D.E. Publicado em 03/04/2019 |
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EMENTA
PENAL. PROCESSO PENAL. APELAÇÃO CRIMINAL. MOEDA FALSA. ARTIGO 289, §1º, DO CÓDIGO PENAL. AUSÊNCIA DE PROVA SUFICIENTE PARA A CONDENAÇÃO. DOLO NÃO COMPROVADO. IN DÚBIO PRO REO. ARTIGO 386, INCISO VII, DO CÓDIGO DE PROCESSO PENAL. ABSOLVIÇÃO. RECURSO PROVIDO.
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ACÓRDÃO
Vistos e relatados estes autos em que são partes as acima indicadas, decide a Egrégia Quinta Turma do Tribunal Regional Federal da 3ª Região, por maioria, dar provimento à apelação da defesa para absolver o réu Renato Aparecido da Silveira, com base no inciso VII do artigo 386 do Código de Processo Penal, conforme voto do Relator Des. Fed. Maurício Kato, acompanhado pelo Des. Fed. Paulo Fontes, vencido o Des. Fed. André Nekatschalow que dava parcial provimento à apelação interposta pela defesa de Renato Aparecido da Silveira, nos termos do relatório e voto que ficam fazendo parte integrante do presente julgado.
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VOTO-VISTA
Inicialmente, cumpre registrar o respeito e admiração que nutro pelo Eminente Desembargador Federal Relator Mauricio Kato, salientando que o meu pedido de vista se assentou na necessidade de uma análise mais detida dos autos para formação da minha convicção.
Materialidade. A materialidade restou devidamente comprovada pelos seguintes elementos de convicção:
Autoria. Restou satisfatoriamente comprovada a autoria delitiva.
Em fase policial, compareceu Adriana Bernardes Tibúrcio, proprietária da lanchonete que funciona em um trailer, em frente à sua residência. Disse que na noite de 08.07.16, compareceu um indivíduo desconhecido em sua lanchonete e pediu um lanche e um refrigerante, no valor total de R$ 15,50 (quinze reais e cinquenta centavos), o qual foi pago com uma nota de R$ 50,00 (cinquenta reais). Não percebeu a irregularidade da nota, pois estava com pouca luz. Somente quando foi fechar o caixa é que percebeu que a nota poderia ser falsa, tendo em vista a qualidade do papel. Em 10.07.16, o mesmo indivíduo, identificado como o sujeito que se encontra na delegacia, Renato Aparecido Silveira, compareceu a lanchonete e pediu outro lanche, pagando novamente com uma nota de R$ 50,00 (cinquenta reais). Pediu para que o acusado aguardasse o lanche e chamou a polícia, para a qual entregou as 2 (duas) notas (fl. 7).
Extrajudicialmente, o acusado alegou que, em 08.07.16, foi abordado por uma pessoa idosa desconhecida, que estava acompanhada de uma criança, a qual lhe solicitou que comprasse um lanche e entregou-lhe uma nota de R$ 50,00 (cinquenta reais). Foi até a lanchonete Dimas, localizada no bairro em que reside, pediu o lanche e pagou com a nota recebida, da qual recebeu R$ 35,00 (trinta e cinco reais) de troco e entregou-o juntamente com o lanche para a mulher. Não desconfiou da autenticidade da nota. Em 10.07.16, encontrou-se novamente com a senhora, a qual lhe fez o mesmo pedido e deu-lhe outra nota de R$ 50,00 (cinquenta reais). Foi na mesma lanchonete e estava aguardando o lanche, quando chegaram os policiais militares, os quais foram chamados pela dona da lanchonete, que alegou a falsidade das notas. Apenas quis fazer um favor para uma desconhecida e pretende ressarcir a dona da lanchonete com relação ao valor da primeira compra (fl. 8).
Também em sede policial, o Policial Militar, Ademar Barboza dos Santos Junior, disse que foi acionado para comparecer a lanchonete localizada na Rua Sergipe, Jardim Paulista, local em que a proprietária alegou ter recebido duas notas falsas de R$ 50,00 (cinquenta reais). Foi até o local, e juntamente com o policial Beethoven, encontrou o sujeito, identificado como Renato Aparecido da Silveira, o qual alegou ter recebido as notas de uma senhora idosa na rua, no mesmo bairro. Diligências foram realizadas nos locais indicados por Renato, mas a senhora não foi localizada nem identificada (fl. 14).
Beethoven Ferreira dos Santos foi ouvido em sede policial e ratificou as informações prestadas pelo seu colega, Ademar Barboza dos Santos Junior (fl. 15).
Em Juízo, a testemunha de acusação, Adriana Bernardes Tibúrcio, disse que trabalhava na lanchonete Dimas à época dos fatos. Recorda-se que o réu presente à audiência foi até a lanchonete e pediu-lhe um lanche, pelo qual pagou com uma nota de R$ 50,00 (cinquenta reais) e voltou o troco a ele. Quando foi fechar o caixa percebeu que a nota era falsa. Sabia que a nota falsa era do acusado, pois não teve movimento aquele dia. Guardou a nota para levar à polícia. O acusado voltou na lanchonete e pediu outro lanche, logo, acionou a polícia enquanto o acusado aguardava o pedido. Posteriormente, seu marido chegou e também desconfiou da autenticidade da nota. Percebeu que a textura da nota era diferente e comparou com outra cédula. Entregou a nota para a polícia (mídia à fl. 106).
A defesa alega ausência de dolo do réu, tendo em vista a impossibilidade de identificar a falsidade da nota. Argumenta ainda, que a conduta do réu de retornar ao local dos fatos, dias depois do ocorrido, reforça essa afirmação.
Não lhe assiste razão.
Ao contrário do alegado pela defesa, o réu não justificou a origem da nota apreendida em sua posse e apresentou versões completamente diferentes dos fatos, em fase policial e em Juízo.
Por outro lado, os depoimentos prestados pelas testemunhas em sede policial e em Juízo são convergentes e comprovam a autoria do réu.
Em que pese a alegação do acusado no sentido de que as cédulas pertenciam a terceiro, a conduta de colocar em circulação a moeda falsa é suficiente para tipificar o delito do art. 289, §1º, do Código Penal.
Portanto, comprovados o dolo, a materialidade e a autoria, a condenação deve ser mantida.
A dosimetria foi fixada pelo Juízo a quo nos seguintes termos:
A defesa pugna pelo afastamento da continuidade delitiva.
Sem razão.
Na terceira fase, está caracterizada a continuidade delitiva na forma do art. 71 do Código Penal, dado que restou comprovado nos autos de que o réu logrou êxito em introduzir cédula falsa no mesmo estabelecimento, por duas vezes, nas mesmas condições de lugar e maneira de execução.
Assiste-lhe parcial razão.
Em que pese a fixação da pena privativa de liberdade no mínimo legal, quando da sua substituição por restritivas de direitos, o Juízo a quo fixou a prestação pecuniária em 3 (três) salários mínimos.
Ocorre que não há nos autos fundamentação capaz de justificar que o réu possua maior capacidade econômica, pelo que fixo a prestação pecuniária em 1 (um) salário mínimo à entidade beneficente a ser definida pelo Juízo da execução.
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RELATÓRIO
Trata-se de apelação criminal interposta pela defesa de Renato Aparecido da Silveira contra a sentença de fls.125/128 que o condenou pela prática do delito previsto no artigo 289, §1º, do Código Penal, ao cumprimento de pena privativa de liberdade de 3 anos e 6 meses de reclusão, em regime inicial aberto, e ao pagamento de 10 dias-multa, cada um fixado no mínimo legal, substituída por duas restritivas de direitos.
Em suas razões recursais (fls. 132/137-vº), a defesa requer a absolvição do acusado, seja pelo princípio da insignificância, seja pela ausência de dolo e, subsidiariamente, a não aplicação do aumento pela continuidade delitiva e a aplicação da pena no mínimo legal.
O Ministério Público Federal não interpôs recurso de apelação, tendo apresentado as contrarrazões às fls. 146/148.
A Procuradoria Regional da República opinou pelo desprovimento do recurso da defesa e pela execução provisória da pena (fls.150/155-vº).
É o relatório.
À revisão, nos termos regimentais.
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VOTO
Consta dos autos que Renato Aparecido da Silveira foi denunciado pela prática do crime previsto no artigo 289, §1º, do Código Penal, pelos fatos a seguir expostos.
Segundo a denúncia, em 08.07.2016, o acusado foi até a "Lanchonete Dimas", comprou um lanche e um refrigerante e pagou com uma nota de R$ 50,00; que a vítima Adriana Bernardes Tibúrcio não percebeu a falsidade da moeda no momento da compra e venda, só vindo a se dar conta horas depois, ao fechar o caixa.
Consta ainda, que no dia 10.07.2016, o acusado retornou ao mesmo estabelecimento com o intuito de fazer compra semelhante pagando com outra nota de R$ 50,00 falsa, contudo, nessa ocasião, Adriana notou a falsidade da nota, por ter sido vítima do mesmo golpe naqueles dias, e acionou a polícia militar.
O laudo Pericial de fls.18/22 atestou a falsidade das cédulas apreendidas.
Após regular instrução, o réu foi condenado pela prática do crime estabelecido no artigo 289, §1º, do Código Penal, ao cumprimento de pena privativa de liberdade de 3 anos e 6 meses de reclusão, em regime inicial aberto, e ao pagamento de 10 dias-multa, cada um fixado no mínimo legal, substituída por duas restritivas de direitos.
Passo à análise das razões recursais.
Da não incidência do princípio da insignificância
Não há que se falar em aplicação do princípio da insignificância, pois este não se aplica aos crimes de moeda falsa, tendo em vista que o bem jurídico protegido é a fé pública, o que torna irrelevante o valor da cédula apreendida ou quantidade de notas encontradas em poder do acusado, nos termos de precedentes do Superior Tribunal de Justiça e desta 5ª Turma: STJ, AGRESP 201302968848, Rel. Min. Gurgel de Faria, 5ª Turma, DJE de 04/03/2016; TRF3, ACR 00015693820094036002, Rel. Des. Fed. PAULO FONTES, 5ª Turma, e-DJF3 Judicial 1 de 21/06/2016; ACR 00092451420124036105, Rel. Des. Fed. ANDRÉ NEKATSCHALOW, 5ª Turma, e-DJF3 Judicial 1 de 18/04/2016.
Com efeito, em se tratando de moeda falsa, os pronunciamentos do Supremo Tribunal Federal são no sentido de atentar, seja qual for o valor, para o dano ao bem protegido - a regular circulação, a fé pública nas cédulas.
Assim, no caso particular, afasta-se a incidência da insignificância pretendida pela defesa.
A materialidade delitiva encontra-se suficientemente demonstrada pelos seguintes elementos de convicção: boletim de ocorrência de fls. 03/05, auto de exibição e apreensão de fls. 06 e, principalmente, o laudo pericial de fls.18/22, que confirmou a falsidade das cédulas apreendidas e pelas cédulas falsas encartadas nos autos (fls.41).
Por sua vez, a autoria delitiva também ficou comprovada pelo interrogatório do próprio réu, bem como pelas declarações das testemunhas.
Do dolo. Contudo, de acordo com o conteúdo probatório colacionado aos autos, o dolo não restou comprovado, de modo que incide o disposto no artigo 155 do Código de Processo Penal, bem como o princípio jurídico in dubio pro reo.
Com efeito, o elemento subjetivo do tipo moeda falsa é o dolo que exige o conhecimento da falsidade da moeda por parte do réu, consistente na vontade livre e consciente de praticar quaisquer das condutas descritas no art. 289, §1º, do Código Penal:
Moeda Falsa
Art. 289 - Falsificar, fabricando-a ou alterando-a, moeda metálica ou papel- moeda de curso legal no país ou no estrangeiro:
Pena - reclusão, de três a doze anos, e multa.
§ 1º - Nas mesmas penas incorre quem, por conta própria ou alheia, importa ou exporta, adquire, vende, troca, cede, empresta, guarda ou introduz na circulação moeda falsa.
Diante disso, observa-se que o acusado, em seu interrogatório judicial, afirmou que a acusação é falsa; que "se soubesse que a nota era falsa não voltaria lá uma segunda vez para comprar de novo"; que recebeu o dinheiro como trabalhador autônomo, cortando árvores e carpindo quintais; que no dia dos fatos, comprou o lanche, pagou e recebeu o troco normalmente; dois dias depois, voltou à lanchonete, na oportunidade Adriana disse que as notas eram falsas e chamou a polícia; que "carpiu uns três terrenos no mesmo dia", não sabendo dizer de quem teria recebido a nota falsa, e que cobrava R$ 50,00 por terreno; que não sabia que as notas eram falsas (mídia eletrônica de fl. 106).
A testemunha de acusação Adriana Bernardes Tibúrcio afirmou em seu depoimento judicial que não se deu conta da falsidade da cédula quando a recebeu, vindo a perceber apenas quando foi fechar o caixa, pois a textura e a cor eram diferentes; disse que a nota de R$ 50,00 falsa era de Renato pois era a única nota desse valor que tinha no caixa, já que naquele dia havia pouco movimento na lanchonete; que enquanto o acusado comia o lanche, ela chamou a polícia (mídia eletrônica de fl. 106).
Já as testemunhas de defesa Luís Antônio Cardoso e Guilherme Agostinho Cardoso, em seus depoimentos judiciais, em nada esclareceram os fatos narrados na denúncia, mas apresentaram boas referências do acusado (mídia eletrônica de fl. 106).
Ora, é indispensável à configuração do crime que o agente tenha ciência da falsidade da moeda. No caso concreto, não houve demonstração inequívoca da ciência prévia do réu acerca da contrafação das cédulas e meros indícios não são hábeis a fundamentar uma decisão condenatória.
No particular, a análise das provas colhidas em juízo - interrogatório do réu e declarações das testemunhas - desaconselha a prolação de um édito condenatório, uma vez que pairam dúvidas se a atitude do acusado foi dolosa ou não, o que configura ônus da acusação a sua demonstração (artigo 156, caput, do Código de Processo Penal).
Destaca-se o fato de que o acusado admitiu em seu interrogatório judicial que não tinha conhecimento da falsidade da cédula, tanto que voltou novamente ao mesmo estabelecimento para comprar outro lanche pouco tempo depois, de modo que a sua conduta de usar a nota falsa no comércio por si só não revela má-fé, além de destoar do modus operandi ao repassar uma nota falsa morando próximo do estabelecimento comercial, e não esboçou nenhuma intenção de fuga, pelo contrário, consumia o lanche no estabelecimento de forma tranquila, ou seja, resta ausente o elemento subjetivo necessário para a condenação pelo tipo em questão.
Tal fato faz pairar dúvidas razoáveis acerca de sua intenção, ou seja, se sua conduta foi dolosa ou não. Por esta razão, não é possível imputar-lhe a responsabilidade penal.
Por conseguinte, ante a ausência de provas suficientes da ciência da falsidade das notas por parte do acusado e tendo em vista o princípio constitucional da presunção de inocência, impõe-se a sua absolvição.
Ante o exposto, dou provimento à apelação da defesa para absolver o réu Renato Aparecido da Silveira, com base no inciso VII do artigo 386 do Código de Processo Penal.
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É como voto.
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