D.E. Publicado em 04/12/2018 |
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EMENTA
ACÓRDÃO
Vistos e relatados estes autos em que são partes as acima indicadas, decide a Egrégia Quarta Seção do Tribunal Regional Federal da 3ª Região, por maioria, rejeitar a preliminar de incompetência da Justiça Federal; por unanimidade, conhecer em parte dos embargos infringentes e, na parte conhecida, por maioria, reduzir a pena-base e afastar a causa de aumento do §1º do artigo 317 do Código Penal e, também por maioria, determinar a expedição de guia de execução provisória da pena somente após o esgotamento das instâncias ordinárias, nos termos do relatório e voto que ficam fazendo parte integrante do presente julgado.
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RELATÓRIO
Trata-se de embargos infringentes opostos por Amado André Messias, contra o acórdão de fls. 475/476 vº, proferido pela Egrégia Primeira Turma desta Corte que, por unanimidade, rejeitou a matéria preliminar e, no mérito, deu parcial provimento ao recurso de apelação do embargante para reduzir a pena fixada pela prática do delito previsto no artigo 317, §1º, do Código Penal e aplicar a substituição da pena privativa de liberdade por restritiva de direitos, nos termos do voto médio do Des. Fed. Hélio Nogueira.
Vencido o Des. Fed. Wilson Zauhy (fls. 471/473) que, no seu voto-vista, dava parcial provimento à apelação do embargante, para estabelecer a competência da Justiça Estadual para processar e julgar o presente feito. Após ser vencido na matéria preliminar, o Des. Fed. Wilson Zauhy afastou a valoração negativa relativa à personalidade do embargante e não aplicou a causa de aumento do §1º do artigo 317, do Código Penal, o que resultou na pena definitiva de 01 (um) ano, 10 (dez) meses e 15 (quinze) dias de reclusão, em regime inicial aberto, e 18 (dezoito) dias-multa, com a substituição da pena privativa de liberdade por duas restritivas de direitos. Determinou a expedição da guia de execução somente após o trânsito em julgado, em observância ao disposto no artigo 147 da LEP.
O acórdão foi assim ementado:
Nos embargos infringentes (fls. 493/503), a defesa requer o acolhimento do voto vencido para o reconhecimento da competência da Justiça Estadual para julgar o feito e, caso não seja acolhido tal pleito, que seja afastada a valoração negativa quanto à personalidade do embargante na fixação da pena-base, bem como a causa de aumento do artigo 317, §1º, do Código Penal, com a consequente redução da pena do embargante para 01 (um) ano, 10 (dez) meses e 15 (quinze) dias de reclusão.
O embargante pede, ainda, que seja sanada a omissão em relação à perda da função pública.
Os embargos infringentes foram admitidos (fl. 514) e redistribuídos, nos termos do artigo 266, §2º, do Regimento Interno desta Corte.
A Procuradoria Regional da República manifestou-se pelo não conhecimento, em parte, dos embargos infringentes e, no mérito, pela rejeição dos embargos (fls. 504/511).
É o relatório.
À revisão.
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VOTO
Inicialmente, a Procuradoria Regional da República, em parecer de fls. 504/511, manifestou-se pelo conhecimento em parte dos embargos infringentes, sob o fundamento de que a análise da imposição da penalidade de perda da função pública vai além dos limites abrangidos pelo acórdão, especialmente no que se refere à matéria de divergência, pois tal questão não foi objeto do recurso de apelação do Embargante, tratando-se de inovação recursal.
Com razão.
A aplicação da pena de perda do cargo público foi fixada na sentença, nos seguintes termos (fls. 394-vº):
Tendo em vista o limite da divergência, ou seja, considerando que a questão sobre a perda da função pública não foi objeto de discordância perante o órgão fracionário e, em consequência, não foi devolvida à Quarta Seção, o pedido de reavaliação da imposição da referida penalidade não deve ser conhecido.
De fato, o embargante interpôs apelação (fls. 403/410), mas não pediu a reforma da sentença com relação à perda do cargo. Assim, não há divergência sobre a referida penalidade imposta.
Por conseguinte, conheço em parte dos embargos infringentes.
Nos termos do artigo 609, parágrafo único, do Código de Processo Penal, os embargos infringentes e de nulidade são restritos à matéria objeto de divergência.
No presente caso, a discordância cinge-se, preliminarmente, ao reconhecimento da competência da Justiça Estadual para julgar o feito e, no mérito, à valoração negativa da personalidade do embargante na fixação da pena-base e à causa de aumento do artigo 317, §1º, do Código Penal, reduzindo-se a pena do embargante para 01 (um) ano, 10 (dez) meses e 15 (quinze) dias de reclusão.
Passo, pois, a analisar a questão devolvida à Quarta Seção do Tribunal Regional Federal da 3ª Região por meio deste recurso.
O voto condutor rejeitou a preliminar de incompetência da Justiça Federal para processar e julgar o presente feito, acompanhando o voto do Des. Fed. Relator, com a seguinte fundamentação (fls. 464):
O voto vencido do Desembargador Federal Wilson Zauhy (fls. 471/473), por sua vez, considerou competente a Justiça Estadual para julgar o feito, nos seguintes termos:
A defesa alega a competência da Justiça Estadual para julgar o processo.
Sem razão.
Consta na denúncia que o embargante é médico e, durante um atendimento pelo Sistema Único de Saúde - SUS na cidade de Olímpia/SP, recusou-se a fornecer receita e guia para realização de exames a uma paciente, exigindo pagamento prévio de consulta médica.
Verifica-se que o SUS recebe verba proveniente do orçamento da seguridade social e, por consequência, da União Federal.
Assim, como embargante praticou o delito como servidor público federal, no exercício de suas funções, a Justiça Federal é competente para julgar o feito, conforme dispõe o artigo 109, IV, da Constituição Federal:
Ademais, o sujeito passivo do crime previsto no artigo 317 do Código Penal é, em primeiro lugar, o Estado, especialmente no que diz respeito à sua moralidade. No presente caso, trata-se de crime praticado contra a Administração Pública Federal, o que atrai a competência da Justiça Federal.
Afasto a preliminar de incompetência absoluta da Justiça Federal para julgar a ação penal.
No mérito, assiste razão ao embargante.
O voto condutor do Des. Fed. Hélio Nogueira fixou a pena-base acima do mínimo legal e reconheceu a causa de aumento prevista no § 1º do artigo 317 do CP, nos seguintes termos:
O voto vencido do Desembargador Federal Wilson Zauhy (fls. 471/473) afastou a valoração negativa quanto à personalidade do acusado e manteve a circunstância negativa do delito, por ser a vítima hipossuficiente. Na terceira fase da dosimetria, afastou a causa de aumento do §1º do artigo 317 do Código Penal, tendo em vista que a conduta narrada na denúncia caracterizou o núcleo do tipo penal e que não restou comprovada a omissão na prática de ato de ofício ou a infringência ao dever funcional, com esses fundamentos:
Aqui, deve prevalecer o voto vencido.
De fato, ao fixar a pena-base, o voto condutor afastou a circunstância judicial desfavorável relativa ao fato do réu ocupar cargo de médico, por não servir para macular a sua personalidade.
No entanto, considerou as circunstâncias do crime como desfavoráveis, tendo em vista que o agente se aproveitou da situação de vulnerabilidade da vítima para cometer o delito.
Dessa forma, na primeira fase da dosimetria da pena foi reconhecida apenas uma circunstância judicial para o aumento da pena acima do mínimo legal previsto.
A majoração da pena-base efetivada pelo voto condutor representou um aumento do dobro da pena mínima prevista para o delito, ou seja, a pena foi aumentada de 1 (um) ano para 2 (dois) anos.
Diante da existência de apenas 1 (uma) circunstância judicial desfavorável e para atender ao princípio da proporcionalidade, mostra-se suficiente a majoração da pena-base do embargante nos moldes do voto vencido, ou seja, fixada em 1 (um) ano, 10 (dez) meses e 15 (quinze) dias de reclusão e 18 (dezoito) dias-multa, o que representa uma majoração de 7/8 (sete oitavos) sobre a pena mínima prevista para o delito.
Também assiste razão ao embargante em relação ao pedido de afastamento da incidência da causa de aumento prevista no § 1º, do art. 317, do CP.
A vítima Marta Aparecida Maria da Silva (fls. 336) narrou que foi atendida pelo embargante em um posto de saúde do SUS, por ser portadora das moléstias fibromialgia e artrite reumatoide. Em seguida, o réu teria determinado que ela o procurasse em seu consultório particular e pagasse pela consulta.
O voto condutor aplicou a causa de aumento prevista no §1º, do artigo 317, do Código Penal, sob o fundamento de que o acusado deixou de praticar ato de ofício em razão da vantagem ilícita, pois não prescreveu receita médica à vítima ao atendê-la pelo SUS, apesar da obrigação de fazê-lo.
Aqui, deve ser afastada a referida causa de aumento.
Para a incidência do aumento de um terço na pena, o acusado deve deixar de praticar ato de ofício em consequência da vantagem indevida.
No presente caso, o embargante deixou de prescrever receita médica não em consequência da vantagem, mas em desfavor do administrado, ou seja, em prejuízo da paciente Marta Aparecida.
Assim, os embargos infringentes devem ser acolhidos para fixar a pena-base em 1 (um) ano, 10 (dez) meses e 15 (quinze) dias de reclusão e 18 (dezoito) dias-multa e afastar a causa de aumento do §1º do artigo 317, do Código Penal, o que torna a pena definitiva do acusado em 1 (um) ano, 10 (dez) meses e 15 (quinze) dias de reclusão e 18 (dezoito) dias-multa, em regime inicial aberto, em consonância com o artigo 33, §2º , "c", do Código Penal.
Conforme o voto vencido, a pena privativa de liberdade deve ser substituída por duas restritivas de direitos consistentes em prestação de serviços à comunidade, a ser regulamentada pelo Juízo da Execução, bem como prestação pecuniária, arbitrada em 10 salários mínimos, vigentes à época dos fatos.
Por fim, o voto vencido deve prevalecer em relação ao início do cumprimento da pena, com a expedição da guia de execução somente após o trânsito em julgado.
O princípio da presunção de inocência previsto no artigo 5º, inciso LVII, da Constituição Federal, segundo o qual ninguém será considerado culpado até o trânsito em julgado de sentença penal condenatória, é absoluto e não comporta exceções.
No particular, ainda que mantida a condenação proferida em primeiro grau, entendo não ser o caso de determinar a execução provisória da decisão penal condenatória.
Isto porque, no momento do julgamento da apelação, ainda não se verifica o esgotamento das vias ordinárias, razão pela qual não há falar em execução provisória da pena, ainda que por força de precedente do Supremo Tribunal Federal (HC nº 126.292).
O paradigma acima apontado não determina a execução provisória da pena diante de um julgamento de segundo grau; apenas a possibilita uma vez exauridas as instâncias ordinárias criminais, o que não se verifica no momento em que o julgador aprecia o recurso de apelação. Neste momento processual, ainda são cabíveis outros recursos.
Antes do trânsito em julgado da condenação, que ocorre com o esgotamento de todos os recursos, só é possível a prisão de natureza cautelar.
Desta feita, ainda que encerradas as vias ordinárias, a execução provisória da pena, com a consequente decretação da prisão do réu, dependeria da comprovação dos requisitos legais e da imprescindibilidade da medida (artigos 282, §6º, 312, caput e 313, todos do Código de Processo Penal).
Ante o exposto, conheço em parte dos embargos infringentes e, na parte conhecida, rejeito a preliminar de incompetência da Justiça Federal e, no mérito, acolho integralmente o recurso para reduzir a pena-base, afastar a causa de aumento do §1º do artigo 317 do Código Penal e para determinar a expedição de guia de execução provisória somente após a certificação do trânsito em julgado.
É como voto.
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Data e Hora: | 02/10/2018 12:43:28 |