D.E. Publicado em 25/11/2019 |
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EMENTA
ACÓRDÃO
Vistos e relatados estes autos em que são partes as acima indicadas, decide a Egrégia Quinta Turma do Tribunal Regional Federal da 3ª Região, por unanimidade, dar parcial provimento ao recurso da acusação para aumentar a pena-base, e, por maioria, dar provimento ao recurso da defesa para aplicar a atenuante de confissão, na fração de 1/6, do que resulta uma pena de 6 (seis) anos, 05 (cinco) meses e 23 (vinte e três) dias de reclusão e 647 (seiscentos e quarenta e sete) dias-multa, nos termos do relatório e voto que ficam fazendo parte integrante do presente julgado.
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DECLARAÇÃO DE VOTO
Trata-se de apelação criminal interposta pelo Ministério Público Federal e pela defesa de Manoel Carlos Natário contra a sentença de fls. 325/330 que, o condenou pela prática do delito previsto nos artigos 33, caput, c. c. o artigo 40, inciso I, da Lei nº 11.343/06, ao cumprimento da pena privativa de liberdade de 4 (quatro) anos, 10 (dez) meses e 10 (dez) dias de reclusão, em regime inicial semiaberto, e ao pagamento de 485 (quatrocentos e oitenta e cinco) dias-multa, arbitrados em 1/30 do salário-mínimo vigente à data do fato, valor corrigido monetariamente, o absolveu da imputação contida no artigo 304, c/c art.297, "caput", do Código Penal, por falta de provas (art.386, VII, do Código de Processo Penal) e absolveu Kamila Aparecida Tibucheski da imputação contida no artigo 33, "caput", c/c art.40, I, da lei nº 11.343/2006, por falta de provas (art.386, V, do Código de Processo Penal).
Em razões recursais, a acusação requereu o aumento da pena-base fixada, o estabelecimento de regime inicial fechado para cumprimento de pena e a condenação da ré Kamila Aparecida Tibucheski pela prática do crime descrito nos artigos 33, caput, c/c art.40, inciso I, ambos da Lei nº 11.343/2006.
Já a defesa de Manoel Carlos Natário, em razões recursais (fls.377/383), pleiteou a aplicação atenuante da confissão espontânea, na fração 1/6 (um sexto).
Contrarrazões apresentadas pela defesa de Kamila, Manoel e pela acusação, respectivamente, às fls. 370/376, às fls.384/389, e, às fls.403/409.
A Procuradoria Regional da República opinou pelo desprovimento da apelação da defesa de Manoel e pelo provimento parcial do apelo ministerial, de modo a manter a sentença absolutória em relação à ré Kamila, porém acolhendo a pedido de exasperação da pena do apelante do Manoel (fls. 418/423).
É o relatório.
O voto do E. Relator é no sentido de dar parcial provimento ao recurso da acusação, para aumentar a pena-base e dar provimento ao recurso da defesa, para aplicar a atenuante de confissão, na fração de 1/6 (um sexto), do que resulta uma pena de 6 (seis) anos, 05 (cinco) meses e 23 (vinte e três) dias de reclusão e 647 (seiscentos e quarenta e sete) dias-multa.
Inicialmente, acompanho o E. Relator no tocante à comprovação da materialidade e autoria delitivas de Manoel Carlos Natário, bem como mantenho a absolvição de Kamila Aparecida Carlos Natária em aplicação ao princípio do in dubio pro reo.
Em relação à dosimetria da pena de Manoel Carlos Natário, da mesma forma, acompanho o E. Relator para dar parcial provimento ao recurso da acusação, para aumentar a pena-base, em razão da grande quantidade (49,3 quilogramas) e da qualidade da droga (maconha), fixando a pena na primeira fase da dosimetria da pena em 08 (oito) anos de reclusão e 800 (oitocentos) dias-multa.
Na segunda fase, o E. Relator fez incidir a atenuante da confissão espontânea descrita no artigo 65, inciso III, alínea "d", do Código Penal, na fração de 1/6 (um sexto), o que acompanho.
Finalmente, na terceira fase, não houve insurgência quanto à incidência da causa de aumento do artigo 40, inciso I, da Lei 11.343/2006, de forma que resta mantida na fração estabelecida na sentença, qual seja, 1/6 (um sexto).
Ademais, na r. sentença foi aplicada a causa de diminuição do § 4º, do artigo 33 da Lei 11.343/2006, fração de 1/6 (um sexto), o que foi mantido pelo E. Relator.
Não obstante, com a devida vênia, divirjo para aumentar o patamar de redução para a fração de 5/12 (cinco doze avos).
Vale consignar que, ao tratar da causa de diminuição do § 4º do art. 33, o legislador estabeleceu tão somente a possibilidade de graduação entre o mínimo de 1/6 (um sexto) e o máximo de 2/3 (dois terços) de diminuição, verbis:
Fixou requisitos cumulativos que, se preenchidos, dão direito à diminuição, naqueles termos.
No presente caso, como destacado pelo E. Relator, o acusado é primário e não tem antecedentes e não há elementos suficientes para concluir que se dedique a atividades criminosas nem integre organização criminosa. Portanto, incide a causa de diminuição do art. 33, § 4º, da Lei n. 11.343/06.
Não há qualquer prova de envolvimento do acusado com organização criminosa. Considerar o acusado neste processo como membro de organização criminosa, pelo fato de estar encaminhando o entorpecente e pela presunção de que a droga pertence à organização criminosa - e que, portanto, dela é colaborador - é por um lado, estender demasiado o conceito de organização criminosa, que para a caracterização depende de ficar demonstrada a existência de uma estrutura estável, com definição de funções e hierarquia de outro, aumentar a pena sem provas dos necessários pressupostos. Tais indivíduos são, no mais das vezes, peças descartáveis na engrenagem do tráfico, substituídas rapidamente, inclusive para não gerar suspeitas. Assim, carece esse tipo de associação do requisito estabilidade, para caracterizar-se como organização para o crime.
Não é dado presumir-se em desfavor do direito de liberdade sem provas, destarte, entendo deva ficar demosntrado, ainda que por um conjunto indiciário, que o réu pertencia, integrava um grupo voltado para a prática de crimes, com um mínimo de estabilidade, para negar-se a diminuição, o que implica dizer que o julgador deve poder concluir da prova dos autos que houve ação prévia junto ao grupo, não sendo possível presumi-lo do fato isolado do transporte aqui julgado, ainda que isso viesse a trazer um benefício a suposto grupo organizado.
Devida a diminuição como bem consignado pelo E. Relator, passo ao problema de sua graduação.
Segundo o critério trifásico de aplicação da pena, encampado pelo Código Penal Brasileiro em seu art. 68, verbis:
A quantidade da droga, por sua vez, é critério aferível no momento de se avaliar as circunstâncias judiciais do art. 59 do Código Penal, dizendo a lei textualmente que:
Refere-se, portanto, claramente às circunstâncias do art. 59, indicando ao intérprete, quais as de maior dentre aquelas ali previstas, portanto, nos termos do art. 68 do Código Penal - dentre aquelas aplicáveis na dosagem da pena base.
O art. 59 do Código Penal diz, por sua vez que:
Portanto, dosar a diminuição entre mínimo e máximo levando em consideração quaisquer das circunstâncias judiciais seria evidente bis in idem. Diminuir menos é agravar, tanto assim é que é preciso fundamentar, motivar explicar porque não se defere a diminuição máxima prevista na lei. Se o agente não tiver nada de negativo que possa ser considerado nessa fase, faria jus à máxima diminuição.
Neste sentido já concluiu a jurisprudência do Supremo Tribunal Federal:
O problema de difícil solução está em que o § 4º do art. 33 da Lei de drogas traz possibilidade de agravamento incerto, a critério do julgador não traça nenhum critério para a graduação da benesse e ainda que o juiz pudesse criar meios de graduação ao dosá-la utilizando-se das circunstâncias do crime, motivos, quantidade e qualidade da droga, conduta social, internacionalidade, ou outras, já previstas em lei, a decisão incidiria em bis in idem vedado.
Não é possível negar a diminuição da lei a quem faz jus, mas também não é possível aplicar o parágrafo como está, sem incidir em bis in idem.
Ora nesse cenário, desde que devida a redução, só seria cabível no patamar máximo de 2/3 (dois terços), pois a única consentânea com o princípio da reserva legal e presunção de inocência, que indicam que na dúvida, no impasse, a solução deve ser em favor do direito de liberdade. Esse foi o meu posicionamento por algum tempo.
Porém, essa solução também deixa a desejar, pois na prática, acaba por provocar um excesso em favor do réu que aniquila o intuito punitivo da norma, e leva a pena aplicável a um resultado incompatível com a gravidade da conduta, que é tida por hedionda pela Constituição Federal, reduzindo a pena a patamares equivalentes ao de crimes de menor potencial ofensivo, o que é incompatível com o mandado de criminalização do inciso XLIII da Constituição Federal dirigido ao tráfico de drogas.
Na verdade, o Estado é titular do direito de punir, limitado pela lei, porém esse direito se traduz também num dever, o dever de punir as condutas contrárias à ordem vigente. Não se olvida que o Estado Brasileiro se propôs a punir efetivamente o tráfico de drogas, já que consta da lei maior que "XLIII - a lei considerará crimes inafiançáveis e insuscetíveis de graça ou anistia a prática da tortura, o tráfico ilícito de entorpecentes e drogas afins, o terrorismo e os definidos como crimes hediondos, por eles respondendo os mandantes, os executores e os que, podendo evitá-los, se omitirem.". Portanto, é dever do legislador estabelecer punições mais graves para o tráfico e para outros crimes reputados hediondos, que para os demais.
A aplicação de 2/3 (dois terços) da diminuição faz resultar evidente desproporcionalidade da pena, e obriga o juiz a praticar excesso em favor do réu, ao solapar, por exemplo, uma grave pena de 6 (seis) anos de reclusão a apenas 2 (dois), muitas vezes, pena inferior à que resulta de muitos crimes de gravidade infinitamente menor que o tráfico, inclusive os de menor potencial ofensivo (pena máxima não superior a dois anos) ou na hipótese de pena-base mínima (5 anos), a 1 ano e 8 meses, na hipótese de pena base mínima com aumento de 1/6 pela internacionalidade do tráfico, 1 ano, 11 meses e 10 dias.
O legislador quis privilegiar a primariedade, em senso lato, sem dúvida. Porém, não lhe cabe fazê-lo a ponto de violar o princípio da proporcionalidade das penas de modo tão flagrante, em face do que dispõe expressamente a Constituição Federal.
Reconheço que desconsiderar a gravidade da conduta preconizada pela Constituição Federal, já fixada com a pena-base e nas fases seguintes da dosimetria em nome da primariedade, minimizando a punição pela redução de 2/3 (dois terços) é de fato praticar o excesso, em favor do réu, o que a lei não poderia fazer, nem pretendeu fazer, pois fixou um redutor variável.
Portanto, a interpretação conforme a Constituição, ao princípio da isonomia que norteia o sistema e aos demais princípios de direito penal, como a individualização da pena e reserva legal, deve afastar também o excesso em favor do réu, privilegiando o princípio da proporcionalidade razoável na aplicação da pena, que decorre da equidade e proibição do excesso, que norteia o legislador e o juiz, seja em favor da sociedade, seja em favor do réu.
Na verdade, a falta de técnica do legislador, ao prever diminuição em patamar elástico e sem critérios para o seu estabelecimento, não deve levar o julgador a resultado evidentemente desproporcional em face da conduta já dosada nas fases anteriores e do sistema repressivo como um todo.
Portanto, uma interpretação conforme a Constituição Federal desse inquietante § 4º da Lei nº 11.343/06 deve afastar a impossível graduação, evitando-se o bis in idem, e por isso estipular o redutor em patamar fixo, sempre que presentes os requisitos cumulativos da causa de diminuição, sob pena de negar-se vigência ao dispositivo, que não é de ser declarado inconstitucional por esse defeito, mas interpretado conforme os princípios constitucionais.
O patamar, pelo exposto, não deve ser o máximo. Entendo que, para atender, dentro da medida do possível a mens legis, procurando situar o julgamento mais proximamente à vontade do legislador (punir o tráfico adequadamente), sem incidir em bis in idem, nem em excesso permissivo, a diminuição, quando devida, deve ser aplicada em patamar fixo.
De forma a atender os interesses em conflito, essa interpretação conforme deve seguir critério de isonomia e equidade. O patamar que melhor atende a esses critérios é o médio, correspondente à média do intervalo pela lei estabelecido, que vem a ser "5/12" (cinco doze avos), fração média entre as de 1/6 e 2/3, fixadas pelo legislador.
Assim, considerados esses elementos, o mais adequado é aplicar a minorante na fração de 5/12 (cinco doze avos), do que resulta a pena definitiva em 04 (quatro) anos, 06 (seis) meses e 13 (treze) dias de reclusão e 453 (quatrocentos e cinquenta e três) dias-multa.
O valor unitário do dia-multa mantenho no estabelecido na sentença.
Mantenho o regime inicial semiaberto, tal como fixado pelo E. Relator, nos termos do artigo 33, § 3º, alínea "b", do Código Penal.
Incabível a substituição da pena privativa de liberdade por restritivas de direitos em decorrência da quantidade de pena fixada, nos termos do artigo 44 do Código Penal.
Ante o exposto, dou parcial provimento ao recurso de apelação da acusação, para aumentar a pena-base (acompanho o E. Relator), e dou provimento ao recurso da defesa, para aplicar a atenuante de confissão, na fração de 1/6 (um sexto) (acompanho o E. Relator). De ofício, reduzo a pena na terceira fase pela incidência da causa de diminuição do § 4º, do artigo 33 da Lei 11.343/2006, na fração de 5/12 (cinco doze avos), de modo que torno definitiva a pena privativa de liberdade de 04 (quatro) anos, 06 (seis) meses e 13 (treze) dias de reclusão, em regime inicial semiaberto, e 453 (quatrocentos e cinquenta e três) dias-multa, no valor unitário mínimo legal.
É o voto.
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RELATÓRIO
Trata-se de apelação criminal interposta pelo Ministério Público Federal e pela defesa de Manoel Carlos Natário contra a sentença de fls. 325/330 que:
a) condenou Manoel Carlos Natário pela prática do delito previsto nos artigos 33, caput, c. c. o artigo 40, inciso I, da Lei nº 11.343/06, ao cumprimento da pena privativa de liberdade de 4 (quatro) anos, 10 (dez) meses e 10 (dez) dias de reclusão, em regime inicial semiaberto, e ao pagamento de 485 (quatrocentos e oitenta e cinco) dias-multa, arbitrados em 1/30 do salário-mínimo vigente à data do fato, valor corrigido monetariamente, bem como o absolveu da imputação contida no artigo 304, c/c art.297, "caput", do Código Penal, por falta de provas (art.386, VII, do Código de Processo Penal) ;
b) absolveu Kamila Aparecida Tibucheski da imputação contida no artigo 33, "caput", c/c art.40, I, da lei nº 11.343/2006, por falta de provas (art.386, V, do Código de Processo Penal).
Em razões recursais, a acusação requer, em síntese (fls. 344/364):
O aumento da pena-base fixada;
b) O estabelecimento de regime inicial fechado para cumprimento de pena;
c) a condenação da ré Kamila Aparecida Tibucheski pela prática do crime descrito nos artigos 33, caput, c/c art.40, inciso I, ambos da Lei nº 11.343/2006.
Já a defesa de Manoel Carlos Natário, em razões recursais, às fls.377/383, requer a aplicação atenuante da confissão espontânea, prevista no artigo 65, inciso III, "d" do Código Penal, a fim de reduzir a pena fixada em 1/6 (um sexto).
Contrarrazões apresentadas pela defesa de Kamila, Manoel e pela acusação, respectivamente, às fls. 370/376, às fls.384/389, e, às fls.403/409.
A Procuradoria Regional da República opinou pelo desprovimento da apelação da defesa de Manoel e pelo provimento parcial do apelo ministerial, de modo a manter a sentença absolutória em relação à ré Kamila, porém acolhendo a pedido de exasperação da pena do apelante do Manoel (fls. 418/423).
É o relatório.
À revisão, nos termos regimentais.
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VOTO
Consta dos autos que Manoel Carlos Natário e Kamila Aparecida Carlos Natário foram denunciados pela prática do crime previsto no artigo 33, caput, c. c. o artigo 40, I, da Lei nº 11.343/06, sendo o primeiro acusado incurso nas penas do artigo 304, c/c art.297, "caput", do Código Penal, porque, em 18/10/2016, foram presos em flagrante na BR-262/MS, em Água Clara/MS por transportarem 49,3 kg (quarenta e nove quilos e trezentos gramas) de maconha, sem autorização ou em desacordo com determinação legal ou regulamentar (fls. 96/97-verso).
Segundo a peça acusatória, os Policiais Militares, em fiscalização de rotina, deram ordem de parada ao veículo FIAT/SIENA/ELX, ano 2008, cor prata, placas HJE-1209, que vinha no sentido Três lagoas, sendo conduzido por Manoel Carlos Natário e tendo como passageira Kamilla Aparecida Tibucheski, quando verificaram que no porta-malas do carro estavam acondicionados em um fundo falso 49,3 kg (quarenta e nove quilos e trezentos gramas) de maconha prensada em tijolos com fita adesiva.
Após regular instrução, sobreveio sentença condenatória contra a qual a acusação interpôs apelação.
Passo a matéria devolvida.
A materialidade, a autoria e o dolo do delito restaram incontestes, em relação ao acusado Manoel Carlos Natário, e não foram objeto de irresignação.
Já em relação à acusada Kamila Aparecida Carlos Natário, a acusação requer a condenação pela prática do crime descrito nos artigos 33, caput, c/c art.40, inciso I, ambos da Lei nº 11.343/2006.
A autoria não é inconteste.
Quanto à autoria, destaca-se que a condenação deve estar fundada em provas robustas e claras, não devendo pairar qualquer dúvida razoável.
No caso concreto, todavia, registre-se que o conjunto probatório não é suficiente para embasar um decreto condenatório da ré.
Em seu interrogatório judicial, a acusada negou a prática delitiva, afirmando que não sabia que havia entorpecente no carro (mídia eletrônica de fl. 285).
Em juízo, as testemunhas de acusação afirmaram que ambos acusados deram versões coincidentes: Manoel sabia da droga e que Kamila não teve participação na prática delitiva (mídia eletrônica de fl. 263).
Pelo que se extraí dos autos, verifica-se que não há elementos firmes e seguros para sustentar um decreto condenatório, ante a ausência de comprovação da autoria delitiva por parte da acusada, de modo que não se admite tal decisão exclusivamente em elementos informativos colhidos na seara policial.
Ademais, compete à acusação a prova de que o acusado concorreu para a empreitada criminosa, mas no caso, o órgão acusatório não se desincumbiu a contento de seu ônus.
Portanto, as provas produzidas pela acusação são frágeis e inconsistentes para concluir, sem sombra de dúvidas, que a acusada teria praticado o crime imputado na denúncia, devendo ser confirmada a sentença absolutória e, nesse contexto, incide o princípio in dubio pro reo.
Das penas aplicadas.
O Magistrado de primeiro grau aplicou as penas para o réu com a seguinte fundamentação:
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Na primeira fase da dosimetria, a acusação requer a majoração da pena-base para o acusado Manoel.
Assiste razão ao órgão ministerial.
Na primeira fase da dosimetria da pena, a natureza e a quantidade da droga, bem como a personalidade e a conduta social do agente são circunstâncias que devem ser consideradas com preponderância sobre o artigo 59 do Código Penal, nos termos do artigo 42 da Lei de Drogas.
Aqui, a apreensão de significativa quantidade de droga de alto custo, demasiadamente nociva e viciante (49,3 kg) justifica a exasperação da pena-base acima do mínimo legal.
Assim, na primeira fase de dosimetria da pena, aumento a pena-base na fração de 3/5 (três quintos), em razão da quantidade e qualidade da droga, o que resulta a pena de 8 (oito) anos de reclusão e 800 (oitocentos) dias-multa, arbitrados em 1/30 (um trigésimo) do salário-mínimo vigente à data do fato, valor corrigido monetariamente.
Na segunda fase da dosimetria, a defesa requer a aplicação da atenuante de confissão.
Tal pleito deve prosperar.
O fato de o réu ter sido preso em flagrante não é óbice ao reconhecimento da confissão, uma vez que a espontaneidade exigida pela norma prescinde de motivos. São, pois, irrelevantes as razões pelas quais o agente admitiu a prática do crime para que se aplique a atenuante.
Manoel confessou, em seu interrogatório judicial, que praticou o delito (mídia, fl. 263).
Assim, aplico a atenuante da confissão (art. 65, III, "d" do Código Penal) e reduzo a pena em 1/6 (um sexto), perfazendo o total de 6 (seis) anos e 8 (oito) meses de reclusão e 666 (seiscentos e sessenta e seis) dias-multa.
A terceira fase da dosimetria não foi objeto de recurso, razão pela qual mantenho o aumento da pena na fração de 1/6 (um sexto), pela transnacionalidade do delito, e a redução, também na fração de 1/6 (um sexto), pela causa de diminuição do artigo 33, §4º da Lei 11.343/06, o que resulta uma pena definitiva de 6 (seis) anos, 05 (cinco) meses e 23 (vinte e três) dias de reclusão e 647 (seiscentos e quarenta e sete) dias-multa.
Do regime de cumprimento de pena
A acusação requer, por fim, a fixação de regime inicial de cumprimento fechado, em relação ao réu Manoel.
A pena privativa de liberdade será executada de forma progressiva, nos termos do artigo 33, caput, §2º, do Código Penal.
Para a fixação do regime prisional, devem ser observados os seguintes fatores: a) modalidade de pena de privativa de liberdade, ou seja, reclusão ou detenção (art. 33, caput, CP); b) quantidade de pena aplicada (art. 33, §2º, alíneas a, b e c, CP); caracterização ou não da reincidência (art. 33, §2º, alíneas b e c, CP) e d) circunstâncias do artigo 59 do Código Penal (art. 33, §3º, do CP).
A exasperação da pena-base com fundamento na natureza e quantidade do entorpecente não impede a fixação de regime prisional mais benéfico, se as circunstâncias subjetivas forem favoráveis.
Aqui, considerando que as circunstâncias judiciais subjetivas do réu (antecedentes, conduta social, personalidade e motivo do crime) não foram valoradas negativamente, o regime inicial de cumprimento de pena deve ser estabelecido com base na pena fixada em concreto.
No particular, a pena concretamente aplicada (6 anos, 05 meses e 23 dias de reclusão) e as circunstâncias judiciais autorizam a manutenção do regime semiaberto, nos termos do artigo 33 do Código Penal.
Mantidos, no mais, os termos da sentença.
Ante o exposto, DOU PARCIAL PROVIMENTO ao recurso da acusação, para aumentar a pena-base e DOU PROVIMENTO ao recurso da defesa, para aplicar a atenuante de confissão, na fração de 1/6 (um sexto), do que resulta uma pena de 6 (seis) anos, 05 (cinco) meses e 23 (vinte e três) dias de reclusão e 647 (seiscentos e quarenta e sete) dias-multa.
Comunique-se ao Juízo das Execuções Criminais.
É como voto.
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