Diário Eletrônico

PODER JUDICIÁRIO

TRIBUNAL REGIONAL FEDERAL DA 3ª REGIÃO

D.E.

Publicado em 10/03/2020
APELAÇÃO CRIMINAL Nº 0003055-38.2008.4.03.6117/SP
2008.61.17.003055-6/SP
RELATOR : Desembargador Federal JOSÉ LUNARDELLI
APELANTE : ORLANDO DONIZETE DA SILVA
ADVOGADO : SP269946 PERLA SAVANA DANIEL (Int.Pessoal)
APELADO(A) : Justica Publica
No. ORIG. : 00030553820084036117 1 Vr JAU/SP

EMENTA

APELAÇÃO CRIMINAL. ART. 273, §§ 1º e 1º-B, INCISO I, DO CÓDIGO PENAL. APLICAÇÃO DO PRECEITO SECUNDÁRIO DO CRIME DE TRÁFICO. ENTENDIMENTO DO STJ. INSTAURAÇÃO DE INCIDENTE DE INSANIDADE MENTAL. DESNECESSIDADE. AUSÊNCIA DE INTERROGATÓRIO. NULIDADE AFASTADA. REVELIA DECRETADA COM FUNDAMENTO NO ARTIGO 367 DO CPP. MATERIALIDADE, AUTORIA E DOLO COMPROVADOS. DOSIMETRIA DA PENA. REGIME INICIAL ABERTO. SUBSTITUIÇÃO DA PENA PRIVATIVA DE LIBERDADE POR PENA DE PRESTAÇÃO DE SERVIÇOS À COMUNIDADE E PRESTAÇÃO PECUNIÁRIA. APELO DA DEFESA DESPROVIDO.
1. Cuida-se de apelação penal interposta pela defesa contra decisão que julgou procedente a denúncia ofertada pelo Ministério Público Federal, para condenar o réu pela prática do crime definido no artigo 273, §§1º e 1º-B, inciso I, do Código Penal.
2. Rejeitada a tese defensiva pela nulidade da sentença, com retorno dos autos ao primeiro grau para instauração de insanidade mental, ausentes indícios de que o réu não tenha pleno desenvolvimento mental, ou que tenha "perturbação", no sentido jurídico-penal, de fator psíquico que dificulte de maneira relevante sua compreensão e discernimento dos fatos e das normas básicas de comportamento.
3. Afastado o pedido de reconhecimento de nulidade a partir da audiência de instrução, por ausência de interrogatório do réu, uma vez que este teve a revelia corretamente decretada, com fundamento no artigo 367 do Código de Processo Penal, por não ter comunicado novo endereço ao juízo, nem comparecido à audiência judicial designada para seu interrogatório. Prejuízo ao qual o réu deu causa.
4. Aplicação da pena prevista no art. 33 da Lei 11.343/06 ao crime do artigo 273 do Código Penal. Entendimento da Corte Especial do STJ (HC nº 239.363-PR) em 26.02.2015, a qual acolheu a arguição de inconstitucionalidade do preceito secundário da norma do art. 273, § 1º -B, V, do Código Penal.
5. A materialidade foi devidamente comprovada nos autos pelo Boletim de Ocorrência nº 4872/2008, pelo Auto de Exibição e Apreensão e pelo Laudo de Exame em Produtos Farmacêuticos nº 5747/2008-NUCRIM/SETEC/SR/DPF/SP, que registram a apreensão de 940 (novecentos e quarenta) unidades de comprimidos Pramil Sildenafil, de fabricação paraguaia. Os peritos consignaram serem proibidas a importação e comercialização dos medicamentos, porquanto não registrados na Agência Nacional de Vigilância Sanitária, tornando inconteste a materialidade delitiva.
6. A autoria restou comprovada pelo Boletim de Ocorrência nº 4872/2008, corroborado pelas demais provas amealhadas em juízo.
7. O dolo, por sua vez, foi evidenciado tanto pelas circunstâncias em que os medicamentos foram apreendidos como pela prova oral produzida.
8. Em razão da subsunção da conduta ao artigo 273, §§ 1º e 1º-B, inciso I, do Código Penal, mantenho a condenação e passo à dosimetria.
9. Constata-se a ocorrência de erro material na sentença, ao afirmar que "a pena-base deve ser fixada no mínimo legal", uma vez que o raciocínio exposto pelo juiz antes e depois de referido trecho é no sentido de valorar negativamente as circunstâncias e consequências do crime, resultando na exasperação da pena-base para 6 (seis) anos de reclusão e 600 (seiscentos) dias-multa na primeira fase da dosimetria.
10. Perfilho do entendimento de que a significativa quantidade de medicamentos importados irregularmente - 940 (novecentos e quarenta) comprimidos - requer maior censura, ante a demonstração de circunstâncias e consequências que extrapolam o ordinário.
11. Pena-base mantida no patamar estabelecido na sentença.
12. Na segunda fase da dosimetria, a pena permaneceu inalterada, o que resta mantido, eis que ausentes circunstâncias agravantes e atenuantes.
13. Na terceira fase da dosimetria, a defesa requer a exasperação do patamar de aplicação da minorante prevista no § 4º do artigo 33 da Lei nº. 11.343/06 para 2/3 (dois terços), o que não merece prosperar, tendo em vista que o réu, de maneira eventual, associou-se a organizações criminosas que comercializam medicamentos clandestinos, além de ostentar condenações criminais pretéritas.
14. Tendo em vista o quantum da pena, resta mantido o regime inicial aberto para o cumprimento da pena, nos termos do artigo 33, §2º, alínea "c", do Código Penal.
15. Preenchidos os requisitos do artigo 44, §2º, do Código Penal, mantenho a substituição da pena privativa de liberdade por duas penas restritivas de direitos, consistentes em prestação de serviços à comunidade ou a entidade pública, a ser determinado pelo juízo de execução, e prestação pecuniária, nos moldes fixados pela sentença.
16. Apelo defensivo desprovido.

ACÓRDÃO

Vistos e relatados estes autos em que são partes as acima indicadas, decide a Egrégia Décima Primeira Turma do Tribunal Regional Federal da 3ª Região, por maioria, NEGAR PROVIMENTO ao recurso de Apelação da Defesa, nos termos do voto do Desembargador Federal Fausto De Sanctis com quem votou a Juíza Federal Convocada Raecler Baldresca.


São Paulo, 12 de dezembro de 2019.
FAUSTO DE SANCTIS
Desembargador Federal


Documento eletrônico assinado digitalmente conforme MP nº 2.200-2/2001 de 24/08/2001, que instituiu a Infra-estrutura de Chaves Públicas Brasileira - ICP-Brasil, por:
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APELAÇÃO CRIMINAL Nº 0003055-38.2008.4.03.6117/SP
2008.61.17.003055-6/SP
RELATOR : Desembargador Federal JOSÉ LUNARDELLI
APELANTE : ORLANDO DONIZETE DA SILVA
ADVOGADO : SP269946 PERLA SAVANA DANIEL (Int.Pessoal)
APELADO(A) : Justica Publica
No. ORIG. : 00030553820084036117 1 Vr JAU/SP

VOTO CONDUTOR

O DESEMBARGADOR FEDERAL FAUSTO DE SANCTIS: Trata-se de recurso de Apelação interposto por ORLANDO DONIZETE DA SILVA em face da sentença proferida pelo Juízo Federal da 1ª Vara de Jaú/SP, que o condenou como incurso no crime tipificado no artigo 273, §§ 1º e 1º-B, inciso I, do Código Penal, à pena de 03 (três) anos de reclusão e pagamento de 300 (trezentos) dias-multa. Substituída a pena privativa de liberdade por duas restritivas de direitos consistentes em prestação de serviços à comunidade e prestação pecuniária de 10 (dez) salários mínimos.


Na sessão realizada em 12.12.2019, divergi do e. Relator a fim de negar provimento à Apelação da Defesa.


Passo aos fundamentos do meu voto.


Na sentença prolatada às fls. 469/486, o Juízo a quo aplicou o preceito secundário da Lei de Drogas ao delito a que fora denunciado o réu, tendo em vista o reconhecimento pelo Colendo Superior Tribunal de Justiça da inconstitucionalidade do preceito secundário do artigo 273, § 1º-B, inciso V, do Código Penal.


Assim, ao final da terceira fase da dosimetria, fez incidir a causa de diminuição prevista no artigo 33, § 4º, da Lei n.º 11.343/2006, no patamar de ½ (metade), a fim de reduzir a pena de 06 (seis) anos e 600 (seiscentos) dias-multa, para fixa-la definitivamente em 03 (anos) anos de reclusão e pagamento de 300 (trezentos) dias-multa.


De outro giro, o e. Relator, em seu voto acostado às fls. 578/584, deu parcial provimento ao recurso da defesa, de modo a fixar em 2/3 (dois terços) a causa de diminuição prevista no artigo 33, § 4º, da Lei n.º 11.343/2006, fixando definitivamente a pena em 01 (um) ano e 10 (dez) meses de reclusão e pagamento de 183 (cento e oitenta e três) dias-multa.


O voto consignou à fl. 583 verso que o réu fazia jus à fixação da causa de diminuição acima mencionada no patamar de 2/3, pois as condenações sofridas pelo réu ocorreram décadas atrás, e que não há indícios que apontem o réu se dedicar a atividades criminosas ou integrar organização criminosa.


No caso concreto, o réu ORLANDO DONIZETE DA SILVA foi denunciado como incurso como incurso no artigo 273, § 1º-B, inciso I, do Código Penal, pois, no dia 11 de setembro de 2008, foram apreendidos com ele 800 (oitocentos) comprimidos do medicamento Pramil Sildenafil, de 50 mg, e 140 (cento e quarenta) comprimidos do medicamento Pramil Sildenafil, de 75 mg, além de embalagens dos medicamentos.


A quantidade de medicamentos apreendidos em poder do réu indica sua finalidade comercial, o que pressupõe seu envolvimento, ainda que de forma eventual, com organizações criminosas que comercializam esses produtos. Além disso, o réu ostenta condenações criminais pretéritas,


A jurisprudência desta Corte é no sentido de que, no caso das mulas e quando se tratar de razoável quantidade de medicamentos, a redução da pena em razão da aplicação da minorante prevista no artigo 33, § 4º, da Lei de Drogas, deve se dar no patamar de 1/6 (um sexto), conforme se observa dos julgados abaixo:


PENAL. APELAÇÃO CRIMINAL. MOEDA FALSA. MEDICAMENTOS IMPORTADOS SEM REGISTRO NA ANVISA. ART. 273, § 1º-B, I, DO CÓDIGO PENAL. MATERIALIDADE, AUTORIA E DOLO COMPROVADOS. DOSIMETRIA DAS PENAS. 1. Materialidade e autoria do crime do art. 289, § 1º, do Código Penal comprovadas pelo auto de apreensão, pelo laudo pericial de documentoscopia e pelas declarações do próprio réu em sede de interrogatório judicial. 2. As notas apreendidas não foram grosseiramente falsificadas, possuindo potencialidade de ludibriar terceiros de boa-fé. Impossibilidade de desclassificação para o delito do art. 171 do Código Penal. 3. Materialidade do crime do art. 273, § 1º-B, I, do Código Penal comprovada pelo auto de apreensão e pelo laudo pericial de química forense. 4. A comercialização é irrelevante para a tipificação do delito, pois o tipo penal descrito no art. 273, § 1º-B, I, do Código Penal abrange a conduta daquele que importa produto destinado a fins terapêuticos ou medicinais sem registro no órgão de vigilância sanitária competente. 5. Autoria e dolo do crime do art. 273, § 1º-B, I, do Código Penal decorrem da apreensão dos medicamentos em poder do apelante, conforme auto de prisão em flagrante e auto de apreensão, do depoimento de testemunha, das declarações de corréu e das declarações do próprio recorrente. 6. Dosimetria da pena do crime do art. 289, § 1º, do Código Penal. A grande quantidade de notas apreendidas justifica o aumento da pena-base. 7. As condições pessoais favoráveis ao acusado não impedem a majoração da pena-base à luz da caracterização de condição judicial desfavorável objetiva. 8. Aplicação da circunstância atenuante da confissão. Mesmo quando imbuída de teses defensivas, descriminantes ou exculpantes, deve ser considerada na graduação da pena, nos termos do art. 65, III, "d", do Código Penal. Precedentes do STJ e Súmula nº 231 dessa Corte. 9. A pena de multa deve seguir o sistema trifásico. 10. Dosimetria da pena do crime do art. 273, § 1º-B, I, do Código Penal. Não há dúvida de que a pena de reclusão, de 10 (dez) a 15 (quinze) anos, e multa para o crime em exame é bastante alta e, por isso, tem levado a algumas perplexidades nos casos concretos examinados, dada a evidente desproporcionalidade que se verifica. Apenas para ficar num exemplo, a pena prevista para o tráfico de drogas, crime de claríssima repulsa social, varia de 5 (cinco) a 15 (quinze) anos de reclusão e multa, o que significa dizer que, em certos casos, aquele que trafica cocaína poderá ter uma pena significativamente inferior à daquele que importa medicamento sem registro na Anvisa. 11. A solução encontrada no âmbito do STJ (aplicação do preceito secundário do crime de tráfico de drogas: art. 33 da Lei nº 11.343/2006), em princípio, é a mais adequada, visto que, no caso de remédios - e mesmo de produtos cosméticos -, trata-se de drogas, tendo o tipo penal, por objetividade jurídica, a saúde pública. 12. Aplicabilidade, ao crime do artigo 273 do CP, da causa de diminuição do artigo 33, §4º, da Lei nº 11.343/06, no patamar de 1/6. 13. Com efeito, a despeito de ser primário, com bons antecedentes, não havendo provas de que se dedica a atividades criminosas ou integre organização criminosa, a quantidade de medicamentos apreendida é expressiva a justificar a redução de 1/6. 14. Concurso material (CP, art. 69), com a consequente soma das penas aplicadas. 15. Apelação não provida. Alteração de ofício da pena de multa aplicada em razão da condenação pelo crime do art. 289, § 1º, do CP. De ofício, aplicar ao delito do artigo 273, §1º, B, I do CP as penas cominadas ao artigo 33 da lei 11.343/06. (grifei)

(ApCrim 0000720-80.2011.4.03.6007, DESEMBARGADORA FEDERAL CECILIA MELLO, TRF3 - DÉCIMA PRIMEIRA TURMA, e-DJF3 Judicial 1 DATA:27/07/2017.)


PENAL. PROCESSUAL PENAL. DELITO DO ART. 273, § 1º-B, DO CÓDIGO PENAL. PRELIMINAR. INTERNACIONALIDADE. COMPETÊNCIA DA JUSTIÇA FEDERAL. MATERIALIDADE, AUTORIA E DOLO COMPROVADOS. DESCLASSIFICAÇÃO DA CONDUTA PARA O DELITO DE CONTRABANDO OU DESCAMINHO. IMPOSSIBILIDADE. DOSIMETRIA. CÓDIGO PENAL, ART. 273. PRECEITO SECUNDÁRIO. APLICAÇÃO DA PENA NA SENTENÇA DO ART, 33 DA LEI N. 11.343/06. CAUSA DE DIMINUIÇÃO DO § 4º DO ART. 33 DA LEI N. 11.343/06. INCIDÊNCIA. REGIME SEMIABERTO. SUBSTITUIÇÃO DA PENA PRIVATIVA DE LIBERDADE POR RESTRITIVAS DE DIREITOS. AUSÊNCIA DOS REQUISITOS LEGAIS. APELAÇÃO CRIMINAL PARCIALMENTE PROVIDA. 1. O Laudo de Exame de Produto Farmacêutico n. 2.051/2009, lavrado por peritos da Polícia Federal, conclui que nenhum dos medicamentos analisados presta-se ao comércio em território nacional, por não terem registro junto à Anvisa, sendo de importação proibida. Acrescenta que a origem dos materiais examinados baseia-se nas informações contidas nas embalagens dos produtos, cujos fabricantes foram declarados como procedentes do Paraguai e dos Estados Unidos da América (fls. 46/65). Considerando que há indícios de internacionalidade do delito, uma vez que os medicamentos teriam sido trazidos do Paraguai, conforme afirmou o próprio acusado em seu interrogatório judicial (mídia à fl. 302), deve ser mantido o feito na Justiça Federal. Preliminar rejeitada. 2. A materialidade, a autoria e o dolo não foram objetos de recurso e restaram devidamente comprovados nos autos. 3. A conduta descrita na denúncia corresponde exatamente ao tipo descrito no art. 273, § 1º-B, do Código Penal, consistente em importar medicamentos sem registro, quando exigível, no órgão de vigilância competente, independentemente da destinação pretendida (revenda), sendo inviável, por força do princípio da especialidade, a aplicação do art. 334 do Código Penal. 4. Ressalvado meu entendimento a respeito, o fato é que, uma vez aplicada a pena do delito de tráfico para o crime do art. 273-B do Código Penal, o Superior Tribunal de Justiça, preconiza que seja considerada a aplicabilidade da causa de diminuição do § 4º do art. 33 da Lei n. 11.343/06 ((STJ, REsp n. 1569202/SP, Rel. Min. Sebastião Reis Júnior, j. 05.05.16). 5. Redução da pena conforme o art. 33, § 4º, da Lei n. 11.343/06, na fração mínima, considerando as circunstâncias subjacentes à prática delitiva. 5. Mantido o regime inicial semiaberto, de acordo com o art. 33, § 2º, b, do Código Penal. Incabível a substituição da pena privativa de liberdade, porquanto não preenchido o requisito objetivo previsto no art. 44, I, do Código Penal. 6. Apelação criminal da defesa parcialmente provida. (grifei)

(ApCrim 0005323-76.2009.4.03.6005, DESEMBARGADOR FEDERAL ANDRÉ NEKATSCHALOW, TRF3 - QUINTA TURMA, e-DJF3 Judicial 1 DATA:01/03/2017.)


Observa-se, assim, que o patamar de redução eleito pelo Juízo a quo é maior até mesmo que a fração aplicada por esta Corte em casos semelhantes, de modo que a sentença não merece qualquer reparo nesse ponto.


Dispositivo


Ante o exposto, voto no sentido de NEGAR PROVIMENTO ao recurso de Apelação interposto pela Defesa.


É o voto.


FAUSTO DE SANCTIS
Desembargador Federal


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APELAÇÃO CRIMINAL Nº 0003055-38.2008.4.03.6117/SP
2008.61.17.003055-6/SP
RELATOR : Desembargador Federal JOSÉ LUNARDELLI
APELANTE : ORLANDO DONIZETE DA SILVA
ADVOGADO : SP269946 PERLA SAVANA DANIEL (Int.Pessoal)
APELADO(A) : Justica Publica
No. ORIG. : 00030553820084036117 1 Vr JAU/SP

RELATÓRIO

EXCELENTÍSSIMO SENHOR DESEMBARGADOR FEDERAL JOSÉ LUNARDELLI:


Cuida-se de ação penal fundada em denúncia oferecida pelo Ministério Público Federal contra Orlando Donizete da Silva pela prática do crime definido no artigo 273, § 1º-B, inciso I, do Código Penal.

Narra a denúncia (fls. 103/105):

"Consta dos presentes autos que, no dia 11 de setembro de 2008, por volta das 10h45, na Rodovia SP 255, Km 147, no Município de Jaú/SP, ORLANDO DONIZETE DA SILVA foi surpreendido transportando medicamentos sem registro na ANVISA e, portanto, de importação e comércio proibidos no território nacional, descritos no auto de exibição e apreensão de fls. 06/07.

Segundo se apurou, na data dos fatos, em fiscalização de rotina, policiais rodoviários abordaram ônibus da empresa Viação Garcia, tendo logrado encontrar abaixo da poltrona nº 35 ocupada pelo ora denunciado, ORLANDO DONIZETE DA SILVA, uma bolsa contendo os medicamentos apreendidos. [...]".

Citaram-se elementos de autoria e materialidade delitiva, e, ao fim, o Ministério Público Federal denunciou Orlando Donizete da Silva pela prática do crime previsto no artigo 273, § 1º-B, inciso I, c.c. art. 14, inciso II, parágrafo único, ambos do Código Penal, em continuidade delitiva.

A denúncia foi recebida em 03 de fevereiro de 2012 (fls. 106/107).

Frustrada a tentativa de citação pessoal do réu (fls. 139, 184, 188, 205), determinou-se a citação editalícia (fls. 209 e 215). Decorreu in albis o prazo para manifestação do réu e apresentação de sua defesa preliminar. Assim, foi determinada a suspensão do processo e do curso do prazo prescricional, com fundamento no artigo 366 do Código de Processo Penal (fl. 223). Após a citação do réu em 24 de setembro de 2018, quando compareceu espontaneamente ao fórum da Comarca de Ibiraci/MG (fl. 355), retomou-se a marcha processual (06 de dezembro de 2018, fls. 356/356v).

Após diversas tentativas de intimação sem êxito (fls. 377v, 389v, 408v, 424, 430), foi realizada audiência de instrução e julgamento em 20 de maio de 2019, à qual o réu não compareceu (fls. 457/458). Assim, em conformidade com o artigo 367 do Código de Processo Penal, o juiz determinou o prosseguimento do feito, por se tratar de acusado que, intimado pessoalmente, mudou de residência sem comunicar o novo endereço ao juízo.

Após regular instrução, sobreveio a sentença de fls. 469/486, pela qual o magistrado de primeiro grau julgou procedente a pretensão punitiva deduzida na denúncia para condenar Orlando Donizete da Silva pela prática do crime insculpido no artigo 273, §§ 1º e 1º-B, inciso I, do Código Penal, tendo como parâmetro o preceito secundário do artigo 33 da Lei 11.343/06, à pena privativa de liberdade de 3 (três) anos de reclusão, e ao pagamento de 300 (trezentos) dias-multa, no valor de 1/30 (um trigésimo) do salário mínimo vigente à época dos fatos, em regime aberto.

A pena foi substituída por prestação de serviços à comunidade ou a entidades públicas, e prestação pecuniária, no valor de 10 (dez) salários mínimos, a ser paga a entidade pública ou privada com destinação social, consoante determinações a serem especificadas no Juízo de Execução.

Por fim, foi concedido ao réu o direito de apelar em liberdade, e não houve condenação ao pagamento das custas processuais, uma vez assistido por defensora dativa.

A sentença foi publicada em 21 de maio de 2019 (fl. 487).

A defesa de Orlando interpôs apelação. Argui preliminar de nulidade processual, requerendo o retorno dos autos ao primeiro grau para que seja determinada a instauração do incidente de sanidade mental do réu, a fim de constatar sua imputabilidade ou não à época dos fatos, bem como a intimação do réu para, além dos atos processuais referentes ao incidente de sanidade mental, ser ouvido em interrogatório em audiência de instrução e julgamento. No mérito, busca o decreto absolutório, sustentando a inexistência de provas para embasar a condenação. Subsidiariamente, requer a reforma da dosimetria, para que seja corrigida a pena-base para cinco, ao invés de seis anos, além do que pleiteia a aplicação da causa de diminuição em seu patamar máximo (dois terços) (fls. 492/499).

Contrarrazões ministeriais às fls. 516/518.

Nesta corte, a Procuradoria Regional da República se manifestou pelo desprovimento do recurso defensivo e pela execução provisória da pena (fls. 531/538vº).

É o relatório.

À revisão.


JOSÉ LUNARDELLI
Desembargador Federal Relator


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Signatário (a): JOSE MARCOS LUNARDELLI:10064
Nº de Série do Certificado: 11DE1812176AF96B
Data e Hora: 30/09/2019 12:05:58



APELAÇÃO CRIMINAL Nº 0003055-38.2008.4.03.6117/SP
2008.61.17.003055-6/SP
RELATOR : Desembargador Federal JOSÉ LUNARDELLI
APELANTE : ORLANDO DONIZETE DA SILVA
ADVOGADO : SP269946 PERLA SAVANA DANIEL (Int.Pessoal)
APELADO(A) : Justica Publica
No. ORIG. : 00030553820084036117 1 Vr JAU/SP

VOTO

EXCELENTÍSSIMO SENHOR DESEMBARGADOR FEDERAL JOSÉ LUNARDELLI:


Cuida-se de apelação penal interposta pela defesa de Orlando Donizete da Silva contra decisão que julgou procedente a denúncia ofertada pelo Ministério Público Federal, para condenar o réu pela prática do crime definido no artigo 273, §§1º e 1º-B, inciso I, do Código Penal, que dispõe:

"Art. 273 - Falsificar, corromper, adulterar ou alterar produto destinado a fins terapêuticos ou medicinais:

Pena - reclusão, de 10 (dez) a 15 (quinze) anos, e multa.

§ 1º - Nas mesmas penas incorre quem importa, vende, expõe à venda, tem em depósito para vender ou, de qualquer forma, distribui ou entrega a consumo o produto falsificado, corrompido, adulterado ou alterado.

§ 1º-B - Está sujeito às penas deste artigo quem pratica as ações previstas no § 1º em relação a produtos em qualquer das seguintes condições:

I - sem registro, quando exigível, no órgão de vigilância sanitária competente."


Da instauração de incidente de insanidade mental


A defesa requer a anulação da sentença, com retorno dos autos ao primeiro grau, para que seja instaurado incidente de insanidade mental.

A defensora dativa pleiteou, em sede de memoriais e preliminarmente em razões de apelação, a instauração de incidente de insanidade mental, tendo em vista que a Oficiala de Justiça que realizou a intimação do réu registrou que o mesmo apresentava confusão mental. Requer a anulação da sentença, para que os autos retornem ao primeiro grau e seja realizado exame médico-legal para constatar a imputabilidade ou não do réu à época dos fatos.

Em que pese o acusado não ter sido submetido à perícia médica para o fim específico de averiguar sua imputabilidade, no caso concreto, não se constata a imprescindibilidade de produção da referida prova, pois os elementos colacionados aos autos revelam a consciência do acusado acerca da ilicitude de sua conduta, bem como sua condição de se determinar conforme esse entendimento.

Primeiramente, anote-se que nenhuma menção foi feita pelos policiais que realizaram o flagrante acerca de comportamento atípico ou sinais de confusão mental do réu durante a abordagem ou nos momentos que se seguiram até o encaminhamento do réu à Delegacia.

Ademais, consta às fls. 410/411 que Orlando recebeu auxílios-doença previdenciários de 25/10/06 a 01/03/2009 e de 31/12/2009 a 01/03/2010. Foi expedido ofício ao Instituto Nacional de Seguridade Social para que informasse a CID (Classificação Internacional de Doenças) que fundamentou a concessão de tais auxílios-doença (fl. 549).

A autarquia federal respondeu ao questionamento às fls. 551/567. Os códigos de CID informados foram S82-7 (que corresponde a fraturas múltiplas da perna) e T93-2 (que corresponde a sequelas de outras fraturas do membro inferior). O réu realizou pedidos subsequentes de afastamento do trabalho por relatar dores e ausência de força nas pernas, mas os médicos responsáveis por sua avaliação concluíram inexistir incapacidade laborativa (fls. 559/560). Também houve pedido de afastamento em razão de eczema herpético, o qual também restou indeferido por não ter sido constatada incapacidade laborativa (fl. 561).

Verifica-se, portanto, que nenhuma das patologias que fundamentou a concessão de auxílio-doença ou os pedidos subsequentes é de natureza psicológica, compromete as faculdades mentais do réu, ou sugere sua inimputabilidade ou semi-imputabilidade.

Soma-se a isto que, conforme exposto na fundamentação da sentença, o réu ostenta extensa relação de condenações criminais transitadas em julgado (fls. 127/133), o que enfraquece ainda mais a tese de inimputabilidade do réu.

Assim, o quanto registrado pela Oficiala de Justiça restou isolado nos autos, não havendo indícios de que o acusado seja portador de doença mental, nem que, à época dos fatos, não compreendesse a ilicitude de sua conduta e não pudesse se determinar de acordo com esse entendimento.

Diante dos elementos colimados, caberia à defesa do recorrente trazer aos autos provas aptas a gerar, ao menos, dúvida efetiva a respeito da imputabilidade do acusado, o que não ocorreu.

De todos os elementos expostos supra, dessume-se de maneira cabal que o réu é plenamente imputável, dotado de total capacidade de discernimento e entendimento dos fatos, de maneira equivalente a pessoa de conhecimento e experiência ordinários.

Com essas considerações, rejeito a tese defensiva pela nulidade da sentença, com retorno dos autos ao primeiro grau para instauração de insanidade mental, ante a ausência de indícios de que o réu não tenha pleno desenvolvimento mental, ou que tenha "perturbação" no sentido jurídico-penal de fator psíquico que dificulte de maneira relevante sua compreensão e discernimento dos fatos e das normas básicas de comportamento.


Da nulidade por ausência de interrogatório


A defesa sustenta que a ausência de intimação do réu para comparecimento à audiência de instrução e julgamento impediu a ampla defesa do mesmo, caracterizando nulidade a partir da audiência de instrução.

A alegação não merece prosperar.

O réu foi citado em 24/09/2018 (fl. 355), ocasião em que declinou o endereço onde residia. Posteriormente, foram realizadas quatro tentativas de intimação de Orlando para a audiência de instrução e julgamento, tanto no endereço indicado por ele quanto em outros, porém todas resultaram frustradas (fls. 377vº, 389vº, 407vº, 408vº). Ante o retorno negativo das diligências, foi determinado o cancelamento da audiência de instrução e julgamento.

O Ministério Público Federal se manifestou à fl. 415, requerendo a designação de nova data de audiência de instrução e julgamento, expedindo-se mandados de intimação do acusado quanto à nova audiência. As diligências foram negativas (fls. 424, 430). A audiência foi redesignada para 20/05/2019 (fl. 434), com regular intimação da defesa técnica.

O réu não compareceu à audiência judicial designada para seu interrogatório, razão pela qual foi declarado revel, com fundamento no artigo 367 do Código de Processo Penal (fls. 457/458).

Referido artigo preceitua que "O processo seguirá sem a presença do acusado que, citado ou intimado pessoalmente para qualquer ato, deixar de comparecer sem motivo justificado, ou, no caso de mudança de residência, não comunicar o novo endereço ao juízo".

Revela-se correta, portanto, a decretação de revelia, uma vez que o réu, citado, não comunicou novo endereço ao juízo.

O juízo a quo somente prosseguiu com feito à revelia após esgotar todas as possibilidades possíveis e plausíveis, determinando diversas tentativas de intimação do réu, nas quais foram utilizados endereços obtidos pelo Ministério Público Federal a partir de cadastros de órgãos públicos. Assim, a ausência de interrogatório ocorreu por culpa exclusiva do recorrente, que não foi encontrado no endereço por ele declinado.

Neste sentido, confira-se o seguinte julgado do Superior Tribunal de Justiça:


PROCESSO PENAL. RECURSO EM HABEAS CORPUS. ROUBO MAJORADO. AUSÊNCIA DE INTERROGATÓRIO. INFRUTÍFERA TENTATIVA DE INTIMAÇÃO. REVELIA. ART. 367 DO CPP. SENTENÇA CONDENATÓRIA. ALEGADO VÍCIO PROCESSUAL POR AUSÊNCIA DE INTIMAÇÃO PESSOAL DO RECORRENTE. RÉU SOLTO. NÃO LOCALIZAÇÃO. INTIMAÇÃO DA DEFESA TÉCNICA. ART. 565 DO CPP. PRINCÍPIO DA VOLUNTARIEDADE. ART. 594 DO CPP. DEFICIÊNCIA TÉCNICA. NULIDADES NÃO CONFIGURADAS. RECURSO NÃO PROVIDO. 1. A República Federativa do Brasil, fundada, entre outros princípios, na dignidade da pessoa humana e na cidadania, consagra como garantia "aos litigantes, em processo judicial ou administrativo, e aos acusados em geral, [...] o contraditório e ampla defesa, com os meios e recursos a ela inerentes" (art. 5º, LV, da Constituição Federal). Refletindo em seu conteúdo os ditames constitucionais, o art. 261 do Código de Processo Penal estabelece que "nenhum acusado, ainda que ausente ou foragido, será processado ou julgado sem defensor". 2. "O devido processo legal, amparado pelos princípios da ampla defesa e do contraditório, é corolário do Estado Democrático de Direito e da dignidade da pessoa humana, pois permite o legítimo exercício da persecução penal e eventualmente a imposição de uma justa pena em face do decreto condenatório proferido", assim, "compete aos operadores do direito, no exercício das atribuições e/ou competência conferida, o dever de consagrar em cada ato processual os princípios basilares que permitem a conclusão justa e legítima de um processo, ainda que para condenar o réu" (HC 91.474/RJ, Rel. Ministro ARNALDO ESTEVES LIMA, QUINTA TURMA, DJe 2/8/2010). 3. O reconhecimento de nulidades no curso do processo penal reclama uma efetiva demonstração do prejuízo à parte, sem a qual prevalecerá o princípio da instrumentalidade das formas positivado pelo art. 563 do CPP (pas de nullité sans grief). 4. No caso em exame, a ausência de interrogatório ocorreu por culpa exclusiva do recorrente, que não foi encontrado no endereço por ele declinado, não podendo, agora, em sede de habeas corpus, pleitear reconhecimento de nulidade, sustentando um prejuízo a que ele mesmo deu causa. É dever do réu informar ao Juízo eventual mudança de endereço. 5. Hipótese em que se deve aplicar a regra contida no art. 367 do CPP: "o processo seguirá sem a presença do acusado que, citado ou intimado pessoalmente para qualquer ato, deixar de comparecer sem motivo justificado, ou, no caso de mudança de residência não comunicar o novo endereço ao Juízo". 6. Nos termos do art. 370, § 1º, CPP, a intimação do defensor constituído deve ocorrer "por publicação no órgão incumbido da publicidade dos atos judiciais da comarca". Além disso, a teor do disposto no art. 392, inciso II, do CPP, "tratando-se de réu solto, mostra-se suficiente a intimação do defensor constituído acerca da r. sentença condenatória" (RHC 66.254/PR, Rel. Ministro FELIX FISCHER, QUINTA TURMA, julgado em 19/05/2016, DJe 10/06/2016). Não há falar, portanto, em intimação pessoal da sentença. 7. "Consoante dispõe expressamente o art. 565 do Código de Processo Penal, nenhuma das partes poderá arguir nulidade a que haja dado causa. Isso porque ninguém pode se beneficiar da própria torpeza, diante do princípio da lealdade processual, derivado da boa-fé" (RHC 107.661/RO, Rel. Ministra LAURITA VAZ, SEXTA TURMA, julgado em 21/02/2019, DJe 11/03/2019). 8. Nos termos do art. 594, caput, do CPP, vigora no sistema processual brasileiro o princípio da voluntariedade, o qual faculta à defesa técnica a interposição de recurso contra decisão desfavorável ao réu. 9. O Superior Tribunal de Justiça firmou entendimento de que "a alegação de deficiência da defesa deve vir acompanhada de prova de inércia ou desídia do defensor, causadora de prejuízo concreto à regular defesa do réu" (RHC 39.788/SP, Rel. Ministro ROGERIO SCHIETTI CRUZ, SEXTA TURMA, DJe 25/2/2015), o que não restou demonstrado na hipótese em apreço. 10. Recurso não provido.

(RHC 100.213/SP, Rel. Ministro RIBEIRO DANTAS, QUINTA TURMA, julgado em 04/06/2019, DJe 11/06/2019)


Ante o exposto, afasto a nulidade alegada pela defesa.

 

Da Pena do artigo 273 do Código Penal


O artigo 273 do Código Penal foi substancialmente modificado pela Lei 9.677/1998. Motivado pela descoberta maciça de medicamentos falsificados comercializados no País, o legislador alterou a redação do caput do artigo e seu §1º, acrescentou os §§1-A e 1-B, incluiu os delitos enumerados no artigo no rol de crimes hediondos e recrudesceu sobremaneira a pena (antes de um a três anos) para dez a quinze anos.

A constitucionalidade do preceito secundário do artigo 273 do Código Penal passou a ser alvo de impugnação e, nesse contexto, foi objeto de decisão da Corte Especial do Colendo Superior Tribunal de Justiça, em arguição de incidente de inconstitucionalidade, tendo sido declarado inconstitucional o preceito secundário da norma penal em testilha, por ofensa aos princípios da proporcionalidade e razoabilidade. Por oportuno, transcrevo a ementa do referido julgado:

ARGUIÇÃO DE INCONSTITUCIONALIDADE. PRECEITO SECUNDÁRIO DO ART. 273, § 1º-B, V, DO CP. CRIME DE TER EM DEPÓSITO, PARA VENDA, PRODUTO DESTINADO A FINS TERAPÊUTICOS OU MEDICINAIS DE PROCEDÊNCIA IGNORADA. OFENSA AO PRINCÍPIO DA PROPORCIONALIDADE.

1. A intervenção estatal por meio do Direito Penal deve ser sempre guiada pelo princípio da proporcionalidade, incumbindo também ao legislador o dever de observar esse princípio como proibição de excesso e como proibição de proteção insuficiente.

2. É viável a fiscalização judicial da constitucionalidade dessa atividade legislativa, examinando, como diz o Ministro Gilmar Mendes, se o legislador considerou suficientemente os fatos e prognoses e se utilizou de sua margem de ação de forma adequada para a proteção suficiente dos bens jurídicos fundamentais.

3. Em atenção ao princípio constitucional da proporcionalidade e razoabilidade das leis restritivas de direitos (CF, art. 5º, LIV), é imprescindível a atuação do Judiciário para corrigir o exagero e ajustar a pena cominada à conduta inscrita no art. 273, § 1º-B, do Código Penal.

4. O crime de ter em depósito, para venda, produto destinado a fins terapêuticos ou medicinais de procedência ignorada é de perigo abstrato e independe da prova da ocorrência de efetivo risco para quem quer que seja. E a indispensabilidade do dano concreto à saúde do pretenso usuário do produto evidencia ainda mais a falta de harmonia entre o delito e a pena abstratamente cominada (de 10 a 15 anos de reclusão) se comparado, por exemplo, com o crime de tráfico ilícito de drogas - notoriamente mais grave e cujo bem jurídico também é a saúde pública.

5. A ausência de relevância penal da conduta, a desproporção da pena em ponderação com o dano ou perigo de dano à saúde pública decorrente da ação e a inexistência de consequência calamitosa do agir convergem para que se conclua pela falta de razoabilidade da pena prevista na lei. A restrição da liberdade individual não pode ser excessiva, mas compatível e proporcional à ofensa causada pelo comportamento humano criminoso.

6. Arguição acolhida para declarar inconstitucional o preceito secundário da norma.

(AI no HC 239.363/PR, Rel. Ministro SEBASTIÃO REIS JÚNIOR, CORTE ESPECIAL, julgado em 26/02/2015, DJe 10/04/2015)


Com a declaração de inconstitucionalidade do preceito secundário da norma penal em tela, a Corte Superior passou a entender pela possibilidade de aplicação das penas previstas para o crime de tráfico de drogas aos crimes tipificados no artigo 273 do Código Penal, em razão da semelhança entre as condutas, inclusive com a possibilidade de aplicação da minorante prevista no §4º do art. 33 da Lei 11.343/06. A propósito, confira-se:

AGRAVO REGIMENTAL NO RECURSO ESPECIAL. FALSIFICAÇÃO, CORRUPÇÃO, ADULTERAÇÃO OU ALTERAÇÃO DE PRODUTO DESTINADO A FINS TERAPÊUTICOS OU MEDICINAIS. VENDA DE 4 (QUATRO) COMPRIMIDOS CYTOTEC POR PROPRIETÁRIO DE FARMÁCIA (ART. 273, §1-B, INCS. I E V, DO CP). INCONSTITUCIONALIDADE DO PRECEITO SECUNDÁRIO PREVISTO NO ART. 273, § 1º-B, V, DO CÓDIGO PENAL DECLARADA NO JULGAMENTO DA AI NO HC N. 239.363/PR (ART. 273, §1-B, V, DO CÓDIGO PENAL). DESPROPORCIONALIDADE DOS DEMAIS INCISOS. POSSIBILIDADE DE APLICAÇÃO DA CAUSA DE DIMINUIÇÃO DO ART. 33, § 4º, DA LEI N. 11.343/06. PRECEDENTES.

1. No julgamento da AI no HC n. 239.363/PR, o Relator afirmou ser necessário conferir à decisão caráter manipulativo de efeitos substitutivos, a fim de dar à norma interpretação conforme a Constituição Federal, promovendo, assim, seu ajuste principiológico. Declarou-se a inconstitucionalidade do preceito secundário (art. 273, § 1-B, V, do CP), substituindo-o pela pena prevista no art. 33 da Lei de Drogas, "com possibilidade até de incidência do respectivo § 4º".

2. Não obstante a AI no HC n. 239.363/PR tenha se referido apenas ao inc. V do art. 273, § 1º-B, do Código Penal, os demais incisos do referido dispositivo legal padecem da mesma desproporcionalidade entre a conduta e a pena.

3. No caso, o agravante, no interior da farmácia de sua propriedade, vendeu para um cliente o medicamente abortivo Cytotec (4 comprimidos), sem o devido registro no órgão de vigilância sanitária e, por conseguinte, de procedência ignorada, restando condenado por infração ao art. 273, § 1º-B, incs. I e V, do Código Penal.

4. Conforme afirmei à oportunidade do julgamento do HC n. 274098/MG, em 9/5/2017, entendo não haver óbice à aplicação do referido precedente da Corte Especial, no caso dos autos, afastando-se, assim, o preceito secundário do art. 273, § 1º-B, do Código Penal, com a incidência, inclusive, da causa de diminuição prevista no art. 33, § 4º, da Lei n. 11.343/06.

5. Agravo regimental provido.

(AgRg no REsp 1602268/DF, Rel. Ministro REYNALDO SOARES DA FONSECA, QUINTA TURMA, julgado em 19/09/2017, DJe 27/09/2017) (g.n.)


RECURSO ESPECIAL. PENAL. ART. 273, § 1-B, DO CP. DECLARAÇÃO DE INCONSTITUCIONALIDADE. PENA DO CRIME DE TRÁFICO DE DROGAS. MINORANTE DO ART. 33, § 4º, DA LEI N. 11.343/2006. PREENCHIMENTO DOS REQUISITOS. APLICAÇÃO. POSSIBILIDADE.

1. Com a declaração de inconstitucionalidade do preceito secundário do art. 273, § 1º-B, do Código Penal, segundo o entendimento jurisprudencial desta Corte Superior, tornou-se possível aplicar aos crimes tipificados nesse artigo as penas previstas para o delito de tráfico de drogas, devido a semelhança entre as condutas, sendo, inclusive, cabível a concessão da minorante do art. 33, § 4º, da Lei n. 11.343/2006 nas hipótese em que o apenado preencha todos os requisitos legais.

2. Agravo regimental improvido.

(AgRg no REsp 1589074/PR, Rel. Ministro SEBASTIÃO REIS JÚNIOR, SEXTA TURMA, julgado em 21/06/2016, DJe 01/07/2016)


AGRAVO REGIMENTAL NO HABEAS CORPUS. INDEFERIMENTO LIMINAR DO WRIT. ART. 210 DO RISTJ. AUSÊNCIA MANIFESTA DE QUALQUER CONSTRANGIMENTO ILEGAL. ART. 273, §§ 1º E 1º-B, I E V, DO CÓDIGO PENAL. IMPORTAR E TER EM DEPÓSITO, PARA VENDA, PRODUTO DESTINADO A FINS TERAPÊUTICOS OU MEDICINAIS SEM REGISTRO NO ÓRGÃO DE VIGILÂNCIA SANITÁRIA, FALSIFICADO E DE PROCEDÊNCIA IGNORADA. PRECEITO SECUNDÁRIO. OFENSA AO PRINCÍPIO DA PROPORCIONALIDADE. MINORANTE PREVISTA NO § 4º DO ART. 33 DA LEI N. 11.343/2006. APLICABILIDADE. ENTENDIMENTO DA CORTE ESPECIAL. PROGRESSÃO DE REGIME. CONFORMIDADE COM A LEI N. 8.072/1990. CRIME DE NATUREZA HEDIONDA. AGRAVO REGIMENTAL NÃO PROVIDO.

[...]

2. A jurisprudência do Superior Tribunal de Justiça, a partir do julgamento da Arguição de Inconstitucionalidade no HC n. 239.363/PR por sua Corte Especial, reconheceu não apenas a desproporcionalidade do preceito secundário do delito previsto no art. 273, § 1º e § 1º-B, I e V, do Código Penal - imputado ao paciente -, a fim de admitir a aplicação da reprimenda prevista no art. 33, caput, da Lei n. 11.343/2006 para o crime em comento, como também a possibilidade de incidência do respectivo § 4º, quando for o caso.

3. Não há, porém, nenhuma ilegalidade manifesta no indeferimento da referida benesse quando, apesar de o paciente não registrar outros antecedentes criminais e ser pequena a quantidade de cada produto importado e mantido em depósito, para venda, sem autorização do órgão de vigilância sanitária competente (Anvisa), falsificado ou de origem desconhecida, a sua variedade e as próprias circunstâncias em que foram encontrados denotam a não eventualidade da prática criminosa.

[...]

(AgInt no HC 355.217/SP, Rel. Ministro ROGERIO SCHIETTI CRUZ, SEXTA TURMA, julgado em 24/05/2016, DJe 06/06/2016) (g.n.)


O Supremo Tribunal Federal reconheceu a repercussão geral da matéria no Recurso Extraordinário nº 979962/RS, ainda pendente de julgamento, mas a Corte já vem decidindo neste sentido, conforme se verifica no seguinte julgado:

Agravo regimental no recurso extraordinário. 2. Alegação de inconstitucionalidade do artigo 273, § 1º-B, do Código Penal. Tese infundada. 3. As penas cominadas ao delito do artigo 273, §1º-B, do Código Penal devem ser substituídas por aquelas previstas no artigo 33 da Lei de Drogas, mantida a constitucionalidade do preceito primário daquele tipo. 4. Agravo desprovido.(RE 1105421 AgR, Relator(a):  Min. GILMAR MENDES, Segunda Turma, julgado em 08/02/2019, ACÓRDÃO ELETRÔNICO DJe-036 DIVULG 21-02-2019 PUBLIC 22-02-2019) (g.n.)


O magistrado a quo reconheceu a inconstitucionalidade do preceito secundário do artigo 273 do Código Penal, aplicando o preceito secundário do artigo 33, caput, da Lei nº 11.343/2006, inclusive a causa de diminuição prevista no § 4º. Conforme exposto, tal entendimento está em consonância com o entendimento atual dos tribunais superiores, e também com o desta Corte, pelo que resta mantido.


Da Materialidade


Cuida-se de crime formal, já que prescinde da efetiva ocorrência do dano a alguém. O objeto material do crime é o produto destinado a fins terapêuticos ou medicinais. Por sua vez, o objeto jurídico é a saúde pública.

A materialidade foi demonstrada pelo Boletim de Ocorrência nº 4872/2008, elaborado pela Polícia Civil de Jaú/SP (fls. 04/05), pelo Auto de Exibição e Apreensão (fls. 06/07) e pelo Laudo de Exame em Produtos Farmacêuticos nº 5747/2008-NUCRIM/SETEC/SR/DPF/SP (fls. 27/35).

Com efeito, referidos documentos registram a apreensão de 800 (oitocentas) unidades de comprimidos Pramil Sildenafil, 50 mg, 140 (cento e quarenta) unidades de comprimidos Pramil Sildenafil, 75 mg, além de 54 (cinquenta e quatro) embalagens dos medicamentos.

O laudo pericial registra que os produtos analisados foram fabricados pela empresa "LA QUIMICA FARMACEUTICA S.A.", de Assunção, no Paraguai. Os peritos consignaram que os comprimidos apresentam como princípio ativo a Sildenafila, e que são proibidas a importação e comercialização dos mesmos, porquanto não registrados na Agência Nacional de Vigilância Sanitária, tornando inconteste a materialidade delitiva.


Da Autoria e do Dolo


A autoria restou comprovada pelo Boletim de Ocorrência nº 4872/2008, elaborado pela Polícia Civil do Estado de São Paulo (fls. 04/05), corroborado pelas demais provas amealhadas em juízo.

O dolo, por sua vez, foi evidenciado tanto pelas circunstâncias em que os medicamentos foram apreendidos como pela prova oral produzida.

O depoimento do policial militar rodoviário Marcelo Navarro Camechi em sede investigativa exprime que abordaram, em averiguação rotineira, um ônibus da empresa Garcia, de placas AKC-4437, de Londrina/PR, e notaram embaixo da poltrona 35, onde estava sentado Orlando Donizeti da Silva, uma bolsa sem etiqueta, dentro da qual havia várias cartelas do medicamento Pramil (fl. 36).

A ficha individual de identificação do passageiro foi juntada à fl. 08, provando que o réu adquiriu o bilhete de passagem nº 58582, poltrona nº 35, saindo de Foz do Iguaçu/PR com destino a Ribeirão Preto/SP.

O policial militar rodoviário Ovídio de Almeida Júnior, por sua vez, acrescentou em seu depoimento que Orlando assumiu a posse dos medicamentos e afirmou que a finalidade seria a venda dos mesmos (fl. 37). O policial Luiz Antonio Moreira detalhou que o réu respondeu ter adquirido os medicamentos em Ciudade del Este, no Paraguai, com o objetivo de revendê-los em sua cidade (fl. 38).

No mesmo sentido foram os depoimentos das testemunhas policiais em juízo, quando relataram as circunstâncias da apreensão dos medicamentos na bagagem do réu. Ovídio de Almeida Júnior explicou que era realizada fiscalização rotineira nos veículos, principalmente em ônibus que saíram de região fronteiriça. Luiz Antonio Moreira reiterou que o réu admitiu a propriedade da bagagem e afirmou ter comprado os medicamentos em Ciudad del Este. Indicou que o réu não aparentava nervosismo e nem apresentava confusão mental, detalhando, inclusive, ter comprado cada cartela por cerca de três ou quatro reais, para revender cada comprido a cinco reais em sua cidade (mídia de fl. 462).

Como se vê, o depoimento das testemunhas policiais é coeso, e coerente com o restante do conjunto probatório produzido, tornando patente que o réu perpetrou a conduta de importar produtos sem registro no órgão de vigilância sanitária competente, ciente de que praticava conduta criminosa, à qual aderiu de forma livre e consciente, tornando induvidosos a autoria delitiva e o dolo.

Em razão da subsunção de sua conduta ao artigo 273, §§ 1º e 1º-B, inciso I, do Código Penal, mantenho a condenação e passo à dosimetria.


Da Dosimetria da Pena


Destaco que a dosimetria da pena para os crimes do art. 273 do Código Penal deve levar em conta as sanções abstratamente previstas para o crime previsto no art. 33 da Lei 11.343/2006, e não apenas a aplicação restrita de seu preceito secundário. Isso porque não se pode, a partir de novo amoldamento da conduta (ao menos para fins sancionatórios, como parece ser a ratio da decisão superior), buscar a aplicação apenas das disposições jurídicas convenientes a uma das partes, mas sim de todo o conjunto de normas atinente ao quadro fático examinado em um caso concreto.

Assim, amoldando-se a conduta ao art. 33 da Lei 11.343/06, não se tem apenas a aplicação de uma disposição normativa específica, mas de todas as normas penais pertinentes a esse enquadramento jurídico. Interpretação outra implicaria verdadeira negativa de vigência a todas as demais disposições legais pertinentes (como as constantes do art. 40 e do art. 33, § 4º, da Lei 11.343.06), as quais, assumido o enquadramento inicial da conduta como amoldada ao art. 33, caput, da Lei 11.343/06, passam a ser em tese aplicáveis ao caso (se preenchidos os demais requisitos fáticos previstos nesses mesmos enunciados normativos).

Na primeira fase da dosimetria, a pena-base foi exasperada para seis anos de reclusão e seiscentos dias-multa, em razão da valoração negativa das circunstâncias e consequências do crime, analisadas conforme o artigo 42 da Lei nº 11.343/06, sob a seguinte fundamentação:

"As circunstâncias de tempo, lugar, meio e modo de execução em que se desenvolveram a ação delituosa revelam que o acusado importou e transportou, com o fim de entregar ao consumo a quantidade de 940 (novecentos e quarenta) comprimidos "Pramil Sildenafil". Com efeito, levando em conta a natureza do fármaco (princípio ativo SILDENAFIL ou SILDENAFILA) e a quantidade importada fraudulentamente, devem ser valoradas negativamente essas circunstâncias judiciais" (fl. 485).

Três parágrafos depois, afirmou-se que:

"Levando em consideração o disposto no art. 42 da Lei 11.343/06, a natureza, a quantidade dos medicamentos, a personalidade e a conduta social do agente devem preponderar sobre as demais circunstâncias judiciais previstas no art. 59 do CP, motivo pelo qual, no caso em exame, a pena-base deve ser fixada no mínimo legal.

À vista dessas circunstâncias analisadas individualmente, fixo a pena-base em 6 (seis) anos de reclusão e ao pagamento de 600 (seiscentos) dias-multa" (fl. 485).

A defesa requer que a pena seja fixada no mínimo legal, que corresponde a 5 (cinco) anos de reclusão e 500 (quinhentos) dias-multa. Constata-se, contudo, a ocorrência de mero erro material na sentença, ao afirmar que "a pena-base deve ser fixada no mínimo legal", uma vez que o raciocínio exposto pelo juiz antes e depois de referido trecho é no sentido de valorar negativamente as circunstâncias e consequências do crime, resultando na exasperação da pena-base para 6 (seis) anos de reclusão e 600 (seiscentos) dias-multa.

Perfilho do entendimento de que a significativa quantidade de medicamentos importados irregularmente requer maior censura, uma vez que foram quase mil comprimidos importados ilicitamente - 940 (novecentos e quarenta) unidades - demonstrando circunstâncias que extrapolam o ordinário.

Por outro lado, a natureza do fármaco, utilizado contra impotência sexual, não tem gravidade extraordinária que enseje reprovação exacerbada, pelo que não se revela possível a majoração da pena nesse aspecto.

Além disso, o magistrado a quo exasperou a pena pelas consequências do crime, utilizando-se dos mesmos fundamentos da valoração negativa das circunstâncias do crime. As consequências do crime devem ser valoradas negativamente quando os efeitos causados pela infração penal transcenderem a normalidade, o que não se verifica no caso dos autos, em que houve apreensão dos fármacos, e considerando-se que a quantidade já foi utilizada para justificar a exasperação das circunstâncias do crime.

Posto isso, afasto a valoração negativa das consequências do crime, e mantenho a exasperação da pena em razão da significativa quantidade de medicamentos, a título de circunstâncias do crime, fixando a pena-base em 5 (cinco) anos e 6 (seis) meses de reclusão, e 550 (quinhentos e cinquenta) dias-multa.

Na segunda fase da dosimetria, a pena permaneceu inalterada, o que resta mantido, eis que ausentes circunstâncias agravantes e atenuantes.

Por derradeiro, na terceira fase da dosimetria, não incide a causa de aumento prevista no art. 40, I, da Lei 11.343/06 já que a conduta imputada ao réu é a de importar, que pressupõe a transnacionalidade. Mantenho o reconhecimento da minorante prevista no § 4º do artigo 33 da Lei nº. 11.343/06. A defesa requer a exasperação do patamar de aplicação da minorante para 2/3 (dois terços), o que merece prosperar, tendo em vista que as condenações sofridas pelo réu ocorreram décadas atrás, e que não há indícios que apontem o réu se dedicar a atividades criminosas ou integrar organização criminosa. Assim, a pena resta definitivamente fixada em 1 (um) ano e 10 (dez) meses de reclusão, e 183 (cento e oitenta e três) dias-multa.

Mantido o valor unitário do dia-multa em 1/30 (um trigésimo) do salário mínimo vigente ao tempo dos fatos.


Do regime inicial de cumprimento da pena


Tendo em vista o quantum da pena, resta mantido o regime inicial aberto para o cumprimento da pena, nos termos do artigo 33, §2º, alínea "c", do Código Penal.


Da substituição da pena privativa de liberdade por restritiva de direitos


Com fundamento no artigo 44, §2º, do Código Penal, o juiz sentenciante determinou a substituição da pena privativa de liberdade por duas penas restritivas de direitos, consistentes em prestação de serviços à comunidade ou a entidade pública, a ser determinado pelo juízo de execução, e prestação pecuniária, no valor de 10 (dez) salários mínimos, a ser destinada a entidade pública ou privada com destinação social.

A pena pecuniária substitutiva da pena privativa de liberdade deve ser fixada de maneira a garantir a proporcionalidade entre a reprimenda substituída e as condições econômicas do condenado, além do dano a ser reparado. Assim, atento a tais parâmetros, e à míngua de informações acerca da condição socioeconômica do réu, reduzo, de ofício, a pena pecuniária para 01 (um) salário mínimo.


Ante o exposto, DOU PARCIAL PROVIMENTO ao recurso defensivo, para aplicar a minorante prevista no § 4º do artigo 33 da Lei nº 11.343/06 no patamar de 2/3 (dois terços), DE OFÍCIO, afasto a valoração negativa das consequências do crime, resultando em pena definitiva de 1 (um) ano e 10 (dez) meses de reclusão, e 183 (cento e oitenta e três) dias-multa, e reduzo a pena de prestação pecuniária para um salário mínimo.


É o voto.




JOSÉ LUNARDELLI
Desembargador Federal


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