Diário Eletrônico

PODER JUDICIÁRIO

TRIBUNAL REGIONAL FEDERAL DA 3ª REGIÃO

D.E.

Publicado em 03/04/2019
APELAÇÃO CRIMINAL Nº 0013478-24.2016.4.03.6102/SP
2016.61.02.013478-0/SP
RELATOR : Desembargador Federal MAURICIO KATO
APELANTE : RENATO APARECIDO DA SILVEIRA
ADVOGADO : RICARDO KIFER AMORIM (Int.Pessoal)
: SP0000DPU DEFENSORIA PUBLICA DA UNIAO (Int.Pessoal)
APELADO(A) : Justica Publica
No. ORIG. : 00134782420164036102 7 Vr RIBEIRAO PRETO/SP

EMENTA

PENAL. PROCESSO PENAL. APELAÇÃO CRIMINAL. MOEDA FALSA. ARTIGO 289, §1º, DO CÓDIGO PENAL. AUSÊNCIA DE PROVA SUFICIENTE PARA A CONDENAÇÃO. DOLO NÃO COMPROVADO. IN DÚBIO PRO REO. ARTIGO 386, INCISO VII, DO CÓDIGO DE PROCESSO PENAL. ABSOLVIÇÃO. RECURSO PROVIDO.
1. Materialidade delitiva suficientemente demonstrada pelos seguintes elementos de convicção: boletim de ocorrência, auto de exibição e apreensão e, principalmente, o laudo pericial, que confirmou a falsidade das cédulas apreendidas e pelas cédulas falsas encartadas nos autos.
2. Autoria delitiva comprovada pelo interrogatório do próprio réu, bem como pelas declarações das testemunhas.
3. Contudo, o dolo não restou comprovado, de modo que incide o disposto no artigo 155 do Código de Processo Penal, bem como o princípio jurídico in dubio pro reo. É indispensável à configuração do crime que o agente tenha ciência da falsidade da moeda. No caso concreto, não houve demonstração inequívoca da ciência prévia do réu acerca da contrafação das cédulas e meros indícios não são hábeis a fundamentar uma decisão condenatória.
4. A análise das provas colhidas em juízo - interrogatório do réu e declarações das testemunhas - desaconselha a prolação de um édito condenatório, uma vez que pairam dúvidas se a atitude do acusado foi dolosa ou não, configurando ônus da acusação a sua demonstração (artigo 156, caput, do Código de Processo Penal).
5. Ausentes provas suficientes da ciência da falsidade das notas por parte do acusado e tendo em vista o princípio constitucional da presunção de inocência, impõe-se a sua absolvição, com base no inciso VII do artigo 386 do Código de Processo Penal.
6. Recurso provido.

ACÓRDÃO

Vistos e relatados estes autos em que são partes as acima indicadas, decide a Egrégia Quinta Turma do Tribunal Regional Federal da 3ª Região, por maioria, dar provimento à apelação da defesa para absolver o réu Renato Aparecido da Silveira, com base no inciso VII do artigo 386 do Código de Processo Penal, conforme voto do Relator Des. Fed. Maurício Kato, acompanhado pelo Des. Fed. Paulo Fontes, vencido o Des. Fed. André Nekatschalow que dava parcial provimento à apelação interposta pela defesa de Renato Aparecido da Silveira, nos termos do relatório e voto que ficam fazendo parte integrante do presente julgado.


São Paulo, 18 de março de 2019.
MAURICIO KATO


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APELAÇÃO CRIMINAL Nº 0013478-24.2016.4.03.6102/SP
2016.61.02.013478-0/SP
RELATOR : Desembargador Federal MAURICIO KATO
APELANTE : RENATO APARECIDO DA SILVEIRA
ADVOGADO : RICARDO KIFER AMORIM (Int.Pessoal)
: SP0000DPU DEFENSORIA PUBLICA DA UNIAO (Int.Pessoal)
APELADO(A) : Justica Publica
No. ORIG. : 00134782420164036102 7 Vr RIBEIRAO PRETO/SP

VOTO-VISTA

Inicialmente, cumpre registrar o respeito e admiração que nutro pelo Eminente Desembargador Federal Relator Mauricio Kato, salientando que o meu pedido de vista se assentou na necessidade de uma análise mais detida dos autos para formação da minha convicção.

Trata-se de apelação criminal interposta pela defesa de Renato Aparecido da Silveira contra a sentença de fls. 125/128, que condenou o acusado pelo cometimento do crime previsto no art. 289, §1º, do Código Penal, em continuidade delitiva, à pena de 3 (três) anos e 6 (seis) meses de reclusão, regime inicial aberto, e 10 (dez) dias-multa, cada qual em 1/30 (um trigésimo) do salário mínimo vigente à data dos fatos. Substituída a pena privativa de liberdade por 2 (duas) restritivas de direitos, consistentes em 3 (três) salários mínimos a entidade pública ou privada com destinação social, e prestação de serviços à comunidade, ambas a serem indicadas pelo Juízo da Execução.
A defesa recorre, alegando, em síntese, o seguinte:
a) requer a aplicação do princípio da insignificância, tendo em vista que a lesão ao bem jurídico foi ínfima e incapaz de lesionar a fé pública ou causar danos à sociedade;
b) ausência de dolo, uma vez que a perícia não considerou a falsificação como grosseira, pelo que o réu não teria como identificar a falsidade da nota, tanto que voltou ao local dos fatos;
c) o apelante justificou a origem da nota apreendida;
d) ausente o requisito subjetivo, não há falar-se em crime, pois o acusado desconhecia a falsidade das notas;
e) subsidiariamente, requer o afastamento do crime continuado, uma vez que não há prova nos autos da autoria do réu em relação à nota falsa entregue no dia 08.07.16;
f) requer-se a aplicação da pena ao mínimo legal, considerando-se a boa conduta social do apelante e a mínima lesão ao bem jurídico tutelado (fls. 132/137v.).
Contrarrazões às fls. 146/148.
O Ilustre Procurador Regional da República, João Francisco Bezerra de Carvalho, manifestou-se pelo desprovimento do recurso da defesa e requereu a imediata execução da pena, tão logo confirmada a condenação (fls. 150/155v.).
O Eminente Relator, Desembargador Federal Maurício Kato, deu provimento à apelação, para absolver o réu por ausência de provas, nos seguintes termos:

Ora, é indispensável à configuração do crime que o agente tenha ciência da falsidade da moeda. No caso concreto, não houve demonstração inequívoca da ciência prévia do réu acerca da contrafação das cédulas e meros indícios não são hábeis a fundamentar uma decisão condenatória.
No particular, a análise das provas colhidas em juízo - interrogatório do réu e declarações das testemunhas - desaconselha a prolação de um édito condenatório, uma vez que pairam dúvidas se a atitude do acusado foi dolosa ou não, o que configura ônus da acusação a sua demonstração (artigo 156, caput, do Código de Processo Penal).
Destaca-se o fato de que o acusado admitiu em seu interrogatório judicial que não tinha conhecimento da falsidade da cédula, tanto que voltou novamente ao mesmo estabelecimento para comprar outro lanche pouco tempo depois, de modo que a sua conduta de usar a nota falsa no comércio por si só não revela má-fé, além de destoar do modus operandi ao repassar uma nota falsa morando próximo do estabelecimento comercial, e não esboçou nenhuma intenção de fuga, pelo contrário, consumia o lanche no estabelecimento de forma tranquila, ou seja, resta ausente o elemento subjetivo necessário para a condenação pelo tipo em questão.
Tal fato faz pairar dúvidas razoáveis acerca de sua intenção, ou seja, se sua conduta foi dolosa ou não. Por esta razão, não é possível imputar-lhe a responsabilidade penal.
Por conseguinte, ante a ausência de provas suficientes da ciência da falsidade das notas por parte do acusado e tendo em vista o princípio constitucional da presunção de inocência, impõe-se a sua absolvição. (fls. 162/163v.)

Data vênia, divirjo do Eminente Relator, a fim de manter a condenação de Renato Aparecido da Silveira pelo cometimento do delito previsto no art. 289, § 1º, do Código Penal.
Moeda falsa (CP, art. 289). Valor irrelevante. Princípio da insignificância ou bagatela. Inaplicabilidade. O bem jurídico tutelado no crime de moeda falsa, previsto no art. 289 do Código Penal, é a fé pública, que é atingida independentemente da quantidade de cédulas utilizadas no delito. Nesse sentido são os seguintes precedentes:

HABEAS CORPUS QUE OBJETIVA RELAXAR PRISÃO EM FLAGRANTE OU OBTER LIBERDADE PROVISÓRIA. MOEDA FALSA. INAPLICAÇÃO DO PRINCÍPIO DA INSIGNIFICÂNCIA (...).
O paciente é acusado de violar o artigo 289, § 1º, do Código Penal. Foi preso em flagrante por estar na posse de nota falsa de R$ 50,00 (cinqüenta reais). Não há que se falar em insignificância da ação criminosa. O crime de moeda falsa integra o Título X do Código Penal e tem por objeto jurídico a fé pública. Logo, além do prejuízo que a conduta possa causar ao público em geral, sujeito passivo é o Estado e a proteção visa garantir a credibilidade do meio circulante (...).
(TRF da 3ª Região, 5a Turma, HC n. 2002.03.00.009532-7-MS, Rel. Des. Fed. André Nabarrete, unânime, j. 21.05.02, DJ 25.06.02, p. 670)
PENAL - APELAÇÃO CRIMINAL - MOEDA FALSA - AUTORIA E MATERIALIDADE DELITIVAS COMPROVADAS - PRINCÍPIO DA INSIGNIFICÂNCIA - INAPLICABILIDADE (...).
(...)
3. No que diz respeito a alegação concernente ao pequeno valor da cédula falsa encontrada com o réu, tal fato não interfere na tipificação ou na consumação do delito de moeda falsa, previsto no artigo 289 do Código Penal, eis que o objeto jurídico primordialmente tutelado pelo tipo penal é a fé pública (...).
(TRF da 3ª Região, 5a Turma, ACR n. 2000.61.02.008051-8-SP, Rel. Des. Fed. Ramza Tartuce, unânime, j. 15.04.03, DJ 20.05.03, p. 439)

Do caso dos autos. A defesa postula a absolvição do réu, em razão do princípio da insignificância, uma vez que o objeto material do crime consiste em 2 (duas) cédulas de R$ 50,00 (cinquenta reais) (fls. 182/187).
Não lhe assiste razão.
Consoante o entendimento acima, o bem jurídico tutelado impede a incidência do princípio da insignificância, tratando-se de conduta que ofende valores imprescindíveis à segurança das relações negociais cotidianas. Independentemente do número e valor das cédulas apreendidas, há periculosidade social da ação, um dos vetores para o reconhecimento da atipicidade material.

Materialidade. A materialidade restou devidamente comprovada pelos seguintes elementos de convicção:

a) Boletim de Ocorrência de Autoria Conhecida n. 744/16 (fl. 3/5);
b) auto de exibição e apreensão de 2 (duas) cédulas de R$ 50,00 (cinquenta reais) (fl.6);
c) Laudo Pericial n. 339/454/2016 que constatou a falsidade das notas (fls. 18/20);
d) Laudo Pericial n. 374.232/16 com a conclusão de que "a análise se a falsificação das peças examinadas (duas cédulas de R$ 50,00) constituiu processo grosseiro ou não, são questões de cunho estritamente subjetivo, não permitindo à perícia classificá-la" (fls. 29/31).

Autoria. Restou satisfatoriamente comprovada a autoria delitiva.

Em fase policial, compareceu Adriana Bernardes Tibúrcio, proprietária da lanchonete que funciona em um trailer, em frente à sua residência. Disse que na noite de 08.07.16, compareceu um indivíduo desconhecido em sua lanchonete e pediu um lanche e um refrigerante, no valor total de R$ 15,50 (quinze reais e cinquenta centavos), o qual foi pago com uma nota de R$ 50,00 (cinquenta reais). Não percebeu a irregularidade da nota, pois estava com pouca luz. Somente quando foi fechar o caixa é que percebeu que a nota poderia ser falsa, tendo em vista a qualidade do papel. Em 10.07.16, o mesmo indivíduo, identificado como o sujeito que se encontra na delegacia, Renato Aparecido Silveira, compareceu a lanchonete e pediu outro lanche, pagando novamente com uma nota de R$ 50,00 (cinquenta reais). Pediu para que o acusado aguardasse o lanche e chamou a polícia, para a qual entregou as 2 (duas) notas (fl. 7).

Extrajudicialmente, o acusado alegou que, em 08.07.16, foi abordado por uma pessoa idosa desconhecida, que estava acompanhada de uma criança, a qual lhe solicitou que comprasse um lanche e entregou-lhe uma nota de R$ 50,00 (cinquenta reais). Foi até a lanchonete Dimas, localizada no bairro em que reside, pediu o lanche e pagou com a nota recebida, da qual recebeu R$ 35,00 (trinta e cinco reais) de troco e entregou-o juntamente com o lanche para a mulher. Não desconfiou da autenticidade da nota. Em 10.07.16, encontrou-se novamente com a senhora, a qual lhe fez o mesmo pedido e deu-lhe outra nota de R$ 50,00 (cinquenta reais). Foi na mesma lanchonete e estava aguardando o lanche, quando chegaram os policiais militares, os quais foram chamados pela dona da lanchonete, que alegou a falsidade das notas. Apenas quis fazer um favor para uma desconhecida e pretende ressarcir a dona da lanchonete com relação ao valor da primeira compra (fl. 8).

Também em sede policial, o Policial Militar, Ademar Barboza dos Santos Junior, disse que foi acionado para comparecer a lanchonete localizada na Rua Sergipe, Jardim Paulista, local em que a proprietária alegou ter recebido duas notas falsas de R$ 50,00 (cinquenta reais). Foi até o local, e juntamente com o policial Beethoven, encontrou o sujeito, identificado como Renato Aparecido da Silveira, o qual alegou ter recebido as notas de uma senhora idosa na rua, no mesmo bairro. Diligências foram realizadas nos locais indicados por Renato, mas a senhora não foi localizada nem identificada (fl. 14).

Beethoven Ferreira dos Santos foi ouvido em sede policial e ratificou as informações prestadas pelo seu colega, Ademar Barboza dos Santos Junior (fl. 15).

Em Juízo, a testemunha de acusação, Adriana Bernardes Tibúrcio, disse que trabalhava na lanchonete Dimas à época dos fatos. Recorda-se que o réu presente à audiência foi até a lanchonete e pediu-lhe um lanche, pelo qual pagou com uma nota de R$ 50,00 (cinquenta reais) e voltou o troco a ele. Quando foi fechar o caixa percebeu que a nota era falsa. Sabia que a nota falsa era do acusado, pois não teve movimento aquele dia. Guardou a nota para levar à polícia. O acusado voltou na lanchonete e pediu outro lanche, logo, acionou a polícia enquanto o acusado aguardava o pedido. Posteriormente, seu marido chegou e também desconfiou da autenticidade da nota. Percebeu que a textura da nota era diferente e comparou com outra cédula. Entregou a nota para a polícia (mídia à fl. 106).

Luís Antônio Cardoso e Guilherme Agostinho Cardoso, testemunhas de defesa, nada acrescentaram aos fatos em seus depoimentos em Juízo, nos quais se limitaram a relatar sobre a personalidade e conduta favoráveis do réu (mídia à fl. 106).
Interrogado em Juízo, Renato Aparecido da Silveira, disse que não conhece Adriana. Não sabia que a nota era a falsa, pois se soubesse não teria voltado no local para comprar outro lanche. Trabalhava carpindo datas e como não gastava muito sempre guardava as notas. Confirma que comprou o lanche, e como gostou dele, voltou novamente no mesmo local para comprar outro. Carpia aproximadamente 4 (quatro) quintais por dia, trabalho pelo qual recebia R$ 50,00 (cinquenta) reais por terreno, mas não sabe quem lhe entregou as notas. Mora perto da lanchonete, umas três ruas à frente. Foi à noite na lanchonete, mas não se recorda do horário. Não apresentaram a primeira nota a ele e não sabe se era sua. A nota parecia normal. Não recebe muito dinheiro em mãos e nunca recebeu nota falsa antes. Nunca trabalhou como caixa (mídia à fl. 106).

A defesa alega ausência de dolo do réu, tendo em vista a impossibilidade de identificar a falsidade da nota. Argumenta ainda, que a conduta do réu de retornar ao local dos fatos, dias depois do ocorrido, reforça essa afirmação.

Não lhe assiste razão.

Ao contrário do alegado pela defesa, o réu não justificou a origem da nota apreendida em sua posse e apresentou versões completamente diferentes dos fatos, em fase policial e em Juízo.

Por outro lado, os depoimentos prestados pelas testemunhas em sede policial e em Juízo são convergentes e comprovam a autoria do réu.

Em que pese a alegação do acusado no sentido de que as cédulas pertenciam a terceiro, a conduta de colocar em circulação a moeda falsa é suficiente para tipificar o delito do art. 289, §1º, do Código Penal.

Portanto, comprovados o dolo, a materialidade e a autoria, a condenação deve ser mantida.

A dosimetria foi fixada pelo Juízo a quo nos seguintes termos:


A sanção penal prevista para o crime previsto no artigo 289, 1º, do Código Penal, é de reclusão, de 03 (três) a 12 (doze) anos, e multa.
No que diz respeito à pena privativa de liberdade, estipulo-a inicialmente em 03 (três) anos de reclusão: a culpabilidade é normal, porquanto o tipo é doloso; o réu não ostenta maus antecedentes; a conduta social e a personalidade do agente são boas; as circunstâncias do crime são normais e as consequências do fato não foram graves.
Consigne-se, por oportuno, que, a teor do que dispõe a Súmula 444 do Superior Tribunal de Justiça, "é vedada a utilização de inquéritos policiais e ações penais em curso para agravar a pena-base", razão pela qual o feito apontado na fl. 54 não servirá como circunstância judicial desfavorável.
Não há in casu qualquer circunstância atenuante ou agravante, causa de aumento ou diminuição de pena. Daí por que a pena imposta pelo delito do artigo 289, 1º, do Código Penal, deve ser definitivamente fixada em 03 (três) anos de reclusão.
Tendo em vista que o acusado, mediante mais de uma ação, praticou dois crimes da mesma espécie, nas mesmas condições de tempo, lugar e maneira de execução, deve o crime subsequente ser havido como continuação do primeiro (CP, art. 71, caput).
Dessa feita, reconheço a existência de crime continuado e, em consequência, aplico a pena de somente uma infração aumentada em 1/6 (um sexto), perfazendo um total de 03 (três) anos e 06 (seis) meses de reclusão. Em razão do número de crimes cometidos em continuidade - dois - a majoração foi feita em 1/6 (um sexto).
Portanto, a pena definitiva é de 03 (três) anos e 06 (seis) meses de reclusão, a ser cumprida em regime inicial aberto (CP, art. 33, 2º, "b").
Todavia, dentro desses quadrantes, incide a regra do artigo 44 do Código Penal, razão por que a pena privativa de liberdade deve ser substituída por penas restritivas de direito.
(...)
No que tange à multa, fixo-a no mínimo legal, qual seja, em 10 (dez) dias-multa (CP, art. 49), adotando o entendimento segundo o qual a regra do art. 72 do CP não se aplica ao crime continuado (STJ, Sexta Turma, HC 95641-DF, Relatora Ministra Jane Silva, data de julgamento 18.03.2008).
Arbitro cada dia-multa em 1/30 (um trigésimo) do salário-mínimo vigente à época dos fatos (CP, art. 49, 1º). Por conseguinte, deverá o acusado pagá-la dentro de 10 (dez) dias depois de transitada em julgado a sentença (CP, art. 50, caput), corrigida monetariamente desde a data dos fatos (CP, art. 50, 2º).
Logo, em síntese, fica o réu condenado a: i) pagar 03 (três) salários mínimos a uma entidade pública ou privada com destinação social, a ser apontada pelo juízo da execução penal; ii) prestar serviços à comunidade, os quais serão estipulados in concreto pelo juízo da execução à luz dos parâmetros delineados nos 1º a 4º do art. 46 do Código Penal; ii) pagar 10 (dez) dias-multa, valendo cada dia-multa 1/30 (um trigésimo) do salário-mínimo vigente à época dos fatos, dentro de 10 (dez) dias após o trânsito em julgado da sentença, corrigidas monetariamente desde a data do ilícito. (destaques do original, fls. 126v./127v.)

A defesa pugna pelo afastamento da continuidade delitiva.

Sem razão.

Na terceira fase, está caracterizada a continuidade delitiva na forma do art. 71 do Código Penal, dado que restou comprovado nos autos de que o réu logrou êxito em introduzir cédula falsa no mesmo estabelecimento, por duas vezes, nas mesmas condições de lugar e maneira de execução.

A defesa requer também a fixação da pena no mínimo legal.

Assiste-lhe parcial razão.

Em que pese a fixação da pena privativa de liberdade no mínimo legal, quando da sua substituição por restritivas de direitos, o Juízo a quo fixou a prestação pecuniária em 3 (três) salários mínimos.

Ocorre que não há nos autos fundamentação capaz de justificar que o réu possua maior capacidade econômica, pelo que fixo a prestação pecuniária em 1 (um) salário mínimo à entidade beneficente a ser definida pelo Juízo da execução.

Execução provisória. HC n. 126.292 do Supremo Tribunal Federal. Esgotamento das vias ordinárias. Em Sessão Plenária, o Supremo Tribunal Federal, em 17.02.16, firmou o entendimento, segundo o qual "a execução provisória de acórdão penal condenatório proferido em grau de apelação, ainda que sujeito a recurso especial ou extraordinário, não compromete o princípio constitucional da presunção de inocência afirmado pelo artigo 5º, inciso LVII da Constituição Federal" (STF, HC n. 126.292, Rel. Min. Teori Zavascki, j. 17.02.16). Em regime de repercussão geral, o Supremo Tribunal Federal reafirmou o entendimento de que não compromete o princípio constitucional da presunção de inocência (CR, art. 5º, LVII) a execução provisória de acórdão penal condenatório proferido em grau recursal, ainda que sujeito a recurso especial ou extraordinário (STF, Repercussão geral em ARE n. 964.246, Rel. Min. Teori Zavascki, j. 10.11.16). A 5ª Turma do TRF da 3ª Região decidiu pela expedição de carta de sentença após esgotadas as vias ordinárias (TRF da 3ª Região, ACr n. 2014.61.19.005575-3, Rel. Des. Fed. Paulo Fontes, j. 06.02.17 e TRF da 3ª Região, ED em ACr n. 2013.61.10.004043-0, Rel. Des. Fed. André Nekatschalow, j. 06.02.17).
Do caso dos autos. Consoante o entendimento acima explicitado, cabe deferir a execução provisória pretendida pela Procuradoria da República, após o exaurimento das vias ordinárias (fls. 150/155v.).
Ante o exposto, DOU PARCIAL PROVIMENTO à apelação interposta pela defesa de Renato Aparecido da Silveira, tão somente para reduzir a prestação pecuniária para 1 (um) salário mínimo, mantidos os demais termos da sentença, e determino a execução provisória das penas, tão logo esgotadas as vias ordinárias (divirjo do Relator).
É o voto.



Andre Nekatschalow
Desembargador Federal


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APELAÇÃO CRIMINAL Nº 0013478-24.2016.4.03.6102/SP
2016.61.02.013478-0/SP
RELATOR : Desembargador Federal MAURICIO KATO
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RELATÓRIO

Trata-se de apelação criminal interposta pela defesa de Renato Aparecido da Silveira contra a sentença de fls.125/128 que o condenou pela prática do delito previsto no artigo 289, §1º, do Código Penal, ao cumprimento de pena privativa de liberdade de 3 anos e 6 meses de reclusão, em regime inicial aberto, e ao pagamento de 10 dias-multa, cada um fixado no mínimo legal, substituída por duas restritivas de direitos.


Em suas razões recursais (fls. 132/137-vº), a defesa requer a absolvição do acusado, seja pelo princípio da insignificância, seja pela ausência de dolo e, subsidiariamente, a não aplicação do aumento pela continuidade delitiva e a aplicação da pena no mínimo legal.


O Ministério Público Federal não interpôs recurso de apelação, tendo apresentado as contrarrazões às fls. 146/148.


A Procuradoria Regional da República opinou pelo desprovimento do recurso da defesa e pela execução provisória da pena (fls.150/155-vº).


É o relatório.


À revisão, nos termos regimentais.


MAURICIO KATO
Desembargador Federal


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Data e Hora: 19/12/2018 22:40:05



APELAÇÃO CRIMINAL Nº 0013478-24.2016.4.03.6102/SP
2016.61.02.013478-0/SP
RELATOR : Desembargador Federal MAURICIO KATO
APELANTE : RENATO APARECIDO DA SILVEIRA
ADVOGADO : RICARDO KIFER AMORIM (Int.Pessoal)
: SP0000DPU DEFENSORIA PUBLICA DA UNIAO (Int.Pessoal)
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No. ORIG. : 00134782420164036102 7 Vr RIBEIRAO PRETO/SP

VOTO

Consta dos autos que Renato Aparecido da Silveira foi denunciado pela prática do crime previsto no artigo 289, §1º, do Código Penal, pelos fatos a seguir expostos.


Segundo a denúncia, em 08.07.2016, o acusado foi até a "Lanchonete Dimas", comprou um lanche e um refrigerante e pagou com uma nota de R$ 50,00; que a vítima Adriana Bernardes Tibúrcio não percebeu a falsidade da moeda no momento da compra e venda, só vindo a se dar conta horas depois, ao fechar o caixa.


Consta ainda, que no dia 10.07.2016, o acusado retornou ao mesmo estabelecimento com o intuito de fazer compra semelhante pagando com outra nota de R$ 50,00 falsa, contudo, nessa ocasião, Adriana notou a falsidade da nota, por ter sido vítima do mesmo golpe naqueles dias, e acionou a polícia militar.


O laudo Pericial de fls.18/22 atestou a falsidade das cédulas apreendidas.


Após regular instrução, o réu foi condenado pela prática do crime estabelecido no artigo 289, §1º, do Código Penal, ao cumprimento de pena privativa de liberdade de 3 anos e 6 meses de reclusão, em regime inicial aberto, e ao pagamento de 10 dias-multa, cada um fixado no mínimo legal, substituída por duas restritivas de direitos.


Passo à análise das razões recursais.



Da não incidência do princípio da insignificância

Não há que se falar em aplicação do princípio da insignificância, pois este não se aplica aos crimes de moeda falsa, tendo em vista que o bem jurídico protegido é a fé pública, o que torna irrelevante o valor da cédula apreendida ou quantidade de notas encontradas em poder do acusado, nos termos de precedentes do Superior Tribunal de Justiça e desta 5ª Turma: STJ, AGRESP 201302968848, Rel. Min. Gurgel de Faria, 5ª Turma, DJE de 04/03/2016; TRF3, ACR 00015693820094036002, Rel. Des. Fed. PAULO FONTES, 5ª Turma, e-DJF3 Judicial 1 de 21/06/2016; ACR 00092451420124036105, Rel. Des. Fed. ANDRÉ NEKATSCHALOW, 5ª Turma, e-DJF3 Judicial 1 de 18/04/2016.


Com efeito, em se tratando de moeda falsa, os pronunciamentos do Supremo Tribunal Federal são no sentido de atentar, seja qual for o valor, para o dano ao bem protegido - a regular circulação, a fé pública nas cédulas.


Assim, no caso particular, afasta-se a incidência da insignificância pretendida pela defesa.


A materialidade delitiva encontra-se suficientemente demonstrada pelos seguintes elementos de convicção: boletim de ocorrência de fls. 03/05, auto de exibição e apreensão de fls. 06 e, principalmente, o laudo pericial de fls.18/22, que confirmou a falsidade das cédulas apreendidas e pelas cédulas falsas encartadas nos autos (fls.41).


Por sua vez, a autoria delitiva também ficou comprovada pelo interrogatório do próprio réu, bem como pelas declarações das testemunhas.


Do dolo. Contudo, de acordo com o conteúdo probatório colacionado aos autos, o dolo não restou comprovado, de modo que incide o disposto no artigo 155 do Código de Processo Penal, bem como o princípio jurídico in dubio pro reo.


Com efeito, o elemento subjetivo do tipo moeda falsa é o dolo que exige o conhecimento da falsidade da moeda por parte do réu, consistente na vontade livre e consciente de praticar quaisquer das condutas descritas no art. 289, §1º, do Código Penal:


Moeda Falsa

Art. 289 - Falsificar, fabricando-a ou alterando-a, moeda metálica ou papel- moeda de curso legal no país ou no estrangeiro:

Pena - reclusão, de três a doze anos, e multa.

§ 1º - Nas mesmas penas incorre quem, por conta própria ou alheia, importa ou exporta, adquire, vende, troca, cede, empresta, guarda ou introduz na circulação moeda falsa.


Diante disso, observa-se que o acusado, em seu interrogatório judicial, afirmou que a acusação é falsa; que "se soubesse que a nota era falsa não voltaria lá uma segunda vez para comprar de novo"; que recebeu o dinheiro como trabalhador autônomo, cortando árvores e carpindo quintais; que no dia dos fatos, comprou o lanche, pagou e recebeu o troco normalmente; dois dias depois, voltou à lanchonete, na oportunidade Adriana disse que as notas eram falsas e chamou a polícia; que "carpiu uns três terrenos no mesmo dia", não sabendo dizer de quem teria recebido a nota falsa, e que cobrava R$ 50,00 por terreno; que não sabia que as notas eram falsas (mídia eletrônica de fl. 106).


A testemunha de acusação Adriana Bernardes Tibúrcio afirmou em seu depoimento judicial que não se deu conta da falsidade da cédula quando a recebeu, vindo a perceber apenas quando foi fechar o caixa, pois a textura e a cor eram diferentes; disse que a nota de R$ 50,00 falsa era de Renato pois era a única nota desse valor que tinha no caixa, já que naquele dia havia pouco movimento na lanchonete; que enquanto o acusado comia o lanche, ela chamou a polícia (mídia eletrônica de fl. 106).


Já as testemunhas de defesa Luís Antônio Cardoso e Guilherme Agostinho Cardoso, em seus depoimentos judiciais, em nada esclareceram os fatos narrados na denúncia, mas apresentaram boas referências do acusado (mídia eletrônica de fl. 106).


Ora, é indispensável à configuração do crime que o agente tenha ciência da falsidade da moeda. No caso concreto, não houve demonstração inequívoca da ciência prévia do réu acerca da contrafação das cédulas e meros indícios não são hábeis a fundamentar uma decisão condenatória.


No particular, a análise das provas colhidas em juízo - interrogatório do réu e declarações das testemunhas - desaconselha a prolação de um édito condenatório, uma vez que pairam dúvidas se a atitude do acusado foi dolosa ou não, o que configura ônus da acusação a sua demonstração (artigo 156, caput, do Código de Processo Penal).


Destaca-se o fato de que o acusado admitiu em seu interrogatório judicial que não tinha conhecimento da falsidade da cédula, tanto que voltou novamente ao mesmo estabelecimento para comprar outro lanche pouco tempo depois, de modo que a sua conduta de usar a nota falsa no comércio por si só não revela má-fé, além de destoar do modus operandi ao repassar uma nota falsa morando próximo do estabelecimento comercial, e não esboçou nenhuma intenção de fuga, pelo contrário, consumia o lanche no estabelecimento de forma tranquila, ou seja, resta ausente o elemento subjetivo necessário para a condenação pelo tipo em questão.


Tal fato faz pairar dúvidas razoáveis acerca de sua intenção, ou seja, se sua conduta foi dolosa ou não. Por esta razão, não é possível imputar-lhe a responsabilidade penal.


Por conseguinte, ante a ausência de provas suficientes da ciência da falsidade das notas por parte do acusado e tendo em vista o princípio constitucional da presunção de inocência, impõe-se a sua absolvição.



Ante o exposto, dou provimento à apelação da defesa para absolver o réu Renato Aparecido da Silveira, com base no inciso VII do artigo 386 do Código de Processo Penal.


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É como voto.


MAURICIO KATO
Desembargador Federal


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