao crime de fraude processual.
2. Já quanto ao crime do artigo 299, do Código Penal não houve o transcurso de lapso temporal suficiente à ocorrência da prescrição.
3. In casu, incide a disposição do artigo 117, § 2, do Código Penal. Assim, entre a data dos fatos, o recebimento da denúncia (31.01.2013 - fls. 106/107), a publicação da sentença (26.11.2013 - fl. 292) e a publicação do acórdão condenatório (30.08.2017 - fls. 395 vº), não houve o transcurso de lapso temporal superior a 04 (quatro) anos.
4. No mérito recursal, o dissenso refere-se à aplicação do princípio da consunção.
5. In casu, restou demonstrado que o delito de falsidade ideológica foi meio para a prática do crime de fraude processual.
6. Consunção reconhecida.
7. Embargos infringentes providos.

ACÓRDÃO

Vistos e relatados estes autos em que são partes as acima indicadas, decide a Egrégia Quarta Seção do Tribunal Regional Federal da 3ª Região, por maioria, após a prolação de voto de desempate, dar provimento aos embargos infringentes, para decretar extinta a punibilidade de JOÃO CELSO ALVES e de CLEUZA BONIFÁCIO CORREA, quanto ao delito do artigo 347, do Código Penal, pela ocorrência da prescrição da pretensão punitiva estatal, com base na previsão contida no artigo 107, inciso IV, em conjunto com o disposto nos artigos 109, VI (com redação anterior à Lei nº 12.234/10) e 110, § 1º, todos do Código Penal; e para absolver os embargantes da prática do delito do artigo 299, do Código Penal, com fundamento no artigo 386, III, do Código de Processo Penal, de acordo com relatório e voto que ficam fazendo parte integrante do presente julgado. Vencidos os Desembargadores Federais Maurício Kato, André Nekatschalow e Fausto de Sanctis, que acolhiam parcialmente os embargos infringentes.



São Paulo, 18 de outubro de 2018.
PAULO FONTES
Desembargador Federal Relator


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EMBARGOS INFRINGENTES E DE NULIDADE Nº 0000378-77.2013.4.03.6111/SP
2013.61.11.000378-7/SP
RELATOR : Desembargador Federal PAULO FONTES
EMBARGANTE : JOAO CELSO ALVES
: CLEUZA BONIFACIO CORREA
ADVOGADO : SP096230 MICHEL JOSE NICOLAU MUSSI e outro(a)
EMBARGADO(A) : Justica Publica
NÃO OFERECIDA DENÚNCIA : RODRIGO CORREA ROZA
No. ORIG. : 00003787720134036111 1 Vr MARILIA/SP

VOTO-VISTA

Trata-se de embargos infringentes opostos por João Celso Alves e Cleuza Bonifácio Correa contra acórdão proferido pela Primeira Turma Julgadora que, por unanimidade, negou provimento à apelação da defesa e, por maioria, deu parcial provimento à apelação do Ministério Público Federal, para, mantendo a condenação dos acusados pela prática do delito previsto no artigo 347 do Código Penal, condená-los pela prática do crime descrito no artigo 299 c.c. os artigos 29 e 69, todos do Código Penal, à pena de 01 (um) ano de reclusão e pagamento de 10 (dez) dias-multa, no valor unitário de 1/30 (um trigésimo) do salário mínimo, restando definitiva, com fulcro no artigo 69, caput, do Código Penal, a pena em 01 (um) ano de reclusão, 03 (três) meses de detenção e 20 (vinte) dias-multa, pena corporal substituída por duas penas restritivas de direitos, nos termos do voto do E. Relator Des. Federal Valdeci dos Santos, acompanhado pelo Des. Federal Hélio Nogueira, vencido o Des. Federal Wilson Zauhy, que negava provimento ao apelo ministerial. Por maioria, determinou a imediata expedição da guia de execução provisória da pena, nos termos do voto do E. Relator, acompanhado pelo Des. Fed. Hélio Nogueira, vencido o Des. Fed. Wilson Zauhy que entende deva ser determinada a expedição de guia de execução somente após a certificação de esgotamento dos recursos ordinários no caso concreto.


De um lado, o voto vencido proferido pelo E. Des. Federal Wilson Zauhy entendeu por bem aplicar o princípio da consunção à espécie. Noutro vértice, o voto vencedor, da lavra do E. Des. Federal Valdeci dos Santos, entendeu tratar-se o caso de concurso material entre os delitos de falsidade ideológica e fraude processual.


Inicialmente, destaco que, em sede de embargos infringentes, o reexame do acórdão recorrido está restrito à parte em que houver divergência entre os julgadores.


No vertente caso, o dissenso se restringe, unicamente, quanto à aplicação do princípio da consunção à espécie, eis que a preliminar de prescrição quanto ao delito previsto no art. 347 do CP (fraude processual), arguida pela defesa, foi acolhida, à unanimidade, por este Colegiado.


As condutas narradas na denúncia versam sobre suposta prática do delito de falsidade ideológica em documento particular, bem como a inovação, na pendência de processo civil, sobre o estado de coisa, com o fim de induzir à erro o juiz que decretou a penhora nos autos da ação monitória nº 2009.61.11.002775-2.


O E. Relator da presente irresignação recursal, Des. Federal Paulo Fontes, reputou que deve prevalecer a conclusão apresentada no voto vencido e, por conseguinte, deu provimento aos embargos infringentes para decretar a extinção da punibilidade de João Celso Alves e de Cleuza Bonifácio Correa, pela ocorrência da prescrição, quanto ao delito de fraude processual, e absolver os embargantes quanto ao delito de falsidade ideológica.


Entendo deva prevalecer o voto do E. Relator em sua integralidade.


Com efeito, o vertente caso trata de sucessivas tentativas de cumprimento de mandado de penhora, efetivamente expedido nos autos da ação monitória nº 2009.61.11.002775-2, em 02.02.2010 e em 05.02.2010, na residência da ré Cleuza Bonifácio Correa. Ainda, a denúncia relata simulações de transações imobiliárias, a saber: a primeira, em 04.02.2010, atinente a uma suposta "venda" do imóvel (matrícula nº 34.631), objeto da penhora, pela embargante ao embargado, sendo eles companheiros em união estável; e, a segunda, em 07.06.2010, aduz sobre a ocorrência de uma "revenda" deste mesmo bem pelo recorrente a terceiros.


Pelas datas em que as transações foram realizadas, infere-se o intento de frustrar a penhora, eis que a primeira tentativa de cumprimento do mandado ocorreu em 02.02.2010 e a segunda em 05.02.2010, porém, a "venda" do imóvel ocorreu anteriormente à primeira tentativa, em 04.02.2010. Verifico, ainda, a juntada aos autos do comprovante de averbação da anulação de registro das escrituras de compra e venda do imóvel objeto da penhora, matrícula nº 34.631, conforme Ofício de fls. 97, do Apenso II.


Depreende-se da narrativa dos fatos e do conjunto probatório, que o delito de falsidade ideológica, constante do registro da escritura de compra e venda, configurou-se como meio para a execução do delito fim, a fraude processual, conquanto os embargantes simularam sucessivas transações imobiliárias relativamente ao mesmo imóvel (matrícula nº 34.631) entre si - considerando que os réus eram companheiros, e, posteriormente, com terceiros, ciente de que sobre o bem recaía determinação judicial de penhora.


Verifica-se evidenciado o intento dos recorrentes em induzir a erro o juiz da execução civil, porquanto a embargante CLEUZA, perante o Oficial de Justiça, ocultou bem imóvel de sua propriedade, a fim de frustrar a penhora.


Destarte, como bem ressaltado pelo juízo a quo, extrai-se o ardil dos embargantes pela declaração do valor ínfimo do imóvel na escritura pública, tendo em vista o valor apontado no Laudo de Avaliação e Intimação nº 1.025, in verbis:


"O relato da certidão, apresentada por cópia às fls. 73 a 80, corroborado pelo depoimento da testemunha de acusação, é preciso ao indicar que o réu JOÃO estava ciente desde o dia 02 de fevereiro de 2.010 de que havia um mandado judicial de penhora do aludido imóvel (fl. 53 do apenso II), mediante pedido da CEF (fl. 50 do apenso II). Não há outra justificativa, a não ser a ciência da ré CLEUZA da iminência da penhora, a alienação injustificada do bem a seu companheiro. Ora, se a finalidade fosse a venda lícita e transparente do bem para terceiros, por que razão venderia o imóvel a seu companheiro para esse o revender? Não há lógica neste proceder, a única explicação razoável é que a ré CLEUZA no afã de evitar a penhora do bem - frustrado de início sob o argumento de bem de família - contou com o apoio de seu companheiro para realizar a escritura de venda e compra datada de 04 de fevereiro de 2.010 (fl. 178 verso) e registrada somente em 13 de maio de 2.010 (R 2/34.631). Corrobora o ardil dos réus os valores ínfimos constantes das escrituras em comparação com o valor do laudo de avaliação e intimação nº 1.025. Neste ponto, feliz a observação do órgão acusador:"Ressalte-se que em ambas transações imobiliárias, os valores constantes das e scrituras são bem inferiores (R$ 2.280,00 e R$ 10.000,00, respectivamente 1ª e 2ª transações) ao do Laudo de Avaliação e Intimação nº 1025 (R$ 60.000,00) e aos mencionados nos depoimentos colhidos (R$ 40.000,00 e R$ 53.000,00, respectivamente 1.ª e 2.ª transações (fls.20/23 e 30/31; fls. 66 e 128/130 do Apenso II)." (fl. 247)."

No presente caso, a falsidade ideológica exauriu a sua potencialidade lesiva no delito de fraude processual, devendo ser por este absorvido.


Desse modo, de rigor, a aplicação do princípio da consunção à espécie, bem como a absolvição dos embargantes pelo delito de falsidade ideológica, como consequência lógica da extinção da punibilidade do delito consuntivo, previsto no art. 347 do CP.


Ante o exposto, dou provimento aos embargos infringentes opostos por João Celso Alves e Cleuza Bonifácio Correa para reconhecer a prescrição pelo delito do art. 347 do CP e absolver os embargantes quanto ao delito do art. 299 do Código Penal, com fundamento no art. 386, III do Código de Processo Penal.


É como voto.


NERY JUNIOR
Vice-Presidente


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EMBARGOS INFRINGENTES E DE NULIDADE Nº 0000378-77.2013.4.03.6111/SP
2013.61.11.000378-7/SP
RELATOR : Desembargador Federal PAULO FONTES
EMBARGANTE : JOAO CELSO ALVES
: CLEUZA BONIFACIO CORREA
ADVOGADO : SP096230 MICHEL JOSE NICOLAU MUSSI e outro(a)
EMBARGADO(A) : Justica Publica
NÃO OFERECIDA DENÚNCIA : RODRIGO CORREA ROZA
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RELATÓRIO

Trata-se de Embargos Infringentes opostos por CLEUZA BONIFÁCIO CORREA e JOÃO CELSO ALVES contra acórdão de fls. 393/395, proferido pela Primeira Turma deste E. Tribunal Regional Federal que, por unanimidade, negou provimento à apelação da defesa e, por maioria, deu parcial provimento à apelação do Ministério Público Federal, para, mantendo a condenação dos acusados pela prática do delito previsto no artigo 347 do Código Penal, condená-los pela prática do crime descrito no artigo 299 c.c. os artigos 29 e 69, todos do Código Penal, à pena de 01 (um) ano de reclusão e pagamento de 10 (dez) dias-multa, no valor unitário de 1/30 (um trigésimo) do salário mínimo, restando definitiva, com fulcro no artigo 69, caput, do Código Penal, a pena em 01 (um) ano de reclusão, 03 (três) meses de detenção e 20 (vinte) dias-multa, pena corporal substituída por duas penas restritivas de direitos, nos termos do voto do relator, acompanhado pelo Des. Fed. Hélio Nogueira, vencido o Des. Fed. Wilson Zauhy que negava provimento à apelação do Ministério Público Federal.

E, por maioria, determinou, ainda, a imediata expedição de guia de execução, nos termos do voto do Des. Fed. Valdeci dos Santos, acompanhado pelo Des. Fed. Hélio Nogueira, vencido o Des. Fed. Wilson Zauhy que determinava a expedição de guia de execução somente após o esgotamento dos recursos ordinários.

A ementa do acórdão foi redigida nos seguintes termos:


"PENAL. PROCESSUAL PENAL. CRIMES DESCRITOS NOS ARTIGOS 299 E 347 DO CÓDIGO PENAL. PRINCÍPIO DA CONSUNÇÃO. INAPLICABILIDADE. CONCURSO MATERIAL. MATERIALIDADE E AUTORIA COMPROVADAS. DELITO PREVISTO NO ARTIGO 342, § 1º, DO CÓDIGO PENAL. MATERIALIDADE NÃO COMPROVADA. APELAÇÃO DA DEFESA DESPROVIDA. APELAÇÃO DA ACUSAÇÃO PARCIALMENTE PROVIDA.
1. Princípio da consunção. No caso dos autos, deve ser afastado o princípio da consunção, uma vez que, embora o delito de falsidade ideológica tenha sido cometido para a consecução do crime de fraude processual, sua lesividade não se exauriu no crime-fim. Observa-se que os efeitos da conduta delitiva dos acusados repercutem em outras esferas jurídicas, pois os valores falsamente declarados na Escritura de Venda e Compra do imóvel constituem base de cálculo de impostos como o ITBI e IRPF, gerando prejuízo ao Erário.
2. A materialidade dos delitos definidos nos artigos 299 e 347, ambos do Código Penal, ficou demonstrada pelo registro de imóvel, pelas peças do Processo n.º 0002775-51.2009.4.03.6111 (Apenso II), pelas peças do Processo n.º 344.01.2011.021747-5 e pelos depoimentos das testemunhas, os quais demonstram a simulação da operação de compra e venda do imóvel de matrícula n.º 34.631 do 1º Cartório de Registro de Imóveis de Marília, inovando artificiosamente estado do referido bem e induzindo o Juízo a erro, para evitar a decretação de penhora na Ação Monitória n.º 0002775-51.2009.4.03.6111, movida pela Caixa Econômica Federal em face da acusada Cleuza Bonifácio Correa.
3. Extrai-se do conjunto probatório que a venda do imóvel de matrícula n.º 34.631 de propriedade da ré Cleuza para o seu companheiro João Celso não ocorreu de fato, uma vez que sequer havia ajuste de pagamento pelo réu João Celso pela compra do imóvel. Nota-se, inclusive, que a quitação da dívida da ré em face da Caixa Econômica Federal se deu somente após a venda do bem para terceiros, cabendo destacar, ainda, que a lavratura da Escritura de Venda e Compra se deu em 04 de fevereiro de 2010, apenas dois dias após o primeiro comparecimento do oficial de justiça para cumprimento do mandado de penhora sobre o imóvel, evidenciando a intenção de evitar a penhora do bem nos autos da ação monitória.
4. Ademais, é certo que os acusados tinham ciência da existência da ação monitória quando da venda do imóvel, tendo em vista que a ré Cleuza foi citada naquela ação em 24 de junho de 2009; por outro lado, em 02 de fevereiro de 2010, o réu João Celso tomou conhecimento da existência de mandado de penhora sobre aquele bem quando da tentativa de cumprimento do mandado pelo oficial de justiça.
5. Cumpre salientar que a alegação da defesa quanto à ausência de prejuízo pela prática do delito de fraude processual não se sustenta, tendo em vista se tratar de crime formal, cuja consumação independe do resultado, bastando a ação do agente e a vontade de concretizá-lo para a configuração do delito.
6. A autoria restou cabalmente demonstrada. O conjunto probatório atesta a responsabilidade penal dos réus, bem como demonstram que os mesmos agiram de forma livre e consciente ao praticar os delitos narrados na denúncia, não se admitindo falar na ausência de dolo e desconhecimento da ilicitude, devendo ser rechaçada a alegação da defesa de que "os denunciados são pessoas ignorantes na acepção da palavra. (...) A denunciada Cleuza é empregada doméstica devidamente registrada em um mesmo local há 35 (trinta e cinco) anos. João Celso é pedreiro e somente isso. Mal sabem se expressar". Isto porque, os depoimentos dos acusados prestados na fase do inquérito policial revelam razoável conhecimento sobre assuntos imobiliários ao defenderem a licitude das transações realizadas pela ausência de constrições judiciais sobre o imóvel à época de sua venda e pela inexistência de notificação de penhora sobre tal bem nos autos da ação monitória. Ademais, os acusados relataram em depoimento judicial que as transações foram realizadas mediante a devida orientação por corretor de imóveis, Rodrigo Correa Rosa, filho da ré Cleuza.
7. Crime de falso testemunho. No caso dos autos, embora a acusada Cleuza Bonifácio Correa tenha prestado depoimento como testemunha nos autos dos Embargos de Terceiro n.º 0002775-51.2009.4.03.6111, relativo ao imóvel objeto de fraude narrada na denúncia, era suspeita, tendo em vista o seu interesse na lide, de modo que o seu depoimento encontrava óbice no art. 405, § 3º, inc. IV, do CPC/1973, não se tratando, portanto, de depoente compromissada. Sendo assim, considerando a ausência de elemento essencial do tipo penal, isto é, a condição de testemunha, deve ser mantida a absolvição da ré no tocante ao delito de falso testemunho, nos termos da r. sentença recorrida.
8. Crime de fraude processual. Dosimetria. A pena-base dos acusados foi fixada no mínimo legal, em 03 (três) meses de detenção para cada réu, em regime inicial aberto, e pagamento de 10 (dez) dias-multas, sendo cada dia-multa no valor de 1/30 (um trigésimo) do salário-mínimo. À míngua de agravantes ou atenuantes e causas de diminuição ou aumento da pena, restou definitiva a pena de 03 (três) meses de detenção e 10 (dez) dias-multas.
9. Crime de falsidade ideológica. Dosimetria. Fixa-se a pena-base dos acusados no mínimo legal, em 01 (um) ano de reclusão, em regime inicial aberto, e 10 (dez) dias-multa, no valor de 1/30 (um trigésimo) do salário-mínimo o dia-multa. Ante a ausência de agravantes ou atenuantes e causas de diminuição ou aumento da pena, resta definitiva a pena de 01 (um) ano de reclusão e 10 (dez) dias-multas.
10. Por fim, com fulcro no artigo 69, caput, do Código Penal, resta definitiva a pena de 01 (ano) de reclusão, 03 (três) meses de detenção e 20 (vinte) dias-multa, salientando-se que, em razão da existência de pena de detenção e de reclusão, deve a pena de reclusão ser executada primeiro.
11. No tocante à substituição das penas na hipótese de concurso material, o STJ já decidiu no sentido de que deve ser considerado o somatório das reprimendas. Portanto, resultando para os acusados a pena privativa de liberdade de 01 (ano) e 03 (três) meses e, considerando o preenchimento dos requisitos do artigo 44 do Código Penal, determina-se a sua substituição por duas penas restritivas de direitos, sendo uma restritiva de direito consistente em prestação de serviços à comunidade ou a entidades públicas, tal como fixada na r. sentença, e a outra, em prestação pecuniária de 2 (dois) salários mínimos em favor da União Federal.
12. Apelação da defesa a que se nega provimento. Apelação da acusação a que se dá parcial provimento".

Às fls. 400/408, pretendem os embargantes, preliminarmente, a extinção da punibilidade, ante o reconhecimento da prescrição. No mérito, requerem a prevalência do voto vencido do Exmo. Des. Federal Wilson Zauhy, que os absolvia do delito do artigo 299, do Código Penal.

Admitidos os embargos e feita a distribuição do recurso perante esta Quarta Seção (fl. 411), os autos foram encaminhados à Procuradoria Regional da República, que opinou, em contrarrazões, pelo reconhecimento da prescrição quanto ao delito do artigo 347, do Código Penal e, no mérito, pelo desprovimento dos embargos infringentes (fls. 414/420).

Após, instado a se manifestar (fl. 442), o Parquet entendeu que seria caso de reconhecer a prescrição também em relação ao crime do artigo 299, do Código Penal (fls. 443/444).

É o Relatório.

À Revisão.


PAULO FONTES
Desembargador Federal Relator


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EMBARGOS INFRINGENTES E DE NULIDADE Nº 0000378-77.2013.4.03.6111/SP
2013.61.11.000378-7/SP
RELATOR : Desembargador Federal PAULO FONTES
EMBARGANTE : JOAO CELSO ALVES
: CLEUZA BONIFACIO CORREA
ADVOGADO : SP096230 MICHEL JOSE NICOLAU MUSSI e outro(a)
EMBARGADO(A) : Justica Publica
NÃO OFERECIDA DENÚNCIA : RODRIGO CORREA ROZA
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VOTO

Da prescrição. Preliminarmente, a defesa requer o reconhecimento da prescrição da pretensão punitiva.

Os embargantes foram condenados na r. sentença de primeiro grau pelo delito do artigo 347, do Código Penal e absolvidos da imputação referente à imputação do crime do artigo 299, do Código Penal.

Em segundo grau, o acórdão confirmou a condenação do delito de fraude processual e ainda entendeu que seria caso de condenação também pelo crime de falsidade ideológica.

No tocante ao delito do artigo 347, do Código Penal, os embargantes foram condenados à pena privativa de liberdade de 3 (três) meses de detenção e pagamento de 10 (dez) dias-multa.

Ausente irresignação da acusação, a prescrição deve ser regulada pela pena aplicada em concreto, segundo o § 1º do artigo 110 do Código Penal.

Em atenção à pena privativa de liberdade aplicada e como os fatos ocorreram em 04.02.2010, a reprimenda prescreve em 2 (dois) anos, nos termos do artigo 109, VI, do Código Penal (redação anterior à Lei nº 12.234/10).

Verifica-se, assim, que já houve o transcurso de lapso prescricional superior a 2 (dois) anos entre a publicação da sentença condenatória (26.11.2013 - fl. 292) e a publicação do v. acórdão (30.08.2017 - fl. 395 vº), sendo forçoso concluir que está extinta a punibilidade dos acusados quanto ao delito do artigo 347, do Código Penal.

Já no tocante ao delito do artigo 299, do Código Penal, deve incidir a previsão do artigo 117, § 1º, 2ª parte, do Código Penal, para a verificação da ocorrência da prescrição. O dispositivo preceitua que: "Nos crimes conexos, que sejam objeto do mesmo processo, estende-se aos demais a interrupção relativa a qualquer deles".

Assim, a sentença condenatória pelo crime do artigo 347 do Código Penal deve ser considerada como marco interruptivo em relação ao delito do artigo 299, do Código Penal.

Os embargantes foram absolvidos na r. sentença da imputação do delito de falsidade ideológica. Após recurso ministerial, foram condenados por tal crime à pena privativa de liberdade de 1 (um) ano de reclusão, e pagamento de 10 (dez) dias-multa.

Tendo havido o trânsito em julgado para a acusação, conforme já ressaltado, a prescrição regula-se pela pena em concreto, de acordo com o artigo 110, § 1º, do Código Penal.

A reprimenda aplicada prescreve em 4 (quatro) anos, nos termos do artigo 109, V, do Código Penal.

Nesse contexto, entre a data dos fatos (04.02.2010), o recebimento da denúncia (31.01.2013 - fls. 106/107), a publicação da sentença (26.11.2013 - fl. 292) e a publicação do acórdão condenatório (30.08.2017 - fls. 395 vº), não houve o transcurso de lapso temporal superior a 04 (quatro) anos.

Remanesce, portanto, a condenação dos acusados pelo delito do artigo 299, do Código Penal.

Passa-se, assim, à análise do mérito do recurso.


Do mérito recursal. Em sede de embargos infringentes, o reexame do mérito da apelação criminal fica restrito ao ponto de divergência entre os julgadores.

No caso, verifica-se que o dissenso diz respeito, unicamente à aplicação do princípio da consunção, com a consequente absolvição dos embargantes em relação ao crime do artigo 299, do Código Penal.

O voto vencedor, de lavra do Exmo. Desembargador Federal Valdeci dos Santos, afastou a incidência da consunção sob os seguintes fundamentos:


"Inicialmente, ressalto que, no caso dos autos, deve ser afastado o princípio da consunção, uma vez que, embora o delito de falsidade ideológica tenha sido cometido para a consecução do crime de fraude processual, sua lesividade não se exauriu no crime-fim.
Com efeito, foi declarado em Escritura de Venda e Compra a alienação do imóvel de matrícula n.º 34.631 ao acusado João Celso Alves, por valor substancialmente inferior ao seu valor real, consoante Laudo de Avaliação (fl. 95 do Apenso II). Da mesma forma, na revenda do bem para Maria Rosa Bizachi da Silva e Iracy Bizachi, o montante declarado na Escritura do imóvel não corresponde ao valor efetivamente negociado. Desta feita, observa-se que os efeitos da conduta delitiva dos acusados repercutem em outras esferas jurídicas, pois os valores falsamente declarados constituem base de cálculo de impostos como o ITBI e IRPF, gerando prejuízo ao Erário.
Neste sentido, assim opinou o Ministério Público Federal em seu parecer de fls. 371/374v: "Muito embora não haja qualquer impeditivo para que um crime apenado de forma mais severa seja absorvido por outro de menor gravidade, até porque tal entendimento está consolidado na Súmula 17/STJ e vem sendo aplicado a outros delitos, o fato é que, no caso em tela, o falso não esgotou o seu potencial lesivo no delito de fraude processual, muito embora tenha sido meio necessário à sua prática. Isso porque os apelados declararam que o imóvel foi negociado, respectivamente, por R$ 2.800,00 e R$ 10.000,00 (fls. 49/51), valores esses muito inferiores ao constante no Laudo de Avaliação, que chegou a R$ 60.000,00 (fls. 128/130). Diante disso, resta claro que além do prejuízo à administração da Justiça, os acusados causaram, também, prejuízo ao erário, na medida em o valor da venda é a base de cálculo do Imposto sobre Transmissão de Bens Imóveis, das despesas com o registro do imóvel e, ainda, refletirá na Declaração de Imposto de Renda Pessoa Física dos envolvidos no negócio. Não se pode dizer portanto, que o falso se exauriu na fraude processual, razão pela qual entendemos ser equivocada a aplicação do princípio da consunção no caso em tela" (fls. 372/372v).
Portanto, no caso vertente, a prática do delito de falsidade ideológica deve ser analisada em concurso material com o crime de fraude processual."

Já o voto vencido, prolatado pelo Exmo. Desembargador Federal Wilson Zauhy, consignava que a falsidade ideológica estaria absorvida pela fraude processual. Vejamos:


"Com a devida vênia, contudo, entendo deva ser mantida a r. sentença que entendeu estar absorvida a falsidade ideológica pela fraude processual.
Aplica-se o princípio da consunção quando um dos delitos configurar meio necessário ou fase normal de preparação ou de execução do outro crime, sendo necessária a existência de nexo de dependência entre as condutas ilícitas, isto é, há o cometimento de um crime-meio que se exaure com a prática do crime-fim.
Do cotejo dos elementos probatórios juntados aos autos, não restou comprovado o intento dos acusados em causar prejuízo aos cofres públicos com o pagamento a menor de ITBI, despesas relativas ao registro da escritura, como ponderado pelo E. Relator. O desígnio dos acusados, ao simular a compra e venda, era somente evitar a formalização de penhora sobre o imóvel de propriedade de CLEUZA BONIFÁCIO CORREA, de modo que o crime de falso revela-se exclusivamente como meio para a prática do delito de fraude, neste exaurindo sua potencialidade lesiva, não subsistindo como crime autônomo.
Por conseguinte, de ser mantida a r. sentença quanto à absolvição do crime do artigo 299 do Código Penal, pela aplicação do princípio da consunção".

Com a devida vênia ao prolator do voto vencedor, reputo que deve prevalecer a conclusão apresentada no voto vencido.

No caso em tela, o delito de falsidade ideológica foi meio para a prática do crime de fraude processual.

Nesse sentido, transcrevo o seguinte trecho da r. sentença de primeiro grau:


"Quanto à fraude processual, diz a acusação que em 02 de fevereiro de 2.010, em cumprimento ao mandado de penhora expedido na ação monitória 2009.61.11.0027750-2, o oficial de justiça foi atendido pelo réu JOÃO CELSO ALVES que disse que a ré CLEUZA BONIFÁCIO CORREA não se encontrava em casa. Logo, no dia 04 de fevereiro do mesmo ano, a ré CLEUZA "vendeu" ao réu JOÃO o imóvel sob a matrícula 34.631, que foi "revendido" em 07 de junho de 2.010 para Maria Rosa Bizachi da Silva, Pedro da Silva e Iracy Bizachi (fls. 178 e 179).
Resta evidente que os réus sabiam do interesse da Justiça naquele imóvel. O relato da certidão, apresentada por cópia às fls. 73 a 80, corroborado pelo depoimento da testemunha de acusação, é preciso ao indicar que o réu JOÃO estava ciente desde o dia 02 de fevereiro de 2.010 de que havia um mandado judicial de penhora do aludido imóvel (fl. 53 do apenso II), mediante pedido da CEF (fl. 50 do apenso II). Não há outra justificativa, a não ser a ciência da ré CLEUZA da iminência da penhora, a alienação injustificada do bem a seu companheiro. Ora, se a finalidade fosse a venda lícita e transparente do bem para terceiros, por que razão venderia o imóvel a seu companheiro para esse o revender? Não há lógica neste proceder, a única explicação razoável é que a ré CLEUZA no afã de evitar a penhora do bem - frustrado de início sob o argumento de bem de família - contou com o apoio de seu companheiro para realizar a escritura de venda e compra datada de 04 de fevereiro de 2.010 (fl. 178 verso) e registrada somente em 13 de maio de 2.010 (R 2/34.631).
Corrobora o ardil dos réus os valores ínfimos constantes das escrituras em comparação com o valor do laudo de avaliação e intimação nº 1.025.
Neste ponto, feliz a observação do órgão acusador:

"Ressalte-se que em ambas transações imobiliárias, os valores constantes das escrituras são bem inferiores (R$ 2.280,00 e R$ 10.000,00, respectivamente 1ª e 2ª transações) ao do Laudo de Avaliação e Intimação nº 1025 (R$ 60.000,00) e aos mencionados nos depoimentos colhidos (R$ 40.000,00 e R$ 53.000,00, respectivamente 1.ª e 2.ª transações (fls.20/23 e 30/31; fls. 66 e 128/130 do Apenso II)." (fl. 247).

A falsidade ideológica constantes na escritura de venda e compra do imóvel é, obviamente, conduta absorvida pelo delito de fraude processual, evidenciando a configuração do tipo, a conduta dolosa dos réus com a finalidade de induzir em erro o juízo a evitar a penhora do imóvel, quando fosse superada a questão relativa ao bem de família.
Não só a inusitada negociação envolvendo a venda do imóvel, mediante contrato celebrado logo após a visita do oficial de justiça, de um convivente a outro, revela o elemento subjetivo do tipo penal, como também a prova oral colhida, que não trouxe qualquer justificativa convincente do porquê da venda de CLEUZA a JOÃO, sabedores da pendência do processo civil monitório e da tentativa de constrição do imóvel".

A intenção dos embargantes, conforme restou demonstrado nos autos, foi a de frustrar a penhora do imóvel.

Cumpre ressaltar que o imóvel, que seria objeto de constrição, foi negociado, respectivamente, por R$ 2.800,00 e R$ 10.000,00 (fls. 49/51), valores inferiores ao constante no Laudo de Avaliação, que chegou a R$ 60.000,00 (fls. 128/130).

Entretanto, os eventuais efeitos reflexos gerados, como o pagamento a menor de ITBI e das despesas relativas ao registro da escritura, constituem mero exaurimento da fraude processual.

O crime de falsidade ideológica, portanto, foi utilizado como ardil para assegurar a consumação da fraude processual, não podendo ser considerado de forma autônoma.

Dessa forma, é de rigor o reconhecimento do princípio da consunção, com a consequente absolvição de CLEUZA BONIFÁCIO CORREA e JOÃO CELSO ALVES quanto ao delito do artigo 299, do Código Penal, com fulcro no artigo 386, III, do Código de Processo Penal.

Remanesceria apenas a condenação dos embargantes quanto ao crime de fraude processual. Contudo, houve o reconhecimento da prescrição quanto a tal delito, com decretação da extinção da punibilidade, desaparecendo, como consequência, todos os efeitos da sentença penal condenatória.


Ante o exposto, dou provimento aos embargos infringentes, para decretar extinta a punibilidade de JOÃO CELSO ALVES e de CLEUZA BONIFÁCIO CORREA, quanto ao delito do artigo 347, do Código Penal, pela ocorrência da prescrição da pretensão punitiva estatal, com base na previsão contida no artigo 107, inciso IV, em conjunto com o disposto nos artigos 109, VI (com redação anterior à Lei nº 12.234/10) e 110, § 1º, todos do Código Penal; e para absolver os embargantes da prática do delito do artigo 299, do Código Penal, nos termos do artigo 386, III, do Código de Processo Penal.


PAULO FONTES
Desembargador Federal Relator


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