Diário Eletrônico

PODER JUDICIÁRIO

TRIBUNAL REGIONAL FEDERAL DA 3ª REGIÃO

D.E.

Publicado em 18/06/2018
APELAÇÃO CRIMINAL Nº 0000006-72.2015.4.03.6107/SP
2015.61.07.000006-6/SP
RELATOR : Desembargador Federal ANDRÉ NEKATSCHALOW
APELANTE : GLEDISTON DA SILVA
ADVOGADO : BA050929 DIONATAS WESLEY FERREIRA MERELES e outro(a)
APELADO(A) : Justica Publica
No. ORIG. : 00000067220154036107 1 Vr ARACATUBA/SP

EMENTA

PENAL. PROCESSUAL PENAL. CÓDIGO PENAL, ART. 273, § 1º-B. APREENSÃO DE MEDICAMENTOS ESTRANGEIROS. COMPETÊNCIA DA JUSTIÇA FEDERAL. INTERNACIONALIDADE DA CONDUTA. DENÚNCIA. INÉPCIA. DEFICIÊNCIA DA DEFESA. NULIDADE RELATIVA. PEDIDO DE ABSOLVIÇÃO. CONDENAÇÃO. ADMISSIBILIDADE. SENTENÇA. FUNDAMENTAÇÃO DEFICIENTE. NULIDADE POR OFENSA AO ART. 93, IX, DA CONSTITUIÇÃO DA REPÚBLICA. NÃO OCORRÊNCIA. REJEITADAS AS ALEGAÇÕES PRELIMINARES. INSIGNIFICÂNCIA. OFENSIVIDADE. TIPICIDADE MATERIAL CARACTERIZADA. MATERIALIDADE. AUTORIA. DOLO. COMPROVAÇÃO. DOSIMETRIA. CAUSA DE DIMINUIÇÃO EM FRAÇÃO ADEQUADA (LEI N. 11.343/06, ART. 33, § 4º). MULTA. PROPORCIONALIDADE. APELAÇÕES DESPROVIDAS.
1. A proteção à saúde pública é de competência concorrente dos entes federativos. Assim, na hipótese de apreensão de medicamentos, não basta a respectiva origem estrangeira para configurar a competência da Justiça Federal. Segundo precedentes do Superior Tribunal de Justiça, é necessário que haja indícios da internacionalidade do crime atribuído ao agente delitivo (STJ, AgRg no CC n. 151.529, Rel. Min. Reynaldo Soares da Fonseca, j. 09.08.17; STJ, HC n. 223.493, Rel. Min. Ribeiro Dantas, j. 08.11.16; STJ, AgRg no CC n. 149.185, Rel. Min. Nefi Cordeiro, j. 26.10.16).
2. Para não ser considerada inepta, a denúncia deve descrever de forma clara e suficiente a conduta delituosa, apontando as circunstâncias necessárias à configuração do delito, a materialidade delitiva e os indícios de autoria, viabilizando ao acusado o exercício da ampla defesa, propiciando-lhe o conhecimento da acusação que sobre ele recai, bem como, qual a medida de sua participação na prática criminosa, atendendo ao disposto no art. 41, do Código de Processo Penal (STF, HC n. 90.479, Rel. Min. Cezar Peluso, j. 07.08.07; STF, HC n. 89.433, Rel. Min. Joaquim Barbosa, j. 26.09.06 e STJ, 5a Turma - HC n. 55.770, Rel. Min. Arnaldo Esteves Lima, j. 17.11.05).
3. O fato descrito na denúncia caracteriza a hipótese penal do art. 273, § 1º-B, do Código Penal, não se aplicando tipo penal do art. 56 da Lei n. 9.605/98, de modo que não cabe oferta de suspensão condicional do processo.
4. Nos termos da Súmula n. 523 do Supremo Tribunal Federal, a deficiência da defesa técnica somente enseja a nulidade do processo se houver prova do prejuízo.
5. O juiz pode condenar o acusado ainda que a acusação manifeste-se pela sua absolvição (STJ, HC n. 196421, Rel. Min. Maria Thereza de Assis Moura, j. 06.02.14; AgRg no AREsp 284611, Rel. Min. Marilza Maynard, j. 16.05.13; HC n. 197068, Rel. Min. Jorge Mussi, j. 16.04.13; HC n. 152128, Rel. Min. Sebastião Reis Júnior, j. 05.02.13).
6. Segundo entendimento já pacificado pelo Supremo Tribunal Federal, somente a inexistência de fundamentação constitui causa de nulidade da decisão por ofensa ao art. 93, IX, da Constituição da República (STF, ARE-AgR n. 725564, Rel. Min. Rosa Weber, j. 12.05.15; ARE-AgR n. 707178, Rel. Min. Gilmar Mendes, j. 11.12.12; ARE-ED n. 676198, Rel. Min. Luiz Fux, j. 02.10.12).
7. Somente a importação de diminuta quantidade de medicamento para uso pessoal não causa potencial lesão ao bem jurídico tutelado pela norma penal do art. 273, § 1º-B, do Código Penal. O Superior Tribunal de Justiça não reconheceu o reduzido grau de reprovabilidade ou a mínima ofensividade da conduta em hipótese de apreensão de 59 (cinquenta e nove) comprimidos de Pramil (STJ, RHC n. 31352/RS, Rel. Min. Marco Aurélio Bellize, j. 11.04.13). No mesmo sentido já decidiu a 5ª Turma deste Tribunal com relação à apreensão de 60 (sessenta) comprimidos do medicamento, afastando a alegação de aquisição para uso próprio (TRF da 3ª Região, ACR n. 0005161-98.2011.4.03.6106, Rel. Des. Fed. Antônio Cedenho, j. 10.09.12).
8. Materialidade e autoria da conduta dolosa comprovadas.
9. Dosimetria. Considerando as circunstâncias da prática delitiva, é adequada a fração de 1/2 (metade) para a causa de diminuição de pena do art. 33, § 4º, da Lei n. 11.343/06.
10. Dado que tanto a pena privativa de liberdade quanto a pena de multa sujeitam-se a critérios uniformes para a sua determinação, é adequada a exasperação proporcional da sanção pecuniária (TRF da 3ª Região, EI n. 0004791-83.2006.4.03.6110, Rel. Des. Fed. André Nekatschalow, j. 16.02.17; TRF da 3ª Região, ACR n. 0002567-55.2013.4.03.6102, Des. Fed. Cecilia Mello, j. 20.09.16; TRF da 3ª Região, ACR n. 0003484-24.2012.4.03.6130, Rel. Des. Fed. Mauricio Kato, j. 11.04.16).
11. No caso dos autos, a pena de multa foi obtida em conformidade com os critérios fixados para o cálculo da pena de reclusão, tendo sido fixado o valor unitário mínimo de 1/30 (um trigésimo) do salário mínimo vigente ao tempo do fato, considerando que não havia nos autos informações suficientes acerca da real situação econômica do réu.
12. Apelações desprovidas.


ACÓRDÃO

Vistos e relatados estes autos em que são partes as acima indicadas, decide a Egrégia Quinta Turma do Tribunal Regional Federal da 3ª Região, por unanimidade, negar provimento às apelações criminais do Ministério Público Federal e do réu Glediston da Silva, nos termos do relatório e voto que ficam fazendo parte integrante do presente julgado.


São Paulo, 11 de junho de 2018.
Andre Nekatschalow
Desembargador Federal Relator


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APELAÇÃO CRIMINAL Nº 0000006-72.2015.4.03.6107/SP
2015.61.07.000006-6/SP
RELATOR : Desembargador Federal ANDRÉ NEKATSCHALOW
APELANTE : GLEDISTON DA SILVA
ADVOGADO : BA050929 DIONATAS WESLEY FERREIRA MERELES e outro(a)
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No. ORIG. : 00000067220154036107 1 Vr ARACATUBA/SP

RELATÓRIO

Trata-se de apelações criminais interpostas pelo Ministério Público Federal e pelo réu Glediston da Silva contra a sentença que condenou o acusado às penas de 2 (dois) anos e 11 (onze) meses de reclusão, regime inicial aberto, e 291 (duzentos e noventa e um) dias-multa, no mínimo valor unitário, por prática do crime previsto no art. 273, §§ 1º e 1º-B, I, do Código Penal, substituída a pena privativa de liberdade por duas penas restritivas de direitos consistentes em duas penas de prestação de serviços à comunidade ou a ente público (fls. 264/271).
O Ministério Público Federal aduz o seguinte:
a) o caso é de remessa dos autos à Justiça Estadual ou de oferta da suspensão condicional do processo diante da aplicação, por analogia, das penas previstas no art. 56 da Lei n. 9.605/98;
b) o caso é de absolvição do réu, por ausência de prova de que os produtos se destinassem ao comércio e porque não havia prova de que o acusado conhecesse sua falsidade (fls. 274 e 184/196v.).

O réu alega o quanto segue:

a) a denúncia é inepta haja vista limitar-se a descrever o fato de modo objetivo, sem registrar o ânimo doloso ou culposo do réu;
b) a resposta à acusação, com seu posterior aditamento, foi omissa, frágil, não expôs todas as teses de mérito e não postulou a absolvição, havendo, portanto, nulidade processual por deficiência de defesa técnica;
c) a sentença é nula uma vez que a defesa apresentou cerca de dez requerimentos em alegações finais, mas nenhum deles foi admitido, avaliado ou expressamente indeferido, exceto os relacionados à atipicidade e a inconstitucionalidade da pena do art. 273 do Código Penal;
d) apesar do disposto no art. 385 do Código de Processo Penal, não é dado ao magistrado, de ofício, condenar o acusado na hipótese em que o membro do Ministério Público, titular da ação penal, proponha a absolvição;
e) o fato é atípico porque as condutas atribuídas ao réu, "adquirir" e "comprar", não são previstas no tipo penal do art. 273, §§ 1º e 1º-B, do Código Penal;
f) os produtos foram adquiridos pelo acusado na cidade de Foz do Iguaçu (PR) e eram para uso próprio, pois o réu participava desde o ano de 2001 em competições de luta de braço;
g) o caso é de absolvição do réu por ausência de dolo ou pela falta de demonstração de que importara ou possuía os produtos com o fim de comercialização;
h) a aquisição de pequenas quantidades de produtos fármacos não implica lesão ao bem jurídico protegido pelo tipo penal do art. 273 do Código Penal;
i) os atos do acusado não causaram dano efetivo ou potencial à saúde pública;
j) a quantidade de produtos adquiridos é irrelevante dado que não havia intenção de comercializá-los ou distribui-los a terceiros, não havendo, portanto, periculosidade social da ação;
k) o réu adquiriu os produtos para consumo próprio, "o que não poderia fugir do que costumeiramente atletas que participam de competição de luta de braço fazem" (cf. fl. 330), assim demonstradas a falta de reprovabilidade da conduta do acusado e sua adequação social;
l) não houve qualquer prejuízo ao Estado;
m) não há falar em fato típico considerando o princípio da insignificância;
n) caso o réu não seja absolvido, cabe a desclassificação para a modalidade culposa do tipo penal, conforme o art. 273, § 2º, do Código Penal;
o) admitindo-se a modalidade culposa do delito, cabe aplicar a suspensão condicional do processo ou fixar as penas no mínimo legal;
p) o réu é primário, jamais foi preso ou processado, não tem antecedentes criminais ou envolvimento com atividades ou organizações criminosas, de modo que cabe fixar a fração máxima de 2/3 (dois terços) para a causa de diminuição prevista no art. 33, § 4º, da Lei n. 11.343/06;
q) considerando a atual crise econômica e a profissão do réu (instrutor físico), pede-se a redução dos dias-multa (fls. 305/341).
O Ministério Público Federal apresentou as contrarrazões, aduzindo que "o recurso do réu merece ser parcialmente provido, se não pelas razões meritórias que invoca, ao menos pelas razões que o MPF explanou em seus memoriais" (cf. fl. 345) (fls. 344/345).
A Ilustre Procuradora Regional da República, Dra. Janice Agostinho Barreto Ascari, manifestou-se pelo desprovimento da apelação do réu (fls. 348/358v.).
Os autos foram encaminhados à revisão, nos termos regimentais.
É o relatório.


Andre Nekatschalow
Desembargador Federal Relator


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APELAÇÃO CRIMINAL Nº 0000006-72.2015.4.03.6107/SP
2015.61.07.000006-6/SP
RELATOR : Desembargador Federal ANDRÉ NEKATSCHALOW
APELANTE : GLEDISTON DA SILVA
ADVOGADO : BA050929 DIONATAS WESLEY FERREIRA MERELES e outro(a)
APELADO(A) : Justica Publica
No. ORIG. : 00000067220154036107 1 Vr ARACATUBA/SP

VOTO

Imputação. Glediston da Silva foi denunciado por prática do crime previsto no art. 273, §§ 1º e 1º-B, do Código Penal, porque em 22.12.14, na Rodovia Assis Chateaubriand, altura do Km 342, em Santópolis do Aguapeí (SP), foi preso em flagrante ao transportar produtos destinados a fins terapêuticos ou medicinais sem registro do órgão de vigilância sanitária, bem como produtos terapêuticos ou medicinais falsificados, os quais importara do Paraguai.

A denúncia narra que Policiais Militares Rodoviários realizavam fiscalização de rotina quando abordaram o veículo Chevrolet Cruze conduzido pelo denunciado.

Os Policiais verificaram as bagagens acondicionadas no porta-malas do automóvel e localizaram, no interior de uma delas, diversos produtos anabolizantes e estimulantes cuja propriedade o denunciado assumiu, informando que viajara até Ciudad del Este, no Paraguai, onde adquirira tais medicamentos e produtos pela quantia de R$ 4.000,00 (quatro mil reais). O denunciado afirmou que os utilizaria para competições de musculação.

O laudo pericial indicou que um dos anabolizantes apreendidos era falso, pois não possuía a substância ativa descrita em sua embalagem. Os demais produtos não possuíam registro válido junto à Anvisa, de modo que sua comercialização e distribuição são proibidas em território nacional (fls. 64/65).

Apreensão de medicamentos estrangeiros. Competência da Justiça Federal. Internacionalidade da conduta. Exigibilidade. A proteção à saúde pública é de competência concorrente dos entes federativos. Assim, na hipótese de apreensão de medicamentos, não basta a respectiva origem estrangeira para configurar a competência da Justiça Federal. Segundo precedentes do Superior Tribunal de Justiça, é necessário que haja indícios da internacionalidade do crime atribuído ao agente delitivo (STJ, AgRg no CC n. 151.529, Rel. Min. Reynaldo Soares da Fonseca, j. 09.08.17; STJ, HC n. 223.493, Rel. Min. Ribeiro Dantas, j. 08.11.16; STJ, AgRg no CC n. 149.185, Rel. Min. Nefi Cordeiro, j. 26.10.16).

Do caso dos autos. O Ministério Público Federal aduz a incompetência da Justiça Federal considerando que o fato, importação de medicamentos por pessoa natural, não corresponde a nenhuma conduta prevista em tratado ou convenção internacional, consoante o art. 109, V, da Constituição da República (fls. 184/185).

Rejeito a alegação haja vista que a denúncia descreve a conduta de importação dos medicamentos de origem paraguaia, de modo que restou demonstrada a internacionalidade do fato e, por consequência, como reconhece a jurisprudência, o interesse da União consoante o art. 109, I, da Constituição da República.

Denúncia. Inépcia. Para não ser considerada inepta, a denúncia deve descrever de forma clara e suficiente a conduta delituosa, apontando as circunstâncias necessárias à configuração do delito, a materialidade delitiva e os indícios de autoria, viabilizando ao acusado o exercício da ampla defesa, propiciando-lhe o conhecimento da acusação que sobre ele recai, bem como, qual a medida de sua participação na prática criminosa, atendendo ao disposto no art. 41, do Código de Processo Penal:


AÇÃO PENAL. Denúncia. Aptidão formal. Reconhecimento. Apropriação indébita previdenciária. Descrição dos fatos que atende ao disposto no art. 41 do CPP.
(...).
Não é inepta a denúncia que descreve os fatos delituosos e lhes aponta os autores.
(STF, HC n. 90.749, Rel. Min. Cezar Peluso, j. 07.08.07)
HABEAS CORPUS. TRANCAMENTO DA AÇÃO PENAL. INÉPCIA DA DENÚNCIA. INOCORRÊNCIA. PEDIDO INDEFERIDO.
A denúncia descreve os fatos imputados à paciente e aponta o fato típico criminal, atendendo ao disposto no art. 41 do Código de Processo Penal. Conduta suficientemente delineada e apta a proporcionar o exercício da defesa.
Habeas corpus indeferido.
(STF, HC n. 89.433, Rel. Min. Joaquim Barbosa, j. 26.09.06)
PROCESSUAL PENAL. HABEAS CORPUS. CRIMES FALIMENTARES. TRANCAMENTO DE AÇÃO PENAL. DENÚNCIA QUE PREENCHE OS REQUISITOS DO ART. 41 DO ESTATUTO PROCESSUAL. CRIME SOCIETÁRIO. DESNECESSIDADE DE DESCRIÇÃO MINUCIOSA DA CONDUTA DE CADA DENUNCIADO. ORDEM DENEGADA.
(...).
2. Não há falar em inépcia da denúncia se a peça acusatória satisfaz todos os requisitos do art. 41 do Código de Processo Penal, sendo mister a elucidação dos fatos em tese delituosos descritos na peça inaugural à luz do contraditório e da ampla defesa, durante o regular curso da instrução criminal.
(...)
4. Ordem denegada.
(STJ, 5a Turma - HC n. 55.770, Rel. Min. Arnaldo Esteves Lima, j. 17.11.05)

Do caso dos autos. Rejeito a alegação de inépcia da denúncia haja vista que a descrição das circunstâncias fáticas não rende ensejo à dúvida acerca da consumação do delito em sua modalidade dolosa

A denúncia narra de forma adequada o fato criminoso, importação de substâncias terapêuticas e medicinais sem registro junto ao órgão de vigilância sanitária, dado que o denunciado teria admitido a viagem até a região de fronteira com o Paraguai e a aquisição dos produtos os quais utilizaria a fim de participar de competições de musculação, o que, consoante a acusação, caracterizou o delito do art. 273, §§ 1º e 1º-B, do Código Penal, tipo penal que exige o dolo da conduta.

Deficiência da defesa. Nulidade relativa. Nos termos da Súmula n. 523 do Supremo Tribunal Federal, a deficiência da defesa técnica somente enseja a nulidade do processo se houver prova do prejuízo:


"No processo penal, a falta de defesa constitui nulidade absoluta, mas a sua deficiência só o anulará se houver prova de prejuízo para o réu."

Do caso dos autos. O réu aduz a nulidade do processo considerando a deficiência de sua defesa técnica.

Sem razão.

O acusado foi regularmente citado (fls. 134/135) e constituiu o defensor que sua apresentou resposta à acusação (fls. 129/131), com a oportunidade de complemento às fls. 138/139.

Iniciada a audiência de instrução e julgamento, foi representado por defensor "ad hoc" em sessão designada para a oitiva de testemunha comum (fl. 151) e, na oportunidade em que foi interrogado, já estava acompanhado da atual defesa constituída (fls. 181 e 212), que apresentou memoriais escritos e aduziu diversas teses em favor do acusado (fls. 226/238).

Rejeito, portanto, a alegação de deficiência da defesa técnica haja vista não verificar prejuízo em desfavor do réu cujos interesses foram regularmente representados ao longo do processo.

Processo Penal. Pedido de absolvição. Condenação. Admissibilidade. O juiz pode condenar o acusado ainda que a acusação manifeste-se pela sua absolvição:

PROCESSO PENAL. HABEAS CORPUS (...). CORRUPÇÃO ATIVA (...). PEDIDO DE ABSOLVIÇÃO DA CORRUPÇÃO (...). CONDENAÇÃO PELO (...) ARTIGO 333 DO CP. VIOLAÇÃO DO SISTEMA ACUSATÓRIO. NULIDADE. AUSÊNCIA. POSSIBILIDADE DE PROLAÇÃO DE SENTENÇA CONDENATÓRIA POR INFRAÇÃO MAIS GRAVE, A DESPEITO DE PLEITO MINISTERIAL DE RECONHECIMENTO DE INFRAÇÃO MAIS BRANDA OU DE ABSOLVIÇÃO (...).
2. O sistema processual pátrio não adota o sistema acusatório puro. Daí, não há nulidade quando, diversamente do quanto requerido pelo Ministério Público, em alegações finais, o magistrado reconhece a responsabilidade do réu, ou o faz por infração penal mais grave do que aquela que, ao cabo da instrução, entendeu o Parquet por ser a adequada ao comportamento do acusado.
(STJ, HC n. 196421, Rel. Min. Maria Thereza de Assis Moura, j. 06.02.14)
PENAL (...). PEDIDO DE ABSOLVIÇÃO FEITO PELO MINISTÉRIO PÚBLICO. ART. 385 DO CÓDIGO DE PROCESSO PENAL. AUSÊNCIA DE VINCULAÇÃO DO JUIZ. PRECEDENTES (...).
- O fato de o Ministério Público manifestar-se pela absolvição do réu, seja em alegações finais, seja em contrarrazões de apelação, não vincula o julgador, o qual tem liberdade de decidir de acordo com o seu livre convencimento, a teor do disposto no art. 385 do Código de Processo Penal. Precedentes desta Corte. Agravo regimental desprovido.
(STJ, AgRg no AREsp 284611, Rel. Min. Marilza Maynard, j. 16.05.13)
HABEAS CORPUS (...). ARTIGO 385 DO CÓDIGO DE PROCESSO PENAL. INCONSTITUCIONALIDADE JAMAIS RECONHECIDA PELOS TRIBUNAIS SUPERIORES. ILEGALIDADE INEXISTENTE (...).
3. O artigo 385 do Código de Processo Penal, que prevê que "nos crimes de ação penal pública, o juiz poderá proferir sentença condenatória, ainda que o Ministério Público tenha opinado pela absolvição", jamais teve a sua inconstitucionalidade reconhecida pelos Tribunais Superiores, sendo reiteradamente aplicado por este Sodalício. Precedentes (...).
(STJ, HC n. 197068, Rel. Min. Jorge Mussi, j. 16.04.13)
HABEAS CORPUS (...). ABSOLVIÇÃO FORMULADA PELO MINISTÉRIO PÚBLICO EM CONTRARRAZÕES DE APELAÇÃO. AUSÊNCIA DE VINCULAÇÃO DO JULGADOR. PRINCÍPIO DO LIVRE CONVENCIMENTO MOTIVADO (...).
4. A jurisprudência deste Superior Tribunal possui entendimento no sentido de que o fato de o órgão ministerial manifestar-se pela absolvição do réu, tanto em alegações finais, quanto em contrarrazões de apelação, não vincula o julgador, por força do princípio do livre convencimento motivado e, ainda, por aplicação do disposto no art. 385 do Código de Processo Penal.
(STJ, HC n. 152128, Rel. Min. Sebastião Reis Júnior, j. 05.02.13)

Do caso dos autos. Rejeito a alegação de nulidade da sentença prolatada em sentido contrário ao pedido absolutório da acusação, pois, consoante o entendimento acima explicitado, aplica-se ao caso o disposto no art. 385 do Código de Processo Penal.

Sentença. Fundamentação deficiente. Nulidade por ofensa ao art. 93, IX, da Constituição da República. Não ocorrência. Segundo entendimento já pacificado pelo Supremo Tribunal Federal, somente a inexistência de fundamentação constitui causa de nulidade da decisão por ofensa ao art. 93, IX, da Constituição da República:

DIREITO PROCESSUAL (...). NEGATIVA DE PRESTAÇÃO JURISDICIONAL. ARTIGO 93, IX, DA CONSTITUIÇÃO DA REPÚBLICA. NULIDADE. INOCORRÊNCIA. RAZÕES DE DECIDIR EXPLICITADAS PELO ÓRGÃO JURISDICIONAL. (...)
2. Inexiste violação do artigo 93, IX, da Lei Maior. A jurisprudência do Supremo Tribunal Federal é no sentido de que o referido dispositivo constitucional exige a explicitação, pelo órgão jurisdicional, das razões do seu convencimento, dispensando o exame detalhado de cada argumento suscitado pelas partes. o.
(STF, ARE-AgR n. 725564, Rel. Min. Rosa Weber, j. 12.05.15)
Agravo regimental em recurso extraordinário com agravo.
2. Direito Administrativo.
3. Improbidade administrativa.
4. Cerceamento de defesa decorrente do indeferimento de provas no âmbito do processo judicial. Tema infraconstitucional. ARE-RG 639.228, rel. Ministro Presidente, DJe 31.8.2011.
5. Arts. 93, IX, e 5º, XXXV, da Constituição Federal, exigem que as decisões sejam fundamentadas, ainda que sucintamente, sem estabelecer, todavia, o exame pormenorizado de cada uma das alegações ou provas. AI-QO-RG 791.292 de minha relatoria, DJe 13.8.2010.
6. Controvérsia acerca da existência dos atos de improbidade. Necessidade do reexame do conjunto fático-probatório. Impossibilidade. Súmula 279. Precedentes.
7. Ausência de argumentos capazes de infirmar a decisão agravada.
8. Agravo regimental a que se nega provimento.
(STF, ARE-AgR n. 707178, Rel. Min. Gilmar Mendes, j. 11.12.12)
EMBARGOS DE DECLARAÇÃO NO RECURSO EXTRAORDINÁRIO COM AGRAVO. CONVERSÃO EM AGRAVO REGIMENTAL. DIREITO DO TRABALHO. CONTRIBUIÇÃO SINDICAL RURAL. ATRASO. MULTA. ANÁLISE DE NORMA INFRACONSTITUCIONAL. IMPOSSIBILIDADE. NEGATIVA DE PRESTAÇÃO JURISDICIONAL. INOCORRÊNCIA. AUSÊNCIA DE REPERCUSSÃO GERAL RECONHECIDA PELA CORTE. CERCEAMENTO DE DEFESA. INOCORRÊNCIA. AGRAVO REGIMENTAL DESPROVIDO.
(...)
4. A matéria relativa à nulidade por negativa de prestação jurisdicional por ausência de fundamentação teve repercussão geral reconhecida pelo Plenário, no julgamento do AI 791.292 QO-RG, Rel. Min. Gilmar Mendes, DJe de 12/08/2010. Naquela assentada, reafirmou-se a jurisprudência desta Suprema Corte, no sentido de que o art. 93, IX, da Constituição Federal exige que o acórdão ou decisão sejam fundamentados, ainda que sucintamente, sem determinar, contudo, o exame pormenorizado de cada uma das alegações ou provas, nem que sejam corretos os fundamentos da decisão. 5. Os princípios da legalidade, do devido processo legal, da ampla defesa e do contraditório, da motivação das decisões judiciais, bem como os limites da coisa julgada e da prestação jurisdicional, quando a verificação de sua ofensa dependa do reexame prévio de normas infraconstitucionais, revelam ofensa indireta ou reflexa à Constituição Federal, o que, por si só, não desafia a abertura da instância extraordinária. Precedentes.
(...)
7. Agravo regimental desprovido.
(STF, ARE-ED n. 676198, Rel. Min. Luiz Fux, j. 02.10.12)

Do caso dos autos. É satisfatória a fundamentação da sentença condenatória, da qual se extrai que o Juízo a quo considerou a aptidão da denúncia (fl. 265v.), a tipicidade dos fatos descritos (fl. 266), a suficiência das provas para a condenação (fls. 266v./267v.) e esclareceu os critérios para a fixação da dosimetria (fls. 267v./271), em conformidade, inclusive, com a atual jurisprudência do Superior Tribunal de Justiça acerca da aplicabilidade do preceito secundário do tipo penal do art. 273, § 1º-B, do Código Penal.

Anoto, ademais, a ausência de interposição de embargos de declaração para sanar as eventuais omissões alegadas pela defesa.

Rejeito, assim, a alegação de nulidade da sentença por omissão em sua fundamentação.

Código Penal, art. 273, § 1º-B. Preceito secundário. Ofensa ao princípio da proporcionalidade. Inconstitucionalidade. A Corte Especial do Superior Tribunal de Justiça declarou, em arguição incidental em habeas corpus, a inconstitucionalidade do preceito secundário do tipo penal do art. 273, § 1º-B, do Código Penal, em atenção aos princípios constitucionais da proporcionalidade e razoabilidade (STJ, AI no HC n. 239.363, Rel. Min. Sebastião Reis Júnior, j. 26.02.15). Diante disso, revejo meu entendimento para acompanhar a jurisprudência do Superior Tribunal de Justiça e assim aplicar, no lugar do preceito secundário do art. 273, § 1º-B, do Código Penal, as penas previstas para o delito de tráfico de drogas, inclusive a causa de diminuição de pena do art. 33, § 4º, e as majorantes do art. 40 da Lei n. 11.343/06 (STJ, HC n. 406.430, Rel. Min. Ribeiro Dantas, j. 21.09.17; STJ, HC n. 398.945, Rel. Min. Reynaldo Soares da Fonseca, j. 19.09.17; STJ, AgRg no REsp n. 1.659.315, Rel. Min. Reynaldo Soares da Fonseca, j. 15.08.17).

Do caso dos autos. A acusação aduz o cabimento do preceito secundário do tipo penal do art. 56 da Lei n. 9.605/98.

No entanto, a jurisprudência do Superior Tribunal de Justiça tem admitido que, reconhecida a inconstitucionalidade do preceito secundário do art. 273, § 1º-B, do Código Penal, cumpre fazer incidir o disposto no art. 33 da Lei n. 11.343/06, como em sentença.

Desse modo, uma vez resolvida a questão sobre a sanção cabível, não se trata de crime de menor potencial ofensivo (Lei n. 9.099/95, art. 61) ou com pena mínima de 1 (um) ano (Lei n. 9.099/95, art. 89), de forma que não cabe a suspensão condicional do processo consoante o art. 89 da Lei n. 9.099/95.

Tipicidade formal. Rejeito a alegação de atipicidade formal do fato haja vista que a conduta atribuída ao acusado, consistente em importação de produtos destinados a fins terapêuticos ou medicinais sem registro do órgão de vigilância sanitária ou falsificados, é prevista no art. 273, §§ 1º e 1º-B, I, do Código Penal.

Código Penal, art. 273, § 1º-B. Insignificância. Ofensividade. Somente a importação de diminuta quantidade de medicamento para uso pessoal não causa potencial lesão ao bem jurídico tutelado pela norma penal do art. 273, § 1º-B, do Código Penal. O Superior Tribunal de Justiça não reconheceu o reduzido grau de reprovabilidade ou a mínima ofensividade da conduta em hipótese de apreensão de 59 (cinquenta e nove) comprimidos de Pramil:

RECURSO ORDINÁRIO EM HABEAS CORPUS. IMPORTAÇÃO E EXPOSIÇÃO À VENDA DE PRODUTO DESTINADO A FINS TERAPÊUTICOS OU MEDICINAIS.
1. ATIPICIDADE DA CONDUTA. APLICAÇÃO DO PRINCÍPIO DA INSIGNIFICÂNCIA .
2. MEDICAMENTO DE VENDA PROIBIDA. MÍNIMA OFENSIVIDADE. NÃO OCORRÊNCIA. RISCO À SAÚDE PÚBLICA.
3. DESCLASSIFICAÇÃO DO CRIME PARA CONTRABANDO OU DESCAMINHO. IMPOSSIBILIDADE. MATÉRIA DE PROVA.
4. RECURSO ORDINÁRIO IMPROVIDO.
1. A lei penal não deve ser invocada para atuar em hipóteses desprovidas de significação social, razão pela qual os princípios da insignificância e da intervenção mínima surgem para evitar situações dessa natureza, atuando como instrumentos de interpretação restrita do tipo penal.
2. No caso, não há como reconhecer o reduzido grau de reprovabilidade ou a mínima ofensividade da conduta, pois a quantidade de medicamentos apreendidos, a saber, 59 (cinquenta e nove) comprimidos de PRAMIL - vasodilatador utilizado no tratamento da disfunção erétil e que não possui registro na ANVISA, não podendo, portanto, ser comercializado no Brasil - e a clara destinação comercial, caracterizada pelo local da apreensão, afastam a aplicação do princípio da insignificância , pois indiscutível o risco à saúde pública decorrente da exposição, à venda, de medicamento proibido.
3. O pleito de desclassificação do crime de importar e expor à venda produto destinado a fins terapêuticos ou medicinais para o crime de contrabando ou de descaminho exige, necessariamente, o revolvimento do conteúdo fático-probatório, procedimento incompatível com a via processual do habeas corpus.
4. Recurso ordinário a que se nega provimento.
(STJ, RHC n. 31352/RS, Rel. Min. Marco Aurélio Bellize, j. 11.04.13).

No mesmo sentido já decidiu a 5ª Turma deste Tribunal com relação à apreensão de 60 (sessenta) comprimidos do medicamento, afastando a alegação de aquisição para uso próprio (TRF da 3ª Região, ACR n. 0005161-98.2011.4.03.6106, Rel. Des. Fed. Antônio Cedenho, j. 10.09.12).

Do caso dos autos. O réu aduz, em síntese, que se trata de importação de produtos medicinais para uso próprio, de forma que não estaria caracterizada a tipicidade material em razão do princípio da insignificância, da ausência de lesão ao bem jurídico, da falta de periculosidade social da ação e, ademais, da adequação social do fato, dada a finalidade da aquisição, melhoramento de suas condições físicas.

Está razoavelmente demonstrado que o réu praticava esporte (luta de braço) e participava de competições físicas, considerando as fotografias e cópias de reportagens juntadas aos autos (fls. 215/223).

Apesar disso, não pode ser considerada diminuta e carente de potencialidade lesiva a quantidade de produtos apreendidos (fls. 8/9), além de não haver nos autos prova de que se destinassem exclusivamente ao uso próprio, não possuindo o réu prescrição clínica para sua utilização, sendo que a internação no País para uso pessoal somente seria possível se acompanhada do respectivo receituário médico e de documento fiscal comprobatório da aquisição regular.

Ademais, o laudo de exame pericial esclarece que parte das substâncias apreendidas é integrante do grupo farmacológico dos esteroides androgênicos anabólicos sintéticos, cujos efeitos no organismo consistem, basicamente, em estímulo e manutenção das características orgânicas masculinas e o aumento da síntese proteica atuante sobre a massa e a força muscular (fl. 83), ressaltando o seguinte:


A ação anabólica destes compostos fez com que os mesmos passassem a ser utilizados furtivamente por praticantes de atividades físicas, assim como aqueles que desejam melhorar a estética corporal. Referidos EAAs são comumente desviados de seu uso terapêutico devido a seus efeitos potencialmente mais anabólicos que androgênicos, visado por seus consumidores, que desejam aumentar o tônus muscular sem os intensos efeitos colaterais representados pela ação androgênica (fl. 84)

Diante de tais esclarecimentos, o alegado objetivo de uso para incremento físico e participação em competições, sem autorização e controle médico, distancia-se da noção de adequação social do fato.

Afastadas as alegações de nulidade e atipicidade da conduta, cumpre verificar a prova de materialidade e autoria.

Materialidade. Está comprovada a materialidade delitiva diante do quanto segue:

a) auto de apresentação e apreensão de 5 (cinco) frascos de Lipo6 Black contendo 60 (sessenta) cápsulas cada, 6 (seis) frascos de M-Drol contendo 90 (noventa) cápsulas cada, 12 (doze) frascos-ampolas de Decaland-Depot 200mg contendo 5ml cada, 10 (dez) cartelas de Oxitoland Oxitolona 50mg com 10 (dez) comprimidos cada, 10 (dez) frascos-ampolas de Testenat Depot 250mg/ml contendo 4ml cada, 1 (um) frasco-ampola de Testosterona Propianato 200ml contendo 10ml, 8 (oito) frascos-ampolas de Stanoject-50 contendo 30ml cada, 5 (cinco) frascos-ampolas de Stanoject-50 contendo 15ml, 5 (cinco) frascos de Stanozoland 10mg com 100 (cem) comprimidos cada, 30 (trinta) ampolas de Testoland Depot 200mg com 2ml cada, 20 (vinte) ampolas de Durateston 250mg com 2ml cada, 10 (dez) ampolas de Sales de Testosterona com 1ml cada, 3 (três) frascos-ampolas de Parabolin Blend com 10ml cada, 2 (dois) frascos-ampolas de Primobolan com 10ml cada, 5 (cinco) frascos de Parabolan com 10ml cada, 3 (três) frascos-ampolas de Masteron com 10ml cada, 3 (três) frascos-ampolas de Testoviron 250 com 10ml cada, 10 (dez) frascos-ampolas de Winstrol com 10ml cada (fls. 8/10);
b) laudo de exame pericial químico, com a conclusão de que o medicamento Durateston resultou negativo para a substância ativa declarada na embalagem e que os demais produtos e medicamentos poderiam ser consumidos para fins terapêuticos dado que continham substâncias de efeitos estimulante e anabolizante, e não possuíam registro junto à Anvisa (fls. 39/55).

Autoria. Está comprovada a autoria delitiva.

Na fase investigativa, o réu afirmou que adquirira os produtos no Paraguai e os utilizaria para competições de fisiculturismo e luta de braço (fl. 5).

Em Juízo, declarou que os produtos eram seus e os havia adquirido porque naquele ano pretendia participar de competições esportivas. Não fora ao Paraguai especificamente para isso, viajara para adquirir produtos como perfume, relógios, camisa, entre outros. Quando estava lá, viu que os preços eram mais acessíveis. Perguntou a um rapaz se ele dispunha de produtos para aumentar a resistência, força e peso, ao que ele respondeu que havia tais produtos na filial de Foz do Iguaçu (PR), cujo número de telefone forneceu. Se tivesse conhecimento, não teria aceitado. Adquiria esse tipo de produto na farmácia desde 2001, quando começou a participar de lutas de braço. Não sabia que era proibido. Os produtos eram apenas para si, tratava-se de uma quantidade pequena para ser usada durante o ano inteiro, haveria várias competições. Deu sorte de nunca "cair" nos testes-sorteio das competições de luta de braço. É desportista e corre todos os dias, trabalha das 6h às 22h. Tem família e não se envolve com nada de errado. Não sabia se os produtos que adquiria no Brasil eram do mesmo princípio ativo, pois as marcas eram diferentes. Pagou em dinheiro. Consumia, por semana, em torno de 20 a 40ml e, por mês, eram cerca de 60ml ou 90ml, a depender de cada substância. Soube posteriormente que era proibido consumir tais produtos, procurou um profissional da área a fim de obter as prescrições. No ano da prisão em flagrante haveria outras 5 (cinco) competições esportivas (mídia eletrônica à fl. 182).

A testemunha Fausto Benedito dos Santos, Policial Militar Rodoviário, declarou em Juízo que, em uma fiscalização de rotina, abordou o veículo e entrevistou os passageiros. Eles disseram que retornavam de Foz do Iguaçu (PR) após viagem de compras no Paraguai. No veículo havia bebidas e outros suvenires, mas nada de ilícito. No porta-malas havia várias bolsas e dentro de uma bagagem foram localizadas as cartelas de comprimidos e as ampolas de anabolizantes em frascos. O réu prontamente assumiu que a bolsa era dele e que adquirira no Paraguai os medicamentos, que lhe foram entregues no hotel onde estava hospedado. Ele disse que havia pago R$ 4.000,00 (quatro mil reais) ou US$ 4.000,00 (quatro mil dólares norte-americanos) pelas mercadorias. No veículo havia três pessoas, o réu era passageiro. A bolsa não tinha identificação, foi o réu quem assumiu que lhe pertencia. O réu disse que treinava e era tudo para seu consumo (mídia eletrônica à fl. 153).

Analisados os autos, é satisfatória a prova de que o réu importara do Paraguai as substâncias anabolizantes proibidas, consoante a confissão extrajudicial e o depoimento da testemunha policial ouvida em Juízo.

Considerando que o réu não praticava esportes de forma amadora e era dono de academia (fl. 222), não é crível que desconhecesse a ilicitude da conduta relativa à importação clandestina desses produtos, sendo do conhecimento comum, além disso, que não são de livre uso por atletas profissionais.

Ademais, na modalidade denunciada, "importar", não se exige o especial fim de agir da conduta para a consumação do delito.

Estão comprovadas, portanto, a autoria e a materialidade da conduta dolosa.

Passo à análise da dosimetria.

Dosimetria. O Juízo a quo fez incidir as disposições do art. 33 da Lei n. 11.343/06, em detrimento do preceito secundário do art. 273 do Código Penal, e fixou a pena-base no mínimo legal de 5 (cinco) anos de reclusão e 500 (quinhentos) dias-multa, considerando não haver circunstâncias judiciais desfavoráveis.

Na segunda fase, foi reconhecida a atenuante pela confissão, que não ensejou a redução da pena abaixo do mínimo legal haja vista o disposto na Súmula n. 231 do Superior Tribunal de Justiça.

Não foram reconhecidas agravantes.

Na terceira fase, incidiu a majorante do art. 40, I, da Lei n. 11.343/06 à razão de 1/6 (um sexto), diante da transnacionalidade da conduta. A pena passou a 5 (cinco) anos e 10 (dez) meses de reclusão e 583 (quinhentos e oitenta e três) dias-multa.

Aplicou-se a causa de diminuição do art. 33, § 4º, da Lei n. 11.343/06, à razão de 1/2 (metade), "considerando a intensidade do dolo, a personalidade do réu, as circunstâncias crime, a natureza da substância e a expressiva quantidade dos produtos apreendidos" (cf. fl. 270). A pena foi reduzida para 2 (dois) anos e 11 (onze) meses de reclusão e 291 (duzentos e noventa e um) dias-multa, resultado definitivo.

O valor unitário do dia-multa foi estabelecido no mínimo legal de 1/30 (um trigésimo) do salário mínimo vigente à época do crime.

Foi fixado o regime inicial aberto, com fundamento no art. 33, § 2º, c, e § 3º, do Código Penal.

A pena privativa de liberdade foi substituída por duas penas restritivas de direitos consistentes em duas penas de prestação de serviços à comunidade ou ente público, pelo período da condenação.

O réu recorre para que a fração da causa de diminuição de pena seja aumentada para o máximo de 2/3 (dois terços) e para que a pena de multa seja reduzida ao mínimo legal.

Não lhe assiste razão.

No tocante à fração da causa de diminuição de pena, foi fixada em 1/2 (metade) diante da "intensidade do dolo, a personalidade do réu, as circunstâncias do crime, a natureza da substância e a expressiva quantidade dos produtos apreendidos" (cf. fl. 270).

A personalidade e o dolo não são circunstâncias que, no caso, rendem ensejo a um juízo negativo sobre a reprovabilidade da conduta.

No entanto, foram apreendidos 16 (dezesseis) frascos, 111 (cento e onze) frascos-ampolas e 10 (dez) cartelas de comprimidos os quais continham as substâncias anabolizantes Metasterona, Nandrolona, Oximetolona, Testosterona, Estanozolol, Drostanolona e Trembolona (fl. 83).

A natureza dessas substâncias e a sua diversidade são circunstâncias que justificam a fixação da fração da causa de diminuição do art. 33, § 4º, da Lei n. 11.343/06 abaixo do máximo legal, conforme a sentença.

Dado que tanto a pena privativa de liberdade quanto a pena de multa sujeitam-se a critérios uniformes para a sua determinação, é adequada a exasperação proporcional da sanção pecuniária (TRF da 3ª Região, EI n. 0004791-83.2006.4.03.6110, Rel. Des. Fed. André Nekatschalow, j. 16.02.17; TRF da 3ª Região, ACR n. 0002567-55.2013.4.03.6102, Des. Fed. Cecilia Mello, j. 20.09.16; TRF da 3ª Região, ACR n. 0003484-24.2012.4.03.6130, Rel. Des. Fed. Mauricio Kato, j. 11.04.16).

No caso dos autos, a pena de multa foi obtida em conformidade com os critérios fixados para o cálculo da pena de reclusão, tendo sido fixado o valor unitário mínimo de 1/30 (um trigésimo) do salário mínimo vigente ao tempo do fato, considerando que não havia nos autos informações suficientes acerca da real situação econômica do réu (cf. fl. 270).

Não é caso, portanto, de reduzi-la, haja vista ter sido calculada de forma adequada.

Ante o exposto, NEGO PROVIMENTO aos recursos do Ministério Público Federal e do réu Glediston da Silva.

É o voto.


Andre Nekatschalow
Desembargador Federal


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