Diário Eletrônico

PODER JUDICIÁRIO

TRIBUNAL REGIONAL FEDERAL DA 3ª REGIÃO

D.E.

Publicado em 29/03/2019
EMBARGOS INFRINGENTES E DE NULIDADE Nº 0016259-09.2014.4.03.6128/SP
2014.61.28.016259-5/SP
RELATOR : Desembargador Federal FAUSTO DE SANCTIS
EMBARGANTE : JOSE ADOLFO MACHADO
ADVOGADO : SP0000DPU DEFENSORIA PUBLICA DA UNIAO (Int.Pessoal)
EMBARGADO(A) : Justica Publica
No. ORIG. : 00162590920144036128 10P Vr SAO PAULO/SP

EMENTA

PENAL E PROCESSO PENAL. EMBARGOS INFRINGENTES. ART. 16 DA LEI Nº 7.492/1986. DOSIMETRIA PENAL - FIXAÇÃO DA PENA-BASE LEVANDO-SE EM CONSIDERAÇÃO O PERÍODO DILARGADO EM QUE SE OPEROU INSTITUIÇÃO FINANCEIRA. CRIME HABITUAL IMPRÓPRIO OU ACIDENTALMENTE HABITUAL, QUE SE PERFECTIBILIZA POR MEIO DE UM ATO DE OPERAÇÃO AO ARREPIO DE AUTORIZAÇÃO LEGAL OU MEDIANTE DECLARAÇÃO FALSA. HABITUAL/REITERADA OPERAÇÃO DE INSTITUIÇÃO FINANCEIRA (POR MAIS DE 23 - VINTE E TRÊS - ANOS), QUE DEVE SER LEVADA EM CONSIDERAÇÃO PARA RECRUDESCER A PENA-BASE. IMPROVIMENTO DOS EMBARGOS INFRINGENTES.
- A configuração típica da conduta nos limites insculpidos no tipo penal elencado no art. 16 da Lei nº 7.492/1986 independe da realização habitual em se operar, sem a devida autorização ou mediante declaração falsa, instituição financeira, bastando uma atuação neste desiderato para que o crime reste perfectibilizado, uma vez que a infração em tela é tida pela doutrina que se debruçou sobre o tema (citando, apenas exemplificativamente, o magistério de Rodolfo Tigre Maia in Dos crimes contra o Sistema Financeiro Nacional: anotações à Lei Federal nº 7.492/1986, São Paulo: Malheiros, 1996, págs. 107/109) como sendo crime habitual impróprio ou acidentalmente habitual.
- Todavia, a reiteração/habitualidade em se operar instituição financeira ao arrepio da presença de autorização ou mediante declaração falsa é aspecto que, ainda que não seja de relevo para a tipificação penal, deve ser levado em consideração pelo julgador quando da fixação da reprimenda que se está impondo ao agente criminoso, especificamente no contexto da sua 1ª etapa de cálculo (pena-base) sob o pálio das circunstâncias ou das consequências da infração penal.
- Mostra-se escorreita a majoração da pena-base levada a efeito pelo v. voto vencedor (incrementando-a de ½) na justa medida em que por demais dilargado o tempo em que o embargante operou, em desacordo com a legislação de regência, instituição financeira (vale dizer, pelo período de 1º de janeiro de 1993 a 22 de junho de 2016), mesmo tendo sido autuado pelo exercício ilegal e ilegítimo de sua atividade, sem se descurar da quantidade de vítimas em vários municípios que sua atividade atingiu. O caso dos autos não se encontra dentro dos limites triviais do tipo penal exatamente porque o exercício clandestino de atividade financeira por mais de 23 (vinte e três) anos não se coaduna com o comum cometimento da infração.
- Negado provimento aos Embargos Infringentes.

ACÓRDÃO

Vistos e relatados estes autos em que são partes as acima indicadas, decide a Egrégia Quarta Seção do Tribunal Regional Federal da 3ª Região, por maioria, negar provimento aos embargos infringentes e de nulidade opostos por José Adolfo Machado, nos termos do relatório e voto que ficam fazendo parte integrante do presente julgado.


São Paulo, 21 de março de 2019.
FAUSTO DE SANCTIS
Desembargador Federal


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EMBARGOS INFRINGENTES E DE NULIDADE Nº 0016259-09.2014.4.03.6128/SP
2014.61.28.016259-5/SP
RELATOR : Desembargador Federal FAUSTO DE SANCTIS
EMBARGANTE : JOSE ADOLFO MACHADO
ADVOGADO : SP0000DPU DEFENSORIA PUBLICA DA UNIAO (Int.Pessoal)
EMBARGADO(A) : Justica Publica
No. ORIG. : 00162590920144036128 10P Vr SAO PAULO/SP

RELATÓRIO

O DESEMBARGADOR FEDERAL FAUSTO DE SANCTIS:


Trata-se de Embargos Infringentes opostos por JOSE ADOLFO MACHADO (fls. 861/865) em face do v. acórdão prolatado pela 5ª Turma deste E. Tribunal Regional Federal (fls. 839, 844/849 e 851/854) que, por maioria, deu parcial provimento ao recurso de Apelação interposto pelo Ministério Público Federal (para exasperar a pena-base) e deu parcial provimento ao recurso de Apelação aviado pelo embargante (para reduzir a quantidade de dias-multa referente à pena de multa), fixando pena definitiva na casa de 01 ano e 06 meses de reclusão e de 15 dias-multa, em razão da perpetração do crime previsto no art. 16 da Lei nº 7.492/1986, nos termos do v. voto exarado pelo Eminente Desembargador Federal Andre Nekatschalow - restou vencido o Eminente Desembargador Federal Mauricio Kato, que dava parcial provimento ao apelo acusatório (para exasperar a pena-base em menor extensão) e dava parcial provimento ao apelo defensivo (em maior extensão para reduzir a quantidade de dias-multa acompanhando o relator), fixando pena definitiva em 01 ano e 03 meses de reclusão e em 12 dias-multa. O v. acórdão encontra-se assim ementado:


PROCESSO PENAL. CRIMES CONTRA O SISTEMA FINANCEIRO. ART. 16 DA LEI N. 7.492/86. MATERIALIDADE E AUTORIA COMPROVADAS. DOSIMETRIA. PENA-BASE. CONFISSSÃO ESPONTÂNEA. REINCIDÊNCIA. REGIME INICIAL DE CUMPRIMENTO DE PENA. 1. A materialidade restou comprovada pela prova documental que indica que a empresa atuou sem a devida autorização pelo Banco Central do Brasil. 2. A autoria delitiva restou demonstrada pelo conjunto probatório e foi confirmada pelo acusado, que em Juízo, confessou a prática do crime, fazendo operar administradora de consórcios sem a devida autorização. 3. O dolo resta comprovado pelas declarações do acusado, que indicam que tinha ciência de que sua conduta configurava a prática do delito a ele imputado e que conhecia toda a legislação relativa a atividade desempenhada pela empresa e da obrigatoriedade da autorização. O réu tinha pleno conhecimento da existência do tipo penal. Além de já ter sido condenado pela prática do mesmo delito em ação criminal anterior, foi questionado e autuado em diversas ocasiões e persistiu em manter as atividades da administradora de consórcio não autorizada pelo Banco Central. O réu confirmou ter perpetrado o delito em sede judicial. 4. É justificável a fixação da pena-base acima do mínimo legal considerando que o acusado persistiu na conduta criminosa ao longo de anos, mesmo após já ter sido notificado e autuado pelo exercício da atividade sem a autorização e, ainda, em razão das consequências do delito, que atingiu a centenas de pessoas em diversos municípios, havendo condenação em ação civil pública. 5. São irrelevantes os motivos pelos quais o agente teria sido levado a confessar o delito perante a autoridade para fazer jus à incidência da atenuante genérica (STJ, HC n. 159.854, Rel. Min. Laurita Vaz, j. 15.06.10; HC n. 117.764, Rel. Min. Og Fernandes, j. 11.05.10; HC n. 46.858, Rel. Min. Hamilton Carvalhido, j. 13.11.07; HC n. 79.381, Rel. Min. Nilson Naves, j. 23.10.07). Assim, pouco importa que o réu tenha sido preso em flagrante, bastando o reconhecimento da prática do delito (STF, HC n. 69.479-RJ, Rel. Min. Marco Aurélio, unânime, DJ 18.12.02, p. 384). 6. 'É possível, na segunda fase da dosimetria da pena, a compensação da atenuante da confissão espontânea com a agravante da reincidência' (STJ, REsp n. 1.341.370, Rel. Min. Sebastião Reis Júnior, j. 10.04.13, para os fins do art. 543-C do CPC). Assim, revejo o entendimento anterior quanto à preponderância da agravante da reincidência sobre a atenuante da confissão. 7. Não obstante o acusado ser reincidente, a quantidade de pena a ele imposta também é considerado para determinar o regime inicial de cumprimento de pena, de maneira que o semiaberto se mostra o cabível ao caso dos autos. 8. Apelações providas parcialmente.

O embargante pleiteia a reforma do julgado a fim de que prevaleça o posicionamento constante do v. voto vencido de modo que seja aumentada a pena-base tão somente em ¼ em razão das consequências do delito serem negativas (e não em ½ conforme constou do v. voto vencedor), redundando em reprimenda definitiva na casa de 01 ano e 03 meses de reclusão e de 12 dias-multa.


O Parquet federal, em contrarrazões, pugnou pelo não provimento dos Embargos Infringentes (fls. 891/893).


É o relatório.


À revisão.


FAUSTO DE SANCTIS
Desembargador Federal Relator


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EMBARGOS INFRINGENTES E DE NULIDADE Nº 0016259-09.2014.4.03.6128/SP
2014.61.28.016259-5/SP
RELATOR : Desembargador Federal FAUSTO DE SANCTIS
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VOTO

O DESEMBARGADOR FEDERAL FAUSTO DE SANCTIS:


Trata-se de Embargos Infringentes opostos por JOSE ADOLFO MACHADO com o objetivo de que prevaleça o v. voto vencido proferido pelo Eminente Desembargador Federal Mauricio Kato (fls. 851/852), que dava parcial provimento ao apelo acusatório para exasperar a pena-base em menor extensão do que a que restou imposta pelo v. voto vencedor (fls. 846/849) - dentro de tal contexto, requer que a majoração da reprimenda em cálculo na 1ª etapa da dosimetria seja elastecida apenas em ¼ em razão das consequências do delito serem deletérias.


DA DOSIMETRIA PENAL - 1ª ETAPA - ANÁLISE DO CASO CONCRETO


Compulsando a presente relação processual penal, depreende-se, a teor do v. voto vencedor (fls. 846/849), da lavra do Eminente Desembargador Federal Andre Nekatschalow, que a pena-base restou assim fixada: (...) É justificável a fixação da pena-base acima do mínimo legal considerando que o acusado persistiu na conduta criminosa ao longo de anos, mesmo após já ter sido notificado e autuado pelo exercício da atividade sem a autorização e, ainda, em razão das consequências do delito, que atingiu a centenas de pessoas em diversos municípios, havendo condenação em ação civil pública (fls. 66/73, 80/91 e 94). Portanto, a pena-base é fixada 1/2 (metade) acima do mínimo legal, em 1 (um) ano e 6 (seis) meses de reclusão e 15 (quinze) dias-multa (...).


Por sua vez, o v. voto vencido (fls. 851/852), proferido pelo Eminente Desembargador Federal Mauricio Kato, no que tange à 1ª etapa da dosimetria, restou assim talhado: (...) Narra a denúncia que, de 1989 até a data de oferecimento da denúncia (22.06.2016), o acusado, na condição de representante e administrador da empresa Sermac Administração de Consórcios S/C, fez operar continuamente pessoa jurídica equiparada a instituição financeira, sem a devida autorização. Prossegue a inicial relatando que o acusado constituiu planos de consórcios de diversos bens, inclusive imóveis, e os ofertou ao público de diversos municípios de São Paulo, razão pela qual o empreendimento veio a ser autuado pelo Banco Central do Brasil, que além de impor multas pretende a cessação das atividades. Dessa forma, José teria causado prejuízo a diversos consorciados, uma vez que a empresa não tem patrimônio líquido mínimo para atuar no ramo de consórcio de bens imóveis, caracterizando instituição financeira. Após a instrução processual, o acusado foi condenado pela prática do delito previsto no artigo 16 da Lei n. 7.492/86 à pena privativa de liberdade de 1 (um) ano, 5 (cinco) meses e 26 (vinte e seis) dias de reclusão, em regime inicial semiaberto, além do pagamento de 58 (cinquenta e oito) dias multa, no valor unitário de 1/30 (um trigésimo) do salário mínimo vigente em 22.06.16. O magistrado de 1º grau aumentou a pena base em 4 meses e 15 dias acima do mínimo legal, fixando-a em 1 (um) ano, 4 (quatro) meses e 15 (quinze) dias de reclusão, baseado nos seguintes argumentos: (...). Por sua vez, o relator aumentou a pena base na fração de 1/2 (metade) com fundamento na conduta social do acusado, bem como nas consequências do delito, senão vejamos: (...). No particular, verifico que a conduta do acusado não ultrapassou os limites do tipo penal, sem justificar um maior grau de reprovabilidade da mesma. Entendo cabível considerar apenas as consequências do delito para majorar a pena base do acusado, de modo a aumentar a pena na fração de 1/4 (um quarto), totalizando, nesta fase, 1 (um) ano e 3 (três) meses de reclusão e 12 (doze) dias-multa (...).


A fim de que seja possível melhor aquilatar qual a pena-base cabível à espécie, mostra-se pertinente tecer breves comentários (até mesmo porque não houve divergência no ponto) acerca de como se deram os fatos que ensejaram a condenação do embargante pela prática do crime insculpido no art. 16 da Lei nº 7.492/1986. Nesse diapasão, tendo como supedâneo o v. voto vencedor (na justa medida em que, como dito, não se nota qualquer divergência de julgamento no que concerne à dinâmica dos fatos), a presente Ação Penal tem como escopo a perquirição da prática do crime anteriormente mencionado atinente ao período de 1º de janeiro de 1993 a 22 de junho de 2016, uma vez que o embargante em tela já tinha sido processado por fatos análogos relativos a interregno anterior ao ano de 1993 (a propósito, cite-se o acolhimento de exceção de coisa julgada na qual delimitada a imputação presente).


Por sua vez, infere-se da confissão judicial do embargante (interrogatório) que ele era o gestor da empresa SERMAC desde a sua criação nos idos de 1989, empresa esta que sempre atuou no ramo de administração de consórcios. Declinou que exercia a atividade sem autorização do Banco Central do Brasil e que a primeira fiscalização suportada pela pessoa jurídica fora levada a efeito em 1993, sendo que, após idas e vindas na tentativa de regularizar a situação da sociedade empresária, resolveu desistir de tal intento, atuando, assim, sem qualquer autorização, tendo assumido que era o único administrador do empreendimento.


Firmadas as premissas fáticas anteriormente deduzidas, importante ressaltar que o crime elencado no art. 16 da Lei nº 7.492/1986 possui a seguinte redação: Fazer operar, sem a devida autorização, ou com autorização obtida mediante declaração (Vetado) falsa, instituição financeira, inclusive de distribuição de valores mobiliários ou de câmbio. A teor da transcrição do preceito primário do tipo, verifica-se que a infração penal em tela é crime habitual impróprio ou acidentalmente habitual, sendo que apenas uma conduta tem relevância para configurá-lo, embora sua reiteração não corresponda à pluralidade de crimes - nesse diapasão, não custa ser rememorado que crime habitual é o que contém comportamentos idênticos e repetidos, que só se perfazem em decorrência de uma ação reiterada (PRADO, Luiz Régis. Curso de direito penal brasileiro, 7ª edição, São Paulo: RT, 2007, volume 01, pag. 35).


A propósito, muito esclarecedora a doutrina de Rodolfo Tigre Maia acerca do tema (in Dos crimes contra o Sistema Financeiro Nacional: anotações à Lei Federal nº 7.492/1986, São Paulo: Malheiros, 1996, págs. 107/109):


(...) É incriminada pelo dispositivo a ação de 'fazer operar instituição financeira'. O núcleo verbal permite duas aproximações exegéticas, que conduzem a diferentes patamares de aplicação da norma: a) A primeira aponta para a necessidade da criação de uma estrutura organizacional análoga à de uma instituição financeira regular, própria ou equiparada, quer efetivamente realizando atividades financeiras sem objetivar precipuamente lesar seus usuários, quer simulando-as ou distorcendo-as, como meio para lograr os incautos que busquem seus serviços. Em resumo, nesta perspectiva o tipo exigiria, para além do mero exercício de atividade financeira, a presença de um simulacro, da fachada de uma instituição financeira legítima ou, mesmo, de uma ramificação não autorizada de uma instituição legalmente habilitada a funcionar. Esta visão traz implícita a caracterização do ilícito como crime habitual próprio, exigindo a prática reiterada das ações previstas no tipo para caracterizá-lo. b) A segunda abordagem concentra-se na identificação da presença de 'atividade financeira própria ou por equiparação', bastando o reconhecimento do exercício desautorizado de qualquer ato negocial característico de tais instituições, consoante definidas pelo art. 1º da Lei de Regência, para conformar a incidência típica, independente de a mesma se dar no âmbito ou não de um arcabouço estrutural/funcional similar ao usado por esta, ou de ser reiteradamente praticada, aos moldes da primeira enunciação. (...) Qual a melhor exegese? Estamos que é a fornecida pela segunda posição. A uma, porque o tipo objetivo é inequívoco: trata-se não de criar, ou de organizar, ou de realizar múltiplas operações, mas de fazer operar, qual seja, pôr em funcionamento, atuar no mercado como instituição financeira; e o que a identifica como tal, ao menos neste dispositivo, é exatamente 'realizar atividade financeira, quer própria, quer equiparada por envolver recursos de terceiros'. A duas, porque a Lei de Regência, em seu art. 1º, parágrafo único, I, estende sua incidência às atividades financeiras eventualmente realizadas por pessoas físicas, equiparando-as às instituições financeiras, deixando manifesto que considera relevante para fins de repressão tais espécies de condutas. Finalmente, a criação de uma instituição financeira como mera 'fachada' para lograr terceiros, sem que se realizem efetivamente operações financeiras, ao menos por equiparação (v.g. consórcios, seguros etc.), configuraria estelionato e não crime contra o SFN. É que, como já sublinhamos, a Constituição reservou ao Estado o poder de autorizar e disciplinar o funcionamento de tais instituições para preservar os investidores e o mercado. (...) Não há necessidade de causação de prejuízos a terceiros ou de reiteração da prática de atividades financeiras, configurando-se delito habitual impróprio de perigo abstrato (...) - destaque nosso.

Portanto, a teor do que se acaba de expor, a configuração típica da conduta nos limites insculpidos no tipo penal elencado no art. 16 da Lei nº 7.492/1986 independe da realização habitual em se operar, sem a devida autorização ou mediante declaração falsa, instituição financeira, bastando uma atuação neste desiderato para que o crime reste perfectibilizado. Calha destacar, entretanto, que a reiteração/habitualidade em se operar instituição financeira ao arrepio da presença de autorização ou mediante declaração falsa é aspecto que, ainda que não seja de relevo para a tipificação penal, deve ser levado em consideração pelo julgador quando da fixação da reprimenda que se está impondo ao agente criminoso, especificamente no contexto da sua 1ª etapa de cálculo (pena-base) sob o pálio das circunstâncias ou das consequências da infração penal.


Retomando o curso por meio da análise do caso concreto, mostra-se escorreita a majoração da pena-base levada a efeito pelo v. voto vencedor (incrementando-a de ½) na justa medida em que por demais dilargado o tempo em que o embargante operou, em desacordo com a legislação de regência, instituição financeira (vale dizer, pelo período de 1º de janeiro de 1993 a 22 de junho de 2016), mesmo tendo sido autuado pelo exercício ilegal e ilegítimo de sua atividade, sem se descurar, conforme bem destacado pelo Eminente Desembargador Federal Andre Nekatschalow, a quantidade de vítimas em vários municípios que sua atividade atingiu.


Desta feita, imperioso que prevaleça o incremento na 1ª etapa da dosimetria penal nos termos em que fixados pelo v. voto vencedor, sendo relevante salientar que o caso dos autos não se encontra dentro dos limites triviais do tipo penal exatamente porque o exercício clandestino de atividade financeira por mais de 23 (vinte e três) anos não se coaduna com o comum cometimento da infração. Devem, pois, serem refutados os argumentos ventilados nos presentes Embargos Infringentes, mantendo-se, por consequência, a dosimetria penal constante do v. voto vencedor.


DISPOSITIVO


Ante o exposto, voto por NEGAR PROVIMENTO aos Embargos Infringentes opostos por JOSE ADOLFO MACHADO, nos termos anteriormente expendidos.


FAUSTO DE SANCTIS
Desembargador Federal


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Data e Hora: 26/03/2019 08:55:56