D.E. Publicado em 02/09/2019 |
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EMENTA
ACÓRDÃO
Vistos e relatados estes autos em que são partes as acima indicadas, decide a Egrégia Décima Primeira Turma do Tribunal Regional Federal da 3ª Região, por unanimidade, JULGAR IMPROCEDENTE a Exceção de Suspeição, nos termos do relatório e voto que ficam fazendo parte integrante do presente julgado.
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Signatário (a): | FAUSTO MARTIN DE SANCTIS:10066 |
Nº de Série do Certificado: | 11A217042046CDD3 |
Data e Hora: | 26/08/2019 13:59:15 |
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RELATÓRIO
O DESEMBARGADOR FEDERAL FAUSTO DE SANCTIS:
Trata-se de Exceção de Suspeição oposta por PAULO SOARES BRANDÃO em face do MM. Juiz Federal SILVIO CÉSAR AROUCK GEMAQUE, titular do MM. Juízo da 9ª Vara Federal Criminal de São Paulo/SP, responsável pela Ação Penal nº 0008230-63.2018.403.6181. Colhe-se da inicial deste expediente:
A teor da r. decisão colacionada à fl. 108, o MM. Juiz Federal Excepto refutou a suspeição nos seguintes termos:
À míngua do arrolamento de testemunhas, os autos foram remetidos a este E. Tribunal, tendo sido colhido parecer da Procuradoria Regional da República (fls. 125/128), que opinou pela improcedência da exceção.
Colhe-se, ademais, dos autos manifestação apresentada pelo excipiente retrucando as razões pelas quais o MM. Juiz excepto não acolheu a presente Exceção de Suspeição (fls. 119/123), bem como peticionamento relatando supostas ofensas à imparcialidade que o MM. Juiz excepto teria cometido em sede de audiência de instrução levada a efeito na Ação Penal nº 0008230-63.2018.403.6181 (fls. 131/133).
É o relatório.
VOTO
Trata-se de Exceção de Suspeição oposta por PAULO SOARES BRANDÃO em face do MM. Juiz Federal SILVIO CÉSAR AROUCK GEMAQUE, titular do MM. Juízo da 9ª Vara Federal Criminal de São Paulo/SP, responsável pela Ação Penal nº 0008230-63.2018.403.6181, na qual se imputa, basicamente, que o MM. Juiz Excepto seria suspeito para o tramitar da relação processual penal indicada por já ter condenado o Excipiente em outra Ação Penal (de nº 0010199-84.2016.403.6181, na qual teria expendido argumentação ao arrepio do entendimento prevalente tanto na doutrina como na jurisprudência, bem como distorcido depoimento prestado pelo Excipiente com o nítido desiderato de o enquadrar nas penas do respetivo tipo penal em que incorrido) - desta feita, requer o afastamento do magistrado mencionado ante a sua parcialidade para a condução do feito subjacente.
DO PRINCÍPIO CONSTITUCIONAL DO JUIZ NATURAL E DA IMPARCIALIDADE COMO PRESSUPOSTO PROCESSUAL PARA O DESENVOLVIMENTO VÁLIDO DE UMA RELAÇÃO PROCESSUAL
O princípio do juiz natural, com assento constitucional em dois incisos do art. 5º do Texto Magno de 1988 (Todos são iguais perante a lei, sem distinção de qualquer natureza, garantindo-se aos brasileiros e aos estrangeiros residentes no País a inviolabilidade do direito à vida, à liberdade, à igualdade, à segurança e à propriedade, nos termos seguintes: (...) XXXVII - Não haverá juízo ou tribunal de exceção (...) LIII - Ninguém será processado nem sentenciado senão pela autoridade competente (...)), sufraga a necessidade do Poder Judiciário ser imparcial quando do julgamento das demandas que lhe são apresentadas ao mesmo tempo em que atua como mecanismo de segurança ao jurisdicionado ante a prescrição impossibilitadora de que haja a designação de magistrado ad hoc para apreciar um caso concreto específico.
Desta feita, a teor do anteriormente exposto, a efetiva interpretação do postulado em tela deve abarcar a vedação de criação de juízos ou de tribunais de exceção, bem como deve impor o devido e o necessário respeito às regras de competência dispostas nas legislações processuais, tudo com o objetivo de que não sejam maculadas a independência e a imparcialidade do órgão julgador, aspectos tão caros ao Estado de Direito (tal qual o existente na República Federativa do Brasil) e que evidenciam pressupostos processuais que devem concorrer no caso concreto para que o desenvolvimento da relação processual seja válido.
Nesse contexto, o direito fundamental assegurado ao cidadão no sentido de ver-se julgado por um juiz imparcial e competente serve de pressuposto para o exercício da jurisdição pelo Estado-juiz, de modo que somente pode ser afastado em situações excepcionais em que evidenciada a existência de causa reveladora de impedimento ou de suspeição do magistrado previamente designado pelas leis distribuidoras de competência. Assim, acaso presente uma situação apta a ofender as necessárias imparcialidade e independência que devem permear a atuação do Estado-juiz (na pessoa do magistrado constitucionalmente designado para assumir a relação processual posta a julgamento), tem cabimento a arguição, sempre excepcional e por meio do veículo processual adequado, de hipótese caracterizadora de impedimento ou de suspeição. A propósito:
Justamente porque se refere ao afastamento do magistrado natural designado de acordo com as regras de competência, as hipóteses de impedimento e de suspeição do juiz não podem ser interpretadas ampliativamente, sob pena de se alargar exceções taxativas a desvirtuar a garantia constitucional (e direito fundamental do cidadão) a um julgamento da lavra do juiz natural contido nas normas processuais - nesse sentido:
Nesse diapasão, o art. 254 do Código de Processo Penal elenca as situações previamente estabelecidas pelo legislador aptas a tergiversar acerca da imparcialidade do magistrado para a condução de um caso concreto distribuído originariamente a sua competência - a propósito:
Consigne-se, por oportuno, que o C. Supremo Tribunal Federal já teve oportunidade de decidir não configurar hipótese caracterizadora de suspeição a prolação de decisão judicial fundada em interpretação possível e razoável de texto legal, ressaltando que eventual revisão por instâncias superiores não teria o condão de indicar que o magistrado originário teria atuado de forma a prejudicar aquele que se insurgiu, pois o exercício da atividade jurisdicional pressupõe a possibilidade de se decidir de acordo com tese jurídica considerada correta pelo prolator do provimento judicial guerreado - nesse sentido:
DO CASO CONCRETO
Insurge-se o excipiente, PAULO SOARES BRANDÃO, em face do atuar jurisdicional do MM. Juiz Federal SILVIO CÉSAR AROUCK GEMAQUE, titular do MM. Juízo da 9ª Vara Federal Criminal de São Paulo/SP e responsável pela Ação Penal nº 0008230-63.2018.403.6181, na justa medida em que referido magistrado já o teria condenado em outra Ação Penal (de nº 0010199-84.2016.403.6181), empregando, para tanto, argumentação ao arrepio do posicionamento prevalente tanto na doutrina como na jurisprudência (podendo ser citado o entendimento de que o crime de estelionato contra a Previdência Social poderia ser perpetrado com dolo eventual enquanto doutrina e jurisprudência sufragariam que sua execução somente poderia dar-se por dolo direto e específico, bem como incremento de pena-base fundado em maus antecedentes decorrentes de inquéritos ou de ação penal em curso ao passo que a Súm. 444/STJ refutaria tal possibilidade, sem se descurar do desrespeito aos ditames insculpidos no art. 226 do Código de Processo Penal), aspecto que denotaria sua vontade de condená-lo a qualquer custo. Salienta, ademais, que referido juiz teria distorcido depoimento prestado pelo Excipiente com o nítido desiderato de o enquadrar nas penas do respectivo tipo penal em que incorrido, sendo tal proceder mais uma manifestação de sua parcialidade, bem como induzido o reconhecimento de testemunha em sede de audiência de instrução, desrespeitando, também, o art. 226 do Código de Processo Penal.
Com efeito, nota-se que as situações anteriormente retratadas apontadas pelo Excipiente guardam semelhança entre si na justa medida em que foram levadas a efeito em decorrência do exercício da ínsita função jurisdicional investida àqueles Juízes Federais a partir do momento em que aprovados em concurso público específico da carreira e nomeados para exercerem tal cargo. Dentro de tal contexto, impossível creditar-se a pecha de parcial ao juiz que simplesmente cumpre com seu mister funcional e, ademais, apenas implementa no caso concreto preceitos constantes na legislação (de acordo com sua livre convicção motivada) a culminar, nos termos da interpretação que pressupõe ser a mais consentânea àquele caso concreto, com a prolação de édito penal condenatório. Importante consignar, ainda, a plena possibilidade disposta no ordenamento pátrio daquele que se sente prejudicado com um comando judicial recorrer do r. provimento judicial por meio do manejo do expediente pertinente (oportunidade em que será lícita a dedução de todas as teses jurídicas aptas a permitir a alteração daquilo que foi decidido).
Em outras palavras, não se mostra lícito o manejo de Exceção de Suspeição com o nítido objetivo de manifestar inconformismo com o que restou decidido em outra Ação Penal, pretensão esta que deverá, a tempo e a modo escorreitos, ser aviada naquela relação processual penal, à luz de que o sistema processual brasileiro garante a faculdade de apresentação de recurso em face de uma r. sentença com a qual não se concorda (seja fática, seja juridicamente). Nesse diapasão, temas como os aventados pelo Excipiente (quais sejam, qual o elemento subjetivo necessário para a configuração do crime de estelionato previdenciário, se é possível majorar a pena-base tendo como supedâneo a existência de inquéritos policiais e de ações penais ainda não transitadas em julgado, potencial distorção do depoimento gravado prestado em juízo quando da exaração de r. provimento judicial condenatório e dever de aplicar a regra constante do art. 226 do Código de Processo Penal em sede de reconhecimento judicial) deverão ser apresentados na via processual prevista pelo Código de Processo Penal como apta a tal mister (recurso de Apelação) e não por meio da suscitação de Exceção de Suspeição que não encontra fundamento de validade em qualquer das taxativas hipóteses previstas no art. 254 do Código de Processo Penal.
Em última instância, acaso fosse possível dar azo às ilações tecidas nesta Exceção de Suspeição, chegar-se-ia ao absurdo lógico de imputar parcialidade ao juiz que profere qualquer espécie de comando judicial (porque sempre haverá o desagrado de uma das partes) como, por exemplo, aquele que recebe a inicial acusatória ofertada pelo Ministério Público, aquele que defere (se a favor da acusação) ou indefere (se contra a defesa) a produção de qualquer prova pugnada ou que, em última consideração, não aquiesce com pretensão deduzida por quaisquer dos atores processuais, haja vista que, com tal proceder e principalmente porque desferido juízo de valor à luz do caso concreto, o atuar jurisdicional já estaria indicando uma pretensa linha a ser tomada ao longo do tramitar de uma Ação Penal.
Aliás, importante salientar que este C. Tribunal Regional Federal da 3ª Região já teve diversas oportunidades para assentar que não se pode cominar de parcial o juiz que, instado a deliberar ainda na fase pré-processual sobre pedidos de medidas cautelares ou de provas necessárias a investigação ou a formação da opinio delicti (como, por exemplo, o deferimento de busca e apreensão, de quebra de sigilo bancário, fiscal ou telefônico ou de interceptação telefônica), as aprecia (para deferir ou indeferir), tendo em vista que ele está apenas exercendo a função jurisdicional no qual investido (muitas vezes por força de cláusula de reserva de jurisdição instituída até mesmo em favor do investigado contra o arbítrio do Estado), o que não enseja em disposição indicativa de pré-julgamento da futura Ação Penal - a propósito:
Por fim, cabe ser rememorado o que restou sufragado pelo E. Supremo Tribunal Federal quando do julgamento RHC 131544 (Rel. Min. DIAS TOFFOLI, Segunda Turma, julgado em 21/06/2016, PROCESSO ELETRÔNICO DJe-159 DIVULG 29-07-2016 PUBLIC 01-08-2016 - transcrição colacionada acima) no sentido de que decisão judicial em que se justifique a escolha de uma interpretação possível não é apta, por si só, a gerar a suspeição de seu prolator, e sua revisão pelas instâncias superiores não significa que o magistrado tenha atuado de forma direcionada a prejudicar o recorrente. Outrossim, 'não se pode considerar um Magistrado suspeito por decidir de acordo com tese jurídica que considera correta, pois se estaria atingindo o exercício da atividade jurisdicional' (RHC nº 127.256/SP-AgR, Segunda Turma, Relator o Ministro Gilmar Mendes, DJe de 10/3/16). Conclui-se asseverando que a quebra do dever de imparcialidade não se confunde com decisão contrária aos interesses do réu.
Desta forma, tendo como base o anteriormente tecido, devem ser refutados os argumentos ventilados pelo Excipiente, PAULO SOARES BRANDÃO, nesta Exceção de Suspeição.
DISPOSITIVO
Ante o exposto, voto por JULGAR IMPROCEDENTE a Exceção de Suspeição, nos termos anteriormente expendidos.
Documento eletrônico assinado digitalmente conforme MP nº 2.200-2/2001 de 24/08/2001, que instituiu a Infra-estrutura de Chaves Públicas Brasileira - ICP-Brasil, por: | |
Signatário (a): | FAUSTO MARTIN DE SANCTIS:10066 |
Nº de Série do Certificado: | 11A217042046CDD3 |
Data e Hora: | 26/08/2019 13:59:12 |