Diário Eletrônico

PODER JUDICIÁRIO

TRIBUNAL REGIONAL FEDERAL DA 3ª REGIÃO

D.E.

Publicado em 17/04/2020
APELAÇÃO CRIMINAL Nº 0002091-55.2016.4.03.6120/SP
2016.61.20.002091-0/SP
RELATOR : Desembargador Federal JOSÉ LUNARDELLI
APELANTE : Justica Publica
APELANTE : MARIA CONCEICAO DE ANUNZIO
ADVOGADO : SP152874 BIANCA CAVICHIONI DE OLIVEIRA e outro(a)
APELADO(A) : Justica Publica
APELADO(A) : EDUARDO ESCOBAR
ADVOGADO : SP368404 VANESSA GONÇALVES JOÃO
APELADO(A) : MARIA CONCEICAO DE ANNUNZIO
ADVOGADO : SP152874 BIANCA CAVICHIONI DE OLIVEIRA
No. ORIG. : 00020915520164036120 1 Vr ARARAQUARA/SP

EMENTA

APELAÇÃO CRIMINAL. ART. 171, §3º DO CP. DECLARAÇÃO IDEOLOGICAMENTE FALSA VISANDO À CONCESSÃO INDEVIDA DE BENEFÍCIO ASSISTENCIAL. PRESCRIÇÃO RECONHECIDA, DE OFÍCIO, APENAS EM RELAÇÃO A UM ACUSADO. CONDENAÇÃO MANTIDA. DOSIMETRIA. MAUS ANTECEDENTES. IMPOSSIBILIDADE DE FIXAÇÃO DE VALOR MÍNIMO PARA REPARAÇÃO DOS DANOS CAUSADOS PELA INFRAÇÃO.
O Ministério Público Federal interpôs recurso em face da sentença objetivando o agravamento da reprimenda imposta à acusada, razão pela qual a prescrição regula-se pela pena máxima em abstrato. Reconhecimento, de ofício, da prescrição da pretensão punitiva em relação ao réu.
Conjunto probatório que, de forma segura, demonstra que a apelante, conscientemente e voluntariamente, obteve vantagem ilícita, induzindo a autarquia previdenciária em erro, mediante a utilização de meio fraudulento consistente na prestação de declaração ideologicamente falsa.
Requerimento instruído com declarações de que o pretenso beneficiário era separado de fato do seu cônjuge. Informação falsa quanto ao núcleo familiar, tudo de forma a simular o preenchimento dos requisitos para a concessão do benefício assistencial.
Maus antecedentes. A ré foi definitivamente condenada nos autos da ação penal nº 0009533-77.2013.403.6120 pela prática do crime do art. 171, §3º do CP, praticado em 26/04/2007 (portanto, anterior ao fato objeto do presente feito).
Por ocasião do oferecimento da denúncia já existia a previsão legal do art. 387, IV, do Código de Processo Penal, introduzido no ordenamento jurídico pela Lei nº 11.719, de 20.06.2008. Todavia, não houve pedido do Ministério Público Federal na inicial para a aferição desses valores e, consequentemente, manifestação da defesa no curso da ação penal acerca do tema.
Concessão da justiça gratuita à apelante.
Apelação da defesa parcialmente provida. Apelação ministerial parcialmente provida. Reconhecimento, de ofício, da prescrição da pretensão punitiva.

ACÓRDÃO

Vistos e relatados estes autos em que são partes as acima indicadas, decide a Egrégia Décima Primeira Turma do Tribunal Regional Federal da 3ª Região, por unanimidade, dar parcial provimento à apelação interposta pela defesa para conceder a justiça gratuita; dar parcial provimento à apelação do Ministério Público Federal para exasperar a pena-base em face dos maus antecedentes, restando a pena definitivamente fixada em 2 anos, 2 meses e 20 dias de reclusão, em regime inicial aberto, e 21 dias-multa e, de ofício, declarar extinta a punibilidade de Eduardo Escobar em relação ao crime do art. 171, §3º do CP praticado até julho/2008 pela ocorrência da prescrição da pretensão punitiva, com fundamento nos arts. 107, IV; 109, V; 110 (com redação vigente ao tempo do fato) e 115, todos do CP, nos termos do relatório e voto que ficam fazendo parte integrante do presente julgado.


São Paulo, 12 de março de 2020.
JOSÉ LUNARDELLI
Desembargador Federal


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APELAÇÃO CRIMINAL Nº 0002091-55.2016.4.03.6120/SP
2016.61.20.002091-0/SP
RELATOR : Desembargador Federal JOSÉ LUNARDELLI
APELANTE : Justica Publica
APELANTE : MARIA CONCEICAO DE ANUNZIO
ADVOGADO : SP152874 BIANCA CAVICHIONI DE OLIVEIRA e outro(a)
APELADO(A) : Justica Publica
APELADO(A) : EDUARDO ESCOBAR
ADVOGADO : SP368404 VANESSA GONÇALVES JOÃO
APELADO(A) : MARIA CONCEICAO DE ANNUNZIO
ADVOGADO : SP152874 BIANCA CAVICHIONI DE OLIVEIRA
No. ORIG. : 00020915520164036120 1 Vr ARARAQUARA/SP

RELATÓRIO

O EXCELENTÍSSIMO SENHOR DESEMBARGADOR FEDERAL JOSÉ LUNARDELLI
Trata-se de apelação criminal interposta pelo MINISTÉRIO PÚBLICO FEDERAL e por MARIA CONCEIÇÃO DE ANNUNZIO em face da sentença proferida pelo Juízo da 1ª Vara Federal de Araraquara/SP, que condenou os réus pela prática do crime previsto no art. 171, §3º do CP.
Narra a denúncia (fls. 94/95):

"Segundo consta do incluso inquérito policial, o denunciado Eduardo Escobar, em comunhão de propósitos com a também denunciada MARIA CONCEIÇÃO DE ANNUNZIO, entre 19 de fevereiro de 2008 e 31 de julho de 2008, obteve para si vantagem indevida no valor de R$4.300,63, em prejuízo do Instituto Nacional do Seguro Social, induzindo a autarquia previdenciária em erro, e assim a mantendo, ao informa-la de inverídica separação de fato de sua mulher, Áurea Sancehs Escobar, com o objetivo de excluir seus ganhos do cálculo da renda per capita familiar e alcançar, com isso, benefício de amparo social ao idoso (NB 88/526.644.924-8), que recebera mensalmente no período acima mencionado.
Segundo se apurou, Maria Conceição de Annunzio atuava na intermediação de pedidos de benefícios previdenciários/assistenciais na agência do INSS em Matão/SP, na condição de 'procuradora' dos pretensos beneficiários. Foi assim que, em dezembro de 2007, providenciou o requerimento do benefício de prestação continuada (ao idoso) a Eduardo Escobar (fls. 05/07), tendo, antes, elaborado a falsa declaração de separação de fato que foi assinada pelo citado requerente (fl. 14), com o intuito de escamotear a renda percebida pela esposa (f. 28).
O pedido de benefício fraudulento foi apresentado por Maria Conceição em 20/12/2007 e Eduardo Escobar, de sua vez, ciente da inverdade da declaração, uma vez concedido o benefício, passou a recebe-lo, tendo-o feito entre fevereiro e julho de 2008, quando houve o óbito de sua esposa, cujos rendimentos, desde então, deixou de compor a renda familiar.
Apurou-se, ainda, que entre setembro de 2013 e setembro de 2014 o denunciado Eduardo Escobar obteve para si vantagem indevida no valor de R$6.544,27, em prejuízo do INSS, outra vez induzindo a autarquia previdenciária em erro, e assim a mantendo, ao omitir o fato de estar vivendo em união estável com Sirlene Aparecida Camargo Mello, informando a inverídica condição de residir sozinho (fl. 35), quando já compusera novo grupo familiar. Pesquisa junto ao CNIS constou que Sirlene Aparecida Camargo Mello obteve remuneração - que, portanto, deveria compor a renda familiar - pelo menos entre setembro de 2013 e fevereiro de 2014, quando trabalhou para a empresa Cambuhy Agrícola Ltda e, entre julho de 2014 e setembro do mesmo ano, quando trabalhou para a empresa Louis Dreyfus Commoditie Agroindustrial S.A.
[...] Assim agindo, Eduardo Escobar e Maria Conceição de Annunzio praticaram a conduta tipificada pelo art. 171, §3º do CP, em continuidade delitiva".
A denúncia foi recebida em 10/03/2016 (fls. 96/98).
Após regular instrução, sobreveio a sentença de fls. 515/524v, publicada em 05/04/2019, por meio da qual o Juízo da 1ª Vara Federal de Araraquara/SP:
i) condenou EDUARDO ESCOBAR pela prática do crime do art. 171, §3º do CP, à pena de 1 ano e 4 meses de reclusão, em regime inicial aberto, e ao pagamento de 30 dias multa no valor unitário equivalente a 1/30 do salário mínimo vigente em julho de 2008. A pena privativa de liberdade foi substituída por duas restritivas de direitos, consistentes em prestação pecuniária no valor de 01 salário mínimo em favor de entidade assistencial a ser indicada pelo Juízo das Execuções Penais e limitação de fim de semana, pelo mesmo tempo da condenação;
ii) condenou MARIA CONCEIÇÃO DE ANNUNZIO pela prática do crime previsto no art. 171, §3º do CP, à pena de 02 anos de reclusão, em regime inicial aberto, e 20 dias multa, no valor unitário de 1/30 do salário mínimo vigente em fevereiro/2008. A pena privativa de liberdade foi substituída por duas restritivas de direitos consistentes em prestação de serviços à comunidade e prestação pecuniária no valor de 05 salários mínimos em favor de entidade assistencial a ser estabelecida pelo Juízo das Execuções;
c) absolveu os réus Maria Conceição de Annunzio e Eduardo Escobar da imputação de estelionato referente ao benefício de amparo assistencial pago entre setembro de 2013 e setembro de 2014, com fundamento no art. 386, V do CPP e no art. 386, VII do CPP, respectivamente.
O Ministério Público Federal interpôs apelação (fl. 528). Em suas razões recursais pede a majoração da pena imposta à acusada Maria Conceição em razão das consequências do crime, conduta social, personalidade e maus antecedentes; aplicação das circunstâncias agravantes previstas no art. 61, II, "g" e art. 62, I, ambos do CP; aumento da quantidade de dias multa, para que seja fixada proporcionalmente à pena privativa de liberdade; fixação de valor mínimo para reparação dos danos (fls. 528v/534).
Contrarrazões apresentadas pela defesa de Maria Conceição (fls. 564/571) pelo desprovimento do recurso. A defesa pede, ainda, a absolvição da ré e reconhecimento da prescrição da pretensão punitiva.
Contrarrazões apresentadas pela defesa de Eduardo Escobar pelo não acolhimento da apelação (fls. 584/591).
A sentença de fls. 554/554v rejeitou os embargos de declaração opostos por Maria Conceição (fls. 536/541).
Apelação interposta pela defesa de Maria Conceição, à fl. 572. Em suas razões recursais, pede a absolvição por ausência de dolo. Alega que a acusada apenas atuou como procuradora do corréu Eduardo, que lhe entregou os documentos necessários ao requerimento do benefício e declarou a composição da renda familiar. Acrescenta que, na qualidade de procuradora, a apelante não tinha o poder de conferir a autenticidade das informações que lhe fora repassada por Eduardo Escobar. Argumenta que o benefício foi restabelecido judicialmente. Pede, ainda, o reconhecimento da prescrição da pretensão punitiva e a concessão dos benefícios da justiça gratuita (fls. 573/583).

Contrarrazões apresentadas pelo Ministério Público Federal, às fls. 613/617v, pelo desprovimento do recurso.

Em parecer, a Procuradoria Regional da República opinou pelo parcial provimento da apelação interposta pelo órgão acusatório a fim de exasperar a pena-base em das consequências do crime e fixar valor mínimo para reparação dos danos causados pela infração penal. Opinou, ainda, pelo parcial provimento do recurso da defesa apenas no tocante ao pedido de concessão de justiça gratuita (fls. 619/623v).

É o relatório.

À revisão.


JOSÉ LUNARDELLI
Desembargador Federal


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APELAÇÃO CRIMINAL Nº 0002091-55.2016.4.03.6120/SP
2016.61.20.002091-0/SP
RELATOR : Desembargador Federal JOSÉ LUNARDELLI
APELANTE : Justica Publica
APELANTE : MARIA CONCEICAO DE ANUNZIO
ADVOGADO : SP152874 BIANCA CAVICHIONI DE OLIVEIRA e outro(a)
APELADO(A) : Justica Publica
APELADO(A) : EDUARDO ESCOBAR
ADVOGADO : SP368404 VANESSA GONÇALVES JOÃO
APELADO(A) : MARIA CONCEICAO DE ANNUNZIO
ADVOGADO : SP152874 BIANCA CAVICHIONI DE OLIVEIRA
No. ORIG. : 00020915520164036120 1 Vr ARARAQUARA/SP

VOTO

O EXCELENTÍSSIMO SENHOR DESEMBARGADOR FEDERAL JOSÉ LUNARDELLI

Presentes os requisitos de admissibilidade, conheço dos recursos interpostos pelo Ministério Público Federal e por Maria Conceição de Annunzio.

Da prescrição

O crime de estelionato previdenciário possui natureza binária, razão pela qual, conforme entendimento consolidado pelos Tribunais Superiores, a natureza do delito depende da condição do agente que o pratica.

Será crime permanente quando praticado pelo próprio beneficiário da previdência social, e nesse caso, o prazo prescricional começará a fluir a partir da cessação da permanência, ou seja, com a supressão do recebimento indevido.

Por sua vez, quando praticado por funcionários da Previdência Social ou por terceiros não beneficiários, será crime instantâneo, hipótese em que o termo inicial da prescrição será a data do início do pagamento do benefício fraudulento (STJ. RESP 201200348686. Marco Aurélio Bellizze. Quinta Turma. DJE Data:10/06/2013) (AGRESP 200900419822, ROGERIO SCHIETTI CRUZ, STJ - SEXTA TURMA, DJE DATA:06/04/2015 ..DTPB).

Fixadas tais premissas, passo a examinar a alegação de prescrição suscitada pela defesa de Maria Conceição de Annunzio.

O Ministério Público Federal interpôs recurso em face da sentença objetivando o agravamento da reprimenda imposta à acusada Maria Conceição.

É sabido que a prescrição somente é regulada pela pena aplicada na sentença depois do trânsito em julgado da sentença condenatória para a acusação ou depois de improvido seu recurso (art. 110 §1º do Código Penal), situação que não se verifica no caso concreto.

A interposição de recurso de apelação pelo Ministério Público Federal visando ao aumento da pena da ré conduz à fixação do prazo prescricional segundo a pena máxima abstrata. Dito isso, nos termos do art. 109, III, do Código Penal, o prazo prescricional é de 12 (doze) anos. In casu, não decorreu prazo superior a 12 (doze) anos entre a data do fato (20/12/2007) e o recebimento da denúncia (10/03/2016), tampouco entre o recebimento da denúncia e a publicação da sentença condenatória (05/04/2019).

Ademais, o instituto da prescrição antecipada, em perspectiva ou "virtual" não encontra amparo no ordenamento jurídico nacional e, derivado de criação doutrinária, há muito foi rechaçado pela jurisprudência, inclusive do E. Supremo Tribunal Federal:


"HABEAS CORPUS. AÇÃO PENAL. PRESCRIÇÃO ANTECIPADA, PELA PENA EM PERSPECTIVA. INADMISSIBILIDADE. PRECEDENTES.
(...) O Supremo Tribunal Federal tem repelido o instituto da prescrição antecipada"
(HC 82155/SP, Relatora Min. Ellen Gracie, DJ 07.03.2003, p.281).

Assim, afasto o pedido de reconhecimento da prescrição da pretensão punitiva formulado pela defesa de Maria Conceição de Annunzio.
Por outro lado, verifico que a pretensão punitiva estatal em relação ao corréu Eduardo Escobar está fulminada pela prescrição.
Eduardo Escobar foi condenado pela prática do crime do art. 171, §3º do CP, à pena de 1 ano e 4 meses de reclusão, em razão da percepção indevida do benefício de prestação continuada entre 19 de fevereiro de 2008 e 31 de julho de 2008.
O Ministério Público Federal interpôs apelação objetivando a exasperação da pena imposta à acusada Maria Conceição e a fixação de valor mínimo para reparação dos danos causados pela infração, em relação a ambos os réus. Em que pese a interposição de recurso pelo órgão acusatório, não existe a possibilidade de agravamento da pena imposta ao acusado Eduardo Escobar, de modo que a prescrição deve ser analisada com base na pena concretamente aplicada ao réu (1 ano e 4 meses, que prescreve em 4 anos conforme art. 109, V do CP).
Eduardo Escobar, nascido em 26/12/1938, era maior de 70 anos na data da sentença, razão pela qual o prazo prescricional deve ser reduzido de metade (art. 115, CP).
Entre a data da a supressão do recebimento indevido do benefício assistencial (31/07/2008) e o recebimento da denúncia (10/03/2016) decorreu prazo superior a 2 anos, impondo-se, de ofício, a extinção da punibilidade de Eduardo Escobar com fundamento nos arts. 107, IV; 109, V; 110 (com redação vigente ao tempo do fato) e 115, todos do CP.
Materialidade, autoria e dolo
A materialidade restou demonstrada através dos seguintes elementos: Requerimento de benefício BPC em nome de Eduardo Escobar (fl. 05); procuração concedida à ré MARIA CONCEIÇÃO ANNUNZIO (fl. 07); declaração sobre a composição do grupo e renda familiar, segundo a qual Eduardo reside com o irmão e não possui rendimentos mensais (fls. 09/11), assinada pela ré MARIA CONCEIÇÃO; certidão de casamento de Eduardo Escobar e Aurea Sanches Gonçalves (fl. 13); declaração de separação de fato datada de 20/12/2007, assinada por Eduardo Escobar (fl. 14); demonstrativo de benefícios recebidos por Áurea Sanches Escobar, esposa de Eduardo Escobar, até 07/2008 (fl. 28); relatório de pesquisa feita por servidor da Autarquia para verificação da residência e situação familiar da requerente do benefício (fls. 38/38v); relação de cálculos dos valores recebidos indevidamente (fl. 42); ofício 21.022.050/125/2015APS MATAO/SP, concluindo pela irregularidade na concessão do benefício (fl. 56).
As provas amealhadas aos autos demonstram que a ré MARIA CONCEIÇÃO ANNUNZIO foi contratada por Eduardo Escobar para requerer o benefício assistencial. Eduardo, contudo, nunca esteve separado de fato de sua esposa Áurea Sanches Escobar (falecida em 10/07/2008), que auferia rendimentos mensais. As informações falsas acerca do núcleo e da renda familiar de Eduardo levaram à concessão indevida do benefício e causaram o prejuízo de R$ 2.975,00 à autarquia previdenciária. O benefício foi pago de 19/02/2008 a 31/07/2008 (NB 88/526.644.924-8).
A possibilidade de verificação, por parte do INSS, das informações prestadas pelos requerentes de LOAS - por exemplo, através de pesquisas in loco- não eximem os requerentes da obrigação de prestar informações verdadeiras. Na presente hipótese, as declarações falsas que instruíram o requerimento administrativo do benefício foram aptas a ludibriar a autarquia previdenciária, ensejando a concessão de vantagem indevida, restando configurada a conduta típica.
Comprovada, portanto, a materialidade do delito previsto no art. 171, §3º do Código Penal.
A autoria e o dolo também restaram sobejamente demonstrados.
MARIA CONCEIÇÃO DE ANNUNZIO atuou como procuradora de Eduardo Escobar junto ao INSS no processo de concessão do benefício assistencial de amparo ao idoso.
Ao ser interrogada pela autoridade policial no bojo do presente inquérito policial, MARIA CONCEIÇÃO afirmou que Eduardo Escobar morava sozinho. Disse que, atualmente (na data do interrogatório), ele convive com uma pessoa que tem uma filha de 10 anos. Não sabia que ele trabalhava como pedreiro. Afirmou que não orientou seus clientes a prestarem falsas declarações no tocante ao estado civil, renda familiar ou endereço. Os requerentes estavam sempre acompanhados de algum parente. Foi enganada por essas pessoas, que, em muitos casos, já lhe entregaram as declarações preenchidas. Informou seus clientes acerca da obrigatoriedade de prestar informações verdadeiras (mídia à fl. 71).
Na fase investigativa, Eduardo Escobar declarou que procurou Maria Conceição em razão de indicação de sua sobrinha. Sua sobrinha havia contratado Maria Conceição para obtenção de benefício em favor da mãe dela. Declarou que na época em que requereu o benefício, seu irmão morava na Rua Domingos Massedani. Disse que Maria Conceição informou endereço indevido em seu requerimento de benefício. Em relação à declaração de separação de fato, o réu afirmou que Maria Conceição foi a responsável por montar esse documento. Assinou os papéis a pedido de Maria Conceição, sem ver nada. Nunca se separou de sua falecida esposa, Aurea Sanches. Entregou os dois primeiros benefícios à Maria Conceição. Na época trabalhava como pedreiro, mas não recolhia contribuições previdenciárias. Não informou ao INSS a renda decorrente do trabalho como pedreiro porque não foi perguntado. Não sabe por que seu benefício foi cancelado.
Em juízo, foram ouvidas as testemunhas Mauro de Mello Coelho, Sirlene Aparecida Camargo Mello, Airton Escobar, Maria Lucia Pires Escobar, Vanderlei Serrenone, Jonas Batista (mídia à fl. 307), Dirceu Borghi Junior, Marina Cristina Mendes (mídia à fl. 360) e Luciana de Souza Rodrigues (mídia à fl. 387).
Mauro de Mello Coelho é funcionário do INSS. Não se recorda dos fatos descritos na denúncia. Declarou que Maria Conceição de Annunzio era funcionária da prefeitura e prestou serviços no INSS em Matão. Atualmente, Maria Conceição trabalha como procuradora junto ao INSS. Não tem conhecimento acerca de qualquer problema envolvendo Maria Conceição no período em que ela trabalhou no INSS.
Airton Escobar, Maria Lucia Pires Escobar, Jonas Batista e Sirlene Aparecida Camargo Mello declararam que o denunciado Eduardo Escobar nunca se separou de Áurea Sanches Escobar.
Dirceu Borghi Junior declarou que não se recorda dos fatos descritos na denúncia. É pesquisador do INSS. Trabalhou com Maria Conceição no INSS em Matão, entre 2000 e 2004. Maria era funcionária da prefeitura e prestou serviços no INSS. Já fez pesquisa em processos de concessão de LOAS em que Maria Conceição foi procuradora, sendo que nesses processos foram constatadas divergências em relação à composição do grupo familiar. Essas irregularidades também foram constatadas em outros processos envolvendo outros procuradores. Em muitos processos relativos a benefícios assistenciais em que Maria Conceição figurou como procuradora foram constatadas fraudes. Quando realiza pesquisa nos endereços, limita-se a buscar as informações acerca da composição do grupo familiar. Declarou que muitos benefícios foram cessados por fraude.
Luciana de Souza Rodrigues exerceu o cargo de técnico do INSS. Declarou que não conhece Eduardo Escobar. Conhece Maria Conceição. Não se recorda do processo de concessão do benefício assistencial a Eduardo Escobar. Trabalhou no INSS até 2011. Trabalhou com Maria na agência de INSS em Matão entre 2004 e 2007 ou 2006. Maria era funcionária cedida da prefeitura. Maria trabalhava com arquivo, perícia. Durante o período em que Maria trabalhou no INSS não houve qualquer problema. Depois da saída de Maria Conceição do INSS, ela passou a trabalhar como procuradora junto ao INSS. A testemunha trabalhava na concessão de benefícios. Para a concessão do LOAS, era necessário o preenchimento de declaração e apresentação de documentos. No ato da concessão, quando o requerente declarava sob as penas da lei que era separado de fato, o servidor realizava pesquisa nos sistemas a fim de verificar se o requerente era casado e se o cônjuge recebia remuneração. A pesquisa externa era realizada apenas em caso de fundada dúvida. Nas hipóteses em que o requerente se declarava separado de fato e informava endereço diverso do cônjuge, não era praxe a realização de pesquisa, e o benefício era concedido no ato.
O réu foi interrogado em juízo. É falsa a declaração prestada ao INSS de que esteve separado de fato de Áurea Sanches Escobar. Não se separou de sua esposa e nunca morou com seu irmão. Não passou o endereço de seu irmão a Maria Conceição. Assinou vários papéis a pedido de Maria Conceição, mas não os leu. Enquanto sua esposa era viva, nunca se separou dela. Não se recorda de entregar a certidão de casamento de seu irmão a Maria Conceição. Na época em que pediu o benefício, em 2007, trabalhava como pedreiro. Nesse período, sua esposa recebia benefício por doença. Há uns três anos, passou a viver com Sirlene. Soube que Maria Conceição trabalhava com concessão de aposentadoria. Maria Conceição lhe disse que ele iria se aposentar por idade. Nunca falou para Maria Conceição que era separado de fato. Não esteve no INSS com Maria. Tem um pouco de dificuldade para ler. Após a cessação de seu benefício, procurou Maria Conceição.
Em seu interrogatório judicial, MARIA CONCEIÇÃO reconheceu que atuou como procuradora no requerimento de beneficio assistencial em favor de Eduardo Escobar. Eduardo lhe procurou pleiteando aposentadoria. Eduardo não preenchia os requisitos e então lhe informou acerca do benefício assistencial. Nessa ocasião, Eduardo lhe disse que residia com o irmão, que era pedreiro e que não tinha condições de cuidar de sua esposa, que era cadeirante. Eduardo não era separado de sua esposa, mas não sabe com quem ela residia naquela época. Recebeu o equivalente a 2 salários. O INSS determinou a realização de pesquisa externa, mesmo constando endereços diversos (do requerente e do cônjuge). O benefício de Eduardo foi cessado. Parou de intermediar pedidos de benefício assistencial em razão das divergências apontadas durante as pesquisas externas. Quando do requerimento do LOAS, Eduardo lhe disse que não residia com a esposa e, portanto, (a ré) preencheu a declaração de separação de fato. Eduardo lhe entregou a certidão de casamento do irmão e o comprovante de endereço do local em que residia. Não se recorda se Eduardo compareceu ao INSS (mídia à fl. 387).
Está demonstrado que, na época em que requereu o benefício assistencial até a data de cessação do pagamento (dezembro/2007 a julho/2008) Eduardo não esteve separado de fato de sua esposa, Áurea Sanches Escobar. Aliás, de acordo com a prova testemunhal, até o falecimento de Áurea, o casal nunca se separou.
Ainda que se trate de pessoa idosa e com baixo grau de instrução, Eduardo foi categórico em afirmar que nunca rompeu a relação conjugal e que nunca residiu com seu irmão, ao contrário do que constou em seu requerimento de LOAS.
MARIA CONCEIÇÃO quer fazer crer que não tinha conhecimento de que Eduardo era casado e que foi enganado por ele. A tese de MARIA CONCEIÇÃO, no entanto, não merece prosperar.
Eduardo procurou MARIA CONCEIÇÃO em seu escritório profissional em busca da concessão de aposentadoria.
Não é crível que MARIA CONCEIÇÃO, que já havia trabalhado no INSS durante quatro anos e atuava como "despachante previdenciária", detentora de conhecimento acerca dos requisitos exigidos para a concessão do benefício de prestação continuada, tenha sido enganada pelo seu cliente, pessoa idosa, de parcos conhecimentos, que não sabia das exigências previstas na Lei nº 8.742/93 para a concessão do benefício assistencial. Eduardo, a princípio, acreditava que poderia fazer jus à aposentadoria e não ao amparo assistencial ao idoso.
Dito isso, não parece verossímil que Eduardo tivesse pleno conhecimento dos requisitos para a concessão do benefício assistencial e que, por conta própria, tenha fornecido à procuradora informações falsas, indispensáveis ao sucesso no requerimento do benefício. Caso assim fosse, Eduardo teria dispensado os serviços de MARIA CONCEIÇÃO, a quem pagou o equivalente a dois salários, e teria feito, sozinho, o requerimento perante o INSS.
Acrescento ainda que a testemunha Luciana de Souza Rodrigues, servidora do INSS ao tempo dos fatos, declarou em juízo que a realização de diligências para apurar o teor das declarações dos pretensos beneficiários era medida excepcional, apenas em caso de fundada dúvida.
Tal fato também indica que a ré, conhecedora dessa informação, sabia que dificilmente as declarações prestadas no momento do requerimento do benefício seriam checadas, o que corrobora o dolo em sua conduta.
As circunstâncias indicam que MARIA CONCEIÇÃO, detentora do conhecimento acerca dos requisitos exigidos na Lei 8.742/93 para a concessão do Benefício de Prestação Continuada e da excepcionalidade da pesquisa de campo promovida na agência do INSS, instruiu o requerimento do benefício de seu cliente Eduardo Escobar com informações inverídicas de modo a garantir o êxito do seu pleito, agindo, portanto, com o dolo necessário à tipificação do delito.
Em outras palavras, as provas dos autos demonstram, de maneira inequívoca, a vontade e consciência da denunciada MARIA CONCEIÇÃO em prestar informações falsas no requerimento de benefício de prestação continuada, obtendo, desse modo, vantagem indevida para si e para Eduardo.
Aliás, o restabelecimento do benefício de prestação continuada pelo Poder Judiciário não afasta a configuração do delito. Na decisão proferida em 09/08/2016 pelo Juízo da 2ª Vara Cível da Comarca de Matão, o magistrado levou em consideração a situação de Eduardo Escobar naquela época e entendeu indevida a cessação do benefício assistencial no ano de 2014. Ou seja, a decisão judicial não abarcou o período compreendido entre fevereiro/2008 e julho/2008, em que o benefício foi pago indevidamente a Eduardo Escobar. Ressalte-se que os réus foram absolvidos em relação ao recebimento do benefício de prestação continuada entre 09/2013 e 09/2014.
De rigor, portanto, a manutenção da condenação da ré MARIA CONCEIÇÃO DE ANNUNZIO pela prática da conduta ilícita prevista no art. 171, §3º do Código Penal.
Da dosimetria
1ª fase
A pena-base foi fixada acima do mínimo legal (1 ano e 6 meses de reclusão) em razão da culpabilidade. Eis os fundamentos:

"as circunstâncias judiciais demonstram que a culpabilidade - aqui compreendida não mais como elemento integrante da estrutura analítica do crime, mas sim como medida do grau de censurabilidade da conduta - se mostra exacerbada, uma vez que a atuação da ré como despachante previdenciário, com larga experiência no ramo, intensifica a consciência da ilicitude. Aliás, a expertise da ré quanto aos usos e costumes da APS de Matão no processamento dos pedidos de amparo assistencial foi essencial para a consecução do delito".
Com efeito, a culpabilidade deve ser valorada negativamente já que a denunciada se aproveitou do seu conhecimento sobre os procedimentos na agência previdenciária e da falha da autarquia, que não checava as informações prestadas pelos pretensos beneficiários, para perpetrar a fraude.
O Ministério Público Federal pede a exasperação da pena-base em razão das consequências do crime, diante do prejuízo causado; conduta social; personalidade e maus antecedentes.
O montante do prejuízo causado (R$ 2.975,00) não extrapola o ordinário em crimes dessa espécie.
A conduta social do agente, entendida como o comportamento do indivíduo no seio familiar, profissional e social, não pode ser valorada negativamente ante a falta de elementos para tal. De fato, não há nada nos autos que permitam a valoração do comportamento da apelante no ambiente em que vive.
O doutrinador Ricardo Augusto Schmitt leciona acerca da conduta social que "devem ser valorados o relacionamento familiar, a integração comunitária e a responsabilidade funcional do agente. Serve para se aferir sua relação de afetividade com os membros da família, o grau de importância na estrutura familiar, o conceito existente perante as pessoas que residem em sua rua, em seu bairro, o relacionamento pessoal com a vizinhança, a vocação existente para o trabalho, para a ociosidade e para a execução de tarefas laborais" (in Sentença Penal Condenatória, 2010, p. 99).
Da mesma forma, a circunstância judicial da "personalidade do agente" refere-se ao caráter do acusado. Deve ser entendida como a "agressividade, a insensibilidade acentuada, a maldade, a ambição, a desonestidade e perversidade demonstrada e utilizada pelo criminoso na consecução do delito" (HC 50.331, LAURITA VAZ, STJ - QUINTA TURMA, DJ DATA:06/08/2007 PG:00550 REVFOR VOL.:00394 PG:00434 ..DTPB).
Inexistindo nos autos quaisquer elementos que permitam a análise desses elementos, a personalidade da acusada não deve ser valorada negativamente.
Por fim, acolho o pedido ministerial para exasperar a pena-base em face dos maus antecedentes.
Maria Conceição de Annunzio foi definitivamente condenada nos autos da ação penal nº 0009533-77.2013.403.6120 pela prática do crime do art. 171, §3º do CP, em 26/04/2007 (portanto, anterior ao fato objeto do presente feito). A certidão de objeto e pé acostada à fl. 507 demonstra que a condenação criminal transitou em julgado em 22/02/2018.
Por conseguinte, fixo a pena-base em 1 ano e 8 meses de reclusão e 16 dias-multa.
2ª fase
Não incidiram circunstâncias atenuantes ou agravantes.
O Parquet Federal pleiteia o reconhecimento das agravantes previstas no art. 61, II, "g" e art. 62, I, ambos do CP, pois a ré teria cometido o delito com violação de dever inerente à profissão e teria dirigido a atividade do corréu Eduardo.
Maria Conceição atuou como procuradora do pretenso beneficiário junto ao INSS, condição que independe de qualquer qualidade especial (como, por exemplo, formação em Direito ou Contabilidade), tanto que o benefício pode ser pleiteado pelo próprio requerente. Acrescente-se que a ré é autônoma, tendo cursado o ensino médio. Assim, reputo que a agravante do art. 61, II, "g" do CP não deve incidir na presente hipótese.
Além disso, as provas coligidas aos autos demonstram apenas que o delito foi praticado em concurso de pessoas, não havendo elementos capazes de demonstrar que Maria Conceição dirigiu a atividade de Eduardo, como alega o Ministério Público Federal. A mera indução à prática delitiva não é suficiente para ensejar o agravamento da pena, nos termos do art. 62 do CP.
Por conseguinte, mantenho a pena intermediária no patamar anterior.
3ª fase
Presente a causa de aumento de 1/3 prevista no §3º do art. 171 do CP.
Assim, fixo definitivamente a pena em 2 anos, 2 meses e 20 dias de reclusão, em regime inicial aberto, e 21 dias-multa, mantido o valor unitário fixado na sentença. Saliente-se que a quantidade de dias multa deve observar o mesmo critério trifásico de cálculo da pena corporal e, por conseguinte, deve ser proporcional à mesma.
Ademais, presentes os requisitos previstos no art. 44 do Código Penal, deve ser mantida a substituição da pena privativa de liberdade por restritivas de direitos, nos termos da sentença.
Da reparação dos danos - art. 387, IV do CPP.
O Parquet Federal pede a fixação de valor mínimo para reparação dos danos causados pela infração. O pleito está amparado no artigo 387, inciso IV do Código de Processo Penal.
A despeito das controvérsias acerca da aplicabilidade da novel redação do dispositivo aos fatos ocorridos antes da sua vigência, entendo que a Lei 11.719/2008, responsável pela alteração, é uma norma de natureza processual penal, ensejando aplicação imediata, por força do princípio do tempus regit actum.
Ademais, o dispositivo em testilha tão-somente determina a liquidação imediata da obrigação de indenizar o dano, dever este há muito disciplinado no artigo 91, inciso I, do Código Penal, não trazendo o dispositivo, qualquer inovação no tocante à existência da obrigação de reparar o dano causado. Nesse sentido:

"PROCESSUAL PENAL. INDENIZAÇÃO DO ART. 387, IV, DO CPP. APLICABILIDADE À AÇÃO PENAL EM CURSO QUANDO A SENTENÇA CONDENATÓRIA FOR PROFERIDA EM DATA POSTERIOR À VIGÊNCIA DA LEI N. 11.719/2008. 1. A regra estabelecida pelo art. 387, IV, do Código de Processo Penal, por ser de natureza processual, aplica-se a processos em curso. 2. Inexistindo nos autos elementos que permitam a fixação do valor, mesmo que mínimo, para reparação dos danos causados pela infração, o pedido de indenização civil não pode prosperar, sob pena de cerceamento de defesa. 3. Recurso especial conhecido, mas improvido." (STJ, 6ª Turma, RESP 201000100227, Rel. Min. SEBASTIÃO REIS JÚNIOR, DJE DATA:20/06/2012 RT VOL.:00926 PG:00831 ..DTPB:.)

No entanto, a permissão legal de cumulação de pretensão acusatória com a indenizatória não dispensa a existência de expresso pedido formulado pelo ofendido ou do Ministério Público (RESP 201102649781, Min. MARCO AURÉLIO BELLIZZE, DJE 09/10/2012; EDRESP 201102467107, Rel. Des. Conv. CAMPOS MARQUES DJE DATA:26/04/2013), nem de ser oportunizado o contraditório ao réu, sob pena de violação ao princípio da ampla defesa (STJ, 6ª Turma, AGRESP 1.383.261, Rel. Min. Sebastião Reis Júnior, DJE 14/11/2013).
Observo que, na presente hipótese, restou inviabilizado o exercício do contraditório.
Por ocasião do oferecimento da denúncia já existia a previsão legal do art. 387, IV, do Código de Processo Penal, introduzido no ordenamento jurídico pela Lei nº 11.719, de 20.06.2008. Todavia, não houve pedido do Ministério Público Federal na inicial para a aferição desses valores e, consequentemente, manifestação da defesa no curso da ação penal acerca do tema.
Diante disso, afasto o pedido formulado pelo órgão acusatório.
Justiça Gratuita
A apelante Maria Conceição requer a concessão dos benefícios da justiça gratuita.
A declaração de fragilidade econômica formulada pela ré autoriza o deferimento dos benefícios da justiça gratuita.
Por outro lado, o artigo 804 do Código de Processo Penal não obsta a condenação de beneficiários da justiça gratuita ao pagamento das custas processuais, ficando, contudo, seu pagamento sobrestado, enquanto perdurar seu estado de pobreza, pelo prazo de cinco anos, quando então a obrigação estará prescrita, conforme determina o artigo 98, § 3º, do novo Código de Processo Civil.
Além disso, a concessão de gratuidade não afasta a responsabilidade do beneficiário pelas despesas processuais e pelos honorários advocatícios decorrentes de sua sucumbência, ou tampouco afasta o seu eventual dever de pagar, ao final, as multas processuais que lhe sejam impostas, nos moldes do artigo 98, §§ 2º e 4º, também da Lei nº 13.105/2015.
Em sintonia com o entendimento jurisprudencial do Superior Tribunal de Justiça (AgRg no AREsp 23.804/DF, 5ª Turma, Rel. Min. Gilson Dipp, DJe 01/08/2012; AgRg no Ag 1377544/MG, Rel. Min. Laurita Vaz, DJe 14/06/2011), o pertinente exame acerca da miserabilidade da apelante deverá ser realizado, com efeito, em sede do Juízo de Execução, fase adequada para aferir a real situação financeira da condenada, restando, por conseguinte, mantida sua condenação ao pagamento das custas processuais nos termos da r. sentença.
Dispositivo
Pelo exposto, dou parcial provimento à apelação interposta pela defesa para conceder a justiça gratuita; dou parcial provimento à apelação do Ministério Público Federal para exasperar a pena-base em face dos maus antecedentes, restando a pena definitivamente fixada em 2 anos, 2 meses e 20 dias de reclusão, em regime inicial aberto, e 21 dias-multa e, de ofício, declaro extinta a punibilidade de Eduardo Escobar em relação ao crime do art. 171, §3º do CP praticado até julho/2008 pela ocorrência da prescrição da pretensão punitiva, com fundamento nos arts. 107, IV; 109, V; 110 (com redação vigente ao tempo do fato) e 115, todos do CP.
É o voto.

JOSÉ LUNARDELLI
Desembargador Federal


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