Diário Eletrônico

PODER JUDICIÁRIO

TRIBUNAL REGIONAL FEDERAL DA 3ª REGIÃO

D.E.

Publicado em 26/11/2019
APELAÇÃO CRIMINAL Nº 0000181-30.2015.4.03.6119/SP
2015.61.19.000181-5/SP
RELATOR : Desembargador Federal JOSÉ LUNARDELLI
APELANTE : AYANDA NYATHI
ADVOGADO : SP0000DPU DEFENSORIA PUBLICA DA UNIAO (Int.Pessoal)
APELADO(A) : Justica Publica
No. ORIG. : 00001813020154036119 6 Vr GUARULHOS/SP

EMENTA

APELAÇÃO CRIMINAL. ART. 304 C/C ART. 297, CP. USO DE PASSAPORTE FALSO. DOSIMETRIA. SÚMULA 231 DO STJ. APLICABILIDADE.
O reconhecimento da atenuante da confissão não tem o condão de reduzir a pena abaixo do mínimo legal, nos termos da Súmula nº 231 do Superior Tribunal de Justiça, que, aliás, consolidou entendimento que já vinha sendo adotado.
Afastada a alegação de afronta ao postulado da individualização da pena, pois as circunstâncias atenuantes não são aptas a reduzir a pena em patamar inferior ao abstratamente cominado no tipo penal, uma vez que não integram a estrutura típica do crime.
Recurso parcialmente provido.

ACÓRDÃO

Vistos e relatados estes autos em que são partes as acima indicadas, decide a Egrégia Décima Primeira Turma do Tribunal Regional Federal da 3ª Região, por unanimidade, negar provimento à apelação da defesa, nos termos do relatório e voto que ficam fazendo parte integrante do presente julgado.


São Paulo, 07 de novembro de 2019.
JOSÉ LUNARDELLI
Desembargador Federal


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APELAÇÃO CRIMINAL Nº 0000181-30.2015.4.03.6119/SP
2015.61.19.000181-5/SP
RELATOR : Desembargador Federal JOSÉ LUNARDELLI
APELANTE : AYANDA NYATHI
ADVOGADO : SP0000DPU DEFENSORIA PUBLICA DA UNIAO (Int.Pessoal)
APELADO(A) : Justica Publica
No. ORIG. : 00001813020154036119 6 Vr GUARULHOS/SP

RELATÓRIO

O EXCELENTÍSSIMO SENHOR DESEMBARGADOR FEDERAL JOSÉ LUNARDELLI

Trata-se de apelação criminal interposta pela Defensoria Pública da União em face da sentença proferida pelo Juízo da 6ª Vara Federal de Guarulhos que condenou Ayanda Nyathi pela prática do crime previsto no art. 304 c/c art. 297 do CP, em continuidade delitiva.

De acordo com a denúncia, "Ayanda Nyathi (ou Imurana Mohammed), no dia 16 de janeiro de 2015 e pela manhã de 17 de janeiro, dolosamente, fez uso de documento público falso (passaporte) perante as autoridades brasileiras ao sair do Brasil (16/01/2015), embarcando em voo para a Guatemala, local onde foi inadmitido em virtude de seu perfil, retornando ao Brasil pela manhã de 17/01/2015, no voo AV85 da companhia aérea Avianca, ocasião em que apresentou o citado passaporte falso às autoridades brasileiras".

A denúncia foi recebida em 23/03/2015 (fls. 73/75).

Após regular instrução, o Juízo da 6ª Vara Federal de Guarulhos/SP proferiu a sentença de fls. 301/307, que julgou procedente a pretensão punitiva estatal para condenar AYANDA NYATHI pela prática do crime previsto no art. 304 c/c art. 297 do CP, em continuidade delitiva, à pena de 2 anos e 4 meses de reclusão, em regime inicial aberto, e 11 dias multa, no valor unitário de 1/30 do salário mínimo vigente ao tempo do fato. A pena privativa de liberdade foi substituída por prestação de serviços à comunidade e multa no valor de 01 salário mínimo, em favor da União.

A sentença foi publicada em 20/04/2016 (fl. 308).

A Defensoria Pública da União interpôs apelação (fl. 311). Em suas razões recursais, pede o reconhecimento e a aplicação da circunstância atenuante referente à confissão espontânea. Alega que a Súmula nº 231 do STJ não deve ser aplicada por falta de amparo legal. Aduz que o art. 65 do CP dispõe expressamente que a pena "sempre" será atenuada, independentemente da pena-base aplicada (fls. 312/318).

O Ministério Público Federal ofereceu contrarrazões, manifestando-se pelo desprovimento do recurso (fls. 323/327v).

Em parecer, a Procuradoria Regional da República opinou pelo não provimento do recurso. Manifestou-se, ainda, pela execução provisória da pena, depois do esgotamento das vias ordinárias (fls. 392/397).

É o relatório.

À revisão.


JOSÉ LUNARDELLI
Desembargador Federal


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APELAÇÃO CRIMINAL Nº 0000181-30.2015.4.03.6119/SP
2015.61.19.000181-5/SP
RELATOR : Desembargador Federal JOSÉ LUNARDELLI
APELANTE : AYANDA NYATHI
ADVOGADO : SP0000DPU DEFENSORIA PUBLICA DA UNIAO (Int.Pessoal)
APELADO(A) : Justica Publica
No. ORIG. : 00001813020154036119 6 Vr GUARULHOS/SP

VOTO

O EXCELENTÍSSIMO SENHOR DESEMBARGADOR FEDERAL JOSÉ LUNARDELLI

Presentes os requisitos de admissibilidade, conheço do recurso interposto pela Defensoria Pública da União e passo ao exame de mérito.

Dos fatos

Ayanda Nyathi fez uso de passaporte falso no dia 16 de janeiro de 2015 perante as autoridades brasileiras no aeroporto internacional de São Paulo, em Guarulhos, ao embarcar em voo para a Guatemala. Ayanda Nyathi não foi admitido naquele país, tendo retornado ao Brasil na manhã do dia 17/01/2015, quando novamente fez uso do passaporte falso.

O Juízo da 6ª Vara Federal de Guarulhos/SP condenou o réu pela prática do crime previsto no art. 304 c/c 297 do CP, em continuidade delitiva.

Da materialidade e da autoria

Embora não impugnadas, observo que a materialidade e a autoria estão demonstradas.

O acusado apresentou o passaporte materialmente falso, nº A00577648, perante as autoridades brasileiras no Aeroporto Internacional de São Paulo, ao sair do Brasil em 16/01/2015 (fl. 33), e no dia 17/01/2015, após ser inadmitido na Guatemala.

Os peritos analisaram o passaporte da República da África do Sul, de numeração A00577648, em nome de Ayanda Nyathi, e concluíram tratar-se de documento adulterado (fls. 53/59).

A prova testemunhal comprova o uso do passaporte falsificado (fls. 02/04 e mídia à fl. 167). Na fase policial, o réu admitiu a prática delitiva (fl. 05). Em juízo, permaneceu em silêncio.

Mantenho, portanto, a condenação de Ayanda Nyathi pela prática do delito do art. 304 c/c art. 297, na forma do art. 71, todos do CP.

Da dosimetria

A pena-base foi fixada no mínimo legal.

Na segunda fase da dosimetria, o Juízo a quo fez constar o seguinte:


"na segunda fase de aplicação da reprimenda não verifico a existência de agravantes genéricas. Despicienda a análise sobre a ocorrência da atenuante inserta no art. 65, III, "d" do CP, uma vez que a pena-base foi fixada no seu patamar mínimo, homenageando-se a Súmula nº 231 do STJ".

Nesse ponto, insurge-se a defesa, postulando a diminuição da pena aquém do mínimo legal, em razão da incidência da circunstância atenuante referente à confissão espontânea, nos moldes do art. 65 do CP, segundo o qual "são circunstâncias que sempre atenuam a pena".

 O reconhecimento da atenuante da confissão não tem o condão de reduzir a pena abaixo do mínimo legal, nos termos da Súmula nº 231 do Superior Tribunal de Justiça, que, aliás, consolidou entendimento que já vinha sendo adotado.

A próposito, destaco a ementa do Recurso Especial, julgado em sede de recurso repetitivo (RESP 1.117.068-PR), de relatoria da Ministra Laurita Vaz:


RECURSO ESPECIAL REPETITIVO. PENAL. VIOLAÇÃO AOS ART. 59, INCISO II, C.C. ARTS. 65 E 68, CAPUT, DO CÓDIGO PENAL. CIRCUNSTÂNCIAS ATENUANTES. MENORIDADE E CONFISSÃO ESPONTÂNEA. REDUÇÃO DA PENA ABAIXO DO MÍNIMO LEGAL. IMPOSSIBILIDADE. CRIME PREVISTO NO ART. 12, CAPUT, DA LEI N.º 6.368/76. COMBINAÇÃO DE LEIS. OFENSA AO ART. 2.º, PARÁGRAFO ÚNICO, DO CÓDIGO PENAL E AO ART. 33, § 4.º, DO ART. 11.343/06. RECURSO CONHECIDO E PROVIDO.
1. É firme o entendimento que a incidência de circunstância atenuante não pode conduzir à redução da pena abaixo do mínimo estabelecido em lei, conforme disposto na Súmula n.º 231 desta Corte Superior.
2. O critério trifásico de individualização da pena, trazido pelo art. 68 do Código Penal, não permite ao Magistrado extrapolar os marcos mínimo e máximo abstratamente cominados para a aplicação da sanção penal.
3. Cabe ao Juiz sentenciante oferecer seu arbitrium iudices dentro dos limites estabelecidos, observado o preceito contido no art. 93, inciso IX, da Constituição Federal, sob pena do seu poder discricionário se tornar arbitrário, tendo em vista que o Código Penal não estabelece valores determinados para a aplicação de atenuantes e agravantes, o que permitiria a fixação da reprimenda corporal em qualquer patamar.
4. Desde que favorável ao réu, é de rigor a aplicação da causa de diminuição prevista no art. 33, § 4.º, da Lei n.º 11.343/06, quando evidenciado o preenchimento dos requisitos legais. É vedado ao Juiz, diante de conflito aparente de normas, apenas aplicar os aspectos benéficos de uma e de outra lei, utilizando-se a pena mínima prevista na Lei n.º 6.368/76 com a minorante prevista na nova Lei de Drogas, sob pena de transmudar-se em legislador ordinário, criando lei nova.
5. No caso, com os parâmetros lançados no acórdão recorrido, que aplicou a causa de diminuição no mínimo legal de 1/6 (um sexto), a penalidade obtida com a aplicação da causa de diminuição do art. 33, § 4º, da Lei n.º 11.343/06, ao caput do mesmo artigo, não é mais benéfica à Recorrida.
6. Recurso especial conhecido e provido para, reformando o acórdão recorrido, i) afastar a fixação da pena abaixo do mínimo legal e ii) reconhecer a indevida cisão de normas e retirar da condenação a causa de diminuição de pena prevista art. 33, § 4º, da Lei n.º 11.343/06, que no caso é prejudicial à Recorrida, que resta condenada à pena de 03 anos de reclusão. Acórdão sujeito ao que dispõe o art. 543-C do Código de Processo Civil e da Resolução STJ n.º 08, de 07 de agosto de 2008 (REsp 1117068 / PR. Ministra Laurita Vaz. Terceira Seção. DJe 08/06/2012).

Extrai-se do referido julgado:


"[...] a jurisprudência desta Corte Superior é sedimentada no sentido de que individualizar a pena é função do julgador consistente em aplicar, depois de examinar com acuidade os elementos que dizem respeito ao fato, a reprimenda que seja, proporcionalmente, necessária e suficiente para reprovação do crime. Como parâmetro inicial, o Juiz sentenciante deverá obedecer e sopesar as circunstâncias judiciais do art. 59, as agravantes e atenuantes e, por fim, as causas de aumento e diminuição de pena, em estrita obediência ao sistema trifásico de individualização da pena estabelecido no art. 68 do Código Penal. Evidentemente, o Magistrado pode majorar ou reduzir o montante da pena dentro dos limites legais, para, ao final, impor ao condenado, de forma justa e fundamentada, a quantidade de pena que o fato está a merecer. Contudo, deve fazê-lo em estrita obediência ao regramento estabelecido no art. 68 do Código Penal, devendo cada etapa ser pormenorizadamente motivada com dados concretos. Não ignoro os judiciosos fundamentos no sentido de que o sistema trifásico exige obediência ao disposto no art. 65 do Código Penal, o qual determina que as circunstâncias nele previstas sempre atenuam a pena. Entretanto, com a devida vênia do posicionamento contrário, tal interpretação literal era rechaçada mesmo antes da reorganização sistemática da parte geral do Código Penal, dada pela Lei n.º 7.209/84. De fato, nunca predominou o entendimento de que as agravantes e atenuantes poderiam levar à fixação da pena fora dos limites mínimo e máximo abstratamente comidas ao crime [...]".

Forte no entendimento do Colendo Superior Tribunal de Justiça, afasto a alegação de afronta ao postulado da individualização da pena, pois as circunstâncias atenuantes não são aptas a reduzir a pena em patamar inferior ao abstratamente cominado no tipo penal, uma vez que não integram a estrutura típica do crime. Assim, em que pese a confissão extrajudicial espontânea do apelante, sua pena não pode ser reduzida aquém do mínimo legal na segunda fase da dosimetria, em consonância com o entendimento jurisprudencial cristalizado no enunciado nº 231 da Súmula do STJ.

Havendo jurisprudência pacífica sobre o tema e sendo entendimento já firmado também no âmbito desta Turma, não vejo como sustentar a tese de não incidência da Súmula 231 do STJ.

Ademais, destaco que o Pleno do Supremo Tribunal Federal igualmente impediu a fixação da pena provisória aquém do mínimo legal pela incidência de circunstância atenuante quando do julgamento do RE nº 597.270/RS, da relatoria do Min. Cezar Peluso, com reconhecimento da existência de repercussão geral.
Por essas razões, mantenho a pena intermediária no patamar de 2 anos de reclusão.
Prosseguindo, na terceira fase não há causas de diminuição e de aumento.
As infrações penais foram praticadas em continuidade delitiva, o que ensejou o aumento da pena no patamar de 1/6 (um sexto).
Destarte, deve ser mantida a pena definitivamente fixada em 2 anos e 4 meses de reclusão e 11 dias multa, no valor unitário mínimo legal.
Mantenho, ainda, a substituição da pena privativa de liberdade por duas restritivas de direitos, consistentes em prestação de serviços à comunidade e prestação pecuniária no valor de 01 salário mínimo, em favor da União.
Dispositivo
Pelo exposto, nego provimento à apelação da defesa.
É o voto.

JOSÉ LUNARDELLI
Desembargador Federal


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Data e Hora: 14/11/2019 17:23:57