Diário Eletrônico

PODER JUDICIÁRIO

TRIBUNAL REGIONAL FEDERAL DA 3ª REGIÃO

D.E.

Publicado em 22/08/2019
EMBARGOS INFRINGENTES E DE NULIDADE Nº 0010067-29.2010.4.03.6119/SP
2010.61.19.010067-4/SP
RELATOR : Desembargador Federal ANDRÉ NEKATSCHALOW
EMBARGANTE : ROEI SHALOM HAGAG
ADVOGADO : ANDRE GUSTAVO BEVILACQUA PICCOLO (Int.Pessoal)
: SP0000DPU DEFENSORIA PUBLICA DA UNIAO (Int.Pessoal)
EMBARGANTE : LIRAZ AVRAHAM
ADVOGADO : ANDRE GUSTAVO BEVILACQUA PICCOLO (Int.Pessoal)
: SP0000DPU DEFENSORIA PUBLICA DA UNIAO e outro(a)
EMBARGADO(A) : Justica Publica
No. ORIG. : 00100672920104036119 2 Vr GUARULHOS/SP

EMENTA

PENAL. PROCESSUAL PENAL. EMBARGOS INFRINGENTES. CAUSA DE DIMINUIÇÃO DO ART. 33, § 4º, DA LEI N. 11.343/06. INCIDÊNCIA NO MÍNIMO LEGAL (1/6). CONDUTA RELEVANTE PARA A ORGANIZAÇÃO CRIMINOSA. PROVIMENTO PARCIAL.
1. Verifica-se que estão preenchidos os requisitos cumulativos do § 4º do art. 33 da Lei n. 11.343/06. Os réus são primários e não têm maus antecedentes. Realizaram uma viagem ao Brasil poucos meses antes do fato, por curto período de tempo. Embora tenham declarado estarem passando por situação econômica difícil, não ficou esclarecido quem financiou a viagem anterior ao Brasil e qual finalidade dela, sendo incompatível com a suas condições financeiras. No entanto, não se pode concluir que se dedicam a atividade criminosa em razão dessa viagem não justificada. Além disso, o fato dos acusados terem realizado o transporte de 5.035 (cinco mil e trinta e cinco) gramas de cocaína, que é considerada uma quantidade elevada de entorpecente, ocultadas em forros falsos das malas, demonstram que desempenhavam função relevante para a organização, mas não indica que a integravam.
2. A jurisprudência do Superior Tribunal de Justiça é no sentido de que o conhecimento pelo agente de estar a serviço do crime organizado para o tráfico transnacional de entorpecentes constitui fundamento concreto e idôneo a ser valorado para fins de estabelecimento da incidência da causa de diminuição de pena do art. 33, § 4º, da Lei n. 11.343/06 no mínimo legal, ante a gravidade da conduta perpetrada (STJ, HC n. 387.077, Rel. Min. Ribeiro Dantas, j. 06.04.17). A redução, por conta disso, será de 1/6 (um sexto), diminuída a pena e tornada definitiva em 5 (cinco) anos, 8 (oito) meses e 1 (um) dia de reclusão, e 566 (quinhentos e sessenta e seis) dias-multa, mantidos, no mais, o voto vencedor.
3. Embargos infringentes parcialmente providos.

ACÓRDÃO

Vistos e relatados estes autos em que são partes as acima indicadas, decide a Egrégia Quarta Seção do Tribunal Regional Federal da 3ª Região, por unanimidade, dar parcial provimento aos embargos infringentes para aplicar a causa de diminuição do art. 33, § 4º, da Lei n. 11.343/06 no mínimo legal, diminuída as penas em 1/6 (um sexto), tornando-as definitivas em 5 (cinco) anos, 8 (oito) meses e 1 (um) dia de reclusão, e 566 (quinhentos e sessenta e seis) dias-multa, mantido, no mais, o voto vencedor, nos termos do relatório e voto que ficam fazendo parte integrante do presente julgado.


São Paulo, 15 de agosto de 2019.
Andre Nekatschalow
Desembargador Federal Relator


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EMBARGOS INFRINGENTES E DE NULIDADE Nº 0010067-29.2010.4.03.6119/SP
2010.61.19.010067-4/SP
RELATOR : Desembargador Federal ANDRÉ NEKATSCHALOW
EMBARGANTE : ROEI SHALOM HAGAG
ADVOGADO : ANDRE GUSTAVO BEVILACQUA PICCOLO (Int.Pessoal)
: SP0000DPU DEFENSORIA PUBLICA DA UNIAO (Int.Pessoal)
EMBARGANTE : LIRAZ AVRAHAM
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RELATÓRIO

Trata-se de embargos infringentes e de nulidade interpostos por Roei Shalow Hagag e Liraz Avraham contra o acórdão de fls. 646/647 e 657/668v., proferido pela 1ª Turma, que, por maioria, deu parcial provimento à apelação do Ministério Público Federal para elevar a pena-base, afastar a causa de diminuição de pena previstas no art. 33, § 4º, da Lei n. 11.343/06, bem como vedou a substituição da pena privativa de liberdade por restritivas de direitos, negou provimento às apelações defensivas, e, de ofício, aplicou a atenuante de confissão espontânea a acusada Liraz, nos termos do relatório e voto do Relator, acompanhado pelo Des. Fed. Valdeci dos Santos, vencido o Des. Fed. Wilson Zauhy que dava parcial provimento ao recurso dos réus para aplicar a causa de diminuição de pena prevista no art. 33, § 4º, da Lei n. 11.343/06 em 2/3 (dois terços), resultando nas penas definitivas de 2 (dois) anos e 9 (nove) dias reclusão e 202 (duzentos e dois) dias-multa, para cada réu, fixando o regime inicial aberto para cumprimento de pena, manteve, para ambos os réus, a fixação de cada dia-multa no valor unitário mínimo, na data da consumação do delito, e a substituição das penas privativas de liberdade por duas penas restritivas de direitos, consistentes em prestação de serviços à comunidade e limitação de fim-de-semana, nos termos a serem definidos pelo Juízo da Execução, por maioria, determinou a imediata expedição de mandado de prisão, nos termos do entendimento firmado pelo STF no HC 126.292 e ADC's 43 e 44.
A ementa foi redigida nos seguintes termos:

PENAL. TRÁFICO INTERNACIONAL DE ENTORPECENTES. AUTORIA E MATERIALIDADE COMPROVADAS. TESTE PERICIAL POR AMOSTRAGEM. INEXIGILIDADE DE CONDUTA DIVERSA AFASTADA. DOSIMETRIA. PENA-BASE. AGRAVANTE DO ART. 62, IV, DO CÓDIGO PENAL. NÃO INCIDÊNCIA. CIRCUNSTÂNCIA ATENUANTE DA CONFISSÃO. APLICABILIDADE. CAUSA DE AUMENTO DA PENA PELA INTERNACIONALIDADE DO DELITO. INOCORRÊNCIA DE BIS IN IDEM. MANTIDO O PATAMAR FIXADO EM PRIMEIRO GRAU. "MULAS" DO TRÁFICO. BENESSE DO § 4º DO ART. 33 DA LEI Nº 11.343/06 INCOMPATÍVEL COM A REPRESSÃO À NARCOTRAFICÂNCIA. REQUISITOS NÃO PREENCHIDOS. REGIME FECHADO. SUBSTITUIÇÃO DE PENA PRIVATIVA DE LIBERDADE POR RESTRITIVA DE DIREITOS. DESCABIMENTO. RECURSO MINISTERIAL PARCIALMENTE PROVIDO. RECURSOS DEFENSIVOS DESPROVIDOS.
1. Os réus foram denunciados pela prática do delito descrito no art. 33 e 40, I, da Lei nº 11.343/06, por serem flagrados prestes a embarcar com destino ao exterior, transportando 5.035 g (cinco mil e trinta e cinco gramas) de cocaína.
2. Materialidade e autoria comprovadas pelo conjunto probatório coligido aos autos.
3. Descabida a alegação de que não restou evidenciado que a totalidade da substância fosse cocaína, porque apenas uma parte do material apreendido foi submetida ao narcoteste. Com efeito, é prática comum proceder-se ao exame pericial toxicológico utilizando-se apenas pequena amostra do total do entorpecente apreendido, quando o material se apresenta homogêneo, como no caso dos autos, consoante afirmaram em Juízo os peritos subscritores do laudo definitivo, que seguiram procedimento preconizado pela Academia Nacional de Polícia.
4. Não merece acolhida a tese da Defesa de estado da necessidade exculpante, uma vez que não foram carreadas aos autos provas contundentes das circunstâncias alegadas, nos termos do art. 156 do Código de Processo Penal. Tanto a coação moral irresistível como o estado de necessidade devem ser comprovados por meios seguros, que demonstrem a presença de todos os seus elementos caracterizadores, não podendo ser reconhecidos com fundamento em meras alegações da Defesa.
5. Mantido o decreto condenatório pela prática do delito previsto no art. 33, caput, c.c. o art. 40, I, ambos da Lei nº 11.343/06.
6. Dosimetria da pena. Pena-base majorada com fundamento no art. 42 da Lei nº 11.343/06. Precedentes dos Tribunais Superiores.
7. Não incide, in casu, a circunstância agravante da prática do delito mediante paga ou promessa de recompensa descrita no art. 62, IV, do Código Penal, pois o pagamento é circunstância implícita ao tipo penal do tráfico de entorpecentes, em especial, àqueles que são contratados para o transporte da droga.
8. O Juízo de primeiro grau aplicou a atenuante da confissão espontânea apenas ao corréu ROEI. Aplica-se ao caso, de ofício, a circunstância atenuante prevista no art. 65, III, d, do Código Penal também à corré LIRAZ. O fato de a ré ter sido presa em flagrante não é óbice ao reconhecimento da confissão, uma vez que a espontaneidade exigida pela norma prescinde de motivos. Ademais, a confissão foi usada por este Relator como fundamento para a manutenção do decreto condenatório. Precedentes.
9. Não merece prosperar a alegação da Defesa de ocorrência de bis in idem na aplicação da causa de aumento prevista no artigo 40, I, da Lei de Drogas, com a conduta típica "exportar", uma vez que se trata de delito de ação múltipla e os réus incidiram nos verbos "transportar" e "trazer consigo". Registro, outrossim, que a distância a ser percorrida pela droga não é variável a ser cotejada, conforme precedentes desta Corte Regional. Mantida a causa de aumento à razão de 1/6 (um sexto).
10. Causa de diminuição de pena do art. 33, § 4º, da Lei nº 11.343/06 inaplicável em caso envolvendo as chamadas "mulas", as quais desenvolvem atividade essencial na estrutura organizacional, levando o tóxico para ser entregue a integrante da associação criminosa no exterior. Benesse incompatível com a repressão à narcotraficância. Desta feita, sem desconsiderar a significativa quantidade de droga apreendida com os réus, denotativa de seu enredamento com organização criminosa, inaplicável a mencionada causa de diminuição.
11. A grande quantidade de cocaína (5.035g Kg); a forma como estava oculta sob o forro falso da bagagem dos réus; a circunstância de terem empreendido viagem internacional, com hospedagem e despesas financiadas pela narcotraficância, o fato dos réus já terem estado no país anteriormente, udo está a denotar seu enredamento, ainda que não habitual, com organização criminosa voltada para o comércio internacional de cocaína, arredando a incidência da norma do § 4º do art. 33 da Lei Antidrogas.
12. Recentíssimos julgados do Superior Tribunal de Justiça se fundam na quantidade da droga confiada ao transportador e circunstâncias do caso concreto para afastar a aplicação da minorante em questão. Precedentes.
13. Regime inicial fechado de cumprimento de pena, nos termos do art. 33, § 3º, do Código Penal.
14. Incabível, in casu, a substituição da pena privativa de liberdade por restritiva de direitos, porquanto não preenchidos os requisitos objetivos e subjetivos do art. 44 do Código Penal.
15. Apelo ministerial parcialmente; apelos defensivos desprovidos e, de ofício, aplicada a atenuante da confissão espontânea à corré LIRAZ.

Os embargantes requerem, em síntese, que prevaleça o voto vencido do Des. Fed. Wilson Zauhy para aplicar a causa de diminuição prevista no art. 33, § 4º, da Lei 11.343/06 na fração de 2/3 (dois terços), visto que são primários e possuem bons antecedentes, e não há prova nos autos de que participassem de organização criminosa (fls. 674/680).
A Ilustre Procuradora Regional da República, Dra. Cristina Marelim Vianna, manifestou-se pelo desprovimento dos embargos infringentes (fls. 685/690).
É o relatório.
À revisão, nos termos regimentais.

Andre Nekatschalow
Desembargador Federal Relator


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EMBARGOS INFRINGENTES E DE NULIDADE Nº 0010067-29.2010.4.03.6119/SP
2010.61.19.010067-4/SP
RELATOR : Desembargador Federal ANDRÉ NEKATSCHALOW
EMBARGANTE : ROEI SHALOM HAGAG
ADVOGADO : ANDRE GUSTAVO BEVILACQUA PICCOLO (Int.Pessoal)
: SP0000DPU DEFENSORIA PUBLICA DA UNIAO (Int.Pessoal)
EMBARGANTE : LIRAZ AVRAHAM
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VOTO

O voto vencedor do Desembargador Federal Hélio Nogueira não aplicou a causa de diminuição prevista no art. 33, § 4º, da Lei n. 11.343/06, nos seguintes termos:

No que tange à causa de diminuição da pena capitulada no art. 33, § 4º, da Lei nº 11.343/06, a Acusação pretende o afastamento da benesse e a Defesa dos corréus objetiva a sua fixação no patamar máximo.
Assiste razão ao Parquet.
Neste ponto, curial deixar anotado que tal benesse concedida pelo legislador deve ficar restrita - quando presentes todos os requisitos legais - a casos excepcionais, de menor gravidade, ou seja, pequenos traficantes, atuantes no mercado doméstico, envolvendo entorpecentes que se possam caracterizar, em princípio, como menos lesivos, e nunca a traficantes internacionais de expressiva quantidade de cocaína - como é a hipótese dos autos, em que os réus sujeitaram-se a realizar o transporte de 5.035g de cocaína, sob forro falso da bagagem, para levá-la até Tel Aviv/Israel (neste sentido: Tribunal Regional Federal da 3ª Região - ACR 27998 - Proc. nº 2006.61.19.005166-0 - 5ª T. - Rel. Juiz Conv. Hélio Nogueira - j. 14.04.08 - D.E. 06.05.08).
Extrai-se, pois, dos autos, pela grande quantidade de substância entorpecente apreendida (5.035g de cocaína); a forma como estava oculta sob o forro falso da bagagem dos réus; o fato de já terem estado anteriormente no Brasil, mesmo alegando não possuírem condições financeiras, por curto período de tempo, conforme consta dos registros dos respectivos passaportes, a circunstância de terem empreendido viagem internacional com hospedagem e despesas financiadas pela narcotraficância, tudo está a denotar o enredamento dos réus, ainda que não habitual, com organização criminosa voltada para o comércio internacional de cocaína, arredando a incidência da norma do § 4º do art. 33 da Lei Antidrogas.
Recentíssimos julgados do Superior Tribunal de Justiça se fundam na quantidade da droga confiada ao transportador e circunstâncias do caso concreto para afastar a aplicação da minorante em questão.
Nesse sentido:
"...7. No caso, revelava-se inviável a aplicação da causa especial de diminuição, tendo em vista a quantidade expressiva de entorpecente apreendido, ou seja, 7.935 g de cocaína e a intensidade da conduta, reveladora de que o réu se dedica a atividades criminosas, razão pela qual a discussão acerca da fração de redução é descabida uma vez que o réu não faria jus à qualquer redução.(...)" (g.n.)
(AgRg no REsp 1446504/SP, Rel. Ministro JORGE MUSSI, QUINTA TURMA, julgado em 23/10/2018, DJe 29/10/2018)
"(...)2. Nos termos do entendimento deste Superior Tribunal de Justiça "Revela-se inviável a aplicação da causa especial de diminuição prevista no § 4º do art. 33 da Lei 11.343/06, porquanto as circunstâncias do caso - existência de diversas viagens de curta duração registradas no passaporte do sentenciado e por ele não justificadas devidamente - levaram a conclusão de que não se tratava de traficante ocasional, mas sim que fazia do tráfico internacional de entorpecentes seu meio de vida, ou seja, que se dedicaria a atividades delituosas" (HC 203.231/SP, Rel. Ministro JORGE MUSSI, QUINTA TURMA, julgado em 27/11/2012, DJe 14/12/2012). Súmula 568/STJ.(...)"
AgRg no AREsp 1328838/SP, Rel. Ministra MARIA THEREZA DE ASSIS MOURA, SEXTA TURMA, julgado em 21/08/2018, DJe 03/09/2018)
"(...)- Na ausência de indicação pelo legislador das balizas para o quantum da redução retromencionada, a natureza e a quantidade de droga apreendida, assim como as demais circunstâncias do art. 59, do CP, podem ser utilizadas na definição de tal índice ou, até mesmo, no impedimento da incidência da minorante, quando evidenciarem, juntamente com as outras circunstâncias do delito, a dedicação do agente ao tráfico de entorpecentes.(...)"
(AgRg no HC 457.489/SC, Rel. Ministro REYNALDO SOARES DA FONSECA, QUINTA TURMA, julgado em 06/11/2018, DJe 16/11/2018)
No caso, a quantidade de 5.035 g. de cocaína, revela-se elevada e, aliada à reiteração de viagens, sem justificativas, ao Brasil, resta presente um conjunto de elementos suficientes para a não aplicação da causa de redução de pena.
Desta feita, inaplicável a mencionada causa de diminuição, restando definitiva a pena de 06 anos 09 meses 20 dias de reclusão e pagamento de 681 dias-multa, no valor unitário de 1/30 do salário mínimo vigente à época dos fatos, corrigido monetariamente.
O voto vencido do Desembargador Federal Wilson Zauhy aplicou a causa de diminuição prevista no art. 33, § 4º, da Lei n. 11.343/06, na fração de 2/3 (dois terços), nos seguintes termos:

Na terceira fase, aplicável a majorante da transnacionalidade, que se configura com a prova da destinação internacional das drogas, "ainda que não consumada a transposição de fronteiras" (Súmula 607/STJ), à razão de 1/6, majorando-se a pena para 6 anos e 27 dias de reclusão e 606 dias-multa.
Extrai-se dos autos que os réus ROEI SHALOM HAGAG e LIRAZ AVRAHAM são primários, não ostentam maus antecedentes e não há prova de que se dediquem a atividades criminosas ou integrem organização criminosa, não sendo suficiente para que se conclua de modo diverso a quantidade de droga a eles confiada, tampouco o fato de terem eles estado no país anteriormente, sem a demonstração de que aquela viagem estivesse relacionada a qualquer conduta delitiva, sob pena de se incorrer em "indisfarçável inversão do ônus da prova e, no extremo, na nulificação da máxima que o operacionaliza o direito à presunção de não-culpabilidade: in dubio pro reo" (STF, HC 97.701/MS, Rel. Min. Ayres Britto, j. 03/04/2012).
Infere-se que as condutas dos réus se ajustam à figura que se convencionou chamar de "mula" (STJ: AgRg no AREsp 4300109, j. 4.2.2014).
Sob esse aspecto, as mulas funcionam como agentes ocasionais de transporte de drogas, não integram, necessariamente, os quadros das organizações criminosas, tampouco tal condição indica a prática habitual delitiva, fazendo-se necessária a análise dos demais elementos constantes nos autos para afastamento da causa de diminuição de pena em questão.
Nesse sentido decidiu recentemente a Segunda Turma do C. STF no bojo do HC 131795 de Relatoria do E. Min. Teori Zavascki, julgado em 03/05/2016, confira-se:
"HABEAS CORPUS. TRÁFICO DE DROGAS. CAUSA DE DIMINUIÇÃO DA PENA PREVISTA NO ART. 33, § 4º, DA LEI 11.343/2006. APLICAÇÃO. TRANSPORTE DE DROGA. EXAME DAS CIRCUNSTÂNCIAS DA CONDUTA. ATUAÇÃO DA AGENTE SEM INTEGRAR ORGANIZAÇÃO CRIMINOSA. 1. A não aplicação da minorante prevista no § 4º do art. 33 da Lei 11.343/2006 pressupõe a demonstração pelo juízo sentenciante da existência de conjunto probatório apto a afastar ao menos um dos critérios - porquanto autônomos -, descritos no preceito legal: (a) primariedade; (b) bons antecedentes; (c) não dedicação a atividades criminosas; e (d) não integração à organização criminosa. Nesse juízo, não se pode ignorar que a norma em questão tem a clara finalidade de apenar com menor grau de intensidade quem pratica de modo eventual as condutas descritas no art. 33, caput e § 1º, daquele mesmo diploma legal em contraponto ao agente que faz do crime o seu modo de vida, razão pela qual, evidentemente, não estaria apto a usufruir do referido benefício. 2. A atuação da agente no transporte de droga, em atividade denominada "mula", por si só, não constitui pressuposto de sua dedicação à prática delitiva ou de seu envolvimento com organização criminosa. Impõe-se, para assim concluir, o exame das circunstâncias da conduta, em observância ao princípio constitucional da individualização da pena (art. 5º, XLVI, da CF). 3. Assim, padece de ilegalidade a decisão do Superior Tribunal de Justiça fundada em premissa de causa e efeito automático, sobretudo se consideradas as premissas fáticas lançadas pela instância ordinária, competente para realizar cognição ampla dos fatos da causa, que revelaram não ser a paciente integrante de organização criminosa ou se dedicar à prática delitiva. 4. Ordem concedida."
Corolário lógico, os réus fazem jus à incidência da causa de diminuição de pena estampada no §4º do artigo 33 da Lei nº 11.343/2006, no patamar máximo de 2/3, resultando na pena definitiva de 2 anos e 9 dias de reclusão e 202 dias-multa.

Os embargantes sustentam que o voto vencido deve prevalecer, aplicando-se a causa de diminuição prevista no art. 33, § 4º, da Lei n. 11.343/06 em sua fração máxima de 2/3 (dois terços), visto que os acusados são primários e de bons antecedentes, e não há prova nos autos de que participassem de organização criminosa (fls. 674/680).
Os embargos infringentes merecem parcial provimento.
Analisadas as circunstâncias da ação delituosa, verifica-se que estão preenchidos os requisitos cumulativos do § 4º do art. 33 da Lei n. 11.343/06. Os réus são primários e não têm maus antecedentes. Realizaram uma viagem ao Brasil poucos meses antes do fato, por curto período de tempo. Embora tenham declarado estarem passando por situação econômica difícil, não ficou esclarecido quem financiou a viagem anterior ao Brasil e qual finalidade dela, sendo incompatível com a suas condições financeiras. No entanto, não se pode concluir que se dedicam a atividade criminosa em razão dessa viagem não justificada. Além disso, o fato dos acusados terem realizado o transporte de 5.035 (cinco mil e trinta e cinco) gramas de cocaína, que é considerada uma quantidade elevada de entorpecente, ocultadas em forros falsos das malas, demonstram que desempenhavam função relevante para a organização, mas não indica que a integravam.
A jurisprudência do Superior Tribunal de Justiça é no sentido de que o conhecimento pelo agente de estar a serviço do crime organizado para o tráfico transnacional de entorpecentes constitui fundamento concreto e idôneo a ser valorado para fins de estabelecimento da incidência da causa de diminuição de pena do art. 33, § 4º, da Lei n. 11.343/06 no mínimo legal, ante a gravidade da conduta perpetrada (STJ, HC n. 387.077, Rel. Min. Ribeiro Dantas, j. 06.04.17).
A redução, por conta disso, será de 1/6 (um sexto), diminuída as penas e tornadas definitivas em 5 (cinco) anos, 8 (oito) meses e 1 (um) dia de reclusão, e 566 (quinhentos e sessenta e seis) dias-multa, mantidos, no mais, o voto vencedor.
Ante o exposto, DOU PARCIAL PROVIMENTO aos embargos infringentes para aplicar a causa de diminuição do art. 33, § 4º, da Lei n. 11.343/06 no mínimo legal, diminuída as penas em 1/6 (um sexto), tornando-as definitivas em 5 (cinco) anos, 8 (oito) meses e 1 (um) dia de reclusão, e 566 (quinhentos e sessenta e seis) dias-multa, mantido, no mais, o voto vencedor.
É o voto.

Andre Nekatschalow
Desembargador Federal


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