D.E. Publicado em 29/09/2020 |
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EMENTA
ACÓRDÃO
Vistos e relatados estes autos em que são partes as acima indicadas, decide a Egrégia Quinta Turma do Tribunal Regional Federal da 3ª Região, por unanimidade, dar provimento ao recurso interposto pela defesa para declarar extinta a punibilidade do réu MAXIMILIANO DE PAIVA PEREIRA, nos termos do art. 107, inciso III, do Código Penal, estendendo tal benefício em favor da corré MÁRCIA RODRIGUES GOMES, nos termos do art. 580 do Código de Processo Penal, nos termos do relatório e voto que ficam fazendo parte integrante do presente julgado.
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RELATÓRIO
Trata-se de embargos de declaração opostos por Maxmiliano de Paiva Pereira contra o acórdão de fls. 694/699 que, por unanimidade, negou provimento à apelação, conforme ementa que transcrevo:
A defesa do embargante aponta omissão quanto à extinção da punibilidade, em razão do fenômeno da abolitio criminis; omissão quanto à análise da tese defensiva; contradição quanto aos relatórios da ANATEL; contradição quanto ao contrato de parceria; e contradição do acórdão com as provas dos autos.
Ciente o Ministério Publico determinou ofício à ANATEL solicitando informações sobre o possível enquadramento nos ditames previstos no art. 10-A da Resolução ANATEL nº 680, de 27 de junho de 2017 (fl.730/ 730 vº).
Em resposta, a ANATEL informou que à época dos fatos não era prática mandatória a fiscalização do quantitativo de acessos em serviço superior ou não a 5000 (cinco mil usuários), além do mais era inexistente o sistema eletrônico para inserção de dados cadastrais e informação quanto ao início das atividades das prestadoras, conforme preconiza a Resolução nº 680 (fls. 738/739).
Em parecer, a Procuradoria Regional da República manifestou-se pelo improvimento, e pugna pela inclusão do feito em pauta para julgamento, para que seja resolvida a questão da abolitio criminis (fls. 743/747).
VOTO
Os embargos de declaração constituem recurso de fundamentação vinculada, cabíveis nas restritas e taxativas hipóteses previstas no art. 619, do Código de Processo Penal, de modo que a mera irresignação com o entendimento apresentado na decisão embargada, visando à reversão do julgado, ainda que deduzida sob o pretexto de sanar omissão, contradição, ambiguidade ou obscuridade, não tem o condão de viabilizar o provimento dos declaratórios.
É sob esse prisma, pois, que passo a analisar os embargos opostos.
O embargante aponta omissão no acórdão no que se refere à extinção da punibilidade, em razão da edição da Resolução 680, de 27 de junho de 2017. Aduz, em suma, que sendo inexigível a autorização da ANATEL para a exploração do serviço ofertado pelo réu, deve ser reconhecida a abolitio criminis.
Vejamos.
O compartilhamento de acesso à internet via ondas de rádio caracteriza exploração de Serviços de Comunicação Multimídia ("SCM"), submetendo-se, portanto, às normatizações da ANATEL.
Ocorre que com o advento da Resolução da ANATEL nº 680, de 27 de junho de 2017, conferiu-se novo tratamento para a exploração de Serviços de Comunicação Multímídia, elencando, dentre outras disposições, hipóteses de dispensa de autorização do órgão para a exploração de tais atividades.
Dispõe a Resolução nº 680/2017, in verbis:
Desta feita, após a edição da Resolução nº 680/2017 da ANATEL, o compartilhamento de internet via rádio desprovido de autorização, quando desenvolvido por pessoa jurídica e operado mediante equipamentos de radiação restrita e/ou meio limitado para no máximo cinco mil usuários (acessos em serviço) deixou de consubstanciar atividade clandestina de telecomunicação, e, por conseguinte, o crime do art. 183 da Lei nº 9.472/191997.
Embora seja um complemento ao art. 183 da Lei nº 9.472/1997, que é norma penal em branco, a Resolução nº 680/2017 da ANATEL alterou a abrangência típica sobre o desenvolvimento clandestino de atividades de telecomunicação, afastando a tipicidade formal nos casos de dispensa da prévia autorização do órgão para a exploração do SVC, nos termos da nova redação conferida ao art. 10-A do Regulamento do Serviço de Comunicação Multimídia (Resolução nº 614/2013 da ANATEL).
Ressalto que o complemento da lei penal em branco que descriminaliza determinada conduta ou que beneficia o réu deve ser aplicado retroativamente, em razão da retroatividade da lei penal mais benéfica (artigo 5º, XL, da Constituição Federal, e artigo 2º do Código Penal).
Sobre o tema, importa colacionar o magistério de Heleno Cláudio Fragoso:
Consultada sobre possível enquadramento dos fatos destes autos na vigente redação do artigo 10-A da Resolução nº 680/ 2017, hipótese em que é dispensada a autorização da agência reguladora, concluiu a ANATEL:
(...)
No caso submetido à análise da ANATEL, o denunciado é Microempreendedor individual - MEI, não sendo, portanto, possível o enquadramento no Art. 10-A, da Resolução nº 680/ 2017.
Conforme transcrito, a ANATEL apresentou resposta negativa, informando que somente as pessoas jurídicas são elegíveis à prestação do Serviço de Comunicação Multimídia com dispensa de autorização da Anatel, desde que cumpridos os demais requisitos elencados no art. 10-A da Resolução nº 680/2017.
Apesar da negativa da agência reguladora, verifica-se que o fato de o prestador do serviço ser microempreendedor não altera a potencialidade lesiva do desenvolvimento da atividade de telecomunicações, haja vista que o risco está relacionado ao equipamento utilizado e ao alcance do serviço prestado.
Na hipótese, não há demonstração do número certo de usuários que utilizavam o Serviço de Comunicação Multimídia comercializado por Márcia Rodrigues Gomes - ME. Todavia, em virtude do princípio in dubio pro reo, a dúvida milita em favor dos acusados, devendo, portanto, prevalecer a conclusão pelo preenchimento do requisito relativo ao limite máximo de usuários da rede. Além disso, à época, a ANATEL não observava o quantitativo de acessos em serviço (se superior ou não a 5000 clientes) durante as diligências fiscalizatórias.
Sobre a prévia comunicação à ANATEL do início da prestação do Serviço de Comunicação Multimídia, trata-se de exigência administrativa a ser apurada no âmbito da entidade autárquica, desde que fornecido meio próprio para tanto. Não se olvida que, à época do início das atividades desenvolvidas pelos réus, a ANATEL não dispunha de sistema apto ao cumprimento destas exigências, sendo, portanto, desarrazoado que os réus sejam prejudicados em função disso.
Outrossim, como ressaltado, sendo exigência meramente administrativa, eventual inobservância ensejará a responsabilização administrativa, e não criminal, do agente.
Do exposto, constata-se a ocorrência do fenômeno da abolitio criminis, tendo a regulamentação posterior emitida pela ANATEL sobre o Serviço de Comunicação Multimídia deixado de considerar criminosa a conduta imputada aos acusados.
Sobre o tema, colaciono ainda os precedentes:
Assim, por não necessitar autorização do órgão competente, nos termos da vigente Resolução 680/2017 da ANATEL, a exploração de SCM desenvolvida pelos réus foi descriminalizada.
Verificada a abolitio criminis e em vista da disposição constitucional da retroatividade da lei penal mais benéfica, de rigor a extinção da punibilidade dos réus.
Ante exposto, declaro extinta a punibilidade do réu MAXIMILIANO DE PAIVA PEREIRA, nos termos do art. 107, inciso III, do Código Penal, estendo tal benefício em favor da corré MÁRCIA RODRIGUES GOMES, nos termos do art. 580 do Código de Processo Penal. Recurso prejudicado.
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