Diário Eletrônico

PODER JUDICIÁRIO

TRIBUNAL REGIONAL FEDERAL DA 3ª REGIÃO

D.E.

Publicado em 26/11/2019
APELAÇÃO CRIMINAL Nº 0001715-13.2009.4.03.6121/SP
2009.61.21.001715-0/SP
RELATOR : Desembargador Federal JOSÉ LUNARDELLI
APELANTE : LIGIA MARIA BAPTISTELLA
ADVOGADO : SP266508 EDUARDO DE MATTOS MARCONDES (Int.Pessoal)
APELANTE : SERGIO GONTARCZIK
ADVOGADO : SP338192 JOSÉ DE ALENCAR MONTEIRO JUNIOR e outro(a)
: SP322802 JOSÉ DE ALENCAR MONTEIRO
APELADO(A) : Justica Publica
EXCLUIDO(A) : ELIANA GOMES DE OLIVEIRA
No. ORIG. : 00017151320094036121 1 Vr TAUBATE/SP

EMENTA

APELAÇÃO CRIMINAL. ART. 313-A DO CP. ALEGAÇÃO DE INÉPCIA DA DENÚNCIA. INOCORRÊNCIA. PEDIDO DE DESCLASSIFICAÇÃO. IMPERTINÊNCIA. CERCEAMENTO DE DEFESA. INOCORRORRÊNCIA. PRELIMINARES REJEITADAS. MATERIALIDADE, AUTORIA E DOLO COMPROVADOS. DOSIMETRIA DA PENA DA RÉ MANTIDA. DOSIMETRIA DA PENA DO RÉU REFORMADA. CRITÉRIO TRIFÁSICO DA MULTA DA RÉ REVISTO DE OFÍCIO. GRATUIDADE DA JUSTIÇA. APELAÇÃO DO RÉU PARCIALMENTE PROVIDA. APELAÇÃO DA RÉ IMPROVIDA.
Demonstrados indícios suficientes de autoria e da materialidade delitiva, não há que se falar em inépcia da denúncia, falta de justa causa ou em nulidade da ação penal, eis que a denúncia preencheu satisfatoriamente os requisitos do artigo 41 do Código de Processo Penal, contendo a exposição do fato criminoso, suas circunstâncias, a qualificação dos agentes e a classificação do crime, bem como permitiu ao réu o exercício pleno do direito de defesa assegurado pela Constituição Federal.
Os réus obtiveram vantagem ilícita, mediante fraude, em detrimento do INSS o que, à primeira vista, adequa-se ao art. 171, § 3º do Código Penal. No entanto, a fraude utilizada pelos réus envolveu a utilização de sistemas informatizados e/ou banco de dados do INSS, o que atrai a incidência do art. 313-A do Código Penal, específico para a situação. Pedido de desclassificação impertinente.
Não assiste razão à defesa da ré quanto à alegação de cerceamento de defesa, pois o processo físico foi dado como desaparecido, havendo nos autos do inquérito policial em apenso as peças essenciais do referido procedimento.
As provas amealhadas demonstram que foram inseridas informações falsas nos sistemas informatizados do INSS, com o fim de garantir à segurada a aposentadoria por tempo de contribuição. Após o desconto dos períodos não comprovados, o tempo de contribuição apurado foi insuficiente para concessão do benefício.
Está fartamente demonstrado que os dados inseridos pela ré no sistema informatizado do INSS não estavam de acordo com os documentos que instruíram o requerimento de concessão de benefício.
Restou comprovado que os réus agiram com o dolo necessário para a configuração do delito de inserção de dados falsos em sistema de informações, com o fim de obter o benefício previdenciário em favor de terceiro.
Condenação dos réus mantida.
Dosimetria da pena da ré sem alterações. A pena definitiva do réu restou fixada em 03 (três) anos, 09 (nove) meses e 15 (quinze) dias de reclusão, e 18 (dezoito) dias-multa, diante da exclusão da valoração negativa das consequências do crime.
Em obediência à proporcionalidade que a pena de multa deve guardar com a pena privativa de liberdade, bem como de acordo com o sistema trifásico de dosimetria da pena, de ofício, reforma-se a pena de multa da ré para 21 (vinte e um) dias-multa, conservado o valor unitário do dia-multa no mínimo legal.
Concessão dos benefícios da justiça gratuita, conforme pleito realizado no apelo do réu.
Preliminares rejeitadas. Apelação do réu parcialmente provida. Apelação da ré improvida.

ACÓRDÃO

Vistos e relatados estes autos em que são partes as acima indicadas, decide a Egrégia Décima Primeira Turma do Tribunal Regional Federal da 3ª Região, por unanimidade, rejeitar as preliminares e: NEGAR PROVIMENTO à apelação da ré LIGIA MARIA BAPTISTELLA; DAR PARCIAL PROVIMENTO à apelação do réu SERGIO GONTARCZIK para reduzir a sua pena para 03 (três) anos, 09 (nove) meses e 15 (quinze) dias de reclusão e18 (dezoito) dias-multa, conservado o valor unitário do dia-multa no mínimo legal, fixar o regime inicial semiaberto e conceder a justiça gratuita; DE OFÍCIO, reduzir a pena de multa da ré LIGIA MARIA BAPTISTELLA para 21 (vinte e um) dias-multa, nos termos do relatório e voto que ficam fazendo parte integrante do presente julgado.

São Paulo, 07 de novembro de 2019.
JOSÉ LUNARDELLI
Desembargador Federal


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APELAÇÃO CRIMINAL Nº 0001715-13.2009.4.03.6121/SP
2009.61.21.001715-0/SP
RELATOR : Desembargador Federal JOSÉ LUNARDELLI
APELANTE : LIGIA MARIA BAPTISTELLA
ADVOGADO : SP266508 EDUARDO DE MATTOS MARCONDES (Int.Pessoal)
APELANTE : SERGIO GONTARCZIK
ADVOGADO : SP338192 JOSÉ DE ALENCAR MONTEIRO JUNIOR e outro(a)
: SP322802 JOSÉ DE ALENCAR MONTEIRO
APELADO(A) : Justica Publica
EXCLUIDO(A) : ELIANA GOMES DE OLIVEIRA
No. ORIG. : 00017151320094036121 1 Vr TAUBATE/SP

RELATÓRIO

O EXCELENTÍSSIMO SENHOR DESEMBARGADOR FEDERAL JOSÉ LUNARDELLI:


Cuida-se de apelações, interpostas por SERGIO GONTARCZIK e LIGIA MARIA BAPTISTELLA, em face da sentença que os condenou como incursos nas sanções do art. 313-A do Código Penal.

Consta da denúncia de fls. 222/231 que LIGIA MARIA BAPTISTELLA, então servidora do INSS, no dia 30/11/2007, inseriu informações falsas nos sistemas previdenciários, com o intuito de obter vantagem indevida em favor de Eliana de Oliveira Silva, consistente em aposentadoria por tempo de contribuição, a que ela não fazia jus. Foi inserida a informação falsa de que a segurada morava no município de São Bento do Sapucaí/SP (a fim de justificar a ausência de agendamento eletrônico para o protocolo de seu requerimento), bem como que a atividade exercida por Eliana na empresa "Telecomunicações de São Paulo S.A", no período de 16 de agosto de 1978 a 28 de abril de 1995 fora laborada em atividade classificada como insalubre, burlando a necessidade de apresentação da respectiva documentação comprobatória, tudo com a finalidade de garantir à segurada o tempo de contribuição necessário à concessão do benefício.

O réu SERGIO GONTARCZIK, por sua vez, ciente da condição de servidora da corré LIGIA MARIA BAPTISTELLA, concorreu para a prática do delito previsto no art. 313-A do Código Penal praticado por ela, na medida em que foi a pessoa contratada pela segurada para requerer o benefício previdenciário.

A denúncia foi recebida em 25 de agosto de 2014 (fl. 232).

Processado o feito, sobreveio a r. sentença de fls. 449/460, publicada em 29/11/2016 (fl. 461), que condenou os réus pela prática do crime previsto no art. 313-A do Código Penal, nos termos do art. 29 do Código Penal.

A pena da ré LIGIA MARIA BAPTISTELLA foi fixada em 04 (quatro) anos e 04 (quatro) meses de reclusão, em regime inicial semiaberto, e 91 (noventa e um) dias-multa, no valor mínimo legal e o réu SERGIO GONTARCZIK foi condenado à pena de 05 (cinco) anos, 07 (sete) meses e 29 (vinte e nove) dias de reclusão, em regime inicial fechado (conforme sentença proferida à fl. 486 que acolheu os embargos de declaração opostos pelo Ministério Público Federal), e 150 (cento e cinquenta) dias-multa, no valor mínimo legal. Ainda, os réus foram condenados ao pagamento das custas processuais.

Em face da sentença foram opostos embargos de declaração à fls. 500/502 pelo réu SERGIO GONTARCZIK, que foram rejeitados pela sentença de fls. 504.

Diante da certidão de fl. 510 comunicando que o réu SERGIO GONTARCZIK estava foragido, e da manifestação do Ministério Público Federal (fl. 511), o r. juízo a quo deferiu o pedido de prisão preventiva do acusado (fl. 514).

Recorrem os réus.

O acusado SERGIO GONTARCZIK interpôs apelação (fls. 527/532), na qual alega que: a) a denúncia é inepta, pois não descreveu a conduta individualizada do apelante, "sendo certo que o mesmo não é, nem nunca foi funcionário público"; b) deve haver a "desclassificação do suposto delito para o tipo penal dos artigos 168-A ou 171 do Código Penal", e c) a vítima (autarquia federal) não agiu com o dever de cuidado com a coisa pública. Caso mantida a condenação, requer a aplicação da continuidade delitiva em relação aos autos nº 0000785-92.2009.403.6121, "aplicando-se a pena de um só dos crimes, aumentada de 1/6 (um sexto) a 2/3 (dois terços)" e a reforma da dosimetria da pena e do regime inicial fixado, nos termos da Súmula 718 do STF. Postula, ainda, a revogação da prisão preventiva e a concessão da justiça gratuita.

A ré LIGIA MARIA BAPTISTELLA suscita, em suas razões recursais (fls. 539/543), o cerceamento da sua defesa, diante da ausência nos autos do procedimento administrativo em que fora apurada a suposta conduta criminosa deste processo. No mérito, alega que deve ser absolvida por ausência de provas quanto à autoria e dolo. Caso mantida a condenação, requer a redução da pena ao mínimo legal.

Contrarrazões do Ministério Público Federal (fls. 546/554).

Nesta Corte, a Procuradoria Regional da República, por meio do parecer de fls. 555/559, opinou pelo não provimento dos recursos dos réus.

É o relatório.

Sujeito à revisão, na forma regimental.


JOSÉ LUNARDELLI
Desembargador Federal Relator


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APELAÇÃO CRIMINAL Nº 0001715-13.2009.4.03.6121/SP
2009.61.21.001715-0/SP
RELATOR : Desembargador Federal JOSÉ LUNARDELLI
APELANTE : LIGIA MARIA BAPTISTELLA
ADVOGADO : SP266508 EDUARDO DE MATTOS MARCONDES (Int.Pessoal)
APELANTE : SERGIO GONTARCZIK
ADVOGADO : SP338192 JOSÉ DE ALENCAR MONTEIRO JUNIOR e outro(a)
: SP322802 JOSÉ DE ALENCAR MONTEIRO
APELADO(A) : Justica Publica
EXCLUIDO(A) : ELIANA GOMES DE OLIVEIRA
No. ORIG. : 00017151320094036121 1 Vr TAUBATE/SP

VOTO

O EXCELENTÍSSIMO SENHOR DESEMBARGADOR FEDERAL JOSÉ LUNARDELLI:

Da inépcia da denúncia.

A defesa do réu SERGIO GONTARCZIK aduz, em seu recurso, a inépcia da denúncia, diante da ausência de individualização de sua conduta delituosa.

Não assiste razão à defesa.

Como é cediço, na fase inicial da ação penal, vigora o princípio in dubio pro societate. Nesse sentido, confira-se:

"RECURSO ESPECIAL. PENAL E PROCESSO PENAL. CRIME DE PREVARICAÇÃO. PRESCRIÇÃO DA PRETENSÃO PUNITIVA. CRIME DE TORTURA. REJEIÇÃO DA DENÚNCIA. INEXISTÊNCIA DE INÉPCIA. DESCRIÇÃO PORMENORIZADA DOS FATOS CRIMINOSOS. FALTA DE JUSTA CAUSA NÃO EVIDENCIADA DE PLANO. INDÍCIOS SUFICIENTES DE AUTORIA E MATERIALIDADE TRAZIDOS PELA PROVA TESTEMUNHAL E PELOS EXAMES DE CORPO DE DELITO. IMPOSSIBILIDADE DE DESCONSTITUIÇÃO DESSAS PROVAS INDICIÁRIAS SEM A ADEQUADA INSTRUÇÃO CRIMINAL. RECURSO ESPECIAL PARCIALMENTE CONHECIDO E, NESSA EXTENSÃO, PARCIALMENTE PROVIDO.
1. Prejudicado o pleito de recebimento da denúncia em relação ao crime de prevaricação, pois mesmo considerada a pena máxima cominada em abstrato já transcorreu lapso suficiente ao reconhecimento da prescrição da pretensão punitiva estatal até a presente data.
2. A teor do princípio in dubio pro societate, a rejeição de denúncia que descreve a existência do crime em tese, bem como a participação dos acusados, possibilitando-lhes o pleno exercício do direito de defesa, só é admissível quando emerge dos autos, de forma inequívoca, a inocência do acusado, a atipicidade da conduta ou a extinção da punibilidade.
3. A inicial acusatória narra condutas que se amoldam, em tese, ao tipo penal de tortura; sendo certo que atende aos requisitos elencados no art. 41 do Código de Processo Penal, pois apresenta indícios suficientes de autoria e materialidade, de forma suficiente para a deflagração da persecução penal.
4. A dúvida quanto à existência do evento criminoso não têm o condão de impedir a persecução penal mediante a instauração do devido processo-crime, com a observância dos postulados decorrentes da ampla defesa, do contraditório e do devido processo legal.
5. Recurso especial parcialmente conhecido e, nessa extensão, parcialmente provido."
(STJ, 5ª Turma, REsp 1113662/SP. Rel. Min. Laurita Vaz, DJe 07/03/2014).

Os fatos descritos na denúncia evidenciam a ocorrência de fato típico, qual seja, a prática do crime do art. 313-A do Código Penal, e a acusação encontra suporte probatório nos elementos coligidos aos autos, especialmente no procedimento administrativo que instruiu a peça inicial.

Demonstrados indícios suficientes de autoria e da materialidade delitiva, não há que se falar em inépcia da denúncia, falta de justa causa ou em nulidade da ação penal, eis que a denúncia preencheu satisfatoriamente os requisitos do artigo 41 do Código de Processo Penal, contendo a exposição do fato criminoso, suas circunstâncias, a qualificação dos agentes e a classificação do crime, bem como permitiu ao réu o exercício pleno do direito de defesa assegurado pela Constituição Federal.

Ademais, o C. Superior Tribunal de Justiça "tem posicionamento jurisprudencial no sentido de que com a superveniência de sentença condenatória fica preclusa a alegação de inépcia da denúncia." (5ª Turma, AgRg no REsp 1325081 / SC, Rel. Min. MOURA RIBEIRO, DJe 21/02/2014).

Rejeitado, portanto, o argumento da defesa.

Da capitulação jurídica

Diante dos fatos narrados na denúncia de fls. 222/231, a acusação imputou a SERGIO GONTARCZIK e LIGIA MARIA BAPTISTELLA a conduta descrita no artigo 313-A do Código Penal, que assevera in verbis:

"Art. 313 -A. Inserir ou facilitar, o funcionário autorizado, a inserção de dados falsos, alterar ou excluir indevidamente dados corretos nos sistemas informatizados ou bancos de dados da Administração Pública com o fim de obter vantagem indevida para si ou para outrem ou para causar dano:
Pena - reclusão, de 2 (dois) a 12 (doze) anos, e multa."

O acusado SERGIO GONTARCZIK interpôs apelação (fls. 527/532), na qual alega que deve haver a "desclassificação do suposto delito para o tipo penal dos artigos 168-A ou 171 do Código Penal".

Não prospera referida alegação.

Aponta a denúncia que os réus, em conluio, inseriram dados falsos em sistema informatizado do INSS. Segundo a acusação, SERGIO GONTARCZIK foi contratado por Eliana de Oliveira Silva para intermediar o requerimento do benefício de aposentadoria por tempo de contribuição. Por sua vez, a então servidora do INSS lotada na agência do INSS em Campos do Jordão/SP, LIGIA MARIA BAPTISTELLA, tinha a incumbência de inserir dados falsos no sistema da autarquia, com a finalidade de garantir o êxito do requerimento do benefício.

Assim, os réus obtiveram vantagem ilícita, mediante fraude, em detrimento do INSS o que, à primeira vista, adequa-se ao art. 171, § 3º do Código Penal. No entanto, a fraude utilizada pelos réus envolveu a utilização de sistemas informatizados e/ou banco de dados do INSS, o que atrai a incidência do art. 313 -A do Código Penal, específico para a situação.

A despeito de SERGIO GONTARCZIK não ser funcionário público, saliente-se que o artigo 30 do Código Penal, prevê, mutatis mutandis, que as condições de caráter pessoal se comunicam quando elementares do crime, o que se verifica in casu. Por conseguinte, reconhecido o concurso de pessoas na prática do crime previsto no art. 313 -A, o particular (não funcionário público) que tenha a vontade livre e consciente para agir com o funcionário público na obtenção de vantagem ilícita, deve responder pelo crime funcional como coautor ou partícipe.

No caso concreto, a denúncia aponta que SERGIO GONTARCZIK atuou em concurso com LIGIA MARIA BAPTISTELLA, então servidora pública do INSS, restando demonstrado que sabia dessa qualidade e utilizou-a para garantir o êxito da empreitada criminosa. Consequentemente, sua conduta também está inserida no art. 313-A do Código Penal, nos termos do art. 30 do mesmo codex.

Nesse sentido:

PENAL. INSERÇÃO DE DADOS FALSOS EM SISTEMA INFORMATIZADO. "EMENDATIO LIBELLI". CONCESSÃO INDEVIDA DE BENEFÍCIO PREVIDENCIÁRIO. MATERIALIDADE DEMONSTRADA. AUTORIA NÃO COMPROVADA. APLICAÇÃO DO PRINCÍPIO IN DUBIO PRO REO. 1. Em relação aos réus Teresinha Aparecida Ferreira de Sousa e Celso Marcansole, os fatos narrados na denúncia subsumem-se ao tipo descrito no art. 313 -A do Código Penal, sendo inviável a aplicação do art. 171, § 3º, do referido diploma legal, tendo em vista o princípio da especialidade. Não há qualquer limitação para a aplicação da regra do artigo 383 do Código de Processo Penal em segunda instância. 2. Materialidade delitiva devidamente demonstrada. 3. Autoria não comprovada. 4. Não foram produzidas provas efetivas no tocante ao dolo da beneficiária Iolanda Micheletto Maia, elemento essencial à caracterização do crime de estelionato qualificado, de modo que deve ser mantida a absolvição da ré. 5. Ante a ausência de prova suficiente da participação do réu Celso Marcansole na ação delituosa, impõe-se a absolvição com fundamento no princípio in dubio pro reo. 6. Apelação de Celso Marcansole provida. Apelação da acusação desprovida. De ofício, alterado o fundamento da absolvição de Iolanda Micheletto Maia para o inciso VII do artigo 386 do Código de Processo Penal. (ACR 00084889320074036105, JUIZA CONVOCADA DENISE AVELAR, TRF3 - SEGUNDA TURMA, e-DJF3 Judicial 1 DATA:12/11/2015 ..FONTE_REPUBLICACAO:.)
"PENAL. PROCESSO PENAL. MATERIALIDADE E AUTORIA DELITIVA COMPROVADAS. ESTELIONATO PREVIDENCIÁRIO. CÓDIGO PENAL, ART. 171 , § 3º. DESCLASSIFICAÇÃO PARA INSERÇÃO DE DADOS FALSOS EM SISTEMA DE INFORMAÇÕES. CÓDIGO PENAL, ART. 313 -A. PRINCÍPIO DA ESPECIALIDADE . ADMISSIBILIDADE. EMENDATIO LIBELLI. VIOLAÇÃO AO PRINCÍPIO DA CORRELAÇÃO ENTRE A DENÚNCIA E A SENTENÇA. INOCORRÊNCIA. EXAME DE CORPO DE DELITO. PRESCINDIBILIDADE. DOSIMETRIA. PENA-BASE. CULPABILIDADE NORMAL PARA O TIPO . AGRAVANTE DO ART. 62, IV, DO CÓDIGO PENAL. VANTAGEM INDEVIDA. ELEMENTO DO TIPO . INAPLICABILIDADE.
(...)
4. A conduta descrita na denúncia subsume-se exatamente ao tipo descrito no art. 313 -A do Código Penal, consistente em inserir dados falsos nos sistemas informatizados da Administração Pública com o fim de obter vantagem indevida para outrem, sendo inviável, por força do princípio da especialidade , a aplicação do art. 171 , § 3º, do Código Penal.
(...)
8. Apelações não providas."
(APELAÇÃO CRIMINAL Nº 0013549-71.2003.4.03.6105/SP, Rel. Des. Fed. André Nekatschalow, TRF 3, 5ª Turma, j. 13.08.2014)

Por fim, resta absolutamente impertinente o pedido de desclassificação da conduta delitiva em análise para crime descrito no artigo 168-A do Código Penal, tendo em vista os núcleos e bens jurídicos diferentemente tutelados.

Sendo assim, não assiste razão à defesa quando pleiteia as referidas desclassificações.

Do cerceamento do direito de defesa.

A ré LIGIA MARIA BAPTISTELLA suscita, em suas razões recursais (fls. 539/543), o cerceamento da sua defesa, diante da ausência nos autos do procedimento administrativo em que fora apurada a suposta conduta criminosa.

Sem razão, pois o processo físico foi dado como desaparecido (fls. 03/05), havendo nos autos do inquérito policial em apenso (IPL nº 19-0167/2009) as peças essenciais do referido procedimento (cópias referentes ao resumo do benefício, extrato de tempo de serviço e documentos pessoais da segurada). Assim, a expedição de ofício à Previdência Social para juntada do procedimento administrativo que embasou a denúncia revela-se completamente despicienda, uma vez que há nos autos CD contendo cópia da reconstituição do processo administrativo NB 42/141.533.318-9 (fls. 161) e, ademais, cabe à defesa providenciar documentos que entende serem relevantes para a comprovação de suas alegações.

Rejeitadas as preliminares, passo à análise do mérito.

Da Materialidade

Analisando as apelações das defesas dos réus, verifico que não houve impugnação quanto à materialidade do delito previsto no art. 313-A do Código Penal, pelo que é incontroversa. Ademais, não se verifica a existência de qualquer ilegalidade neste ponto a ser corrigida de ofício por este Tribunal. A sentença assim se pronunciou:

"MATERIALIDADE
Resta incontroverso que houve a concessão indevida do benefício previdenciário de aposentadoria por tempo de contribuição nº 141.533.318-9 a segurada Eliana Gomes de Oliveira mediante inserção de tempo de serviço submetido a condições insalubres sem comprovação. Pois bem. Segundo apurado pelo INSS (DVD encartado à fl. 160, referente ao processo administrativo de concessão de benefício n.º 42/141.533.318-9), a inserção maliciosa de dados falsos no sistema informatizado da Previdência Social consistiu na informação (inserida em 30.11.2007) de que a segurada Eliana Gomes de Oliveira exerceu na empresa TELECOMUNICAÇÕES DE SÃO PAULO S.A., no período compreendido entre 16.08.1978 a 28.04.1995 atividade especial (telefonista), sem a existência de formulário próprio para a realização do enquadramento. Ademais, verificou-se que somente com a inserção dos dados falsos de atividades laborativas foi possível a contagem de tempo de serviço suficiente para concessão do benefício, ou seja, 26 anos, 09 meses e 20 dias. Muito embora o INSS tenha notificado Eliana Gomes de Oliveira para regularizar sua situação perante a referida Autarquia (apresentação de documentos, CTPS), não o fez, razão pela qual o pagamento do benefício foi bloqueado (fl. 18 do arquivo "parte 1" da mídia de fl. 160).Em juízo, declarou que laborou na TELECOMUNICAÇÕES DE SÃO PAULO S/A, sendo que por seis anos exerceu a função de telefonista e o restante como "atendente de serviço I" e como "monitora". Tempo estimado de serviço: 19 anos (16/08/1978 até 13/07/1999 - fl. 06, parte I da mídia de fl. 160). Por outro lado, a inserção de endereço inexistente para Eliana Gomes de Oliveira, como sendo no Município de São Bento do Sapucaí/SP (fl. 14 do IPL), não constitui, no presente caso, fato típico. Senão vejamos. O artigo 393, I, "b", da Instrução Normativa INSS/PRES n.º 11/2006, vigente à época, permitia a inclusão ou alteração de endereço do segurado apenas mediante ato declaratório. De fato, apurou-se que, na realidade, a segurada residia na cidade São Paulo (fl. 07), situação que propiciou a dispensa de agendamento prévio e habilitação/concessão do benefício, na Agência da Previdência Social em Campos do Jordão/SP. A inserção do endereço como sendo em São Bento do Sapucaí gerou a dispensa do agendamento prévio porque havia um acordo na agência de Campos do Jordão/SP nesse sentido visando beneficiar os segurados residentes naquele Município, fato incontroverso nos autos. Contudo, a normativa expedida pelo INSS possibilitava a inserção de dado desse gênero no sistema informatizado sem exigência de comprovação do endereço por parte do segurado, razão pela qual forçoso concluir que, no máximo, serviu como ato preparatório voltado para a consumação do delito de inserção de tempo de serviço a maior no sistema informatizado do INSS. Destarte, patente a configuração da inserção de dados falsos no sistema do INSS, consistente na inclusão de tempo de serviço a maior, bem como exercido em condições prejudiciais à saúde com a conversão em tempo comum, com a finalidade de obter vantagem indevida."

Diante do exposto, restou verificado que houve inserção de tempo de serviço submetido a condições insalubres sem comprovação no sistema informatizado do INSS com o fim de garantir o cumprimento da carência de tempo exigida e permitir a concessão indevida do benefício previdenciário NB 141.533.318-9 da segurada Eliana Gomes de Oliveira.

Ressalte-se, por fim, que não prospera a alegação do réu de que a vítima (autarquia federal) não agiu com o dever de cuidado com a coisa pública. As informações inverídicas inseridas no sistema informatizado do INSS são potencialmente lesivas à fé pública e permitem a tipificação da conduta.

Comprovada, portanto, a materialidade do crime do art. 313-A do Código Penal.

Da autoria e do Dolo

A autoria e o dolo também restaram demonstrados, em que pese a negativa dos réus SERGIO GONTARCZIK e LIGIA MARIA BAPTISTELLA.

Com efeito, a auditoria realizada no benefício NB 141.533.318-9 da segurada Eliana Gomes de Oliveira aponta que a ré LIGIA MARIA BAPTISTELLA (matrícula 0941126) foi a responsável pela habilitação e concessão do benefício (fl. 12), tendo a mesma "autorização para inserir/excluir/alterar dados nos sistemas do INSS durante os atos de habilitação e concessão de benefícios", conforme assegura ofício nº 062/MOB/BENEF/GEX emitido pela autarquia federal (fls. 114/117). Ainda, de acordo com seu depoimento policial (fls. 39/41), a acusada "ocupou a função de chefe do setor de benefícios no período de 2003 a 2007", o que demonstra seu amplo conhecimento na área de benefícios previdenciários. A testemunha Marilene Domingues Pereira dos Santos, em seu depoimento judicial, corroborou as informações acima. Confira-se trecho:

"MP: A senhora chegou a trabalhar com a Sra. Lígia?
Testemunha: Trabalhei.
MP: Ela fazia o quê?
Testemunha: Ela era chefe de benefícios.
MP: E a senhora fazia o quê?
Testemunha: Eu atendia na linha de frente. É o atendimento inicial: habilitação, concessão...
MP: E a Lígia era chefe da Senhora?
Testemunha: Chefe.
MP: Então a Lígia era a responsável por todo o setor de benefícios?
Testemunha: Isso.
MP: A Lígia detinha conhecimento sobre a sistemática de trabalho no setor de benefícios?
Testemunha: Sim, porque eu não sabia nada, não fazia nada. Então todas as dúvidas tinham que perguntar pra Lígia". (mídia de fl. 383)

Em relação ao réu SERGIO GONTARCZIK, a segurada Eliana Gomes de Oliveira, em sede policial (fls. 67/68), declarou que SERGIO era o responsável por providenciar a sua aposentadoria. Ainda, em juízo, relatou:

"MP: Eu vou pedir pra senhora nos contar como conheceu o advogado Sergio Gontarczik, o que a senhora tratou com ele, que documentos a senhora entregou e qual o resultado disso.
Testemunha: eu pedi pra ele ver minha aposentadoria especial. Ele disse que sim e me pediu os documentos. levei os documentos e passou um tempo ele disse que a aposentadoria tinha saído em São Bento do Sapucaí ou Campos do Jordão, não lembro. No dia que saiu a aposentadoria, a gente recebeu e a secretaria dele estava do lado e pegou toda a parte dela. quer dizer, eu não peguei nada. O combinado com ele foi isso aqui, ó. Dois cheques ele me devolveu, e dois não me devolveu.
MP: A senhora então combinou de pagar...
Testemunha: Quatro parcelas do que eu iria receber.
MP: Foi avisado para a senhora que o Dr Sergio ia colocar um período maior de trabalho pra justificar o pedido de benefício?
Testemunha: Não." (mídia de fl. 383)

Para ratificar a sua versão dos fatos, juntou o boleto e recibos relativos ao pagamento que fez ao acusado (fls. 366/369).

O dolo dos réus exsurge das próprias circunstâncias fáticas e das provas produzidas nos autos, que demonstram a atuação direta dos acusados na inserção de dados falsos nos sistemas do INSS que permitiram a concessão do benefício previdenciário NB 141.533.318-9 da segurada Eliana Gomes de Oliveira.

Acrescento, por fim, que o crime investigado nestes autos faz parte de um amplo quadro delitivo imputado aos réus SERGIO GONTARCZIK e LIGIA MARIA BAPTISTELLA, conforme esclareceu o r. juízo a quo quando da abertura da audiência de instrução e julgamento (16 processos - mídia de fl. 383). Eles foram relacionados a várias fraudes praticadas em detrimento do INSS, sempre se utilizando do modus operandi praticado nos presentes autos. Inclusive, por este motivo, a defesa do acusado requereu a aplicação da continuidade delitiva em relação aos autos nº 0000785-92.2009.403.6121, "aplicando-se a pena de um só dos crimes, aumentada de 1/6 (um sexto) a 2/3 (dois terços)".

Descabido referido pleito, uma vez que eventual reconhecimento de crime continuado entre os autos mencionados compete ao Juízo das Execuções no momento da unificação das penas.

Corroborando esse entendimento, colaciono os seguintes julgados:

"HABEAS CORPUS SUBSTITUTIVO DE RECURSO ORDINÁRIO. DESCABIMENTO. COMPETÊNCIA DAS CORTES SUPERIORES. MATÉRIA DE DIREITO ESTRITO. MODIFICAÇÃO DE ENTENDIMENTO DESTE TRIBUNAL, EM CONSONÂNCIA COM A SUPREMA CORTE. CRIMES DA LEI N.º 11.343/06. PACIENTE DENUNCIADO EM OITO AÇÕES PENAIS DIVERSAS, APONTADO COMO COMANDANTE DO TRÁFICO DE DROGAS NA ZONA SUL CARIOCA. CONEXÃO OU CONTINÊNCIA ENTRE OS CRIMES AFASTADA PELA INSTÂNCIA ORDINÁRIA NO JULGAMENTO DO CONFLITO NEGATIVO DE COMPETÊNCIA SUSCITADO PELO RÉU. POSSIBILIDADE DE SEPARAÇÃO DOS PROCESSOS . ART. 80 DO CÓDIGO DE PROCESSO PENAL. FEITOS EM FASES DISTINTAS. AUSÊNCIA DE ILEGALIDADE FLAGRANTE QUE, EVENTUALMENTE, PUDESSE ENSEJAR A CONCESSÃO DA ORDEM DE OFÍCIO. HABEAS CORPUS NÃO CONHECIDO.
(...)
3. A conexão e a continência têm como finalidade garantir a união dos processos de forma a propiciar ao julgador uma melhor visão do quadro probatório, permitindo-lhe entregar a melhor prestação jurisdicional e evitando-se, com isso, a existência de decisões conflitantes. No caso, reconheceu o acórdão impugnado que apesar do mesmo modus operandi e nomem iuris, as supostas condutas criminosas foram cometidas em situações de tempo e lugar distintos, não havendo conexão ou continência entre elas.
4. Ademais, ainda que a junção dos processos fosse cabível, não seria conveniente, tornando inclusive mais difícil a fase probatória, haja vista envolver centenas de corréus, no âmbito de associações criminosas diferentes, que participaram, em tese, dos crimes de tráfico de drogas, porte de armas e lavagem de dinheiro imputados ao Paciente, apontado como comandante do tráfico na zona sul do Rio de Janeiro/RJ.
5. E, eventual existência de continuidade delitiva não torna possível a reunião com processos que se encontram em fases distintas - hipótese em tela. Eventual ocorrência de continuidade delitiva somente poderá ser solvida por quem a lei atribui competência para tanto, o Juízo das Execuções, que deverá decidir acerca de soma ou unificação das penas decorrentes das ações penais deflagradas contra a Paciente.
6. Assim, não resta configurada ilegalidade manifesta que permita a concessão da ordem de ofício, pois, nos termos do art. 80 do Código de Processo Penal, a separação dos processos constitui uma faculdade da instância ordinária, a quem cabe avaliar a conveniência da separação dos processos instaurados em desfavor do Paciente.
7. Habeas corpus não conhecido. (grifei)
(STJ. HC 256784. Rel Min. Laurita Vaz. T5. 31/03/2014)"

Mantenho, portanto, a condenação dos acusados SERGIO GONTARCZIK e LIGIA MARIA BAPTISTELLA pela prática do crime definido no artigo 313-A do Código Penal.

Passo à análise da dosimetria.

Dosimetria

A r. sentença de fls. 449/460 condenou os réus pela prática do crime previsto no art. 313-A do Código Penal.

A pena da ré LIGIA MARIA BAPTISTELLA foi fixada em 04 (quatro) anos e 04 (quatro) meses de reclusão, em regime inicial semiaberto, e 91 (noventa e um) dias-multa, no valor mínimo legal. O réu SERGIO GONTARCZIK, por sua vez, foi condenado à pena de 05 (cinco) anos, 07 (sete) meses e 29 (vinte e nove) dias de reclusão, em regime inicial fechado (conforme sentença proferida à fl. 486 que acolheu os embargos de declaração opostos pelo Ministério Público Federal), e 150 (cento e cinquenta) dias-multa, no valor mínimo legal. Ainda, os réus foram condenados ao pagamento das custas processuais.

LIGIA MARIA BAPTISTELLA

1ª Fase

Na primeira etapa da dosimetria, o MM. Juízo de primeiro grau fixou a pena-base acima do mínimo legal, sob os seguintes fundamentos:

"Nos moldes do artigo 59 do Código Penal, a ré agiu com culpabilidade exacerbada, pois presente a elevada consciência sobre a ilicitude do fato, em razão de ser, à época do fato criminoso, profissional pública com ampla experiência profissional, pois ocupava o cargo de técnica do Seguro Social há 25 anos e a função de chefe do setor de benefícios há três anos, utilizando-se desse predicado para inserir dado falso no sistema informatizado do INSS e conceder em tempo recorde o benefício fraudulento requerido por meio do corréu Sérgio a Eliana Gomes de Oliveira.
As circunstâncias do delito se revelaram comuns à espécie típica praticada pela acusada.
No tocante aos antecedentes, cumpre referir, com base na folha de registros criminais da acusada (fls. 146/157 e 298/299), a inexistência de informação de qualquer condenação transitada em julgado referente a delito praticado anteriormente aos fatos narrados na presente exordial.
Não há informações suficientes para definição da conduta social da acusada e sua personalidade.
O motivo do crime é ínsito ao tipo penal - obtenção de vantagem indevida a terceiro e causar dano.
As consequências do ilícito também são normais à espécie, nada tendo a se valorar como fator extrapenal.
A vítima em nada influenciou a prática do delito.
Assim, diante da existência de uma circunstância desfavorável, fixo a pena-base acima do mínimo legal, qual seja, em 03 (três) anos e 3 (três) meses de reclusão."

A defesa apresentou apelação às fls. 539/543, pleiteando a redução da pena ao mínimo legal.

É certo que o Código Penal não estabelece patamares de elevação em razão do reconhecimento de circunstâncias judiciais previstas em seu art. 59, de modo que, em tese, é possível o incremento da pena-base até mesmo ao seu limite máximo em razão da existência de uma única circunstância considerada desfavorável, desde que o magistrado decline, de forma fundamentada, o motivo de tal exasperação. Sobre o tema, confira-se:

"PENAL E PROCESSUAL PENAL. HABEAS CORPUS SUBSTITUTIVO DE RECURSO PRÓPRIO. INADEQUAÇÃO. TENTATIVA DE HOMICÍDIO QUALIFICADO. VALORAÇÃO NEGATIVA DAS CONSEQUÊNCIAS DO CRIME MANTIDA. ACRÉSCIMO CONCRETAMENTE MOTIVADO. AUMENTO DA FRAÇÃO DE REDUÇÃO PELA TENTATIVA. CRITÉRIO DO ITER CRIMINIS PERCORRIDO OBSERVADO. ÓBICE AO REVOLVIMENTO FÁTICO-PROBATÓRIO NA VIA ELEITA. HABEAS CORPUS NÃO CONHECIDO.
[...]
III - Quanto ao critério numérico de aumento para cada circunstância judicial negativa, insta consignar que 'A análise das circunstâncias judiciais do art. 59 do Código Penal não atribui pesos absolutos para cada uma delas a ponto de ensejar uma operação aritmética dentro das penas máximas e mínimas cominadas ao delito'. Assim, é possível que 'o magistrado fixe a pena-base no máximo legal, ainda que tenha valorado tão somente uma circunstância judicial, desde que haja fundamentação idônea e bastante para tanto' (AgRg no REsp 143071/AM, Sexta Turma, Rel. Min. Maria Thereza de Assis Moura, DJe 6/5/2015). No presente caso, em relação ao quantum de exasperação na primeira fase da dosimetria, não há desproporção na reprimenda-base aplicada, porquanto existe motivação particularizada, vinculada à discricionariedade e à fundamentação da r. sentença, ausente, portanto, notória ilegalidade a justificar a concessão da ordem de ofício. Precedentes.
IV - Em relação à fração da tentativa, observa-se que as instâncias ordinárias destacaram a adequação da fração mínima aplicada, levando em conta o critério do iter criminis, que foi substancialmente percorrido e chegou muito próximo da consumação, uma vez que o paciente: "acertou a vítima com dois tiros, um na região axilar, outro na região do abdômen, tendo percorrido os atos executórios à integralidade. Por outro lado, entendo que também deve ser sopesada, neste quesito, a proximidade de violação ao bem jurídico protegido (a ofendida correu risco de morte). Assim, dadas as peculiaridades do caso, correta a redução da reprimenda no patamar de 1/3 da pena." Portanto, inexiste constrangimento ilegal a ser sanado, pois o acórdão recorrido se encontra em consonância com a jurisprudência desta Corte, que considera idôneo, no tocante ao quantum de redução pela tentativa, o critério do iter criminis percorrido. Ademais, a alteração da fração correspondente à tentativa exigiria o reexame do iter criminis percorrido pela agente, o que é inviável nesta sede, de cognição sumária, onde é vedado o exame aprofundado das provas. Precedentes.
Habeas corpus não conhecido."
(STJ, HC 426.444/RS, Rel. Min. FELIX FISCHER, QUINTA TURMA, julgado em 01/03/2018, DJe 07/03/2018) -grifei

De se ver que, considerando o intervalo em abstrato das penas cominadas ao delito (02 a 12 anos de reclusão), a circunstância judicial desfavorável foi concreta e razoavelmente fundamentada e ponderada, inexistindo razão jurídica para a sua redução.

Mantenho, assim, a pena-base fixada na sentença.

2ª Fase

Na segunda fase, não foram consideradas quaisquer atenuantes ou agravantes, o que resta mantido.

Por conseguinte, a pena, nesta fase, resta provisoriamente fixada em 03 (três) anos e 03 (três) meses de reclusão.

3ª Fase

Na 3ª fase, o r. Juízo a quo não aplicou nenhuma causa de diminuição da pena, o que também resta mantido.

Em relação às causas de aumento, ainda no decisum, o juízo aumentou a pena em 1/3, nos termos do §2º do artigo 327 do Código Penal.

Mantenho a incidência referida causa de aumento especial, haja vista que há nos autos comprovação de que a acusada, na época dos fatos, exercia função de direção (chefia do setor de benefícios do INSS - fls. 39 e mídia de fl. 383).

Desta feita, a pena definitiva restou mantida em 04 (quatro) anos e 04 (quatro) meses de reclusão.

Multa

Em obediência à proporcionalidade que a pena de multa deve guardar com a pena privativa de liberdade, bem como de acordo com o sistema trifásico de dosimetria da pena, de ofício, reformo a pena de multa para 21 (vinte e um) dias-multa, conservado o valor unitário do dia-multa no mínimo legal.

Do regime inicial de cumprimento de pena e da substituição da pena privativa de liberdade por restritiva de direitos

Mantenho, outrossim, o regime semiaberto para o início do cumprimento da pena privativa de liberdade (CP, art. 33, §§ 2º e 3º).

Incabível a substituição dessa pena por restritivas de direitos, por falta de requisito objetivo (CP, art. 44, I).

SERGIO GONTARCZIK

1ª Fase

Na primeira fase da dosimetria da pena, o magistrado sentenciante fixou a pena-base em 04 (quatro) anos, 10 (dez) meses e 08 (oito) dias de reclusão, uma vez que reputou desfavoráveis os antecedentes do réu e as consequências do ilícito. Transcrevo:

"Nos moldes do artigo 59 do Código Penal, o réu agiu com culpabilidade normal à espécie.
As circunstâncias do delito são prejudiciais ao acusado, pois o modus operandi consistiu em ludibriar terceiro de boa-fé, aproveitando-se de sua condição de advogado para angariar a sua confiança e imputar credibilidade em sua conduta profissional, e assim obter a documentação idônea para concretizar a inserção indevida de dados falsos no sistema informatizado do INSS por meio do concurso com a corré. Contudo, como esta circunstância, a meu sentir, equivale à agravante de quebra de confiança profissional, será sopesada na segunda fase de aplicação da pena.
No tocante aos antecedentes, cumpre referir, com base na folha de registros criminais do acusado e consulta no sistema processual realizada pelo Ministério Público Federal (fls. 282/296 e 408/410), a existência de condenação penal com trânsito em julgado em 18/07/2012 e 19/10/2011, respectivamente, nos autos n.º 0080269-66.2006.8.26.0050 e 0015460-62.2009.8.26.0050.
Não há informações suficientes para definição da conduta social do acusado e sua personalidade.
O motivo do crime é ínsito ao tipo penal - obtenção de vantagem indevida e causar dano.
As consequências do ilícito também são anormais à espécie, pois, consoante as provas coligidas nestes autos, a Autarquia sofreu prejuízo econômico com a ocorrência de pagamento do benefício concedido irregularmente.
A vítima em nada influenciou a prática do delito.
Assim, diante da existência de duas circunstâncias desfavoráveis (entre sete circunstâncias sopesadas, pois a condição de advogado será analisada a seguir como agravante), fixo a pena-base acima do mínimo legal, qual seja, em 04 (quatro) anos e 10 (dez) meses e 08 (oito) dias de reclusão."

A defesa apresentou apelação às fls. 527/532, pleiteando a reforma da dosimetria da pena, nos termos da Súmula 718 do STF.

Assiste parcial razão à defesa, no que tange à valoração negativa das consequências do crime, uma vez que o crime foi praticado em detrimento de entidade de direito público, sendo o prejuízo da Administração Pública inerente ao tipo.

Assim, considerando a existência de uma circunstância judicial desfavorável, a pena-base comporta redução, pelo que fica fixada em 03 (três) anos e 03 (três) meses de reclusão.

2ª Fase

Na segunda fase, não foram consideradas quaisquer atenuantes, o que resta mantido.

Em relação às agravantes, o r. juízo a quo aplicou a prevista no artigo 61, II, "g" do Código Penal.

Em que pese ser desnecessária a atuação de advogado para o requerimento administrativo de benefício previdenciário, no caso em exame, mantenho a agravante aplicada, uma vez que a segurada contratou os serviços do réu por confiar no seu conhecimento como advogado (conforme seu depoimento constante na mídia de fl. 383), sendo patente a violação do dever profissional de SÉRGIO.

Por conseguinte, a pena, nesta fase, resta provisoriamente fixada em 03 (três) anos, 09 (nove) meses e 15 (quinze) dias de reclusão.

3ª Fase

Na 3ª fase, o r. Juízo a quo não aplicou nenhuma causa de aumento ou diminuição da pena, o que também resta mantido.

Desta feita, a pena definitiva restou fixada em 03 (três) anos, 09 (nove) meses e 15 (quinze) dias de reclusão.

Multa

Em obediência à proporcionalidade que a pena de multa deve guardar com a pena privativa de liberdade, bem como de acordo com o sistema trifásico de dosimetria da pena, de ofício, reformo a pena de multa para 18 (dezoito) dias-multa, conservado o valor unitário do dia-multa no mínimo legal.

Do regime inicial de cumprimento de pena e da substituição da pena privativa de liberdade por restritivas de direitos

A sentença recorrida fixou o regime inicial fechado para o cumprimento da pena. Ainda, diante da certidão de fl. 510 comunicando que o réu SERGIO GONTARCZIK estava foragido, e da manifestação do Ministério Público Federal (fl. 511), o r. juízo a quo deferiu o pedido de prisão preventiva do acusado (fl. 514).

O apelante pleiteia a reforma do regime inicial fixado, nos termos da Súmula 718 do STF: "A opinião do julgador sobre a gravidade em abstrato do crime não constitui motivação idônea para a imposição de regime mais severo do que o permitido segundo a pena aplicada". Postula, ainda, a revogação da prisão preventiva.

Com efeito, considerando a redução da pena total para 03 (três) anos, 09 (nove) meses e 15 (quinze) dias de reclusão, bem como tendo em vista a presença de maus antecedentes, fixo o regime inicial semiaberto para o cumprimento da pena, com base no disposto no artigo 33, §2º, alínea "b", e §3º do Código Penal.

Ademais, observo que persistem os motivos que ensejaram a decretação da custódia cautelar, haja vista a ausência de alteração do quadro fático-processual desde a decretação da medida.

Por outro lado, a prisão preventiva do réu deve se adequar ao regime semiaberto.

Desse modo, determino que o acusado fique custodiado em estabelecimento penal compatível com o regime semiaberto.

Por fim, preservo o decidido pelo juiz de primeira instância no que tange à substituição da pena privativa de liberdade (ausência dos requisitos constantes do artigo 44 do Código Penal).

Do pedido de concessão da justiça gratuita

A sentença condenou os réus ao pagamento das custas processuais. O apelante SERGIO GONTARCZIK requereu a concessão dos benefícios da justiça gratuita.

Nada obstante, esclareço que a mera concessão de gratuidade da justiça não exclui a condenação do réu nas custas do processo nos termos do artigo 804 do Código de Processo Penal, ficando, contudo, seu pagamento sobrestado, enquanto perdurar seu estado de pobreza, pelo prazo de cinco anos, quando então a obrigação estará prescrita, conforme determina o artigo 98, § 3º, do novo Código de Processo Civil.

Além disso, a concessão de gratuidade não afasta a responsabilidade do beneficiário pelas despesas processuais e pelos honorários advocatícios decorrentes de sua sucumbência, ou tampouco afasta o seu eventual dever de pagar, ao final, as multas processuais que lhe sejam impostas, nos moldes do artigo 98, §§ 2º e 4º, também da Lei 13.105/2015.

Em sintonia com o entendimento jurisprudencial do Superior Tribunal de Justiça (AgRg no AREsp 23.804/DF, 5ª Turma, Rel. Min. Gilson Dipp, DJe 01/08/2012; AgRg no Ag 1377544/MG, Rel. Min. Laurita Vaz, DJe 14/06/2011), o pertinente exame acerca da miserabilidade do apelante deverá ser realizado, com efeito, em sede do Juízo de Execução, fase adequada para aferir a real situação financeira do condenado, restando, por conseguinte, mantida sua condenação ao pagamento das custas processuais nos termos da r. sentença.

Dispositivo

Ante o exposto, rejeito as preliminares e:

a) NEGO PROVIMENTO à apelação da ré LIGIA MARIA BAPTISTELLA;

b) DOU PARCIAL PROVIMENTO à apelação do réu SERGIO GONTARCZIK para reduzir a sua pena para 03 (três) anos, 09 (nove) meses e 15 (quinze) dias de reclusão e18 (dezoito) dias-multa, conservado o valor unitário do dia-multa no mínimo legal, fixar o regime inicial semiaberto e conceder a justiça gratuita;

c) DE OFÍCIO, reduzo a pena de multa da ré LIGIA MARIA BAPTISTELLA para 21 (vinte e um) dias-multa.

É o voto.

JOSÉ LUNARDELLI
Desembargador Federal


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