Diário Eletrônico

PODER JUDICIÁRIO

TRIBUNAL REGIONAL FEDERAL DA 3ª REGIÃO

D.E.

Publicado em 05/10/2018
EMBARGOS INFRINGENTES E DE NULIDADE Nº 0004980-22.2014.4.03.6000/MS
2014.60.00.004980-1/MS
RELATOR : Desembargador Federal MAURICIO KATO
EMBARGANTE : JOZUE RODRIGUES DAS NEVES
ADVOGADO : HELOISA ELAINE PIGATTO (Int.Pessoal)
: SP0000DPU DEFENSORIA PUBLICA DA UNIAO (Int.Pessoal)
EMBARGADO(A) : Justica Publica
No. ORIG. : 00049802220144036000 5 Vr CAMPO GRANDE/MS

EMENTA

PENAL. PROCESSO PENAL. ESTELIONATO. USO DE DOCUMENTO FALSO. DOSIMETRIA. ATENUANTE DA CONFISSÃO ESPONTÂNEA. AGRAVANTE DA REINCIDÊNCIA. CIRCUNSTÂNCIAS IGUALMENTE PREPONDERANTES. COMPENSAÇÃO. PRECEDENTES DO STJ. ARTIGO 61, II, "B" DO CÓDIGO PENAL. AGRAVANTE AFASTADA. EMBARGOS INFRINGENTES ACOLHIDOS.
1. Nos termos do artigo 609, parágrafo único, do Código de Processo Penal, os embargos infringentes e de nulidade são restritos à matéria objeto de divergência.
2. A atenuante da confissão espontânea e a agravante da reincidência são circunstâncias igualmente preponderantes, nos termos do artigo 67 do Código Penal, e se compensam.
3. O reconhecimento da agravante do artigo 61, II, "b", do Código Penal depende da demonstração de que o uso de documento público tinha por finalidade "facilitar ou assegurar a execução, a ocultação, a impunidade ou vantagem de outro crime".
4. Embargos infringentes acolhidos.

ACÓRDÃO

Vistos e relatados estes autos em que são partes as acima indicadas, decide a Egrégia Quarta Seção do Tribunal Regional Federal da 3ª Região, por unanimidade, acolher os embargos infringentes, nos termos do relatório e voto que ficam fazendo parte integrante do presente julgado.


São Paulo, 20 de setembro de 2018.
MAURICIO KATO
Desembargador Federal


Documento eletrônico assinado digitalmente conforme MP nº 2.200-2/2001 de 24/08/2001, que instituiu a Infra-estrutura de Chaves Públicas Brasileira - ICP-Brasil, por:
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EMBARGOS INFRINGENTES E DE NULIDADE Nº 0004980-22.2014.4.03.6000/MS
2014.60.00.004980-1/MS
RELATOR : Desembargador Federal MAURICIO KATO
EMBARGANTE : JOZUE RODRIGUES DAS NEVES
ADVOGADO : HELOISA ELAINE PIGATTO (Int.Pessoal)
: SP0000DPU DEFENSORIA PUBLICA DA UNIAO (Int.Pessoal)
EMBARGADO(A) : Justica Publica
No. ORIG. : 00049802220144036000 5 Vr CAMPO GRANDE/MS

RELATÓRIO

Trata-se de embargos infringentes opostos por Jozué Rodrigues das Neves, contra o acórdão de fls. 261/272-vº, proferido pela Egrégia Décima Primeira Turma desta Corte que, por unanimidade, deu provimento ao recurso de apelação interposto pelo Ministério Público Federal para reduzir a fração relativa à tentativa, incidente na dosimetria da pena aplicada pela prática do crime de estelionato majorado e, por maioria, para aplicar a agravante prevista no art. 61, II, "b", do Código Penal, na dosimetria da pena aplicada pela perpetração do crime de uso de documento falso, nos termos do voto do Relator Des. Fed. Fausto de Sanctis, acompanhado pelo Juiz Federal Convocado Alessandro Diaferia.

Vencido o Des. Fed. José Lunardelli, que não aplicava a referida agravante.

Ainda, por unanimidade, a Turma decidiu dar parcial provimento ao recurso de apelação interposto pelo embargante, para reconhecer a ocorrência de erro material no que tange ao valor do dia-multa constante do dispositivo da r. sentença recorrida, nos termos do voto do Des. Fed. Relator, acompanhado pelo Juiz Federal Convocado Alessandro Diaferia.

Vencido o Des. Fed. José Lunardelli que, além de corrigir o mencionado erro material da sentença, dava provimento à apelação da defesa em maior extensão, para compensar a agravante de reincidência com a atenuante de confissão.

O acórdão foi assim ementado:

"PENAL. ESTELIONATO PRATICADO CONTRA A CAIXA ECONÔMICA FEDERAL - CEF NA FORMA TENTADA. ALEGAÇÃO DE CRIME IMPOSSÍVEL. FLAGRANTE PREPARADO OU PROVOCADO X FLAGRANTE ESPERADO. USO DE DOCUMENTO FALSO. ABSORÇÃO PELO CRIME DE ESTELIONATO. IMPOSSIBILIDADE. DOSIMETRIA DA PENA. PLEITO DE COMPENSAÇÃO DA AGRAVANTE DA REINCIDÊNCIA COM A ATENUANTE DA CONFISSÃO. AGRAVANTE PREVISTA NO ART. 61, II, 'B', DO CÓDIGO PENAL. FRAÇÃO REDUTORA DECORRENTE DO RECONHECIMENTO DA FIGURA TENTADA.
- Para que seja possível aplicar em um caso concreto o entendimento consubstanciado na Súm. 145/STF (segundo a qual não há crime, quando a preparação do flagrante pela polícia torna impossível a sua consumação), que culmina como ilegal o fragrante preparado ou provocado, faz-se imperiosa a existência e a atuação de um agente provocador (que pode ser tanto um particular como uma autoridade policial), que instiga a execução criminosa com o objetivo de prender em flagrante aquele que perpetra a suposta infração penal e, ao mesmo tempo, toma todas as medidas necessárias para que o crime não se consume.
- Tal situação difere do contexto em que levado a efeito um flagrante esperado, no qual não há a figura do agente provocador e, portanto, não se cogita na instigação para a prática da infração penal (que pode, inclusive, se consumar), sendo hígida a privação de liberdade. Na espécie de flagrante ora em comento nota-se uma passividade da autoridade policial, que apenas acompanha o desenrolar das ações dos criminosos, não influindo no ânimo destes para a prática da infração penal, apenas atuando quando ao menos iniciado o intento criminoso.
- Analisando os aspectos fáticos constantes dos autos, impossível se mostra o reconhecimento da figura do flagrante preparado ou provocado, uma vez que não se vislumbra a presenta de agente provocador (seja particular, seja autoridade policial) a instigar a consecução do crime pelo acusado, o que afasta a figura do crime impossível constante da Súm. 145/STF.
- Sequer é possível cogitar-se que a fraude já tinha sido percebida pelo preposto da Caixa Econômica Federal - CEF (tanto que houve o informe da autoridade policial para comparecimento na instituição bancária), de modo que o meio era inidôneo ao atingimento do resultado almejado a ensejar a aplicação do preceito contido no art. 17 do Código Penal. De acordo com o artigo mencionado, nota-se que, para que a tentativa não seja punida, o meio empregado pelo agente precisa ser absolutamente (completamente) ineficaz para a consecução da empreitada criminosa ou o objeto (pessoa ou coisa sobre a qual recai a conduta do sujeito ativo do tipo penal) precisa ser absolutamente impróprio para o desiderato pretendido pelo criminoso, o que não se vislumbra dos autos.
- Para que seja possível a avocação do princípio da consunção a fim de que um crime seja absorvido por outro, faz-se necessária a existência de uma infração penal (ou, até mesmo, de infrações penais), denominada crime-meio, que esteja dentro do iter criminis como fase de preparação ou como fase de execução de outra infração criminal (esta chamada de crime-fim), havendo efetiva comprovação de vínculo de subordinação entre as condutas típicas. Ademais, imperioso que haja a comprovação de que a potencialidade lesiva do crime-meio exauriu-se por completo com a perpetração do crime-fim.
- As condutas contidas dos autos mostram-se verdadeiramente autônomas entre si na justa medida em que o acusado apresentou documento de identidade (RG) falso ao atendente da Caixa Econômica Federal - CEF com o fim de sacar empréstimo consignado e também ofereceu referida documentação quando instado a se identificar em decorrência da abordagem policial. Assim, ainda que a abordagem tenha ocorrido dentro da agência da Caixa Econômica Federal - CEF, houve a realização da conduta típica prevista no art. 304 do Código Penal, de forma autônoma e independente do anterior delito de estelionato na forma tentada, de modo que impossível cogitar-se na incidência do postulado da consunção com o desiderato de que o emprego do documento falso reste absorvido pelo delito patrimonial.
- O C. Superior Tribunal de Justiça, por meio do julgamento de recurso especial representativo da controvérsia, assentou tese segundo a qual seria possível cogitar-se da compensação da agravante da reincidência com a atenuante da confissão quando da segunda etapa da dosimetria da pena (REsp 1341370/MT, Rel. Min. SEBASTIÃO REIS JÚNIOR, TERCEIRA SEÇÃO, julgado em 10/04/2013, DJe 17/04/2013). Tendo em vista a aplicação no precedente repetitivo anteriormente citado da locução "é possível", diante da concorrência da agravante da reincidência e da atenuante da confissão, lícito se mostra ao magistrado compensá-las (a teor do entendimento sufragado REsp 1341370/MT representativo da controvérsia), podendo, entretanto, diante das circunstâncias do casos concreto, afastar tal posicionamento para considerar prevalente uma ou outra (conforme já decidiu o próprio C. Superior Tribunal de Justiça no HC 397.073).
- Deve ser reconhecida na espécie a incidência da agravante prevista no art. 61, II, 'b', do Código Penal, na justa medida em que o acusado perpetrou o delito de uso de documento falso ao apresentar o RG ideologicamente falsificado às autoridades policiais que o abordaram dentro da agência da Caixa Econômica Federal - CEF com o objetivo de assegurar a execução, a ocultação e a impunidade de outro crime (qual seja, o estelionato majorado que estava em curso e foi obstado pela intervenção policial).
- A gradação da fração a incidir quando assentada a ocorrência de uma infração penal na forma tentada guarda relação com o quanto do iter criminis que foi percorrido até o momento em que obstada a consecução do crime por circunstâncias alheias à vontade do agente. Desta forma, na situação de pouco tramitar do iter criminis, a fração redutora tenderá a ser próxima da maior possível prevista no parágrafo único do art. 14 do Código Penal (qual seja, 2/3); por outro lado, quanto mais percorrida a empreitada criminosa, menor o redutor a incidir na espécie (restando, assim, mais aproximado da fração de 1/3).
- Dado provimento ao recurso de apelação interposto pelo MINISTÉRIO PÚBLICO FEDERAL (para reduzir a fração atinente à tentativa incidente na dosimetria da pena aplicada pela prática do crime de estelionato majorado na forma tentada e para aplicar a agravante prevista no art. 61, II, 'b', do Código Penal, na dosimetria da pena aplicada pela perpetração do crime de uso de documento falso) e dado parcial provimento ao recurso de apelação interposto pelo acusado JOZUÉ RODRIGUES DAS NEVES (apenas para reconhecer a ocorrência de erro material no que tange ao valor do dia-multa constante do dispositivo da r. sentença recorrida)".

Nos embargos infringentes (fls. 276/286), a defesa requer a prevalência do voto vencido proferido pelo Des. Fed. José Lunardelli, que entendia pela inaplicabilidade da agravante do artigo 61, II, "b", do Código Penal e que dava provimento ao apelo defensivo em maior extensão, a fim de compensar a agravante da reincidência com a atenuante da confissão.

Os embargos infringentes foram admitidos (fl. 288) e redistribuídos, nos termos do artigo 266, §2º, do Regimento Interno desta Corte.

A Procuradoria Regional da República manifestou-se pela rejeição dos embargos (fls. 291/298-vº).

É o relatório.

À revisão.


MAURICIO KATO
Desembargador Federal


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EMBARGOS INFRINGENTES E DE NULIDADE Nº 0004980-22.2014.4.03.6000/MS
2014.60.00.004980-1/MS
RELATOR : Desembargador Federal MAURICIO KATO
EMBARGANTE : JOZUE RODRIGUES DAS NEVES
ADVOGADO : HELOISA ELAINE PIGATTO (Int.Pessoal)
: SP0000DPU DEFENSORIA PUBLICA DA UNIAO (Int.Pessoal)
EMBARGADO(A) : Justica Publica
No. ORIG. : 00049802220144036000 5 Vr CAMPO GRANDE/MS

VOTO

Nos termos do artigo 609, parágrafo único, do Código de Processo Penal, os embargos infringentes e de nulidade são restritos à matéria objeto de divergência.

Passo, pois, a analisar a questão devolvida à Quarta Seção do Tribunal Regional Federal da 3ª Região por meio deste recurso.

O embargante foi condenado pela prática do crime previsto no artigo 171, §3º, c/c art. 14, inciso II, ambos do Código Penal e do delito do artigo 304 c/c 299, ambos do Código Penal, por ter tentado celebrar contrato de empréstimo consignado junto à Caixa Econômica Federal, mediante a apresentação de documento falso. O acusado, na sequência, quando solicitada a sua identificação pela polícia federal, apresentou cédula de identidade falsa.

No presente caso, a discordância cinge-se em relação à aplicabilidade da agravante do artigo 61, II, "b", do Código Penal e à compensação da agravante de reincidência com a atenuante da confissão.

O voto vencedor deu provimento à apelação do Ministério Público Federal e determinou a incidência da agravante prevista no artigo 61, II, "b", do Código Penal, na dosimetria da pena aplicada ao crime de uso de documento falso. Além disso, deu parcial provimento ao recurso da defesa, sem compensar, entretanto, agravante e atenuante, com os seguintes fundamentos (fls. 266-vº/270):

"(...)
DA DOSIMETRIA DA PENA - CRIME DE ESTELIONATO
1ª fase da dosimetria
(...)
2ª fase da dosimetria - pleito de compensação da agravante da reincidência com a atenuante da confissão
Recorreu apenas o acusado JOZUÉ RODRIGUES DAS NEVES em relação à segunda fase da dosimetria, pugnando a compensação da agravante da reincidência com a atenuante da confissão. Com efeito, o tema em tela encontra-se regido pelo art. 67 do Código Penal, que dispõe que, no concurso de agravantes e atenuantes, a pena deve aproximar-se do limite indicado pelas circunstâncias preponderantes, entendendo-se como tais as que resultam dos motivos determinantes do crime, da personalidade do agente e da reincidência.
Nesse contexto, importante ser dito que o C. Supremo Tribunal Federal possuía entendimento, pacificado por ambas suas Turmas, no sentido de que a agravante da reincidência preponderaria sobre a atenuante da confissão, sendo, assim, impossível cogitar-se da compensação pleiteada, conforme se afere da ementa que segue:
Habeas Corpus substitutivo de recurso ordinário. Roubo circunstanciado. Compensação da agravante da reincidência com a atenuante da confissão espontânea. Impossibilidade 1. O acórdão impugnado está em conformidade com a jurisprudência de ambas as Turmas do Supremo Tribunal Federal, no sentido de que, a teor do art. 67 do Código Penal, "a agravante da reincidência prepondera sobre a atenuante da confissão espontânea, razão pela qual é inviável a compensação pleiteada" (RHC 110.727, Rel. Min. Dias Toffoli). 2. Habeas Corpus extinto sem resolução de mérito por inadequação da via processual (HC 105543, Rel. Min. ROBERTO BARROSO, Primeira Turma, julgado em 29/04/2014, PROCESSO ELETRÔNICO DJe-100 DIVULG 26-05-2014 PUBLIC 27-05-2014) - destaque nosso.
Todavia, posteriormente, o mesmo C. Supremo Tribunal Federal assentou posicionamento no sentido de que não haveria tema constitucional a ser deliberado na questão em tela, razão pela qual afastou o reconhecimento da repercussão geral, sob o argumento de que o tema era afeto à interpretação da legislação infraconstitucional não passível de ser enfrentada por meio da interposição de recurso extraordinário - a propósito, segue a ementa do julgado em que refutado o assentamento da repercussão geral da questão constitucional ora em comento:
DIREITO PENAL. RECURSO EXTRAORDINÁRIO. COMPENSAÇÃO DA AGRAVANTE DA REINCIDÊNCIA COM A ATENUANTE DA CONFISSÃO ESPONTÂNEA. MATÉRIA INFRACONSTITUCIONAL. AUSÊNCIA DE REPERCUSSÃO GERAL. 1. O Tribunal de origem, ao interpretar o art. 67 do Código Penal, entendeu ser possível a compensação entre a agravante da reincidência e a atenuante da confissão espontânea, por considerá-las, em tese, igualmente preponderantes. 2. Inexistência de matéria constitucional a ser apreciada. Questão restrita à interpretação de norma infraconstitucional. 3. Afirmação da seguinte tese: não tem repercussão geral a controvérsia relativa à possibilidade ou não de compensação da agravante da reincidência com a atenuante da confissão espontânea (RE 983765 RG, Rel. Min. ROBERTO BARROSO, julgado em 15/12/2016, PROCESSO ELETRÔNICO DJe-027 DIVULG 09-02-2017 PUBLIC 10-02-2017) - destaque nosso.
Nesse diapasão, o deslinde da questão ficou a cargo do C. Superior Tribunal de Justiça que, por meio do julgamento de recurso especial representativo da controvérsia, assentou tese segundo a qual seria possível cogitar-se da compensação da agravante da reincidência com a atenuante da confissão quando da segunda etapa da dosimetria da pena, conforme termos contidos da ementa ora colacionada:
RECURSO ESPECIAL REPRESENTATIVO DA CONTROVÉRSIA (ART. 543-C DO CPC). PENAL. DOSIMETRIA. CONFISSÃO ESPONTÂNEA E REINCIDÊNCIA. COMPENSAÇÃO. POSSIBILIDADE. 1. É possível, na segunda fase da dosimetria da pena, a compensação da atenuante da confissão espontânea com a agravante da reincidência. 2. Recurso especial provido (REsp 1341370/MT, Rel. Min. SEBASTIÃO REIS JÚNIOR, TERCEIRA SEÇÃO, julgado em 10/04/2013, DJe 17/04/2013) - destaque nosso.
Tendo em vista a aplicação no precedente repetitivo (cuja observância se mostra obrigatória com espeque no art. 927, III, do Código de Processo Civil) anteriormente citado da locução "é possível", mostra-se escorreita a análise do caso concreto (e das peculiares inerentes a tal feito) com o fito de dar concretude ao comando interpretativo fixado pelo C. Superior Tribunal de Justiça. Aliás, tal posicionamento de aferição da preponderância de acordo com as circunstâncias concretas encontra o beneplácito da própria jurisprudência formada acerca do tema, no âmbito do C. Superior Tribunal de Justiça, posterior à fixação da tese representativa da controvérsia, conforme é possível ser aferido do julgado que segue:
HABEAS CORPUS. IMPETRAÇÃO EM SUBSTITUIÇÃO AO RECURSO CABÍVEL. UTILIZAÇÃO INDEVIDA DO REMÉDIO CONSTITUCIONAL. VIOLAÇÃO AO SISTEMA RECURSAL. NÃO CONHECIMENTO. (...) COMPENSAÇÃO DA CONFISSÃO ESPONTÂNEA COM A REINCIDÊNCIA. ACUSADO MULTIRREINCIDENTE. IMPOSSIBILIDADE. PREPONDERÂNCIA DA AGRAVANTE SOBRE A ATENUANTE. CONSTRANGIMENTO ILEGAL NÃO CONFIGURADO. 1. A 3ª Seção desta Corte Superior de Justiça, ao examinar os EREsp n. 1.154.752/RS, firmou o entendimento de que, por serem igualmente preponderantes, é possível a compensação entre a agravante da reincidência e a atenuante da confissão espontânea, devendo o julgador atentar para as singularidades do caso concreto. 2. Conquanto no julgamento do HC 365.963/SP o aludido colegiado tenha firmado a compreensão de que a reincidência específica pode ser integralmente compensada com a confissão espontânea, no caso dos autos verifica-se que o primeiro paciente é multirreincidente, o que justifica a preponderância da agravante sobre a atenuante. Precedentes. 3. Habeas corpus não conhecido (HC 397.073/DF, Rel. Min. JORGE MUSSI, QUINTA TURMA, julgado em 12/12/2017, DJe 19/12/2017) - destaque nosso.
Desta feita, diante da concorrência da agravante da reincidência e da atenuante da confissão, lícito se mostra ao magistrado compensá-las (a teor do entendimento sufragado REsp 1341370/MT representativo da controvérsia), podendo, entretanto, diante das circunstâncias do casos concreto, afastar tal posicionamento para considerar prevalente uma ou outra (nos termos do HC 397.073/DF), entendimento com o qual me filio e passo a deliberar acerca do caso trazido à julgamento.
Andou bem o magistrado sentenciante ao ponderar a necessidade de valoração negativa da reincidência em relação à confissão levada a efeito pelo acusado JOZUÉ RODRIGUES DAS NEVES (tanto em sede policial como em sede judicial), exasperando a pena base (então fixada no mínimo legal - 01 ano de reclusão) em apenas 02 meses, patamar por demais razoável (o que confirma que foi levada em consideração a confissão executada), uma vez que o acusado em tela foi condenado por crime doloso contra a vida (certidão juntada à fl. 169), o que, por si só, se mostra grave a preponderar sobre a confissão da perpetração do crime patrimonial ora em julgamento, razão pela qual não merece acolhimento o apelo defensivo no ponto.
3ª fase da dosimetria (...)
Pena definitiva - estelionato majorado na forma tentada
Como corolário do que foi exposto, a pena definitiva imposta ao acusado JOZUÉ RODRIGUES DAS NEVES pela perpetração do crime de estelionato majorado na forma tentada remonta à casa de 01 ano e 13 dias de reclusão. Mantida a pena de multa tal qual fixada à míngua de recurso sobre o tema.
DA DOSIMETRIA DA PENA - CRIME DE USO DE DOCUMENTO FALSO
1ª fase da dosimetria
(...)
2ª fase da dosimetria - pleito de compensação da agravante da reincidência com a atenuante da confissão
O tema em tela já foi objeto de deliberação (para ser rechaçado) quando da análise da segunda fase da dosimetria da reprimenda imposta pela perpetração do crime de estelionato majorado na forma tentada. Reportando ao lá estabelecido, de rigor o afastamento do pleito de compensação formulado pelo acusado JOZUÉ RODRIGUES DAS NEVES em seu apelo, devendo, portanto, ser mantida a exasperação da pena base em 02 meses.
2ª fase da dosimetria - pleito de reconhecimento da agravante prevista no art. 61, II, 'b', do Código Penal
Pugna o MINISTÉRIO PÚBLICO FEDERAL pelo reconhecimento da agravante disposta no art. 61, II, 'b', do Código Penal: São circunstâncias que sempre agravam a pena, quando não constituem ou qualificam o crime: (...) II - ter o agente cometido o crime: (...) b) para facilitar ou assegurar a execução, a ocultação, a impunidade ou vantagem de outro crime (...).
Com efeito, com razão o inconformismo ministerial, uma vez que deveria ter sido reconhecida na espécie a agravante em tela na justa medida em que o acusado JOZUÉ RODRIGUES DAS NEVES perpetrou o delito de uso de documento falso ao apresentar o RG ideologicamente falsificado às autoridades policiais que o abordaram dentro da agência da Caixa Econômica Federal - CEF com o objetivo de assegurar a execução, a ocultação e a impunidade de outro crime (qual seja, o estelionato majorado que estava em curso e foi obstado pela intervenção policial).
Nesse contexto, deve ser aplicada à pena até então fixada (01 ano e 02 meses de reclusão) a fração de 1/6 decorrente da agravante ora reconhecida, donde se chega a uma reprimenda corporal na casa de 01 ano, 04 meses e 10 dias de reclusão.
3ª fase da dosimetria - causa de aumento ou de diminuição de pena
Nada a valorar nessa terceira etapa de fixação da pena ante a ausência de causa de aumento ou de diminuição de pena.
Pena definitiva - uso de documento falso
Como corolário do que foi exposto, a pena definitiva imposta ao acusado JOZUÉ RODRIGUES DAS NEVES pela perpetração do crime de uso de documento falso remonta à casa de 01 ano, 04 meses e 10 dias de reclusão. Mantida a pena de multa tal qual fixada à míngua de recurso sobre o tema.
(...)
DISPOSITIVO
Ante o exposto, voto por DAR PROVIMENTO ao recurso de apelação interposto pelo MINISTÉRIO PÚBLICO FEDERAL (para reduzir a fração atinente à tentativa incidente na dosimetria da pena aplicada pela prática do crime de estelionato majorado na forma tentada e para aplicar a agravante prevista no art. 61, II, 'b', do Código Penal, na dosimetria da pena aplicada pela perpetração do crime de uso de documento falso) e por DAR PARCIAL PROVIMENTO ao recurso de apelação interposto pelo acusado JOZUÉ RODRIGUES DAS NEVES (apenas para reconhecer a ocorrência de erro material no que tange ao valor do dia-multa constante do dispositivo da r. sentença recorrida), nos termos anteriormente expendidos".

O voto vencido, por sua vez, determinou a compensação entre a reincidência e a atenuante da confissão espontânea e afastou a aplicação da agravante prevista no art. 61, II, "b", do Código Penal para o crime de uso de documento falso.

Acerca da não incidência da referida agravante, mantida pelo voto vencido, a sentença julgou (fl. 214):

"Não incide a agravante prevista no art. 61, II, "b", do Código Penal, uma vez que não foi comprovada nos autos que o réu praticou o delito de uso de documento falso para facilitar ou assegurar a execução e vantagem do crime de estelionato".

Aqui, o voto vencido deve prevalecer.

Na segunda fase da fixação da dosimetria da pena, o voto vencedor reconheceu a concorrência da agravante da reincidência com a atenuante da confissão, mas deixou de compensá-las por ter sido o réu condenado por crime doloso contra a vida, o que se mostra grave e deve preponderar sobre a confissão da perpetração do crime patrimonial.

No entanto, a confissão espontânea e a reincidência são circunstâncias igualmente preponderantes, nos termos do artigo 67 do Código Penal e, dessa forma, se compensam, conforme entendimento pacificado pelo Superior Tribunal de Justiça em julgamento de recurso repetitivo (STJ, REsp nº 1.341.370, Relator Ministro Sebastião Reis Júnior, julgado em 10/04/2013).

Registre-se que, se a confissão do réu, ainda que parcial ou qualificada, for utilizada pelo magistrado para fundamentar a condenação, deve incidir a respectiva atenuante.

Assim, deve ocorrer a compensação da atenuante da confissão com a agravante da reincidência.

Ademais, na segunda fase da dosimetria da fixação da pena para o crime de uso de documento falso, o voto vencedor aplicou a agravante do artigo 61, II, "b", do Código Penal, por ter o embargante apresentado cédula de identidade falsa às autoridades policiais que o abordaram dentro da agência da Caixa Econômica Federal - CEF, para assegurar a execução, a ocultação e a impunidade do crime de estelionato majorado que estava em curso e foi obstado pela intervenção policial.

O artigo 61, inciso II, do Código Penal prevê circunstâncias que tornam o crime mais grave, desde que não constituam elementar do tipo e, por consequência, justifiquem a fixação de pena mais grave.

O reconhecimento da agravante do artigo 61, II, "b", do Código Penal depende da demonstração de que o uso de documento público tinha por finalidade "facilitar ou assegurar a execução, a ocultação, a impunidade ou vantagem de outro crime", o que não restou comprovado nos presentes autos.

Por conseguinte, deve ser afastada a incidência da circunstância que agrava a pena prevista no art. 61, II, "b", do Código Penal.

Para o crime de estelionato, a pena-base foi fixada em 1 (um) ano de reclusão. Na segunda fase da dosimetria, compensada a circunstância agravante da reincidência e a atenuante da confissão, nos termos do voto vencido. Na terceira fase, com a aplicação da majoração da pena em 1/3 (um terço) em razão da causa de aumento do §3º do artigo 171 do Código Penal e, em sequência, da redução de 1/3 (um terço) da pena pela tentativa, resta fixada a pena definitiva de 10 (dez) meses e 20 (vinte) dias de reclusão e 08 (oito) dias-multa.

Com relação ao crime de uso de documento falso, a pena-base foi fixada em 1 (um) ano de reclusão. Na segunda fase, compensada a circunstância agravante da reincidência e a atenuante da confissão espontânea, bem como afastada a incidência da agravante prevista no artigo 61, inciso II, "b", do Código Penal. Ausentes causas de aumento e de diminuição da pena na terceira fase da dosimetria, resta fixada a pena definitiva em 1 (um) ano de reclusão e 10 (dez) dias-multa.

Em decorrência do concurso material, a pena somada pela prática dos delitos é de 1 (um) ano, 10 (dez) meses e 20 (vinte) dias de reclusão e 08 (oito) dias-multa.

Ante o exposto, acolho os embargos infringentes para que prevaleça o voto vencido em sua integralidade.

É como voto.


MAURICIO KATO
Desembargador Federal


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