Diário Eletrônico

PODER JUDICIÁRIO

TRIBUNAL REGIONAL FEDERAL DA 3ª REGIÃO

D.E.

Publicado em 25/10/2019
APELAÇÃO/REMESSA NECESSÁRIA Nº 0021553-34.2011.4.03.6100/SP
2011.61.00.021553-2/SP
RELATOR : Desembargador Federal MARCELO SARAIVA
APELANTE : Uniao Federal (FAZENDA NACIONAL)
ADVOGADO : SP000004 RAQUEL VIEIRA MENDES E LÍGIA SCAFF VIANNA
APELADO(A) : INCA COML/ EXPORTADORA LTDA
ADVOGADO : SP208351 DANIEL BETTAMIO TESSER e outro(a)
REMETENTE : JUIZO FEDERAL DA 2 VARA DE SAO PAULO>1ª SSJ>SP
No. ORIG. : 00215533420114036100 2 Vr SAO PAULO/SP

EMENTA

MANDADO DE SEGURANÇA. RETENÇÃO DE MERCADORIAS. NÃO DEMONSTRAÇÃO DA MOTIVAÇÃO DO ATO.
1. O provimento recorrido encontra-se devidamente fundamentado, tendo dado à lide a solução mais consentânea possível, à vista dos elementos contidos nos autos.
2. Conforme exposto em sentença, "que a retenção das mercadorias importadas pela Impetrante, submetida a procedimento especial de fiscalização, sem a demonstração clara de quais os indícios que levaram a autoridade a submetê-la a tal processo, é ato ilegal, ferindo o princípio da razoabilidade e da proporcionalidade, cabendo sua correção através do mandado de segurança. Tem o presente remédio a função de coibir atos de desvio ou abuso de poder por parte de autoridade, que viole direito líquido e certo de alguém. No presente caso, a autoridade agiu fora dos ditames legais. Assim, fica caracterizada a violação a direito do Impetrante, devendo ser concedida a segurança pretendida". Desse modo, de rigor a manutenção do julgado.
3. A adoção, pelo presente julgado, dos fundamentos externados na sentença recorrida - técnica de julgamento "per relationem" -, encontra amparo em remansosa jurisprudência das Cortes Superiores, mesmo porque não configura ofensa ao artigo 93, IX, da CF/88, segundo o qual "todos os julgamentos dos órgãos do Poder Judiciário serão públicos, e fundamentadas todas as decisões, sob pena de nulidade (...)". Precedentes do STF e STJ.
4. Remessa Oficial improvida.
5. Apelo improvido.

ACÓRDÃO

Vistos e relatados estes autos em que são partes as acima indicadas, decide a Egrégia Quarta Turma do Tribunal Regional Federal da 3ª Região, por unanimidade, negar provimento à Remessa Oficial e à Apelação, nos termos do relatório e voto que ficam fazendo parte integrante do presente julgado.



São Paulo, 26 de setembro de 2019.
MARCELO SARAIVA
Desembargador Federal Relator


Documento eletrônico assinado digitalmente conforme MP nº 2.200-2/2001 de 24/08/2001, que instituiu a Infra-estrutura de Chaves Públicas Brasileira - ICP-Brasil, por:
Signatário (a): MARCELO MESQUITA SARAIVA:10071
Nº de Série do Certificado: 7E6C6E9BBD25990F
Data e Hora: 08/10/2019 19:13:34



APELAÇÃO/REMESSA NECESSÁRIA Nº 0021553-34.2011.4.03.6100/SP
2011.61.00.021553-2/SP
RELATOR : Desembargador Federal MARCELO SARAIVA
APELANTE : Uniao Federal (FAZENDA NACIONAL)
ADVOGADO : SP000004 RAQUEL VIEIRA MENDES E LÍGIA SCAFF VIANNA
APELADO(A) : INCA COML/ EXPORTADORA LTDA
ADVOGADO : SP208351 DANIEL BETTAMIO TESSER e outro(a)
REMETENTE : JUIZO FEDERAL DA 2 VARA DE SAO PAULO>1ª SSJ>SP
No. ORIG. : 00215533420114036100 2 Vr SAO PAULO/SP

RELATÓRIO

Vistos, etc.


Trata-se de Mandado de Segurança, impetrado por Inca Comercial Exportadora Ltda. em face de ato praticado pelo Inspetor da Receita Federal do Brasil em São Paulo/SP, objetivando a suspensão da necessidade de prestação de garantias, instituída pelo art. 7º da IN/SRF 228/02, bem como da parametrização automática das importações para o canal cinza de conferência aduaneira, devendo a seleção do SISCOMEX se dar de forma aleatória. Apresentou documentos (fls. 30 a 148).


Indeferida a liminar (fls. 150 e 151).


Prestação de informações pela autoridade coatora (fls. 165 a 171).


Na sentença (fls. 173 e 174), o MM Juízo a quo assinalou "que a retenção das mercadorias importadas pela Impetrante, submetida a procedimento especial de fiscalização, sem a demonstração clara de quais os indícios que levaram a autoridade a submetê-la a tal processo, é ato ilegal, ferindo o princípio da razoabilidade e da proporcionalidade, cabendo sua correção através do mandado de segurança. Tem o presente remédio a função de coibir atos de desvio ou abuso de poder por parte de autoridade, que viole direito líquido e certo de alguém. No presente caso, a autoridade agiu fora dos ditames legais. Assim, fica caracterizada a violação a direito do Impetrante, devendo ser concedida a segurança pretendida". Destarte, concedeu a segurança nos termos requeridos. Sem condenação em honorários advocatícios, nos termos da Súmula 105/STJ; à Remessa Oficial.


A União Federal, em suas razões de Apelação (fls. 183 a 191), argumentou que a impetrante estava sendo investigada em conformidade com a Instrução Normativa nº 228/2002, ante indícios de que houve a prática de infração punível com a pena de perdimento de mercadorias. Nesses termos, requer a reforma da sentença.


Inca Comercial Exportadora Ltda., em suas contrarrazões (fls. 341 a 347), requereu o não provimento do recurso.


Em sua manifestação (fls. 361 a 364), o Ministério Público Federal opinou pelo não provimento do apelo.


É o relatório.


VOTO

No caso em tela, não há que se falar na reforma da sentença, proferida nos seguintes termos:


"(...)

Pretende o Impetrante a liberação das mercadorias importadas da China, mercadorias estas que, ao entrarem em território nacional foram objeto de fiscalização pelo "canal cinza", ou seja, quando a fiscalização entende que existem indícios de importação fraudulenta.

Alega que a início de fiscalização determinou a apresentação de garantia para a liberação da mercadoria importada sem, entretanto, fundamentar a decisão administrativa ou mesmo determinar o valor da garantia.

Nas informações, a autoridade apontada como coatora alegou que a Impetrante é objeto de investigação devido a indícios de interposição fraudulenta de terceiros, tendo em vista o volume das mercadorias que importa em confronto com a capacidade financeira da empresa, demonstrado através da fixação de seu capital social.

De fato, um dos indícios que levam a fiscalização a inicial procedimento investigatório é o valor das importações em confronto com o capital social da empresa importadora. Verificado o descompasso, inicia-se a investigação, requerendo-se, à empresa, diversos documentos que são capazes de demonstrar a procedência, ou não, da possibilidade levantada na não-liberação da mercadoria importada.

No caso em tela, a informação apresentada limitou-se a explanar quais os dispositivos legais que embasam referida retenção e a afirmar que a Impetrante está sendo investigada pois há indícios de infração punível com a pena de perdimento de mercadorias, qual seja, interposição fraudulenta de terceiros, disposta no art. 23, inciso V, 1º e 2º do Decreto-Lei nº 1.455/76, justamente em relação as suas operações no comércio exterior, ou seja, quando ao volume das mercadorias que importa.

Entendo que, para justificar a retenção das mercadorias, além da fundamentação no momento da lavratura do termo de início de fiscalização, como defende o Impetrante, deveria a autoridade, nas informações prestadas nestes autos, demonstrar concretamente quais os fatos que se subsumiram à hipótese prevista na norma legal e que são efetivamente os indícios que levaram à aplicação desse procedimento especial de fiscalização, justificando dessa forma a retenção das mercadorias com liberação mediante a prestação de caução.

Não constou, entretanto, das informações prestadas quais seriam, concretamente, os fatos que consistiram nos indícios que levaram à fiscalização especial.

Em contrapartida, o Impetrante anexou aos autos o contrato firmado com a empresa chinesa, com tradução juramentada, em seu nome (fls. 40); o conhecimento de embarque marítimo no qual consta seu nome, não contestado pela Impetrada, bem como as Declarações de Imposto de Renda do exercício de 2009 (ano-calendário 2008) até o exercício de 2011 (ano-calendário de 2010), através das quais pode ser verificado aumento do valor do faturamento líquido da mesma (que demonstra a capacidade financeira da empresa) e a comunicação de deferimento da sua habilitação para operar no comércio exterior (fls. 40), com estimativa de US$ 320.000,00 para importações e para exportações, a cada seis meses.

Desta feita, entendo que a retenção das mercadorias importadas pela Impetrante, submetida a procedimento especial de fiscalização, sem a demonstração clara de quais os indícios que levaram a autoridade a submetê-la a tal processo, é ato ilegal, ferindo o princípio da razoabilidade e da proporcionalidade, cabendo sua correção através do mandado de segurança.

Tem o presente remédio a função de coibir atos de desvio ou abuso de poder por parte de autoridade, que viole direito líquido e certo de alguém. No presente caso, a autoridade agiu fora dos ditames legais. Assim, fica caracterizada a violação a direito do Impetrante, devendo ser concedida a segurança pretendida.

"Direito líquido e certo é o que se apresenta manifesto na sua existência, delimitado na sua extensão e apto a ser exercitado no momento da sua impetração." (Hely Lopes Meirelles, Direito Administrativo Brasileiro, editora Revista dos Tribunais, 15ª edição, São Paulo, 1990, p.610).

No caso, está comprovado, nos autos, a existência do direito alegado pelo impetrante.

Assim, entendo presentes a liquidez certeza do direito alegado e julgo procedente o pedido e concedo a segurança pleiteada na inicial, nos termos do artigo 269, inciso I, do Código de Processo Civil. Neste ato também concedo a liminar, a fim de que sejam imediatamente liberadas as mercadorias retidas individualizadas na inicial.

(...)"

Conforme se extrai da transcrição supra, a sentença recorrida encontra-se devidamente fundamentada, tendo o r. Juízo de 1º grau dado à lide a solução mais consentânea possível à vista dos elementos contidos nos autos.


Por outro lado, o recurso apresentado pela apelante nada trouxe de novo que pudesse infirmar o quanto decidido, motivo pelo qual de rigor a manutenção da sentença por seus próprios fundamentos.


Registre-se, por oportuno, que a adoção, pelo presente julgado, dos fundamentos externados na sentença recorrida - técnica de julgamento "per relationem" -, encontra amparo em remansosa jurisprudência das Cortes Superiores, mesmo porque não configura ofensa ao artigo 93, IX, da CF/88, segundo o qual "todos os julgamentos dos órgãos do Poder Judiciário serão públicos, e fundamentadas todas as decisões, sob pena de nulidade (...)". Confiram-se, nesse sentido, os seguintes julgados:


"EMBARGOS DE DECLARAÇÃO - INOCORRÊNCIA DE CONTRADIÇÃO, OBSCURIDADE OU OMISSÃO - PRETENDIDO REEXAME DA CAUSA - CARÁTER INFRINGENTE - INADMISSIBILIDADE - INOCORRÊNCIA DE CONSUMAÇÃO, NA ESPÉCIE, DA PRESCRIÇÃO PENAL - INCORPORAÇÃO, AO ACÓRDÃO, DAS RAZÕES EXPOSTAS PELO MINISTÉRIO PÚBLICO FEDERAL - MOTIVAÇÃO "PER RELATIONEM" - LEGITIMIDADE JURÍDICO-CONSTITUCIONAL DESSA TÉCNICA DE FUNDAMENTAÇÃO - DEVOLUÇÃO IMEDIATA DOS AUTOS, INDEPENDENTEMENTE DA PUBLICAÇÃO DO ACÓRDÃO, PARA EFEITO DE PRONTA EXECUÇÃO DA DECISÃO EMANADA DA JUSTIÇA LOCAL - POSSIBILIDADE - EMBARGOS DE DECLARAÇÃO REJEITADOS.
(...)
- Reveste-se de plena legitimidade jurídico-constitucional a utilização, pelo Poder Judiciário, da técnica da motivação "per relationem", que se mostra compatível com o que dispõe o art. 93, IX, da Constituição da República. A remissão feita pelo magistrado - referindo-se, expressamente, aos fundamentos (de fato e/ou de direito) que deram suporte a anterior decisão (ou, então, a pareceres do Ministério Público ou, ainda, a informações prestadas por órgão apontado como coator) - constitui meio apto a promover a formal incorporação, ao ato decisório, da motivação a que o juiz se reportou como razão de decidir. Precedentes." (destaquei)
(STF, AI 825520 AgR-ED, Relator Ministro CELSO DE MELLO, Segunda Turma, j. 31/05/2011, DJe 09/09/2011)
"AGRAVO INTERNO. AGRAVO EM RECURSO ESPECIAL. PROCESSUAL CIVIL. AUSÊNCIA DE PREQUESTIONAMENTO. FUNDAMENTAÇÃO PER RELATIONEM. POSSIBILIDADE.
1. Consoante o entendimento pacificado do Superior Tribunal de Justiça, não há que se falar em nulidade por ausência de fundamentação ou por negativa de prestação jurisdicional a decisão que se utiliza da fundamentação per relationem. Precedentes. Incidência da Súmula n° 83/STJ.
2. Não se admite o recurso especial quando a questão federal nele suscitada não foi enfrentada no acórdão recorrido. Incidem as Súmulas 282 e 356 do Supremo Tribunal Federal (STF).
3. Agravo interno a que se nega provimento." (destaquei)
(STJ, AgInt no AREsp 1322638/DF, Relatora Ministra MARIA ISABEL GALLOTTI, QUARTA TURMA, j. 11/12/2018, DJe 18/12/2018)
"AGRAVO REGIMENTAL NO RECURSO ESPECIAL. DENUNCIAÇÃO CALUNIOSA. TEMPESTIVIDADE DO RECURSO ESPECIAL COMPROVADA NO AGRAVO. POSSIBILIDADE. ACÓRDÃO COM FUNDAMENTAÇÃO PER RELATIONEM. AUSÊNCIA DE NULIDADE. PROCESSO ADMINISTRATIVO INSTAURADO. TIPICIDADE. DOLO. NECESSIDADE DE INCURSÃO VERTICAL NA ANÁLISE DAS PROVAS. SÚMULA 7. AGRAVO REGIMENTAL NÃO PROVIDO.
1. Não há cogitar nulidade do acórdão por ausência de fundamentação ou ofensa ao artigo 93, IX, da Constituição Federal 1988, se o órgão julgador na origem, ao apreciar a apelação, se utiliza de trechos de decisão anterior ou de parecer ministerial como razão de decidir, não configura ofensa ao princípio constitucional da motivação das decisões judiciais (APn n. 536/BA, Corte Especial, Dje 4/4/2013).
(...)
5. Agravo regimento não provido." (destaquei)
(STJ, AgRg no REsp 1482998/MT, Relator Ministro ROGERIO SCHIETTI CRUZ, SEXTA TURMA, j. 13/11/2018, DJe 03/12/2018)
"PROCESSUAL CIVIL. AGRAVO INTERNO NO RECURSO ESPECIAL. CÓDIGO DE PROCESSO CIVIL DE 2015. APLICABILIDADE. VIOLAÇÃO AO ART. 535 DO CPC. INOCORRÊNCIA. OMISSÃO E CONTRADIÇÃO. NÃO CARACTERIZAÇÃO. MOTIVAÇÃO PER RELATIONEM. LEGITIMIDADE JURÍDICO-CONSTITUCIONAL DESSA TÉCNICA DE FUNDAMENTAÇÃO. VALIDADE. DIREITO AMBIENTAL. ART. 10 DA LEI N. 6.938/81. COMPETÊNCIA PARA LICENCIAMENTO. PODER FISCALIZATÓRIO. IBAMA. POSSIBILIDADE. ÁREAS DE PRESERVAÇÃO PERMANENTE. DIREITO ADQUIRIDO. FATO CONSUMADO EM MATÉRIA AMBIENTAL. AUSÊNCIA. REVISÃO. IMPOSSIBILIDADE. SÚMULA N. 7/STJ. INCIDÊNCIA. SENTENÇA ABSOLUTÓRIA. AUSÊNCIA DE PROVAS. INCOMUNICABILIDADE DAS ESFERAS ADMINISTRATIVA E PENAL. ARGUMENTOS INSUFICIENTES PARA DESCONSTITUIR A DECISÃO ATACADA. HONORÁRIOS RECURSAIS. NÃO CABIMENTO. APLICAÇÃO DE MULTA. ART. 1.021, § 4º, DO CÓDIGO DE PROCESSO CIVIL DE 2015. DESCABIMENTO.
(...)
IV - O Supremo Tribunal Federal chancelou a técnica da motivação per relationem, por entender que se reveste de plena legitimidade jurídico-constitucional e se mostra compatível com o que dispõe o artigo 93, IX, da Constituição Federal. A remissão feita pelo magistrado - referindo-se, expressamente, aos fundamentos (de fato e/ou de direito) que deram suporte à anterior decisão (ou, então, a pareceres do Ministério Público ou, ainda, a informações prestadas por órgão apontado como coator) - constitui meio apto a promover a formal incorporação, ao ato decisório, da motivação a que o juiz se reportou como razão de decidir. Precedentes.
(...)
XII - Agravo Interno improvido." (destaquei)
(AgInt no REsp 1283547/SC, Relatora Ministra REGINA HELENA COSTA, PRIMEIRA TURMA, j. 23/10/2018, DJe 31/10/2018)

Face ao exposto, nego provimento à Remessa Oficial e à Apelação, nos termos da fundamentação.


É o voto.


MARCELO SARAIVA
Desembargador Federal


Documento eletrônico assinado digitalmente conforme MP nº 2.200-2/2001 de 24/08/2001, que instituiu a Infra-estrutura de Chaves Públicas Brasileira - ICP-Brasil, por:
Signatário (a): MARCELO MESQUITA SARAIVA:10071
Nº de Série do Certificado: 7E6C6E9BBD25990F
Data e Hora: 08/10/2019 19:13:30