Diário Eletrônico

PODER JUDICIÁRIO

TRIBUNAL REGIONAL FEDERAL DA 3ª REGIÃO

D.E.

Publicado em 25/11/2019
RECURSO EM SENTIDO ESTRITO Nº 0002260-77.2017.4.03.6000/MS
2017.60.00.002260-2/MS
RELATOR : Desembargador Federal ANDRÉ NEKATSCHALOW
RECORRENTE : Justica Publica
RECORRIDO(A) : TIAGO BARBERATTO
: PITTA E BARBERATO LTDA -ME
ADVOGADO : MS013658 FLAVIA RENATA BARBOSA GOMES
No. ORIG. : 00022607720174036000 5 Vr CAMPO GRANDE/MS

EMENTA

PENAL. PROCESSO PENAL. CRIME AMBIENTAL. ART. 69-A DA LEI N. 9.605/98. ATIPICIDADE DA CONDUTA. DESCABIMENTO. RECEBIMENTO DE DENÚNCIA NO JUÍZO AD QUEM. RECURSO EM SENTIDO ESTRITO PROVIDO.
1. Fato relatado na denúncia subsome-se ao tipo penal do art. 69-A da Lei n. 9.605/98.
2. Sujeito ativo do crime é qualquer pessoa responsável pela conduta ilícita.
3. Preenchidos requisitos do art. 41 do Código de Processo Penal.
4. De acordo com a Súmula n. 709 do Supremo Tribunal Federal, o provimento de recurso em sentido estrito interposto contra a decisão que rejeita a denúncia importa no seu recebimento.

ACÓRDÃO

Vistos e relatados estes autos em que são partes as acima indicadas, decide a Egrégia Quinta Turma do Tribunal Regional Federal da 3ª Região, por maioria, dar provimento ao recurso em sentido estrito interposto pelo Ministério Público Federal para receber a denúncia contra Tiago Barberato e Pitta e Barberato Ltda. Me, pelo cometimento do delito previsto no art. 69-A da Lei n. 9.605/98, e determinar o prosseguimento da ação penal, nos termos do relatório e voto que ficam fazendo parte integrante do presente julgado.

São Paulo, 30 de setembro de 2019.
Andre Nekatschalow
Desembargador Federal Relator


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RECURSO EM SENTIDO ESTRITO Nº 0002260-77.2017.4.03.6000/MS
2017.60.00.002260-2/MS
RELATOR : Desembargador Federal ANDRÉ NEKATSCHALOW
RECORRENTE : Justica Publica
RECORRIDO(A) : TIAGO BARBERATO
: PITTA E BARBERATO LTDA -ME
ADVOGADO : MS013658 FLAVIA RENATA BARBOSA GOMES
No. ORIG. : 00022607720174036000 5 Vr CAMPO GRANDE/MS

DECLARAÇÃO DE VOTO

Trata-se de recurso em sentido estrito interposto pelo Ministério Público Federal contra a decisão de fls. 24/26, que rejeitou a denúncia contra Tiago Barberato e Pitta e Barberato Ltda-ME, pela prática do crime previsto no art. 69-A, caput, da Lei nº 9.605/98, com fundamento no art. 395, III, do Código de Processo Penal.

Em suas razões recursais de fls. 29/31, a acusação pleiteia a reforma da decisão, ao fundamento de que a conduta descrita na denúncia se enquadra no tipo penal do art. 69-A da Lei nº 9.605/98. Alega que o crime em questão é comum e que não está restrito às hipóteses de licenciamento, tratando de qualquer procedimento administrativo. Aduz, ainda, que o art. 1º da Instrução Normativa nº 112/06 do Ibama, estabelece que o Documento de Origem Florestal - DOF é documento público federal, logo sua falsificação repercute na emissão de licença para transportar e armazenar madeira. Por fim, afirma que o Superior Tribunal de Justiça, no julgamento do conflito de competência nº 151.291/ GO, conheceu do conflito sem considerar a conduta atípica.

Contrarrazões às fls. 34/39.

Não houve juízo de retratação (fl. 32).

Em parecer de fls. 46/48, a Procuradoria Regional da República manifestou-se pelo provimento do recurso em sentido estrito.

Em sessão de julgamento realizada em 30/09/2019, a Quinta Turma, por maioria, decidiu dar provimento ao recurso em sentido estrito para receber a denúncia contra Tiago Barberato e Pitta e Barberato Ltda. ME, pelo cometimento do delito previsto no art. 69-A da Lei nº 9.605/98, e determinar o prosseguimento da ação penal, nos termos do voto do Desembargador Federal André Nekatschalow, acompanhado pela Juíza Federal Convocada Louise Filgueiras.

Passo a declarar meu voto.

Divirjo do Relator para manter o reconhecimento da atipicidade dos fatos contidos na denúncia.

Consta dos autos que, no dia 25.08.16, a empresa denunciada PITTA E BARBERATTO LTDA - ME, por meio de seu sócio proprietário TIAGO BARBERATTO, apresentou relatório ambiental contendo informação falsa, consistente em saldo virtual de madeira serrada (743,27 m³) inexistente em estoque físico, no procedimento administrativo digital de controle do Documento de Origem Florestal - SISDOF.

Narra a acusação que, durante fiscalizações realizadas pelo Instituto Brasileiro do Meio Ambiente - IBAMA, verificou-se que o montante de madeira serrada cadastrada no sistema eletrônico em favor da empresa PITTA E BARBERATTO LTDA.ME estava demasiadamente elevado.

Diante desta suspeita, os agentes do IBAMA se dirigiram à empresa e constataram a existência de estoque real no pátio de apenas 184,25 m³ de madeira serrada, o que demonstrou que os 743,27 m³ de madeira apontados no SISDOF eram fictícios.

Segundo a narrativa acusatória, os fatos descritos foram todos feitos em benefício da empresa, já que as informações falsas permitiram a realização de transações comerciais à margem de qualquer controle fiscal.

Em decisão de fls. 24/26, o Juízo a quo rejeitou a denúncia com fundamento no art. 395, III, do Código de Processo Penal, com fundamento na atipicidade do fato, já que se trata de crime próprio, o qual não pode ser praticado pelo proprietário da empresa ou pela pessoa jurídica por ele responsável.

Em suas razões recursais, a acusação pleiteia, em síntese, o recebimento da denúncia.

No julgamento do recurso, o Relator Desembargador Federal André Nekatschalow concluiu pelo enquadramento típico dos fatos no art. 69-A da Lei nº 9.605/98, com o consequente recebimento da denúncia.

Ao contrário do Relator, reconheço a atipicidade da conduta praticada.

O delito previsto no art. 69-A da Lei nº 9.605/98 assim prevê:


" Art. 69-A. Elaborar ou apresentar, no licenciamento, concessão florestal ou qualquer outro procedimento administrativo, estudo, laudo ou relatório ambiental total ou parcialmente falso ou enganoso, inclusive por omissão:
Pena - reclusão, de 3 (três) a 6 (seis) anos, e multa.      
§ 1o Se o crime é culposo:      
Pena - detenção, de 1 (um) a 3 (três) anos.      
§ 2o A pena é aumentada de 1/3 (um terço) a 2/3 (dois terços), se há dano significativo ao meio ambiente, em decorrência do uso da informação falsa, incompleta ou enganosa".

Verifica-se que o tipo legal contempla como elemento normativo "estudo, laudo ou relatório ambiental total ou parcialmente falso ou enganoso". A finalidade do mencionado tipo penal é assegurar a lisura dos procedimentos administrativos ambientais, haja vista a possibilidade de um documento falso macular um procedimento de natureza ambiental.

Ora, as informações inseridas no SIDOF não se encaixam no conceito de relatório ambiental para fins penais, já que se trata de um sistema eletrônico cujos dados são incluídos pelas próprias empresas que utilizam recursos florestais.

Consoante a Portaria n° 253, de 18 de agosto de 2006, do Ministério do Meio Ambiente - MMA, que instituiu o sistema-DOF:


"Art. 1° Instituir, a partir de 1° de setembro de 2006, no âmbito do Instituto Brasileiro do Meio Ambiente e dos Recursos Naturais Renováveis-IBAMA, o Documento de Origem Florestal DOF em substituição à Autorização para Transporte de Produtos Florestais-ATPF.
§ 1° Entende-se por DOF a licença obrigatória para o transporte e armazenamento de produtos e subprodutos florestais de origem nativa, contendo as informações sobre a procedência desses produtos, gerado pelo sistema eletrônico denominado Sistema-DOF.
§ 2° O controle do DOF dar-se-á por meio do Sistema-DOF, disponibilizado no endereço eletronico do IBAMA, na Rede Mundial de Computadores - Internet.
Art. 2° Caberá ao IBAMA regulamentar os procedimentos necessários para a implantação do DOF."

A Instrução Normativa N° 112, de 21 de agosto de 2006, do IBAMA, ainda acrescenta que:


"Art. 10 O DOF será emitido e impresso pelo usuário, com base no saldo de produtos e subprodutos florestais, via acesso ao Sistema - DOF disponível na Internet no seguinte endereço eletrônico: www.ibama.gov.br".

O relatório ambiental, por sua vez, é um documento técnico, cujo objetivo principal é apresentar os resultados dos estudos técnicos e científicos da avaliação dos impactos ambientais.

No caso dos autos, não se pode dizer que eventual informação falsa a respeito de um saldo virtual de madeira serrada possa ser considerado como um relatório ambiental apresentado em procedimento de licenciamento ou procedimento administrativo.

Desta feita, por inexistir a necessária subsunção do fato à norma penal incriminadora, reconheço a atipicidade da conduta.

Ante o exposto, nego provimento ao recurso em sentido estrito (divirjo do Relator).

É o voto.


MAURICIO KATO
Desembargador Federal


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RECURSO EM SENTIDO ESTRITO Nº 0002260-77.2017.4.03.6000/MS
2017.60.00.002260-2/MS
RELATOR : Desembargador Federal ANDRÉ NEKATSCHALOW
RECORRENTE : Justica Publica
RECORRIDO(A) : TIAGO BARBERATTO
: PITTA E BARBERATO LTDA -ME
ADVOGADO : MS013658 FLAVIA RENATA BARBOSA GOMES
No. ORIG. : 00022607720174036000 5 Vr CAMPO GRANDE/MS

RELATÓRIO

Trata-se de recurso em sentido estrito interposto pelo Ministério Público Federal contra a decisão de fls. 24/26v., que rejeitou a denúncia contra Tiago Barberato e Pitta e Barberato Ltda-ME, pela prática do crime previsto no art. 69-A, caput, da Lei n. 9.605/98, com fundamento no art. 395, III, do Código de Processo Penal.
Alega-se, em síntese, o seguinte:
a) o Juízo a quo rejeitou a denúncia por considerar o fato atípico, tratando-se apenas de irregularidade administrativa;
b) a conduta descrita na denúncia subsome-se, com perfeição, ao crime do art. 69-A da Lei n. 9.605/98;
c) o crime em questão é comum, podendo ser praticado por qualquer pessoa;
d) o tipo penal não está restrito às hipóteses de licenciamento, tratando de qualquer procedimento administrativo. Ainda, o art. 36 do Novo Código Florestal afirma que o transporte, por qualquer meio, e o armazenamento de madeira, lenha, carvão e outros produtos ou subprodutos florestais oriundos de florestas nativas, para fins comerciais ou industriais, requerem licença do órgão competente do Sisnama;
e) o art. 1º da Instrução Normativa n. 112/06, do Ibama, estabelece que o Documento de Origem Florestal - DOF é documento público federal, que consiste em licença obrigatória para o controle do transporte e armazenamento de produtos e subprodutos florestais de origem nativa;
f) desta forma, a falsificação de dados no "sistema DOF" repercute na emissão de licença para transportar e armazenar madeira;
g) o Superior Tribunal de Justiça, no julgamento do conflito de competência n. 151.291/ GO, conheceu do conflito sem considerar a conduta atípica (fls. 29/31).
Foram apresentadas contrarrazões (fls. 34/39).
Não houve juízo de retratação (fl. 32/32v.).



A Ilustre Procuradora Regional da República, Dra. Janice Agostinho Barreto Ascari, opinou pelo provimento do recurso em sentido estrito (fls. 46/48v.).
Dispensada a revisão, nos termos regimentais.
É o relatório.


VOTO

O Ministério Público Federal denunciou Tiago Barberato e Pitta e Barberato Ltda - ME pelo crime do art. 69-A da Lei n. 9.605/98, por terem apresentado relatório contendo informações falsas, consistente em saldo virtual de madeira serrada:
1. Consta da inclusa notícia de fato que, em 25.08.16, a empresa denunciada PITTA E BARBERATTO LTDA - ME, por meio de seu sócio proprietário TIAGO BARBERATTO, apresentou relatório ambiental contendo informação falsa, consistente em saldo virtual de madeira serrada (743,27 m³) inexistente em estoque físico (fl. 03), no procedimento administrativo digital de controle do Documento de Origem Florestal - SISDOF (fl. 05).
2. Durante fiscalizações realizadas pelo Instituto Brasileiro do Meio Ambiente - IBAMA, no bojo da chamada Operação Fronteira Verde, iniciada com o objetivo de fiscalizar empresas com saldos suspeitos no sistema oficial de controle do DOF, verificou-se que o montante de madeira serrada cadastrada no sistema eletrônico em favor da denunciada empresa PITTA E BARBERATTO LTDA.ME encontrava-se bastante elevado - 927,53 m³ (fl. 05).
3. Em razão dessa constatação, agentes do IBAMA se dirigiram à empresa. Após fiscalização feita no local, verificaram a existência de estoque real no pátio de apenas 184,25 m³ de madeira serrada (fl. 05).
4. Diante disso, foi considerada a ocorrência de 743,27 m³ de madeira fictícia, existente apenas no SISDOF (fl. 05).
5. Tal estoque fictício, não baixado no sistema DOF, pode ser utilizado em outros delitos ambientais, servindo para dar aparência de legalidade em madeiras irregulares.
6. Os fatos acima descritos foram todos feitos em benefício da empresa, visto que as informações falsas permitiram que realizasse transações comerciais à margem de qualquer controle fiscal, o que redundou em vantagens incorporadas às suas receitas, beneficiando, por consequência, o codenunciado TIAGO BARBERATTO.
7. Expostos os fatos, tem-se a classificação legal.
8. O denunciado TIAGO BARBERATTO, por meio da pessoa jurídica PITTA E BARBERATTO LTDA-ME, de forma consciente e voluntária, elaborou relatórios ambientais falsos em procedimento administrativo do IBAMA, consistente no sistema eletrônico de licenciamento e controle do saldo de madeiras de Documento de Origem Florestal (SISDOF). Assim agindo, incorreu no crime tipificado no art. 69-A, da Lei nº 9.605/98.
9. A autoria encontra-se provada pelo relatório fotográfico (fls. 07/10), com a presença do denunciado TIAGO BARBERATTO durante a fiscalização. A materialidade está comprovada pelo Auto de Infração nº 9107098/E (fls. 03), e pelo relatório que discrimina todas as madeiras lançadas no sistema do DOF (fls. 04/10).
10. Diante do exposto, o MINISTÉRIO PÚBLICO FEDERAL denuncia TIAGO BARBERATTO como incurso nas penas do art. 69-A, caput, da Lei n. 9.605/98. Denuncia ainda a pessoa jurídica PITTA E BARBERATTO pela prática do delito tipificado no art. 69-A, caput, c. c. art. 3º, ambos da Lei nº 9.605/98, requerendo que, recebida e autuada a presente, seja instaurado o devido processo penal, citando-se os denunciados para que se veja processar e, ao final da regular instrução, condenar (fls. 2/5).

O Juízo a quo rejeitou a denúncia com fundamento no art. 395, III, do Código de Processo Penal, por entender que o fato é atípico, tratando-se apenas de irregularidade administrativa, e por ser próprio o crime do art. 69-A, da Lei n. 9.605/98, não podendo o proprietário da empresa e a pessoa jurídica responsável figurarem como sujeitos ativos do crime:

Segundo a denúncia, o réu TIAGO, na condição de proprietário da empresa PITTA E BARBERATTO LTDA - ME, apresentou relatório ambiental contendo informação falsa, em procedimento administrativo digital do IBAMA de controle de Documento de Origem Florestal - SISDOF. Aduz que se verificou que o montante de madeira serrada cadastrada no sistema eletrônico de controle do DOF, não condizia com o estoque físico no pátio da empresa.
Dispõe a Portaria n.° 253 de 18 de agosto de 2006 do Ministério do Meio Ambiente - MMA, que criou o sistema-DOF:
"Art. 1° Instituir, a partir de 1° de setembro de 2006, no âmbito do Instituto Brasileiro do Meio Ambiente e dos Recursos Naturais Renováveis-IBAMA, o Documento de Origem Florestal DOF em substituição à Autorização para Transporte de Produtos Florestais-ATPF.
§ 1° Entende-se por DOF a licença obrigatória para o transporte e armazenamento de produtos e subprodutos ?orestais de origem nativa, contendo as informações sobre a procedência desses produtos, gerado pelo sistema eletrônico denominado Sistema-DOF.
§ 2° O controle do DOF dar-se-á por meio do Sistema-DOF, disponibilizado no endereço eletronico do IBAMA, na Rede Mundial de Computadores - Internet.
Art. 2° Caberá ao IBAMA regulamentar os procedimentos necessários para a implantação do DOF."
Trata-se, portanto, de um sistema eletrônico em que as próprias empresas que utilizam recursos florestais ficam responsáveis pela informação, junto ao IBAMA, dos respectivos créditos, permitindo-lhes, a partir dai, a movimentação normal das entradas e saídas dos produtos florestais.
A Instrução Normativa N° 112, de 21 de agosto de 2006, do IBAMA, regulamentou os procedimentos para a utilização do sistema-DOF, fixando da seguinte forma o acesso pelo usuário:
"Art. 10 O DOF será emitido e impresso pelo usuário, com base no saldo de produtos e subprodutos ?orestais, via acesso ao Sistema - DOF disponível na Internet no seguinte endereço eletrônico: www.ibama.gov.br.
Art. 11. O acesso ao Sistema - DOF será feito pela pessoa física ou jurídica cadastrada na categoria correspondente junto ao Cadastro Técnico Federal - CTF e em situação regular perante o Ibama.
§ 1° O acesso de que trata este artigo será realizado por meio de senha, emitida pelo sistema de cadastro do Ibama diretamente para o usuário, a quem cabe zelar por sua guarda e responsabilidade pelo uso."
Vê-se, portanto, que o acesso da pessoa física ou jurídica no sistema-DOF se dá mediante a utilização de senha pelo usuário.
Destarte, tem-se que o fato narrado na denúncia não pode ser classificado no art. 69-A da Lei n.° 9.605/98.
Dispõe o art. 96-A da Lei n.° 9.605/98:
"Art. 69-A. Elaborar ou apresentar, no licenciamento, concessão florestal ou qualquer outro procedimento administrativo, estudo, laudo ou relatório ambiental total ou parcialmente falso ou enganoso, inclusive por omissão.
Pena - reclusão, de 3 (três) a 6 (seis) anos, e multa."
O referido dispositivo diz respeito à prática de ilícito referente à elaboração e apresentação de laudos periciais para fins de licenciamento. Trata-se, na realidade, de delito semelhante à falsa perícia (art. 342 do CP). O sujeito ativo pode ser apenas pessoa habilitada tecnicamente a elaborar estudo, relatório ou laudo. Classifica-se, portanto, como crime próprio.
Nesse sentido são os ensinamentos do eminente Guilherme de Souza Nucci
"515. Análise do núcleo do tipo: elaborar (construir em formato de trabalho a ser apresentado) ou apresentar (exibir, passar a terceiros) são as condutas alternativas deste tipo misto, que têm por objeto estudo (trabalho especifico sobre determinado assunto), laudo (parecer técnico) ou relatório (narração ordenada e minuciosa sobre certo fato). Essas peças devem ser constituídas, no todo ou em parte, de modo falso (não correspondente à realidade) ou enganoso (pronto a ludibriar terceiros). Cuida-se, na realidade, de um delito semelhante à falsa perícia (art. 342, CP).
516. Sujeitos ativo e passivo: o sujeito ativo e somente o técnico ou funcionário encarregado de elaborar estudo, relatório ou laudo. (...).
518. Momentos para a concretização do delito. Por ocasião de um procedimento administrativo qualquer, como para a expedição de licença (permissão duradoura) ou concessão (autorização para a exploração de determinada área ou recurso) ?orestal (relativa a matas em geral). Muitas normas de proteção ambiental necessitam de complementos para que tenham relevo penal (normas penais em branco). Esse é o motivo pelo qual inúmeras delas carregam, no tipo, as exigências de previa autorização do órgão competente. Ora, para que as licenças, autorizações, permissões em geral sejam fornecidas, as autoridades baseiam-se em técnicos, que elaboram pareceres, relatórios, laudos. entre outras peças. Se tais informes forem desencontrados da realidade ou tiverem por finalidade ludibriar a atenção dos fiscais do meio ambiente, podem ser expedidas autorizações irregulares. Estas, por sua vez, terminam, muitas vezes, por impedir a responsabilização criminal daqueles que devastam floretas com intuito de lucro, provocando graves danos ambientais. Grifei
520. Objetos material e jurídico: o objeto material é o estudo, laudo ou relatório ambiental falso ou enganoso. Os objetos jurídicos são a moralidade da administração e a proteção ao meio ambiente."
No caso, o sistema-DOF, meio eletrônico pelo qual as empresas que utilizam recursos ?orestais inserem informações referentes às entradas e saídas dos produtos florestais, não se caracteriza como estudo, laudo ou relatório ambiental, para fins de classificação no disposto no art. 69-A da Lei n.° 9.605/98.
Além disso, o réu, tido como proprietário ou administrador da pessoa jurídica, apontado como o responsável pela inserção de dados no sistema-DOF e a própria pessoa jurídica, não podem figurar como Sujeito ativo do referido crime, por não se qualificarem como técnicos encarregados de elaborar estudo, relatório ou laudo, mas usuários do sistema.
Logo, tem-se que os fatos imputados aos réus, isto é, elaborar relatórios ambientais falsos em procedimento administrativo do IBAMA, consistente no sistema eletrônico de licenciamento e controle do saldo de madeiras de Documentos de Origem Florestal-DOF, não se enquadram no tipo previsto no art. 69-A da Lei n.° 9.605/98.
Assim, o fato narrado na denúncia é atípico, tratando-se apenas de irregularidade administrativa.
Ante o exposto, e o mais que dos autos consta, REJEITO A DENÚNCIA, oferecida contra TIAGO BARBERATTO e PITTA E BARBERATTO LTDA-ME, qualificados nos autos, em relação a imputação da prática do ilícito previsto no art. 69-A, caput, da Lei n.° 9.605/98, com fundamento no art. 395, inciso III, do Código de Processo Penal.

O Ministério Público Federal requereu a reforma da sentença e a Procuradoria Regional da República apresentou parecer favorável ao pedido, para que a denúncia seja recebida, sem prejuízo de diverso enquadramento legal do fato típico, que poderia caracterizar o crime do art. 299 do Código Penal ou aquele do art. 46, parágrafo único, da Lei n. 9.605/98.
Assiste razão ao Ministério Público Federal.
O Juízo a quo considerou o crime do art. 69-A, da Lei n. 9.605/98, como crime próprio, não sendo possível sua prática por pessoa não habilitada tecnicamente a elaborar estudo, relatório ou laudo.
Esse entendimento não encontra respaldo na própria Lei n. 9.605/98, que em seu art. 2º afirma que aquele que, de qualquer forma, concorrer para os crimes previstos na lei específica, incidirá nas penas a eles cominadas, bem como o diretor, o administrador, o membro do conselho e de órgão técnico, o auditor, o gerente, o preposto ou mandatário de pessoa jurídica, que, sabendo da conduta criminosa de outrem, deixar de impedir sua prática, quando podia agir para evitá-la.
Evidente que não se trata de crime próprio e sim de crime comum, passível de ser cometido por qualquer pessoa.
Ainda, o Juízo a quo considerou que o sistema DOF (Documentos de Origem Florestal) não se caracteriza como estudo, laudo ou relatório para as finalidades elencadas no art. 69-A da Lei n. 9.605/98, que seriam o licenciamento e a concessão florestal.
A literalidade do art. 69-A da Lei n. 9.605/98 faz referência à apresentação de informações falsas ou enganosas em relatório ambiental não apenas no licenciamento e concessão florestal, mas em qualquer outro procedimento administrativo.
O Ministério Público Federal esclarece, em seu recurso, que o Documento de Origem Florestal (DOF), referido na sentença, consiste em licença obrigatória para o controle do transporte e armazenamento de produtos e subprodutos florestais de origem nativa, conforme instituído pela Instrução Normativa n. 112/06, do Ibama.
Desta forma, é possível concluir que as informações enganosas, inseridas no sistema, caracterizam o fato típico do art. 69-A, da Lei n. 9.605/98.
Há indícios suficientes de autoria e materialidade, constantes do Auto de Infração e do relatório fotográfico (fls. 9/16).
Presente a justa causa, que legitima a instauração do processo penal, não se afigura adequado obstar à acusação o exercício da ação penal, na qual haverá a produção de novas provas, sob o crivo do contraditório e da ampla defesa, para completo esclarecimento dos fatos objeto da denúncia.
Tendo a denúncia atendido aos requisitos do art. 41 do Código de Processo Penal, com a exposição do fato criminoso, os indícios de autoria e a classificação jurídica do delito, a sentença deve ser reformada, a determinar a instauração da ação penal para esclarecimento dos fatos durante a instrução processual penal.
Denúncia. Recebimento. Tribunal. Admissibilidade. De acordo com a Súmula n. 709 do Supremo Tribunal Federal, o provimento de recurso em sentido estrito interposto contra a decisão que rejeita a denúncia importa no seu recebimento:
Salvo quando nula a decisão de primeiro grau, o acórdão que provê o recurso contra a rejeição da denúncia vale, desde logo, pelo recebimento dela.
Ante o exposto, DOU PROVIMENTO ao recurso em sentido estrito para receber a denúncia contra Tiago Barberato e Pitta e Barberato Ltda. Me, pelo cometimento do delito previsto no art. 69-A da Lei n. 9.605/98, e determinar o prosseguimento da ação penal.
É o voto

Andre Nekatschalow
Desembargador Federal


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