D.E. Publicado em 13/12/2019 |
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EMENTA
ACÓRDÃO
Vistos e relatados estes autos em que são partes as acima indicadas, decide a Egrégia Quinta Turma do Tribunal Regional Federal da 3ª Região, por maioria, dar parcial provimento à apelação do Ministério Público Federal para condenar Raimundo Guedes Ferreira pela prática do crime do art. 312, caput, na forma do art. 71, ambos do Código Penal, à pena de 2 (dois) anos, 8 (oito) meses e 20 (vinte) dias de reclusão, regime inicial aberto, e 12 (doze) dias-multa fixados no valor unitário de 1/30 (um trigésimo) do salário mínimo vigente ao tempo dos fatos, substituída a pena privativa de liberdade por 2 (duas) restritivas de direitos, consistentes em prestação de serviços à comunidade ou a entidades públicas pelo tempo da pena privativa de liberdade e pena pecuniária no valor de 2 (dois) salários mínimos, nos termos do relatório e voto que ficam fazendo parte integrante do presente julgado.
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Data e Hora: | 04/12/2019 13:24:25 |
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DECLARAÇÃO DE VOTO
Trata-se de apelação criminal interposta pelo Ministério Público Federal contra a sentença de fls. 737/745v., que absolveu Raimundo Guedes Ferreira da prática do crime previsto no artigo 312, caput¸ c. c. o artigo 327, § 1º, ambos do Código Penal, com fundamento no artigo 386, VII, do Código de Processo Penal, julgando improcedente o pedido formulado na denúncia e rejeitando-a em relação ao fato ocorrido em dezembro de 2011 e à continuidade delitiva.
Apela o Ministério Público Federal, sustentando em síntese, a existência de provas suficientes da materialidade e da autoria delitivas, a inexistência de nulidade por violação ao artigo 212 do Código de Processo Penal e a correta tipificação dos fatos no artigo 312, caput, c. c. o artigo 327, § 1º, ambos do Código Penal, requerendo a condenação do réu nos termos da denúncia e fundamentando:
a) a materialidade e a autoria foram comprovadas pelo procedimento administrativo e por todo conjunto de elementos informativos dos autos do inquérito policial e pelos documentos produzidos em Juízo;
b) a Centralizadora de Desenvolvimento de TI - CEDES/SP efetuou verificação no sistema dos caixas eletrônicos no período de 01.08.13 a 15.08.13, e não registrou qualquer anormalidade no funcionamento das máquinas, tal como dispensa de cédulas em duplicidade;
c) há imagem gravada, no corredor de abastecimento, que registra o interior de um equipamento quando o réu o abastece, deixando claro que, no compartimento destinado às cédulas de R$ 50,00 (cinquenta reais) não havia 220 (duzentos e vinte) cédulas conforme o saldo do equipamento registrava;
d) a autoria pode ser extraída das declarações prestadas pelas testemunhas à autoridade policial, às comissões internas de apuração da Caixa Econômica Federal e em Juízo, segundo as quais Raimundo traiu a confiança que lhe era depositada como tesoureiro da agência de Taquarituba/SP, apropriando-se indevidamente de valores que estavam nos caixas eletrônicos;
e) o réu era o único responsável pelo abastecimento e controle dos caixas de autoatendimento;
f) informado da diferença no numerário dos caixas, por funcionário que o substituíra em suas férias, em 2011, o réu pediu-lhe que não alardeasse o assunto e disse que não conferia os valores porque acreditava que as máquinas trabalhavam certo;
g) os fatos ocorridos em dezembro de 2011 corroboram a prova dos fatos versados neste processo, porque presentes fortes indícios que Raimundo, de modo semelhante ao apurado, naquela ocasião também se apoderou dos valores faltantes do ATM - caixa de autoatendimento;
h) admite-se a prova indiciária para efeitos de condenação quando formar uma cadeia concordante de indícios sólidos e graves, unidos por nexo de causa e efeito, não contrariados por contra indícios ou provas diretas favoráveis ao acusado, sendo o que ocorre no presente caso;
i) defeitos constatados em equipamentos de outras agências ocasionaram dispensa de valores em duplicidade em valores muito inferiores àqueles apurados na agência de Taquarituba, não havendo justificativa, em um dos fatos descritos, para o desfalque no valor de R$ 15.020,00 (quinze mil e vinte reais) em um equipamento que teve saques registrados em valor inferior, apurado em R$ 14.539,00 (quatorze mil, quinhentos e trinta e nove reais);
j) nenhum correntista noticiou a falsa dispensa de notas em duplicidade;
k) o procedimento administrativo apurou a responsabilidade do réu na ausência do valor de R$ 66.565,00 (sessenta e seis mil, quinhentos e sessenta e cinco reais) de seis caixas de autoatendimento;
l) deve ser reconhecida a agravante genérica do artigo 61, II, g, do Código Penal (fls. 749/781).
Foram apresentadas contrarrazões (fls. 786/798).
A Ilustre Procuradora Regional da República, Dra. Isabel Cristina Groba Vieira, manifestou-se pelo provimento do recurso (fls. 800/802v.).
Em sessão de 02.12.19, o Des. Federal André Nekatschalow, por seu voto, DEU PARCIAL PROVIMENTO à apelação do Ministério Público Federal para condenar Raimundo Guedes Ferreira pela prática do crime do artigo 312, caput, na forma do artigo 71, ambos do Código Penal, à pena de 2 (dois) anos, 8 (oito) meses e 20 (vinte) dias de reclusão, regime inicial aberto, e 12 (doze) dias-multa fixados no valor unitário de 1/30 (um trigésimo) do salário mínimo vigente ao tempo dos fatos, substituída a pena privativa de liberdade por 2 (duas) restritivas de direitos, consistentes em prestação de serviços à comunidade ou a entidades públicas pelo tempo da pena privativa de liberdade e pena pecuniária no valor de 2 (dois) salários mínimos. Determinou fosse comunicado ao Tribunal Regional Eleitoral, para os fins previstos no artigo 15, III, da Constituição da República. Condenou o réu em custas (CPP, artigo 805). Após o trânsito em julgado, fosse lançado o nome do réu no rol de culpados (CR, artigo 5º, LVII).
Não comungo do entendimento adotado por Sua Excelência.
Raimundo Guedes Ferreira foi denunciado como incurso nas penas do artigo 312, caput, c. c. o artigo 327, § 1º, na forma do artigo 71, todos do Código Penal, porque entre os dias 01.08.13 e 15.08.13, na unidade da Caixa Econômica Federal de Taquarituba/SP, localizada na Rua Dr. Ataliba Leonel, n. 503, na condição de Tesoureiro Executivo da agência bancária, apropriou-se, em proveito próprio, de R$ 66.565,00 (sessenta e seis mil, quinhentos e sessenta e cinco reais), que tinha posse em razão do cargo exercido.
Narra a denúncia que, em 31.10.13, instaurou-se o Procedimento Administrativo n. SP.7829.2013.G.000609, destinado a apurar irregularidades na gestão do numerário sob a responsabilidade do acusado, tendo a comissão responsável verificado que, ao contrário do afirmado por Raimundo Guedes em sede policial, o numerário sob sua responsabilidade não era efetivamente contado, conforme procedimento estabelecido, sendo ele o único a fazer a verificação e podendo apropriar-se indevidamente dos valores.
De início acompanho o Relator, para considerar válidas as oitivas das três testemunhas, cujos depoimentos foram considerados inválidos pelo Relator.
A materialidade delitiva encontra-se suficientemente comprovada pelos elementos dos autos, conforme se verifica de:
a) extratos de conferência dos ATMs nas datas de 01.08.13 e 15.08.13 (fls. 57/63, volume I, do Apenso I);
b) Documento de Lançamento de Evento-DLE com o valor da diferença apurada nos ATMs, R$ 66.565,00 (sessenta e seis mil, quinhentos e sessenta e cinco reais) (fls. 67/68, volume I, do Apenso I);
c) cópias dos e-mails trocados pela CEDES/SP e pela agência de Taquarituba/SP com a solicitação de auditoria nos ATMs, reportando possível falha no sistema e conclusão de que os equipamentos não dispensaram cédulas em duplicidade (fls. 70/79, volume I, do Apenso I);
d) relatórios de movimentação dos ATMs no período de 01.08.13 a 15.08.13 (fls. 139/199, volume I do Apenso I e fls. 202/221, volume II, do Apenso I);
e) mídia com as imagens da agência bancária de Taquarituba/SP nos dias dos fatos, especificamente do ambiente da tesouraria e corredor de abastecimento dos ATMs (fls. 22/223, volume II, do Apenso I);
f) relatório conclusivo de apuração de responsabilidade da conduta de Raimundo Guedes Ferreira (fls. 228/236, volume II, do Apenso I);
g) cópia de mensagem eletrônica de Raimundo Guedes Ferreira à Caixa Econômica Federal, com proposta de pagamento dos valores apurados no processo administrativo (fls. 258/259, volume II, do Apenso I).
h) laudo de perícia criminal federal, registro de áudios e imagens, contendo análise das imagens registradas pelo sistema de segurança CFTV da Agência Taquarituba/SP, da Caixa Econômica Federal, no ambiente da tesouraria e no corredor de abastecimento dos ATMs, que comprova que Raimundo foi o único a ter acesso aos equipamentos para suprimento do numerário (fls. 87/97);
b) rescisão do contrato de trabalho de Raimundo Guedes Ferreira por justa causa, pela conduta dolosa de apropriação de valores da Caixa Econômica Federal (fls. 149/151).
A despeito de a materialidade delitiva encontrar-se comprovada nestes autos, penso que o dolo delitivo não foi suficientemente demonstrado em Juízo.
De início, observo que a conduta dolosa atribuída ao acusado derivou das conclusões a que chegou o Processo de Apuração de Responsabilidade n. SP.7829.2013.G.000609 (volume I e II, do Apenso I), que averiguou a conduta de Raimundo Guedes Ferreira e concluiu que este teria agido com dolo na apropriação de recursos da Caixa Econômica Federal sob sua guarda.
Infere-se de tal processo que referida conclusão se deu pelos seguintes fatores:
1) cópias dos e-mails trocados pela CEDES/SP e pela agência de Taquarituba/SP, reportando possível falha no sistema e conclusão de que os equipamentos não dispensaram cédulas em duplicidade (fls. 70/79, volume I, do Apenso I);
2) relatórios de movimentação dos ATMs no período de 01.08.13 a 15.08.13 (fls. 139/199, volume I do Apenso I e fls. 202/221, volume II, do Apenso I);
3) mídia com as imagens da agência bancária de Taquarituba nos dias dos fatos, especificamente do ambiente da tesouraria e corredor de abastecimento dos ATMs (fls. 22/223, volume II, do Apenso I), indicando que Raimundo Guedes foi o único a ter acesso aos equipamentos para suprimento do numerário (fls. 87/97);
4) rescisão do contrato de trabalho de Raimundo Guedes Ferreira por justa causa, pela conduta dolosa de apropriação de valores da Caixa Econômica Federal (fls. 149/151).
Em sede policial, Raimundo Guedes negou a prática delitiva. Consignou que o acompanhamento das conferências dos numerários para elaboração dos Termos de Verificação de Valores - TVVs de número 01 a 08/2013 foram todos realizados, alguns pelo declarante e outros pela comissão do Termo de Verificação de Valores - TVV. Quanto ao relatório conclusivo, confirmou que as diferenças apontadas realmente ocorreram, tendo sido constatadas pela conferência física dos numerários. Afirmou terem ocorrido problemas no multicanal, os quais foram detectados em rede nacional pela área técnica, devido a saques feitos por clientes, diretamente nos terminais de autoatendimento. Negou que tivesse contribuído para o ocorrido e alegou que o GEOPE06 - Operacional Convênios e Conciliação Contábil expediu comunicado confirmando as ocorrências e indicando erro nos terminais 34781003, 34781004, 34781006 e 34781008, que estariam dispensando numerários em duplicidade. Afirmou que, ao retornar de férias, em dezembro de 2013, foi encontrada nova diferença no valor de R$ 250,00 (duzentos e cinquenta reais). Ainda, afirmou que, em 2011, quando estava em férias, foi encontrada uma diferença no valor de R$ 6.300,00 (seis mil e trezentos reais) e, na semana seguinte, uma diferença de R$ 10,00 (dez reais). Concluiu discordando dos termos do relatório conclusivo, alegando que não condiziam com a realidade, pois dele consta que a CEDES/SP teria emitido um relatório informando que não foi localizada ocorrência de dispensa de numerário em duplicidade nos terminais da agência de Taquarituba sem jamais ter ido à agência apurar tal fato (fl. 106/107).
Em Juízo, Raimundo Guedes acrescentou às declarações que prestou à Autoridade Policial que era tesoureiro da agência da Caixa Econômica Federal e que, em 15.08.13, recebeu um comunicado sobre um problema técnico de sistema, que ocasionava a dispensa de cédulas em duplicidade, havendo 11.616 (onze mil, seiscentos e dezesseis) equipamentos com problemas e ele deveria analisar o anexo junto ao e-mail e verificar se algum dos equipamentos da agência havia sido afetado. Afirmou que, conforme a relação de equipamentos, havia ATMs da agência de Taquarituba com problemas e ele auditou as máquinas e identificou a diferença de valores. Contou que, na primeira máquina, constatou uma diferença superior a dez mil reais e reportou ao gerente geral que lhe pediu para analisar os outros equipamentos. Esclareceu que as 6 (seis) máquinas eram abastecidas com valores entre 30 (trinta) a 35 (trinta e cinco) mil reais diariamente, geralmente ao final da tarde. Disse não ter reparado que havia menos cédulas na máquina do que deveria, e que não conferia as máquinas todos os dias, apenas duas vezes por mês. Disse que não foi comunicado de nenhuma reclamação de clientes sobre a dispensa de cédulas em duplicidade. Esclareceu que as conferências de Termo de Verificação de Valores - TVV eram efetivamente realizadas e aconteceram duas vezes por mês com a conferência dos valores. Garantiu que Paulo Brittes, em 2011, quando o substituiu por ocasião de suas férias, assinou a conferência dos valores das máquinas na troca da função. Informou que teve a rescisão por justa causa revista por decisão da Justiça do Trabalho. Esclareceu que o procedimento para abastecimento dos ATMs consistia em constatar a movimentação dos equipamentos por relatório do sistema, que mostrava a necessidade de abastecimento. Em seguida, ele retirava o valor do cofre e abastecia os equipamentos, sendo acompanhado pela GIRET por meio do sistema. Disse que os equipamentos recontavam as cédulas todas as vezes em que as gavetas com as cédulas eram movimentadas. Afirmou que os equipamentos não foram periciados (mídia à fl. 641).
Bruno Jorge Cardoso Hee, bancário da agência da Caixa Econômica Federal Vila Falcão, ouvido em sede policial, nada acrescentou aos fatos contidos na denúncia. Afirmou desconhecer era membro suplente da comissão ou quem eram os integrantes. Afirmou que nunca presenciou nenhum comentário sobre a data do Termo de Verificação de Valores - TVV nem acompanhou sua elaboração, apenas assinou um Termo de Verificação de Valores - TVV, em setembro de 2013. Afirmou que uma pessoa que identificou como Márcio, como eventual, tinha acesso ao cofre, mas não realizava a abertura. (fl. 69).
Márcio de Almeida Monteiro, bancário da agência da Caixa Econômica Federal de Taquarituba/SP, em depoimento na esfera administrativa, disse que os Termos de Verificação de Valores - TVVs geralmente não eram realizados e, quando aconteciam, os caixas conferiam os malotes uns dos outros e o tesoureiro conferia o numerário do cofre. Afirmou que, nas vezes que realizaram a verificação, ele pessoalmente conferia o dinheiro dos malotes dos caixas, do cofre e dos ATMs. Declarou não se lembrar da realização de nenhum Termo de Verificação de Valores - TVV de data incerta. Disse que o Gerente Geral, presidente da comissão, algumas vezes não solicitava que fossem realizados, mas quando não realizavam, os Termos de Verificação de Valores - TVVs eram apenas assinados e digitados. Falou que a comissão não realizava a contagem física de todo o numerário, pois não recebia ordem do presidente da comissão. Esclareceu que, em 31.07.13, não foi realizada a conferência, apenas assinados os formulários do Termo de Verificação de Valores - TVV. Afirmou que as auditorias nos ATMs também não eram realizadas, desconhecendo quem fazia a conferência, sendo comum Raimundo realizá-la sozinho. Informou que, como substituto eventual do tesoureiro, tem a senha eletrônica do cofre, mas não a senha do segredo mecânico e que, fora os períodos de substituição, teve acesso ao cofre apenas um dia em que foi solicitado pelo Gerente Bruno para que colocasse a senha enquanto aguardava Raimundo voltar do almoço. Afirmou que, até o momento em que ocorreu a diferença nos ATMs, não havia Ordem de Serviço de designação dos membros para o Termo de Verificação de Valores - TVV, que foi feita pelo Gerente Geral Afonso e assinada posteriormente ao acontecido (fl. 19, volume I, do Apenso I).
Em seu segundo depoimento em sede administrativa deu nova versão aos fatos, alegando que seu primeiro depoimento se deu para agradar Raimundo Guedes. Disse que a OS n. 007/12 foi assinada entre 26.08.13 e 28.08.13, sendo-lhe entregue pelo Gerente Geral Afonso, o qual acredita que a tenha elaborado, buscando livrar-se de uma responsabilização por não a ter feito no início de sua gestão. Declarou que não se lembra de ter participado dos Termos de Verificação de Valores - TVVs de 31.01.13, de 28.02.13, de 28.03.13, de 30.04.13, de 31.05.13, de 28.06.13, e de 31.07.13, tendo apenas recebido e assinado o formulário como de costume. Quanto ao Termo de Verificação de Valores - TVV de 21.08.13, afirmou que participou e que todas as conferências após a constatação de 15.08.13 foram efetivamente realizadas. Acrescentou que estranha o fato de nenhum cliente ter reclamado da dispensa de cédulas em duplicidade e o fato de o ATM 1007 ter apresentado a maior diferença de valor, pois é o menos utilizado pelos clientes (cfr. fls. 46/47, volume I, do Apenso I).
Em sede policial e em Juízo ratificou as declarações que prestou em seu segundo depoimento administrativo (cfr. fl. 123 e mídia audiovisual à fl. 412).
A mesma circunstância se deu quanto aos depoimentos prestados por Ana Luiza Colturato Gonçalves. Em um primeiro momento, em suas declarações em sede administrativa, afirmou que Termos de Verificação de Valores - TVVs não eram realizados porque não havia comissão, recordando-se de ter participado poucas vezes da conferência dos itens. Falou que, naquele ano, não havia ainda uma Ordem de Serviço e que, na maioria dos Termos de Verificação de Valores - TVVs, somente assinava a planilha, acreditando que o tesoureiro realizava a conferência, mas sem ter certeza se lhe cabia essa atribuição. Acreditava que os Termos de Verificação de Valores - TVVs eram realizados em data incerta, por comunicação do Gerente Geral no mesmo dia e momento da realização, uma vez por mês, não se recordando do Termo de Verificação de Valores - TVV do final do mês. Afirmou que a conferência física foi realizada apenas nos primeiros meses, não sabendo informar porque alguns itens não eram conferidos, nem sabendo dizer se era pela confiança do gerente em Raimundo ou outro motivo. Esclareceu que auxiliava Márcio na contagem, sendo os malotes conferidos no próprio guichê do caixa e, na tesouraria, o numerário do cofre. Afirmou que o Termo de Verificação de Valores - TVV de 31.07 não foi realizado. Esclareceu que o responsável pelas auditorias nos ATMs era Raimundo, não sabendo informar como eram realizadas, sendo comum que Raimundo as realizasse sozinho. Não soube informar se outras pessoas teriam acesso ao numerário do cofre, possuindo apenas a senha mecânica. Informou que ninguém tem acesso ao numerário, com exceção de um dia em que Márcio precisou colocar a senha do cofre para a empresa "Protege", que havia vindo buscar o numerário no momento de almoço de Raimundo. Por fim, disse que a Ordem de Serviço da comissão de Termo de Verificação de Valores - TVV foi realizada apenas depois da diferença constatada nos ATMs e que, até o momento do depoimento, 19.11.13, não havia comissão de Termo de Verificação de Valores - TVV formalmente constituída (fl. 21, volume I, do Apenso I).
Posteriormente, alterou a versão que apresentou sobre os fatos e relatou que o Termo de Verificação de Valores - TVV era efetivamente realizado (fls. 48/49, volume I, do Apenso I).
Em sede policial e em Juízo ratificou as declarações que prestou em seu segundo depoimento administrativo (cfr. fl. 75 e mídia audiovisual à fl. 620).
Paulo Brittes Filho, bancário lotado, à época dos fatos, na agência de Taquarituba/SP, em depoimento prestado perante a comissão do processo disciplinar e civil, esclareceu que foi lavrado Termo de Verificação de Valores - TVV apenas após ser encontrada diferença nos ATMs, o que foi feito pela própria comissão investigativa. Afirmou que quando substituiu Raimundo Guedes, em dezembro de 2011, conferiu o cofre no ato da substituição, sem, no entanto, conferir os ATMs, pela quantidade de trabalho. Contou que encontrou uma diferença de R$ 6.300,00 (seis mil e trezentos reais) pulverizada em 3 (três) ATMs. Informou o fato ao Gerente Geral e comunicou Raimundo Guedes Ferreira por telefone. Informou que Raimundo Guedes ficou surpreso ao saber da diferença e que ele, após a ocorrência, começou a conferir diariamente o saldo dos ATMs, desconfiando que elas pudessem estar dispensando cédulas em duplicidade, encontrando apenas uma diferença de R$ 10,00 (dez reais) em uma dos ATMs. Questionado por Raimundo Guedes, confirmou que, na época, entrou em contato com o empregado Gustavo, de Bauru, que afirmou que alguns equipamentos estavam apresentando problemas de dispensa de cédulas (fl. 55, volume I, do Apenso I).
Em sede policial Paulo e em Juízo ratificou integralmente seu depoimento prestado em sede administrativa (cfr. fl. 71 e mídia audiovisual à fl. 390).
Veridiana Fogaça dos Santos, bancária então lotada na agência da Caixa Econômica Federal de Taquarituba/SP, em depoimento prestado em sede administrativa, esclareceu que à época dos fatos integrou a comissão do Termo de Verificação de Valores - TVV e que o Gerente Geral Caio e a Gerente Ana lhe chamavam para realizar a conferência, duas vezes por mês, do numerário do cofre, com exceção do numerário dos ATMs, que não eram conferidos. Afirmou que o numerário do cofre era conferido no ambiente do cofre, e os ATMs não soube informar. Contou que assinou a OS n. 005/12 em 28.08.13, a pedido do Gerente Geral Afonso, que lhe telefonou e combinou de encontrá-la, dizendo que haviam ficado alguns documentos que precisava assinar. Esclareceu que faltava seu carimbo no documento porque estavam em um posto de gasolina (fl. 56, volume I, Apenso I).
Em Juízo, em uma primeira oitiva, ratificou as declarações que prestou em sede administrativa (cfr. mídia à fl. 388). Em uma segunda oitiva, afirmou ao Juízo não participar da conferência do autoatendimento, apenas dos contratos e do numerário do cofre e dos caixas, que era realizada dentro do cofre. Disse que o Gerente Afonso lhe pediu para que assinasse a ordem de serviço, dizendo que estava para ser transferido de agência e queria deixar os documentos corretos. Esclareceu não estar na agência de Taquarituba/SP na época dos fatos. Explicou que o repasse da tesouraria para os caixas e o abastecimento dos caixas de autoatendimento eram realizados pelo acusado. Acrescentou que o suprimento dos caixas de autoatendimento gerava um recibo impresso. Contou que apenas Raimundo tinha acesso à tesouraria e que todos os ambientes da agência são fiscalizados por câmeras. Afirmou que, na prática, a comissão de Termo de Verificação de Valores - TVV não fiscalizava os terminais de autoatendimento (fl. 565/565v.).
Afonso Borges Filho, então gerente da agência de Taquarituba/SP, em sede administrativa, informou que, em razão de ser sua primeira designação como Gerente Geral de agência não sabia de suas atribuições, razão pela qual, não designou a comissão do Termo de Verificação de Valores - TVV nem marcou as reuniões, acreditando que a conferência fosse atribuição do tesoureiro. Disse que, após a diferença no saldo dos ATMs, entrou em contato com a GIRET de Bauru, que lhe questionou sobre os Termos de Verificação de Valores - TVVs, momento em que tomou conhecimento sobre suas atribuições e buscou regularizar a situação dos Termos de Verificação de Valores - TVVs já formalizados e assinados pela comissão, com a elaboração da ordem de serviço com data retroativa. Afirmou que houve um consenso entre os membros da comissão sobre o fato de estarem assinando a ordem de serviço para regularização, sem que houvesse pedido que omitissem a informação de que a assinatura fora posterior às ocorrências. Explicou que colheu a assinatura de Veridiana em um posto de gasolina por questão de logística, pois cruzariam seus caminhos naquele local. Informou que a empregada sabia que se tratava de uma regularização. Falou que, se os ATMs tivessem emitido cédulas em duplicidade, provavelmente algum cliente teria mencionado o fato. Afirmou que, após o ocorrido, a relação de confiança que tinha com o tesoureiro foi quebrada, sendo todos os Termos de Verificação de Valores - TVVs realizados (fl. 133, volume I, do Apenso I).
Em sede policial, Afonso ratificou as declarações que prestou em sede do processo administrativo e afirmou que, de fato, não recebeu as informações sobre as atribuições contidas no manual OR 050 (fl. 83).
Em Juízo, Afonso disse que a diferença de numerário de aproximadamente R$ 67.000,00 (sessenta e sete mil reais) foi identificada pelo tesoureiro Raimundo Guedes, após conferência motivada por comunicado da Caixa, de que poderiam ocorrer diferenças nos saldos dos caixas de autoatendimento por dispensa de cédulas em duplicidade. Falou que reportou o fato ao Gerente de tesouraria de Bauru, porque as diferenças identificadas eram muito superiores as demais diferenças apuradas em âmbito nacional. Relatou que a diferença encontrada por Raimundo Guedes, em um dos caixas de autoatendimento, superava o valor movimentado no equipamento e que a diferença de numerário era física, e não eletrônica. Nesse sentido, a diferença de saldo deveria ter sido dispensada em duplicidade nos terminais de autoatendimento, não havendo nenhuma manifestação dos clientes nesse sentido. Falou que acredita que esses fatos devem ter motivado a dispensa de Raimundo. Esclareceu que sempre manteve uma relação de confiança com Raimundo, que nunca lhe dera motivos para desconfiança (mídia à fl. 472).
Adriano Benetti Nigro, Supervisor de Filial da Caixa Econômica Federal, em sede policial, confirmou as informações do relatório conclusivo do processo administrativo e esclareceu que atuou como presidente da Comissão Processante da Caixa Econômica Federal, tendo elaborado o relatório. Afirmou que Raimundo não é mais funcionário da Caixa Econômica Federal e não soube afirmar se apresentou algum recurso administrativo (fl. 66).
Letícia Alves Vieira das Chagas, em Juízo, disse que trabalhou com Raimundo Guedes na agência da Caixa Econômica Federal, de 2007 até 2010. Disse não ter conhecimento dos problemas relacionados aos caixas de autoatendimento. Afirmou que desconhece qualquer fato que desabone a conduta de Raimundo Guedes (mídia à fl. 412).
Márcio Aparecido Sakoda, em Juízo, disse que conhece Raimundo Guedes desde 2010, quando trabalharam juntos na agência da Caixa Econômica Federal de Santa Cruz do Rio Pardo. Afirmou que desconhece qualquer fato que desabone a conduta de Raimundo Guedes. Relatou que não teve conhecimento direto sobre os problemas técnicos nos ATMs, apenas soube, na agência de Santa Cruz, que havia ocorrido alguns casos isolados de máquinas que teriam tido problemas, inclusive, na agência em que trabalha, não ocorreu essa falha (mídia à fl. 412).
Lucas Gabriel Nogueira, em Juízo, disse que trabalhou como vigilante da agência da Caixa Econômica Federal, no período de um ano, concomitante com Raimundo Guedes. Falou que quem tinha o controle dos caixas, abastecendo e repondo os numerários, era apenas Raimundo. Esclareceu que, na época dos fatos, os funcionários comentavam sobre uma falha no sistema do banco que causava erro na dispensa de cédulas em duplicidade quando os clientes realizavam saques, tendo acontecido em âmbito nacional, em algumas agências do Brasil. Contou que Raimundo Guedes solicitou uma auditoria para comprovar que o erro acontecia na máquina. Soube que, tempos depois, Raimundo Guedes foi afastado. Informou que a agência era toda monitorada por câmeras e que Raimundo Guedes sempre estava no cofre, na tesouraria ou no corredor de abastecimento. Afirmou que Raimundo Guedes era muito correto em tudo o que fazia e não conhece nenhum fato que o desabone (mídia à fl. 606).
Extrai-se da prova testemunhal produzidas nos autos a inconclusividade quanto à conduta típica atribuída ao acusado.
Verifica-se dos relatos prestados por Márcio de Almeida Monteiro e por Ana Luiza Colturato Gonçalves em sede administrativa as versões apresentadas por eles nas duas vezes em que foram ouvidos em sede administrativa, razão pela qual, a meu ver suas declarações mostram-se enfraquecidas como elemento de prova indicativo da conduta ilícita atribuída ao acusado.
Não bastassem tais fatos, observe-se que nas demais declarações apresentadas ao Juízo pelas testemunhas arroladas pela acusação e pela defesa, não houve qualquer indicação precisa de ser Raimundo Guedes o responsável pela subtração do numerário indicado pela denúncia, ocorrendo apenas ilações de que seria ele o responsável, já que competiria a ele a verificação e conferência de tal numerário.
No entanto, extrai-se de já mencionadas declarações que outras pessoas também eram corresponsáveis e eximiram-se de qualquer responsabilidade penal, em razão de reconhecerem suas negligências com o trato do bem público (cfr. mídias audiovisuais às fls. 388, 390, 412, 472 e 606).
De fato, tenho que os elementos de prova produzidos nos autos são e não indicam, estreme de dúvidas, a prática delitiva atribuída a Raimundo Guedes.
De início, observe-se que a conferência dos caixas de atendimento não era feita mensalmente e os formulários eram assinados com base nas informações do banco o que, a princípio, gera dúvida quanto a seu real abastecimento.
Razão assiste à defesa do acusado quando indica ausência de prova pericial, na medida em que referido exame de corpo de delito direto no equipamento não foi feito por perito judicial, mas sim por órgão interno (de engenharia) da própria instituição financeira, no caso a Caixa Econômica Federal.
Embora chame a atenção o desvio de aproximados R$66.000,00 (sessenta e seis mil reais) relacionado à agência bancária da Caixa Econômica Federal em Taquarituba/SP, quando comparado ao total de desvios verificados no País, cerca de R$330.000,00 (trezentos e trinta mil reais), não me parece razoável concluir pela conduta delitiva do acusado.
No particular, houve, a meu ver, concorrência de fatores e patente negligência da Caixa Econômica Federal em proceder à conferência necessária do numerário disponibilizado em caixas eletrônicos de autoatendimento em Taquarituba/SP, mesmo porque, caberia aos gerentes, assim como ao réu, conferirem o funcionamento de já mencionadas máquinas.
Chama a atenção os relatos apresentados por Afonso Borges Filho, então gerente da agência de Taquarituba/SP, em sede administrativa, ocasião em que relatou que por ser sua primeira designação como Gerente Geral de agência da Caixa Econômica Federal não sabia quais eram suas atribuições, razão pela qual, não designou a comissão do Termo de Verificação de Valores - TVV nem marcou reuniões, acreditando que a conferência fosse atribuição exclusiva do tesoureiro (cfr. fl. 133, volume I, do Apenso I).
Nesse particular, penso não se encontrar suficientemente comprovada a prática delitiva atribuída a Raimundo Guedes Ferreira.
Ana Luiza, ouvida em Juízo, disse não poder afirmar que Raimundo tenha se apropriado dos valores, mas apenas que era ele o responsável pelos numerários (mídia audiovisual à fl. 620).
Afonso Borges Filho, em sede administrativa, afirmou desconhecer ser de sua responsabilidade a conferência dos Termos de Verificação de Valores (fls. 133, Apenso I); em sede policial ratificou suas declarações (fl. 83) e, em Juízo, afirmou que fora o réu, Raimundo Guedes, o responsável pela verificação da diferença de R$67.000,00, após conferência motivada pelo comunicado da Caixa. Relatou que a diferença encontrada por Raimundo Guedes em um dos caixas de autoatendimento, superava o valor movimentado no equipamento e que a diferença de numerário era física, razão pela qual deveria ocorrer dispensa de numerário em duplicidade nos terminais de autoatendimento, infere que tais acontecimentos devem ter motivado a dispensa do acusado (mídia audiovisual à fl. 472).
Acresça-se a tais fatos, a circunstância de o Laudo Pericial, acostado às fls. 87/97, afirmar que não foi constatada nenhuma ação delituosa nas imagens analisadas, sob o fundamento de não ser possível mensurar quantas cédulas havia, quantas foram retiradas e quantas supridas.
Com efeito, tenho que, pelos elementos dos autos, não foi suficientemente comprovada a conduta delitiva imputada ao acusado, razão pela qual, penso ser o caso de manter-se sua absolvição, o que faço com fundamento no artigo 386, VII, do Código de Processo Penal.
Ante o exposto, NEGO PROVIMENTO ao apelo do Ministério Público Federal (DIVIRJO DO RELATOR).
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RELATÓRIO
Foram apresentadas contrarrazões (fls. 786/798).
A Ilustre Procuradora Regional da República, Dra. Isabel Cristina Groba Vieira, manifestou-se pelo provimento do recurso (fls. 800/802v.).
É o relatório.
À revisão, nos termos regimentais.
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VOTO
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