D.E. Publicado em 03/04/2019 |
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EMENTA
ACÓRDÃO
Vistos e relatados estes autos em que são partes as acima indicadas, decide a Egrégia Quinta Turma do Tribunal Regional Federal da 3ª Região, por maioria, dar provimento ao recurso da defesa para absolver o réu, com fundamento no artigo 386, VI do Código de Processo Penal, nos termos do relatório e voto que ficam fazendo parte integrante do presente julgado.
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VOTO-VISTA
Inicialmente, cumpre registrar o respeito e admiração que nutro pelo Eminente Desembargador Federal Relator Mauricio Kato, salientando que o meu pedido de vista se assentou na necessidade de uma análise mais detida dos autos para formação da minha convicção.
Trata-se de apelação criminal interposta por José Wilson dos Reis contra a sentença de fls. 403/409, que condenou o réu à pena de 3 (três) anos, 8 (oito) meses e 13 (treze) dias de reclusão, regime inicial aberto, por prática do delito previsto no art. 129, § 1º, II, do Código Penal, e declarou extinta a punibilidade do réu em relação ao crime do art. 3º, i, da Lei n. 4.898/65, com fundamento nos arts. 107, IV, e 109, VI, ambos do Código Penal, e art. 61 do Código Penal.
Em razões recursais apresentadas nesta Corte (CPP, art. 600, § 4º), alega a defesa, em síntese, o seguinte:
O Procurador da República oficiante em 1ª instância manifestou-se pela sua incompetência para a oferta de contrarrazões (fls. 454/455).
O Ilustre Procurador Regional da República, Dr. Márcio Domene Cabrini, manifestou-se em parecer pelo desprovimento do recurso (fls. 463/465v.).
O Eminente Relator, Desembargador Federal Mauricio Kato, deu provimento ao recurso da defesa para absolver o réu, com fundamento no art. 386, VI, do Código de Processo Penal. Em seu voto, consignou o seguinte:
Data venia, divirjo do Relator, a fim de manter a condenação de José Wilson dos Reis pelo cometimento do delito previsto no art. 129, § 1º, II, do Código Penal, e, de ofício, reduzir a pena-base imposta em 1º grau.
Acompanho o Relator quanto ao não reconhecimento da excludente de ilicitude por legítima defesa.
Com efeito, não procede a alegação da defesa no sentido de que "o disparo se deu, de forma a preservar a integridade física do Apelante, eis que exposto a uma concentração grande de populares, bem como ter se dado logo após ter sofrido injusta agressão física imposta pela vítima" (sic, fl. 451).
E, com a devida vênia, entendo que tampouco restou configurada a excludente de ilicitude por estrito cumprimento de dever legal.
Assim como a tese de que o acusado teria agido para repelir injusta agressão a direito próprio, o reconhecimento de excludente de ilicitude por estrito cumprimento de dever legal é incompatível com as circunstâncias do caso concreto, pois restou demonstrado que o ofendido foi alvejado quando já se distanciava do local dos fatos e inclusive estava de costas para o acusado.
A versão dos fatos apresentada pelo réu, de que teria efetuado o disparo para deter a vítima, a qual, segundo afirma, teria resistido à ordem de prisão e o desacatado, não se mostra razoável a justificar a lesão corporal praticada. Não se cogita que um agente policial tenha o dever legal de atirar contra indivíduo que ofereça "resistência" à prisão fugindo do local dos fatos.
Mantém-se, portanto, a conclusão do Juízo a quo:
Subsidiariamente, a defesa requereu a diminuição da pena ao mínimo legal previsto no caput do art. 129 do Código Penal, reconhecendo-se a lesão corporal de natureza leve.
Não lhe assiste razão.
Conforme laudo de exame de corpo de delito realizado em 13.10.09, Luiz Santana sofreu lesão corporal de natureza grave, pois a agressão resultou em perigo de vida, sendo necessária pronta intervenção cirúrgica (fl. 83).
Apesar de o laudo posterior, elaborado em 18.10.16, ter concluído que Luiz Santana sofrera lesões corporais de natureza leve (fl. 389), a avaliação feita sete anos após os fatos não infirma a conclusão do primeiro laudo.
Sem reparos, portanto, à fundamentação da sentença:
Por todo o exposto, mantenho a condenação de José Wilson dos Reis por prática do crime do art. 129, § 1º, II, do Código Penal.
Dosimetria. O Juízo de 1º grau fixou a pena acima do mínimo legal, nos seguintes termos:
O apelante não se insurgiu contra a dosimetria.
Todavia, procedo à sua revisão, de ofício, por ofensa ao entendimento consolidado na Súmula n. 444 do Superior Tribunal de Justiça ("É vedada a utilização de inquéritos policiais e ações penais em curso para agravar a pena-base").
As informações nos autos acerca de antecedentes do acusado não trazem notícias de trânsito em julgado de condenações anteriores, vide fls. 57 e 62 e Apenso de Antecedentes.
Assim, afastada uma das circunstâncias judiciais desfavoráveis, reduzo a pena-base para 1 (um) ano e 6 (seis) meses de reclusão.
Na segunda fase da dosimetria, mantendo as agravantes reconhecidas pelo Juízo a quo, exaspero a pena em 1/3 (um terço), por incidência da agravante do art. 61, II, c, do Código Penal, perfazendo 2 (dois) anos de reclusão, e mais 1/3 (um terço) por incidência da agravante do art. 61, II, g, do Código Penal, totalizando 2 (dois) anos e 8 (oito) meses de reclusão, ausentes causas de diminuição ou aumento de pena.
Fixo o regime inicial aberto, nos termos do art. 33, § 2º, c, do Código Penal.
Incabível a substituição da pena privativa de liberdade por penas restritivas de direitos, nos termos do art. 44, I, do Código Penal, por tratar-se de crime cometido com violência.
Ante o exposto, NEGO PROVIMENTO ao recurso de apelação, e, de ofício, reduzo a pena-base imposta em 1º grau, perfazendo a pena definitiva de 2 (dois) anos e 8 (oito) meses de reclusão, a ser cumprida em regime inicial aberto.
É o voto.
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VOTO
JOSÉ WILSON DOS REIS foi denunciado como incurso no artigo 129, 1º, inciso II do Código Penal e no artigo 3º, i, da Lei 4.898/1965, nos seguintes moldes:
" Consta dos autos que o denunciado JOSÉ WILSON DOS REIS, no dia 26 de julho de 2009, por volta das 09h10, na Rodovia BR 176, altura do Km 453, Bairro Capinzal, no município de Registro, ofendeu a integridade corporal de Luiz Santana, produzindo-lhe a lesão corporal de natureza grave descrita nos Laudos de Exame de Lesões Corporais de fls. 41 e 58.
Assim agindo, também praticou, em tese, o crime de abuso de autoridade, já que é policial rodoviário federal e, por ocasião dos fatos, estava no exercício de suas funções, tendo atingido a incolumidade física da vítima.
Com efeito, conforme se apurou, no dia dos fatos, o caminhão conduzido por André Luiz Possamai se acidentou BR 115 e a carga ficou espalhada às margens da rodovia.
Algum tempo depois, o denunciado, policial rodoviário federal que estava no exercício das suas funções, esteve no local e pediu às pessoas que ali estavam para que não se aproximassem da carga, pelo que foi atendido.
Apesar de os presentes terem atravessado para o outro lado da rodovia, JOSÉ WILSON dirigiu-se até o local onde estavam e iniciou uma discussão com a vítima, entrando em luta corporal.
O ofendido se desvencilhou e começou a correr, ao passo que JOSÉ sacou a pistola que trazia consigo e desferiu um tiro que atingiu a nádega esquerda da vítima e saiu pela região próxima à sua virilha.
A vítima foi prontamente socorrida, mas sofreu lesões corporais de natureza grave, em razão do perigo de vida pela necessidade de ser submetida à cirurgia de emergência (fls. 83)."
Processado o feito, sobreveio sentença de fls. fls. 403/409 por meio da qual o apelante foi condenado ao cumprimento da pena de 3 (três) anos, 8 (oito) meses e 13 (treze) dias de reclusão, em regime aberto, como incurso no artigo 129, § 1º, inciso II do Código Penal.
Alega o apelante, em síntese, que agiu em legítima defesa própria, visando impedir que outros populares se estimulassem a se insurgirem contra o mesmo, que se encontrava sozinho no local dos fatos. Alternativamente, pretende a redução da pena para o mínimo legal.
Com razão, em parte.
A sentença condenatória foi apoiada no depoimento da testemunha Alessandro dos Santos Santana que afirmou que a luta corporal entre o réu e a vítima Luiz Santana teria se iniciado após este se negar a apresentar seus documentos pessoais ao acusado e em seguida começado a correr e tropeçado; quando o denunciado o agarrou pelo colarinho e o trouxe para perto da pista novamente; que o acusado pediu para o Sr. Luiz Santana se ajoelhar, e ao ele se recusar, tentou forçá-lo, o que ocasionou a queda de ambos, nesse momento, conseguindo se desvencilhar do acusado, a vítima começou a correr, ao passo que o acusado apontou a arma em sua direção e efetuou o disparo.
Também nos depoimentos da vítima e das testemunhas André Luiz Possamai, Eliseu Batista da Costa, Valdir Lara Alves e João Batista Paulino Filho que relataram a mesma sequência de eventos.
Ocorre que, no interrogatório judicial, afirmou o réu que não dava para saber quem estava esperando para fazer bico em eventual transbordo de carga e quem estava esperando para saquear a carga; que deu voz de prisão a Luiz Santana porque ao pedir documento e não ter sido atendido, pretendia detê-lo para averiguação, também que conhece o pessoal da seguradora e quem costuma fazer transbordo e nunca havia visto Luiz Santana fazendo transbordo. Também que, quando ocorre capotamento de veículo de carga, procura preservar a ordem e a disciplina porque o tempo para desobstruir a pista é muito pequeno e que toda vez que tem acidente na beira da pista, com grande número de pessoas , o saque de carga é iminente; por fim, que ao atirar procurava deter Luiz Santana.
O cenário que se me apresenta é a de ocorrência com caminhão com carga que tombou em rodovia federal e que o policial federal, verificou que muitas pessoas estavam próximas ao caminhão, e com o objetivo de evitar que a carga fosse saqueada ou ocorressem novos acidentes, tentou dispersar as pessoas, determinando que se afastassem do veículo acidentado, sendo que a suposta vítima se recusou a se afastar e apresentar seus documentos e, após, entrar em luta corporal, tentou fugir, momento em que o réu efetuou o disparo.
Embora entenda não ser caso de legítima defesa própria, como alegado pela defesa, é caso de exclusão de ilicitude, por estrito cumprimento do dever legal, nos termos do artigo 23 do Código Penal, que assim dispõe:
" Exclusão de ilicitude
Não há crime quando o agente pratica o fato:
(...)
III - em estrito cumprimento do dever legal ou no exercício regular de direito."
Ante o exposto, dou provimento ao recurso da defesa para absolver o réu, com fundamento no artigo 386, VI do Código de Processo Penal.
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Data e Hora: | 21/02/2019 18:42:26 |