D.E. Publicado em 12/06/2020 |
|
|
|
|
|
EMENTA
ACÓRDÃO
Vistos e relatados estes autos em que são partes as acima indicadas, decide a Egrégia Décima Primeira Turma do Tribunal Regional Federal da 3ª Região, por unanimidade, rejeitar as preliminares arguidas pelas defesas e, no mérito: dar provimento ao recurso de MARCO AURÉLIO KLEMZ para reconhecer a prescrição da pretensão punitiva estatal em relação ao crime do artigo 288 do Código Penal e, consequentemente, extinguir sua punibilidade, entendendo o efeito aos demais corréus, e absolver o apelante, com fulcro no artigo 386, inciso VII, do Código de Processo Penal, da imputação do crime previsto no artigo 155, §4º, incisos II e IV, do Código de Processo Penal e negar provimento à apelação de MÁRCIO TAVARES PIRATH, nos termos do voto do Des. Fed. Relator; prosseguindo, a Turma, por maioria, decidiu dar parcial provimento ao apelo de VALTER ANDRÉ, para estabelecer a pena-base em menor proporção que aquela prevista na sentença e, de ofício, reconhecer a incidência da atenuante de confissão prevista no artigo 65, III, "d", do Código Penal, fixando a pena definitiva em 05 (cinco) anos e 10 (dez) meses de reclusão, no regime inicial semiaberto, e 28 (vinte e oito) dias-multa, no valor unitário mínimo legal; de ofício, estabelecer a pena-base para MÁRCIO TAVARES PIRATH em menor proporção que aquela prevista na sentença, e fixar sua pena definitiva em 05 (cinco) anos de reclusão, no regime inicial semiaberto, e 25 (vinte e cinco) dias-multa, no valor unitário mínimo legal e dar parcial provimento ao recurso de apelação de RAFAEL KNOLL e RODRIGO KNOLL, para estabelecer a pena-base em menor proporção que aquela prevista na sentença, e fixar a pena definitiva em 05 (cinco) anos de reclusão, no regime inicial semiaberto, e 25 (vinte e cinco) dias-multa, no valor unitário mínimo legal, nos termos do voto do Des. Fed. Relator, com quem votou o Des. Fed. Nino Toldo, com a ressalva de seu entendimento no sentido de que o crime continuado (CP, art. 71) integra o sistema trifásico da dosimetria da pena (CP, art. 68), pois constitui causa de aumento, vencido o Des. Fed. Fausto De Sanctis que negava provimento às apelações dos réus VALTER ANDRÉ, RAFAEL KNOLL e ROGÉRIO KNOLL, a fim de manter suas condenações pela prática do crime tipificado no artigo 155, §4º, incisos II e IV, na forma do artigo 71, ambos do Código Penal, e, de ofício, redimensionava as penas de multa.
Documento eletrônico assinado digitalmente conforme MP nº 2.200-2/2001 de 24/08/2001, que instituiu a Infra-estrutura de Chaves Públicas Brasileira - ICP-Brasil, por: | |
Signatário (a): | JOSE MARCOS LUNARDELLI:10064 |
Nº de Série do Certificado: | 11DE20030532761D |
Data e Hora: | 01/06/2020 12:42:52 |
|
|
|
|
|
RELATÓRIO
O EXCELENTÍSSIMO SENHOR DESEMBARGADOR FEDERAL JOSÉ LUNARDELLI:
Cuida-se de ação penal pública fundada na denúncia de fls. 02/20, oferecida pelo Ministério Público Federal contra VALTER ANDRÉ, MÁRCIO TAVARES PIRATH, MARCO AURÉLIO KLEMZ, RODRIGO KNOLL E RAFAEL KNOLL pela prática, em tese, do crime previsto no artigo 155, §4º, incisos II e IV, na forma do artigo 71, por 83 (oitenta e três) vezes, e pelo crime previsto no artigo 288, caput, todos do Código Penal.
Conforme se extrai dos autos, o presente feito adveio do desmembramento da ação penal instaurada perante a Justiça Estadual, na Comarca de Estreito/SC, distribuída sob o nº 082.06.001821-8. Em um primeiro momento, em virtude da localização e prisão dos réus, bem como da não localização dos acusados Nibar Schlischting Júnior e Marco Aurélio Klemz, houve a determinação de desmembramento quanto a esses últimos, ocasionando a ação penal nº 082.002631-8. Posteriormente, em razão, mais uma vez, da não localização e citação do réu Marco Aurélio Klemz, o Juízo Estadual determinou novo desmembramento, que por sua vez deu origem à presente ação penal.
Consta dos autos que, iniciado o seu processamento, foi arguida a incompetência do Juízo pelo Ministério Público, tendo em vista a verificação de prejuízo em detrimento da Caixa Econômica Federal. Os autos foram remetidos à Justiça Federal de Florianópolis, que determinou a reunião dos feitos. Em seguida, houve o declínio de competência para a Subseção Judiciária de São Paulo, considerando que a maioria dos crimes ocorreram no Estado de São Paulo, e por fim, declínio para a 1ª Vara Federal da Subseção Judiciária de São João da Boa Vista/SP, visto que a prática da maioria dos crimes se deu na cidade de Mogi Guaçu/SP.
Redistribuído o feito, houve a ratificação da denúncia de fls. 02/20 pelo Ministério Público Federal, que requereu o recebimento da inicial em relação aos acusados, com exceção de Nibar Schlischting Júnior, que fora absolvido por sentença transitada em julgado.
Narra a peça acusatória, em síntese, que os acusados se associaram em caráter permanente e estável para a prática delitiva e, por meio da invasão de sistemas de informática pelo uso da rede mundial de computadores (Internet), obtiveram acesso a números de contas correntes, de agências, bem como de senhas de usuários que acessavam às instituições bancárias online, realizando assim transações financeiras fraudulentas com o fito de subtrair valores em dinheiro, além de aliciar pessoas interessadas em quitar títulos, cobrando, para tanto, 40% (quarenta por cento) de seu valor.
Por meio da decisão de fls. 1118/1121 (publicada em 13 de novembro de 2012 - fl. 1121), o Juízo a quo recebeu a denúncia.
Regularmente processado o feito, sobreveio a sentença de fls. 1892/1901v, por meio da qual o Juízo a quo julgou procedente a pretensão acusatória para condenar, pela prática do crime descrito no artigo 155, §4º, incisos II e IV, e artigo 288, na forma do artigo 69, todos do Código Penal, nos seguintes moldes:
i) VALTER ANDRÉ, à pena privativa de liberdade de 10 (dez) anos e 03 (três) meses de reclusão, em regime inicial fechado, bem como ao pagamento de 270 (duzentos e setenta) dias-multa, no valor unitário de 1/30 (um trigésimo) do salário mínimo vigente ao tempo dos fatos;
ii) MÁRCIO TAVARES PIRATH, à pena privativa de liberdade de 07 (sete) anos e 01 (um) mês de reclusão, em regime inicial semiaberto, bem como ao pagamento de 220 (duzentos e vinte) dias-multa, no valor unitário de 1/30 (um trigésimo) do salário mínimo vigente ao tempo dos fatos;
iii) MARCO AURÉLIO KLEMZ, à pena privativa de liberdade de 07 (sete) anos e 01 (um) mês de reclusão, em regime inicial semiaberto, bem como ao pagamento de 220 (duzentos e vinte) dias-multa, no valor unitário de 1/30 (um trigésimo) do salário mínimo vigente ao tempo dos fatos;
iv) RAFAEL KNOLL, à pena privativa de liberdade de 07 (sete) anos e 01 (um) mês de reclusão, em regime inicial semiaberto, bem como ao pagamento de 220 (duzentos e vinte) dias-multa, no valor unitário de 1/30 (um trigésimo) do salário mínimo vigente ao tempo dos fatos;
v) RODRIGO KNOLL, à pena privativa de liberdade de 07 (sete) anos e 01 (um) mês de reclusão, em regime inicial semiaberto, bem como ao pagamento de 220 (duzentos e vinte) dias-multa, no valor unitário de 1/30 (um trigésimo) do salário mínimo vigente ao tempo dos fatos.
A sentença foi publicada em 19 de outubro de 2018 (fl. 1902)
Os acusados RODRIGO KNOLL e RAFAEL KNOLL apresentaram recurso de apelação à fl. 1920. Em suas razões de fls. 2009/2070, requereram, preliminarmente, o reconhecimento da nulidade por cerceamento de defesa, sustentando óbice ao acesso dos autos da medida cautelar que decretou a quebra de sigilo telefônico dos apelantes, bem assim por não terem sido intimados para a audiência de oitiva de testemunhas, pugnando pela anulação da sentença e do processo desde a abertura da instrução.
Ainda em sede preliminar, pugnaram pela nulidade do feito ab initio em decorrência da inépcia da inicial acusatória. No mérito, pleitearam a absolvição por ausência de elementos de prova. No tocante à dosimetria da pena, a aplicação da pena-base no mínimo legal e a inaplicabilidade da qualificadora do inciso IV, §4º, do artigo 155 do Código Penal, ante a incidência de bis in idem em relação ao artigo 288 do Código Penal.
O réu MARCO AURÉLIO KLEMZ, de sua vez, recorreu à fl. 1924. Com razões às fls. 1961/1976, aduziu, preliminarmente, à superveniência da prescrição da pretensão punitiva estatal em relação aos fatos previstos no artigo 288 do Código Penal e à nulidade do feito ab initio por inépcia da denúncia. No mérito, requereu a absolvição por ausência de comprovação da autoria delitiva quanto ao apelante. Em relação à dosimetria da pena, pleiteou: (i) redução da pena-base ao mínimo legal, tendo em vista que sua exasperação, fundamentada na gravidade do crime praticado, caracteriza bis in idem; (ii) redimensionamento das penas aplicadas na segunda e na terceira fase; (iii) diminuição do quantum de majoração referente à continuidade delitiva de 2/3 (dois terços) para 1/6 (um sexto); (iv) redimensionamento da pena de multa.
O acusado MÁRCIO TAVARES PIRATH, com apelo às fls. 1979/1986, pugnou pela absolvição, ante a ausência de provas de autoria delitiva, com fulcro no artigo 386, inciso VI, do Código de Processo Penal.
Por fim, o réu VALTER ANDRÉ interpôs recurso às fls. 2076/2106, pleiteando, inicialmente, a nulidade do feito por inépcia da exordial acusatória e também das interceptações telefônicas por ausência de transcrição integral e sua perícia. No mérito, requereu a absolvição por ausência de provas de autoria delitiva. No que concerne à dosimetria penal, pleiteou a fixação da pena-base no mínimo legal e a redução da fração de aumento aplicada em relação à continuidade delitiva para 1/3 (um terço).
Contrarrazões da acusação às fls. 1988/1991 e 2113/2131.
Nesta Corte, a Procuradoria Regional da República, por meio do parecer de fls. 2146/2158v, opinou pelo desprovimento dos apelos defensivos, salvo quanto ao reconhecimento da prescrição referente ao crime previsto no artigo 288 do Código Penal, alegada pela defesa de MARCO AURÉLIO KLEMZ, com efeitos estendidos aos demais réus.
É o relatório.
Sujeito à revisão.
Documento eletrônico assinado digitalmente conforme MP nº 2.200-2/2001 de 24/08/2001, que instituiu a Infra-estrutura de Chaves Públicas Brasileira - ICP-Brasil, por: | |
Signatário (a): | JOSE MARCOS LUNARDELLI:10064 |
Nº de Série do Certificado: | 11DE1812176AF96B |
Data e Hora: | 26/03/2020 16:15:54 |
|
|
|
|
|
VOTO
O EXCELENTÍSSIMO SENHOR DESEMBARGADOR FEDERAL JOSÉ LUNARDELLI:
Presentes os requisitos de admissibilidade, conheço dos apelos interpostos.
I - Dos fatos
Consoante já relatado, o Ministério Público Federal denunciou VALTER ANDRÉ, MÁRCIO TAVARES PIRATH, MARCO AURÉLIO KLEMZ, RODRIGO KNOLL E RAFAEL KNOLL pela prática, em tese, do crime previsto no artigo 155, §4º, incisos II e IV, na forma do artigo 71, por 83 (oitenta e três) vezes, e do crime previsto no artigo 288, caput, todos do Código Penal.
Narra a exordial acusatória, inicialmente oferecida pelo Ministério Público do Estado de Santa Catarina e posteriormente ratificada pelo Ministério Público Federal em São Paulo (fls. 02/05):
Conforme consta da inicial, na apreensão foram constatados documentos diversos (impressos por VALTER ANDRÉ nas dependências do estabelecimento comercial de RAFAEL KNOLL), os quais comprovavam as transações financeiras fraudulentas realizadas pelos criminosos. Já no interior das maletas supracitadas, foram encontrados um aparelho celular, um notebook, além de papéis com anotações e comprovantes de pagamento através da Internet. Depreende-se de tais elementos que o notebook era utilizado por VALTER para invadir personal computers e assim ter acesso a dados bancários de correntistas de diversas instituições financeiras - dentre as quais, Caixa Econômica Federal, Banco do Brasil, Banco Real, Banco do Estado de Santa Catarina, Banco GF - Portugal, BANRISUL, Banco do Estado de São Paulo e Unibanco -, por meio das quais era realizada a subtração de valores, mediante fraude do sistema operacional responsável pela segurança dessas máquinas e em concurso de agentes com RODRIGO KNOLL, RAFAEL KNOLL, MARCO AURÉLIO KLEMZ, MÁRCIO TAVARES PIRATH e Nibar Schlischting Júnior.
Além de tais subtrações, colhe-se da exordial que entre os dias 1º de dezembro de 2004 e 19 de janeiro de 2005, 09 de junho de 2005, outubro de 2005, 17 e 18 de maio de 2006, a organização criminosa, através do referido meio fraudulento, obteve os dados referentes às contas correntes das empresas Adeltour Agência de Viagens Ltda., Udo Beltramini Indústria e Comércio de Madeiras Ltda., bem como das vítimas Jaime José Mora, Silvio Benelli, e outras não identificadas, e assim subtraiu valores em dinheiro destinados a pagamentos de títulos, tributos, dentre outras faturas.
Extrai-se da denúncia que alguns membros da aludida organização criminosa tinham a função de recrutar pessoas interessadas na quitação de títulos de diversas espécies perante instituições financeiras, por intermédio das subtrações fraudulentas. Dos interessados, que entregavam aos criminosos a documentação necessária à efetivação da transação, era cobrada a importância de 40% (quarenta por cento) do valor integral da transação.
No que se refere ao modus operandi utilizado pelos criminosos, a inicial acusatória o descreveu nos seguintes moldes (fl. 19):
Diante disso, os acusados foram denunciados pela prática de 83 (oitenta e três) crimes de furto duplamente qualificados (mediante fraude e concurso de agentes), na forma do artigo 71 do Código Penal, e pelo delito, à época, de quadrilha previsto no artigo 288 do Código Penal, em concurso material.
I - Da extinção da punibilidade (crime do artigo 288 do Código Penal)
Previamente ao exame de outras questões deduzidas nos autos, deve-se reconhecer a prescrição da pretensão punitiva quanto a uma das condutas imputadas aos acusados.
Com efeito, em suas razões recursais, MARCO AURÉLIO KLEMZ alega a ocorrência da prescrição em relação ao crime de associação criminosa, previsto no artigo 288 do Código Penal.
A prescrição é fenômeno extintivo da punibilidade que se opera quando transcorrido determinado lapso temporal, previsto em lei, entre dois marcos também previstos no ordenamento, vale dizer, entre dois marcos interruptivos ou entre a data dos fatos e o primeiro dos marcos de interrupção (o recebimento da denúncia). Com o trânsito em julgado da sentença acusatória para a acusação, deve a prescrição ser calculada com base na pena cominada concretamente em primeiro grau (artigo 110 do Código Penal); sendo esta de 01 (um) ano e 03 (três) meses de reclusão quanto ao crime do artigo 288 do Código Penal, o lapso temporal para cálculo da prescrição é de quatro anos (artigo 109, V, do Código Penal).
No caso em tela, a denúncia (que imputa fatos em tese ocorridos até o ano de 2006) foi recebida em 13 de novembro de 2012 (fls. 1118/1121), configurando-se nessa data o primeiro marco interruptivo da prescrição (artigo 117, I, do Código Penal). Já a sentença - segundo marco interruptivo da prescrição (artigo 117, IV, do Código Penal) - foi publicada em 19 de outubro de 2018 (fl. 1902). Constata-se, pois, o transcurso de prazo superior a quatro anos entre esses marcos, o que impõe o reconhecimento da prescrição da pretensão punitiva e, por consequência, a extinção da punibilidade quanto à conduta em tese amoldada ao artigo 288 do Código Penal.
Nesses termos, acolho tal parcela do recurso de apelação, para declarar extinta a punibilidade de MARCO AURÉLIO KLEMZ quanto à imputação de prática do crime previsto no artigo 288 do Código Penal, o que faço com fulcro nos artigos 107, IV, do Código Penal, e 61 do Código de Processo Penal, e estendo o efeito do recurso aos demais acusados VALTER ANDRÉ, MÁRCIO TAVARES PIRATH, RODRIGO KNOLL E RAFAEL KNOLL.
II - Da matéria preliminar
Da inépcia da denúncia
Os acusados MARCO AURÉLIO KLEMZ e VALTER ANDRÉ sustentam a inépcia da exordial acusatória. Argumentam que a peça vestibular não especifica a conduta delitiva perpetrada pelos acusados, inexistindo apontamentos a respeito da participação nos crimes contra o patrimônio e, especialmente, do papel de cada denunciado no âmbito do delito de autoria coletiva. Sustentam que o Parquet Federal tão somente citou o nome dos apelantes como coautores, sem fazer qualquer menção pormenorizada de sua conduta, violando, portanto, o disposto no artigo 41 do Código de Processo Penal.
A referida alegação não comporta acolhida.
Na fase inicial da ação penal, vigora o princípio do in dubio pro societate, não se exigindo, nessa fase, prova cabal da autoria e materialidade delitivas, o que somente se verificará, se o caso, ao fim da instrução.
Bastam, dessa forma, os indícios de materialidade e autoria do crime. A propósito:
In casu, a narração constante da denúncia evidencia a ocorrência, em tese, de fatos típicos praticados pelos acusados, quais sejam, subtrair valores mediante expediente fraudulento consistente em acessar sistemas de informática para obter números de agências, contas correntes e senhas de usuários que acessavam instituições bancárias online, no bojo de quadrilha formada por três ou mais pessoas com o fim específico de praticar infrações penais contra o patrimônio, em detrimento de instituições financeiras.
A inicial acusatória esclarece a forma como a conduta delitiva era praticada pelos denunciados, valendo-se de empreendimentos comerciais como base operacional e com o intuito de recrutar clientes que fornecessem faturas diversas para pagamento, para a realização das transações financeiras fraudulentas, apontando a participação de cada um dos acusados.
Verifica-se que a denúncia delineou os elementos de convicção que a embasaram, narrando de modo satisfatório os comportamentos porventura engendrados pelos corréus para a prática delitiva, ou seja, da sua análise extrai-se, com clareza, tanto o fato típico que lhes foi imputado, como as condutas supostamente por eles perpetradas.
Assim, não se vislumbra qualquer prejuízo à ampla defesa e ao contraditório, tendo sido o fato criminoso e as condutas ilícitas em tese praticadas pelos corréus suficientemente relatados e descritos, a teor do disposto no artigo 41 do Código de Processo Penal.
Nesse sentido, o entendimento do Supremo Tribunal Federal e do Superior Tribunal de Justiça:
Afasto, portanto, a aventada inépcia da denúncia, pois preenchidos os requisitos exigidos pelo ordenamento processual penal. Rejeitada está a preliminar em apreço.
Da alegada nulidade relativa às interceptações telefônicas
A defesa dos réus RODRIGO KNOLL e RAFAEL KNOLL requer a nulidade do feito ab initio por cerceamento de defesa, consubstanciado no óbice ao acesso dos autos da medida cautelar que decretou a quebra do sigilo telefônico, pugnando pela inutilização das provas derivadas das escutas telefônicas dos autos nº 082.06.001821-8/002 (os quais tramitaram perante a 3ª Vara Criminal da Comarca de Florianópolis) e demais elementos compartilhados.
Asseverou que a tese foi levantada em sede de alegações finais, contudo, o Juízo a quo rejeitou os argumentos defensivos, esclarecendo que as interceptações telefônicas, autorizadas judicialmente, estiveram à disposição da defesa durante toda a instrução, assegurando-lhe a oportunidade de manusear os autos antes mesmo das alegações finais.
A defesa sustenta que não foram juntadas aos autos as decisões de quebra de sigilo, tampouco os CDs contendo os áudios interceptados, limitando-se o Juízo ao compartilhamento do relatório final e de parte das transcrições, o que teria ocasionado prejuízo aos réus e violado a ampla defesa. Ocorre, contudo, que às fls. 2409/2411 do Apenso nº 082.06.001821-8/002 - Volume XI está acostada a decisão que deferiu o pedido de interceptação telefônica em relação aos telefones celulares listados na decisão, dentre os quais, os números pessoais de VALTER ANDRÉ, RODRIGO KNOLL, Márcio "Gordo" (que seria MÁRCIO TAVARES PIRATH) e Nibar "PP". No mesmo volume, foram juntados os CDs relativos às gravações em sua integralidade (fls. 2399/2408).
No mesmo sentido é a defesa do acusado VALTER ANDRÉ, que sustenta a nulidade da interceptação telefônica realizada no bojo da presente ação penal por violação ao artigo 6º, §1º, da Lei nº 9.296/96, o qual estipularia a obrigatoriedade das transcrições relativas às interceptações telefônicas autorizadas pelo Poder Judiciário. Requer a conversão do julgamento em diligência, para que se proceda à transcrição integral por meio de perícia técnica.
A princípio, destaco que não prospera a tese de que deveria ter havido a transcrição integral ou degravação integral do teor das interceptações telefônicas realizadas na investigação policial. Conforme posição pacífica dos Tribunais Superiores, o ordenamento não exige a degravação integral do conteúdo interceptado, mas apenas a menção aos excertos entendidos como relevantes pelo órgão acusatório, restando franqueado, sempre, o acesso das defesas à íntegra dos áudios, inclusive para que todas as partes possam produzir eventual prova atinente ao contexto das conversas e a como devem ser compreendidas determinadas colocações externadas nos diálogos captados. Em outros termos: para fins de proteção dos direitos constitucionais ao contraditório e à ampla defesa, bem assim para cumprimento da legislação de regência do tema (Lei nº 9.296/96), é necessário transcrever devidamente (ou expor o teor), e sem cortes inadequados, os diálogos que embasam a denúncia. Quanto ao mais, deve ser garantido à defesa o acesso completo aos diálogos interceptados, para que esta possa aferir a regularidade e correção das transcrições realizadas, bem como, em querendo, proceder à feitura da transcrição de outros diálogos, se isso convier a alguma linha defensiva.
Nesse sentido, cito precedentes dos E. STF e STJ:
No tocante às alegações dos acusados RODRIGO e RAFAEL, consigne-se que o requerimento de acesso às mídias digitais contendo as gravações somente foi feito pela defesa em momento posterior à instrução criminal e à fase de diligências (artigo 402 do Código de Processo Penal), conforme se extrai das alegações finais de fls. 1761/1812. Após o pleito defensivo, procedeu-se à juntada dos 11 (onze) apensos ao presente feito, nos quais constas as mídias relativas às interceptações telefônicas realizadas no âmbito da investigação criminal, como se verifica nos autos nº 082.06.001821-8/002.
Ressalte-se que a análise dos relatórios das interceptações telefônicas foi oportunizada ao Ministério Público Federal e, em seguida, às defesas dos réus, mediante vista sucessiva, consoante decisão de fl. 1874. Assim, não há que se falar em óbice ao acesso aos elementos probatórios produzidos na fase de investigação e utilizados pelo órgão ministerial para formular a acusação atribuída aos réus. Saliente-se que a defesa dos acusados RODRIGO KNOLL e RAFAEL KNOLL, após ter acesso aos apensos juntados ao feito, requereu seu desentranhamento, contudo, na mesma manifestação, acabou por ratificar integralmente as alegações finais anteriormente apresentadas, sem nada requerer (fl. 1881).
Destarte, não há dúvida de que houve o pleno exercício do contraditório e da ampla defesa, uma vez que as provas foram disponibilizadas à defesa para livre análise e manifestação.
Igualmente não procede a alegação da defesa no sentido de imprestabilidade das provas produzidas no bojo da interceptação telefônica em razão da ausência de perícia oficial referente às vozes contidas nas gravações. Consoante consolidado entendimento do Superior Tribunal de Justiça, é prescindível a realização de perícia para identificação das vozes captadas nas interceptações. Nesse sentido:
No caso em apreço, foi realizada interceptação nos aparelhos celulares dos números pessoais dos réus, o que conduz à presunção de que se tratava das vozes dos acusados. Ademais, possibilitou-se a identificação das vozes em outros momentos da persecução penal.
Por derradeiro, anoto que não se sustenta o pleito de nulidade do feito formulado pelos réus RAFAEL e RODRIGO ante a alegada ausência de intimação da audiência de instrução. Consoante registrou a magistrada a quo à fl. 1506, foi realizada a devida intimação dos acusados para o mencionado ato processual, como se verifica na certidão de fl. 1496.
Portanto, rejeito as preliminares defensivas.
III - Da materialidade e da autoria delitiva
A prova produzida e coligida ao feito, em especial a documental, devidamente corroborada em juízo, demonstra a materialidade do crime de furto qualificado de forma inconteste. Dentre os elementos probatórios, destaca-se o auto de prisão em flagrante (fls. 24/34 - Volume 1), o termo de apreensão (fls. 43/50) dos objetos e documentos encontrados nas dependências da empresa RCR Informática, de propriedade de RAFAEL KNOLL (conforme se comprova pela documentação juntada às fls. 402/408 - Volume 2). Naquele local foi encontrado e apreendido o notebook em posse do réu VALTER ANDRÉ, estando o referido aparelho eletrônico conectado à rede mundial de computadores e à impressora existente no local, bem como os diversos comprovantes de pagamento de débitos variados, aparelho celular, fotocópias de faturas e boletos bancários, comprovantes de licenciamento eletrônico, pagamentos realizados via internet, depósitos e transferências de diversas agências bancárias, tais como Banco do Brasil, Bradesco, Banco Itaú, Banespa, Unibanco e Banco Real (fls. 141/147 e 150 - Volume 1), os quais evidenciavam as transações fraudulentas realizadas pelos acusados.
Comprova também a materialidade o Laudo Pericial nº IC 1848/2006 (fls. 841/845 do Apenso 00.8206.201.8218 - Volume V), o qual revela que as anotações constantes do material apreendido (no qual se verificam, ressalte-se, os nomes dos demais corréus), foram feitas por VALTER ANDRÉ.
A documentação encaminhada pela Caixa Econômica Federal e acostada às fls. 1267/1356 do Apenso nº 00.8206.201.8218 - Volume VII, referente às contestações de saque realizadas no âmbito da Agência de Mogi Guaçu/SP, demonstram os diversos saques efetuados, entre os anos de 2004 e 2006, em detrimento de correntistas da citada empresa pública federal.
A prova testemunhal colhida em juízo ratificou os elementos produzidos na fase de inquérito, os quais serão apreciados a seguir.
Da análise dos referidos elementos probatórios extrai-se que, no dia 18 de maio de 2006 foi realizada a prisão em flagrante dos acusados VALTER ANDRÉ, RAFAEL KNOLL e RODRIGO KNOLL no interior do estabelecimento comercial RCR Informática localizado na Rua Fúlvio Aducci, Estreito, Florianópolis, de propriedade de RAFAEL. Na ocasião, VALTER foi flagrado operando um notebook conectado ao computador e à impressora da loja, por onde receberia mensagens de uma funcionária concernentes a operações bancárias realizadas. Na caixa de mensagens da referida funcionária foram encontrados diversos itens pelos peritos criminais, os quais foram posteriormente impressos, tais como recibos de pagamentos via internet (de contas diversas provenientes do consumo de energia elétrica, água, telefone, taxas concernentes a veículos automotores como IPVA, DPVAT, multas e financiamentos) datados dos dias 17 e 18 de maio de 2006, referentes a contas bancárias de clientes e instituições financeiras variadas. Junto ao notebook havia ainda duas bolsas de cores marrom e preta, no interior da qual foram encontrados diversos documentos e papéis manuscritos, que indicavam nomes, contas bancárias, registros de números de códigos de barra, números de placas e Renavans, entre outros. Em posse de VALTER foi também apreendido o aparelho celular de marca Samsung, modelo SCH-A895, com terminal de número (011) 7374-9341.
A materialidade delitiva, com ênfase ao modus operandi utilizado pelos agentes delitivos, restou demonstrada pelas declarações colhidas na fase de inquérito, posteriormente corroboradas em sede judicial pelas testemunhas, assim como a autoria delitiva, conforme será delineado a seguir.
Em sede policial, o investigador de polícia Evandro Ricardo Volante declarou a respeito do presente caso (fls. 24/25 do Apenso - Volume I):
Em juízo (mídia de fl. 1505), a testemunha Evandro, que coordenou a investigação, confirmou suas declarações extrajudiciais. Esclareceu que os procedimentos investigatórios se iniciaram a partir de uma ligação anônima recebida na Delegacia de Polícia de Florianópolis/SC, na qual uma pessoa que à época dizia se chamar João, deu a notícia de atuação de um possível hacker naquela cidade. Segundo o informante, o hacker seria de São Paulo e viria esporadicamente para Florianópolis/SC para praticar crimes. Essa pessoa de prenome João forneceu ao investigador alguns números de telefone, prometendo-lhe mais informações. Passados alguns, dias, telefonou ao policial dizendo que o hacker iria para Florianópolis/SC no meio do mês. A partir dessa notícia, Evandro passou a montar campana no aeroporto, fez a identificação da pessoa, descobrindo mais tarde que se tratava do acusado VALTER ANDRÉ.
De acordo com a testemunha, após a identificação de VALTER os policiais passaram a apurar a atuação dos demais criminosos. Teve-se a notícia de que VALTER realizava operações junto a MÁRCIO TAVARES PIRATH, conhecido como "Márcio Gordo", sobre quem já havia notícia de envolvimento com crimes, como de estelionato. Posteriormente, soube-se que os irmãos KNOLL também participavam na prática delitiva. RODRIGO, à época dos fatos, comercializava veículos, o que viabilizava a captação de "clientes" para a prática delitiva, e RAFAEL, que era proprietário de uma loja de assistência técnica e revenda de aparelhos celulares, onde também oferecia o serviço ilícito realizado pelos acusados aos clientes do mencionado estabelecimento comercial. Diante das informações e dos números de telefone que foram fornecidos por João, foi solicitada ao delegado a representação pela interceptação telefônica. O investigador passou a acompanhar as interceptações, autorizadas judicialmente, e notou que VALTER dirigia-se a Florianópolis/SC quinzenalmente, o que permitiu monitorá-lo e encontrá-lo naquele dia 18 de maio de 2006 no estabelecimento comercial de RAFAEL, operando o notebook para imprimir os comprovantes de pagamento relativos às transações fraudulentas.
Tais fatos foram confirmados pelo policial Augusto Luiz Fernandes Júnior, que acompanhou a investigação e monitoramento dos agentes até a prisão em flagrante de VALTER, RAFAEL e RODRIGO.
Em seu depoimento, o investigador Evandro destaca a liderança do acusado VALTER ANDRÉ, que seria a pessoa que detinha o conhecimento para realizar as transações financeiras fraudulentas, ingressando ilicitamente em sistemas de informática pela rede mundial de computadores, com o fito de obter senhas e demais dados bancários de usuários de diversas instituições financeiras. De acordo com a testemunha, os acusados RAFAEL KNOLL, RODRIGO KNOLL e MÁRCIO TAVARES PIRATH eram responsáveis pela captação de pessoas que tivessem interesse em quitar débitos (fossem boletos bancários, contas de energia elétrica, água, taxas e impostos), cobrando-se pelo serviço valor inferior àquele previsto no título. A partir disso, VALTER realizava o pagamento dos débitos utilizando-se das senhas obtidas ilicitamente, referentes a contas bancárias dos correntistas vítimas das fraudes. Como restou demonstrado, RAFAEL, RODRIGO e MÁRCIO, em razão da atividade comercial que exerciam ao tempo dos fatos - frise-se, RAFAEL possuía a loja destinada à assistência técnica e revenda de aparelhos de telefone, enquanto RODRIGO e MÁRCIO destinavam-se à venda de veículos automotores -, viabilizava-se o acesso a "clientes" que fornecessem os títulos a serem pagos pela associação criminosa.
Consoante se extrai das provas dos autos, VALTER liderava a associação criminosa destinada à subtração por meio de expediente fraudulento consistente na obtenção de dados de correntistas de instituições financeiras diversas (dentre as quais, a Caixa Econômica Federal) através da invasão a sistemas de informática pelo uso da rede mundial de computadores. Assim, os demais acusados (RAFAEL, RODRIGO, MÁRCIO e MARCO) captavam pessoas que tivessem interesse em realizar a quitação de débitos diversos, e mediante o pagamento de valor inferior àquele disposto no título (quarenta por cento sobre o valor do débito), era realizada a quitação do débito com ingresso ilícito no sistema eletrônico concernente a contas bancárias daqueles correntistas. O referido modus operandi restou comprovado pela ampla documentação apreendida e coligida ao feito, constituída de diversos comprovantes de quitação de boletos bancários, contas de concessionárias, taxas e impostos relativos a veículos automotores (obtidos no âmbito do comércio de automóveis realizado por RODRIGO e MÁRCIO), entre outros. Tal prática foi desenvolvida reiteradamente entre os anos de 2004 e 2006, em detrimento de instituições financeiras diversas, caracterizando-se 83 (oitenta e três) crimes no total, conforme apurou-se na investigação ratificada posteriormente, sob o crivo do contraditório.
Na fase policial, o acusado VALTER ANDRÉ admitiu a prática ilícita descrita no presente feito, consoante declarações colhidas transcritas abaixo (fls. 27/29 do Apenso - Volume I):
Como visto, na fase de inquérito o acusado VALTER ANDRÉ confessou a prática delitiva, esclarecendo o modo de execução da empreitada criminosa. Segundo seus relatos, os réus RAFAEL, RODRIGO e MÁRCIO eram as pessoas responsáveis por obter débitos (que poderiam ser faturas diversas, contas de energia elétrica, água, telefone, taxas ou tributos) de clientes variados, os quais seriam quitados por meio de acesso ilícito a contas bancárias de terceiros. Em suas declarações, o réu admite que no momento da prisão, no interior do estabelecimento comercial de RAFAEL KNOLL, realizava as operações fraudulentas por meio do notebook apreendido naquela ocasião.
Em seu interrogatório judicial, VALTER ANDRÉ afirmou não serem verdadeiras as acusações que lhe foram atribuídas. Negou ter enviado qualquer espécie de mensagem eletrônica contendo arquivos ilícitos ou subtraído valores de instituições financeiras mediante fraude. Asseverou que no momento da prisão, realizada no interior da loja de eletrônicos, comprava um aparelho celular, por acaso, e que as pastas e o notebook encontrados em seu poder na ocasião não seriam de sua propriedade.
Na fase policial, RODRIGO KNOLL apresentou esclarecimentos a respeito do relacionamento profissional que possuía com os corréus, referente ao seu negócio de revenda de veículos automotores sem, contudo, admitir qualquer prática ilícita nos comerciais desenvolvidos, conforme transcrição abaixo (fls. 30/31 do Apenso):
Em juízo, o acusado RODRIGO refutou o crime que lhe foi imputado. Disse que conheceu VALTER por ser despachante, já que àquela época trabalhava com aquisição de veículos no Estado de São Paulo, para revenda (como consta dos autos, possuía o estabelecimento comercial RPM Veículos). Afirmou que desenvolvia o negócio de revenda de veículos junto a Nibar, enquanto MÁRCIO e MARCO AURÉLIO possuíam outros automóveis que eram colocados à venda (mídia de fl. 1619).
RAFAEL KNOLL, perante a autoridade policial, declarou (fls. 33/34):
O acusado RAFAEL, igualmente, negou ter cometido o delito em seu interrogatório. Asseverou ter conhecido VALTER na loja de seu irmão RODRIGO, devendo ter falado com ele aproximadamente três vezes. Disse não ter conhecimento a respeito do esquema em que realizava o pagamento de títulos bancários de pessoas interessadas. Confirmou ser proprietário da loja de eletrônicos com bandeira da empresa de telefonia TIM, e que MÁRCIO e MARCO AURÉLIO já foram sócios de seu irmão RODRIGO na empresa destinada à venda de veículos.
Em seu interrogatório, o réu MÁRCIO, afastando-se da responsabilidade penal, afirmou ter conhecido o corréu VALTER na RPM Veículos. Segundo MÁRCIO, VALTER esteve na loja uma vez, onde o viu conversando com RODRIGO a respeito de negócios de automóveis. Disse que não tinha muito envolvimento a empresa, apenas disponibilizava alguns de seus veículos para venda, cada um pagava algumas despesas para manter o estabelecimento, que sequer teria firma registrada. Asseverou que MARCO era um dos sócios da RPM Veículos anteriormente à data em que ingressou no negócio, sendo que ao sair da empresa MÁRCIO comprou a sua parte e passou a ocupar seu lugar.
MARCO AURÉLIO também refutou a prática do crime em seu interrogatório. Disse ter trabalhado de fato com compra e venda de veículos, bem como ter visto VALTER ANDRÉ na RPM Veículos por duas ou três vezes, porém rechaçou qualquer aproximação com o intuito de aliciar pessoas interessadas no pagamento de contas.
A despeito das negativas dos acusados, os elementos de prova produzidos nos autos, em especial o depoimento do investigador Evandro Ricardo Volante colhido em juízo, sob o crivo do contraditório, demonstram de forma contundente, a autoria delitiva em relação aos acusados VALTER ANDRÉ, RAFAEL KNOLL, RODRIGO KNOLL e MÁRCIO TAVARES PIRATH. Ressalte-se que Evandro liderou a investigação no caso em apreço, sublinhando a atuação de VALTER na realização das transações e consequentes subtrações fraudulentas, de acordo com o modus operandi delineado no presente feito. No tocante a RAFAEL, RODRIGO e MÁRCIO destacou a atuação consistente em "aliciar clientes" que forneceriam as faturas a serem quitadas por meio do expediente fraudulento controlado por VALTER (mediante a cobrança de quarenta por cento do valor integral da transação). A atividade comercial desenvolvida por RODRIGO e MÁRCIO (revenda de veículos automotores), bem como por RAFAEL (estabelecimento comercial destinado a eletrônicos, sendo uma loja autorizada da empresa de telefonia TIM - RCR Informática), representou elemento facilitador para a empreitada desenvolvida pelo referido grupo criminoso. O investigador sublinhou que RODRIGO era a pessoa que mantinha contato com VALTER com mais frequência, embora os demais acusados (RAFAEL e MÁRCIO) também se relacionassem à atividade delitiva.
No entanto, o mesmo não se pode dizer em relação a MARCO AURÉLIO KLEMZ. De acordo com a acusação, o citado réu, reconhecido como "Marcos Careca" nas interceptações telefônicas, seria um dos agentes atuantes na captação de clientes para a prática delitiva desenvolvida por VALTER. Contudo, o que se encontra nos autos a respeito de MARCO AURÉLIO, é apenas a notícia de que seria sócio de RODRIGO no bojo da RPM Veículos, consoante se verifica nas declarações extrajudiciais de RODRIGO, à fl. 30: "(...) que faz dois anos aproximadamente que o declarante, Nibar Schlischting Junior, conhecido por PP e Marco Aurélio Klemz, conhecido por Marcos Careca, resolveram montar uma sociedade, com a finalidade de compra e venda de veículos com o nome fantasia de RPM Veículos, alugando o local do antigo proprietário; que faz dois meses aproximadamente que Marcos Careca saiu da sociedade, vendendo a sua parte para Márcio Gordo. (...)".
Não há no feito qualquer outro elemento relevante e concreto de que MARCO AURÉLIO efetivamente tenha participado da empreitada criminosa, como se extrai do próprio depoimento da testemunha Evandro. Ao ser questionado a respeito da participação de MARCO AURÉLIO KLEMZ, o investigador de polícia afirma que o réu, assim como a pessoa conhecida por PP (que seria Nibar Schlischting Júnior), teriam tido somente uma participação eventual. É o que se extrai de suas declarações, gravadas na mídia de fl. 1619: "Foi eventual. O Marcos também, se eu não me engano foi só um boleto, uma fatura, alguma coisa".
Ora, não entendo ser possível a condenação criminal do acusado com fulcro na mera menção de participação eventual consistente na apresentação de um boleto. Com efeito, esse é o único elemento em detrimento do réu dentre as provas judiciais produzidas na instrução, o que não é suficiente para o decreto condenatório. No que concerne aos demais réus, VALTER, RAFAEL, RODRIGO e MÁRCIO, os policiais ouvidos no feito apresentaram diversos esclarecimentos a respeito dos ajustes realizados entre os agentes que viabilizassem materialmente a subtração dos valores pertencentes às variadas instituições financeiras lesadas em razão da fraude empregada, o que não se verifica no tocante a MARCOS AURÉLIO. Ressalte-se não se tratar, no caso, de crime empresarial que exija a análise da atuação do acusado no bojo da empresa que mantinha com os corréus à época dos fatos para análise de eventual delito, mas sim de crime patrimonial cometido em concurso e mediante emprego de expediente fraudulento, para o qual a existência das empresas mantidas pelos agentes criminosos tornou-se um facilitador da prática delitiva.
O decreto condenatório exige elementos de prova robustos e concretos, que não se verificam no presente caso em relação a MARCO AURÉLIO KLEMZ, já que insuficientes as provas acostadas aos autos. O que se verifica na hipótese são indícios acerca da participação do réu no crime de furto qualificado descrito na inicial acusatória, em detrimento de provas conclusivas de autoria. Inexistindo prova judicial que demonstre a autoria delitiva de forma indene de dúvida, não há que se falar em condenação. A dúvida deve ser revertida em favor do réu, em observância ao princípio do in dubio pro reo.
Destarte, entendo que o conjunto probatório é insuficiente para comprovar a participação de MARCO AURÉLIO KLEMZ no cometimento do delito previsto no artigo 155, §4º, incisos II e IV, do Código Penal, razão pela qual o absolvo com fulcro no artigo 386, inciso VII, do Código de Processo Penal.
No entanto, quanto aos demais corréus, VALTER ANDRÉ, RAFAEL KNOLL, RODRIGO KNOLL e MÁRCIO TAVARES PIRATH estão presentes elementos probantes suficientes quanto à materialidade e à autoria do crime de furto qualificado em tela, bem como a presença do elemento subjetivo do tipo na conduta perpetrada pelos acusados, em detrimento de vítimas variadas, a consubstanciar o total de 83 (oitenta e três) furtos.
Ressalte-se que as qualificadoras são incontestáveis, tendo em vista o expediente fraudulento empregado para obtenção de dados bancários de correntistas, a viabilizar a subtração de valores (artigo 155, §4º, inciso II, do Código Penal), e que o crime foi praticado em concurso de agentes, por, ao menos, quatro pessoas que atuaram em conjunto, com consciência de que cooperavam entre si para um objetivo comum, o que configura o concurso de agentes (artigo 155, §4º, inciso IV, do Código Penal).
Destarte, tendo em vista o conjunto de provas amealhadas aos autos, mantenho a condenação de VALTER ANDRÉ, RAFAEL KNOLL, RODRIGO KNOLL e MÁRCIO TAVARES PIRATH pela prática do crime previsto no artigo 155, §4º, incisos II e IV, na forma do artigo 71, ambos do Código Penal. Passo à dosagem da pena.
IV - Da dosimetria da pena
VALTER ANDRÉ
No tocante ao crime de furto qualificado, o réu foi condenado definitivamente à pena de 08 (oito) anos e 09 (nove) meses de reclusão, bem como ao pagamento de 270 (duzentos e setenta) dias-multa, no valor de 1/30 (um trigésimo) do salário mínimo vigente ao tempo dos fatos. A defesa pretende a reforma da pena atribuída ao réu, para que seja fixada a pena-base no mínimo legal e reduzida a fração aplicada em relação à continuidade delitiva. Vejamos.
Na primeira fase da dosimetria, o juiz sentenciante fixou a pena-base em 04 (quatro) anos e 06 (seis) meses de reclusão e 40 (quarenta) dias-multa, no valor unitário mínimo legal, de acordo com os fundamentos transcritos a seguir, in verbis (fls. 1895/1895v):
Como se vê, a pena-base foi exasperada em função da valoração negativa de três circunstâncias judiciais: a culpabilidade, as circunstâncias e as consequências do crime.
A princípio, consigno que o magistrado a quo utilizou a qualificadora prevista no artigo 155, §4º, inciso II, do Código Penal (furto mediante fraude) como circunstância judicial negativa (circunstâncias do crime) e o concurso de pessoas (artigo 155, §4º, inciso IV, do Código Penal) como qualificadora objetiva.
A este respeito, o Superior Tribunal de Justiça já firmou o entendimento de que "Presentes duas qualificadoras, é possível a utilização de uma delas para qualificar o delito e da outra como circunstância negativa, seja como agravante, seja como circunstância judicial desfavorável, residualmente" (5ª Turma, Rel. Min. Moura Ribeiro, RESP 201202629678, DJE: 07.10.2013). No mesmo sentido, os precedentes a seguir: STJ, 6ª Turma, Rel. Min. Maria Thereza de Assis Moura, HC 227727, DJE: 12.12.2013 e STJ, 5ª Turma, Rel. Min. Laurita Vaz, HC 255202, DJE: 09.04.2013.
Assim, mantenho a valoração negativa das circunstâncias do crime, promovida em função da qualificadora referente à fraude, eis que devidamente caracterizada no caso em apreço.
No que concerne à culpabilidade do agente, entendo ser cabível, de fato, seu julgamento desfavorável. A conduta criminosa do acusado VALTER (responsável pela efetivação do expediente fraudulento) realmente se revelou ser de reprovabilidade acentuada, tendo em vista o grau de especialização e potencial lesivo da fraude empregada na empreitada criminosa, especialmente quando se tem em consideração à época em que praticado o crime, quando não expedientes fraudulentos de tamanha magnitude não eram tão comuns como nos tempos atuais, tal qual bem fundamentou o magistrado sentenciante. Deve, portanto, ser mantida a valoração negativa de tal circunstância judicial.
Da mesma forma, as consequências do crime devem ser consideradas desfavoráveis, haja vista a proporção do delito praticado, mediante emprego de procedimento fraudulento apto a atingir grande número de correntistas, o que ocasionou a necessidade de indenização pelas instituições financeiras lesadas. Assim, mantenho igualmente sua valoração negativa.
Em relação às demais circunstâncias judicias, não há elementos suficientes nos autos que permitam sua valoração - o acusado não é portador de maus antecedentes, os motivos são inerentes ao tipo penal e nada há a respeito de sua personalidade e conduta social.
Desse modo, mantenho o julgamento negativo da culpabilidade, das circunstâncias e das consequências do crime. No entanto, entendo que a majoração operada na sentença de fato foi demasiada, considerando a existência de apenas três circunstâncias judiciais desfavoráveis. Por esse motivo, redimensiono a pena-base para exasperá-la em menor proporção que aquela promovida na sentença, e estabeleço a pena da primeira etapa em 03 (três) anos e 06 (seis) meses de reclusão e 17 (dezessete) dias-multa, esta última fixada proporcionalmente à pena privativa de liberdade e em consonância ao sistema trifásico da dosagem penal.
Na segunda etapa da dosimetria, foi reconhecida a circunstância agravante descrita no artigo 62, inciso I, do Código Penal, que dispõe: "A pena será ainda agravada em relação ao agente que: I - promove, ou organiza a cooperação no crime ou dirige a atividade dos demais agentes.". Com efeito, deve ser mantida a incidência da referida agravante, haja vista os elementos já analisados no presente feito, os quais revelam a posição de direção da atividade criminosa de VALTER em relação aos corréus.
No tocante às circunstâncias atenuantes, entendo ser cabível o reconhecimento daquela prevista no artigo 65, inciso III, "d", do Código Penal, visto que o acusado, em suas declarações da fase policial, admitiu a prática da atividade criminosa, sendo que suas palavras foram úteis para a formação do convencimento do julgador, nos moldes da Súmula 545 do Superior Tribunal de Justiça.
Sendo assim, de ofício, reconheço a incidência da atenuante de confissão espontânea. Diante da presença da agravante do artigo 62, inciso I, do Código Penal, as aludidas circunstâncias restam compensadas, e a pena intermediária permanece no patamar de 03 (três) anos e 06 (seis) meses de reclusão e 17 (dezessete) dias-multa.
Na terceira fase, não há causas de aumento ou de diminuição, razão pela qual a pena é fixada em 03 (três) anos e 06 (seis) meses de reclusão e 17 (dezessete) dias-multa.
Conforme reconheceu o Juízo, os crimes de furto qualificado em apreço foram cometidos em continuidade delitiva, já que praticados em condições semelhantes de lugar, tempo e modo de execução, e com o mesmo objetivo, o que caracteriza a continuidade delitiva.
Tais circunstâncias revelam a caracterização da ficção jurídica do crime continuado, nos termos do artigo 71 do Código Penal, que prescreve: "Quando o agente, mediante mais de uma ação ou omissão, pratica dois ou mais crime s da mesma espécie e, pelas condições de tempo , lugar, maneira de execução e outras semelhantes, devem os subseqüentes ser havidos como continuação do primeiro, aplica-se-lhe a pena de um só dos crime s, se idênticas, ou a mais grave, se diversas, aumentada, em qualquer caso, de um sexto a dois terços.".
Assim, presente a figura da continuidade delitiva, a despeito do pleito defensivo, mantenho o patamar de 2/3 (dois terços) aplicado pelo magistrado a quo, tendo em vista a quantidade de crimes praticados - 83 (oitenta e três) infrações - e o entendimento dos Tribunais Superiores sobre o tema (STJ, 6ª Turma, AEARESP 267.637, Rel. Min. Assusete Magalhães, DJE 13/09/2013). A pena definitiva resta, portanto, fixada em 05 (cinco) anos e 10 (dez) meses de reclusão e 28 (vinte e oito) dias-multa, no valor unitário mínimo legal.
Diante do novo quantum de pena fixado, e tratando-se de condenado não reincidente e que não ostenta maus antecedentes, estabeleço o regime semiaberto para início do cumprimento da pena, nos termos do artigo 33, §2º, "b", do Código Penal, por ser mais adequado.
A detração prevista no artigo 387, §2º, do Código de Processo Penal não aproveita ao réu no caso.
Incabível a substituição da pena privativa de liberdade por restritivas de direitos, eis que ausentes os requisitos exigidos pelo artigo 44 do Código Penal.
MÁRCIO TAVARES PIRATH
Em relação ao crime de furto qualificado, o acusado foi condenado definitivamente à pena de 05 (cinco) anos e 10 (dez) meses de reclusão e ao pagamento de 220 (duzentos e vinte) dias-multa, no valor de 1/30 (um trigésimo) do salário mínimo vigente ao tempo dos fatos.
Na primeira fase da dosimetria, o juiz sentenciante fixou a pena-base em 03 (três) anos e 06 (seis) meses de reclusão e 30 (trinta) dias-multa, no valor unitário mínimo legal, por considerar desfavoráveis as circunstâncias e as consequências do crime, conforme fundamentação retro transcrita.
Consigno, como visto, que o magistrado a quo utilizou a qualificadora prevista no artigo 155, §4º, inciso II, do Código Penal (furto mediante fraude) como circunstância judicial negativa (circunstâncias do crime) e o concurso de pessoas (artigo 155, §4º, inciso IV, do Código Penal) como qualificadora objetiva.
A este respeito, o Superior Tribunal de Justiça já firmou o entendimento de que "Presentes duas qualificadoras, é possível a utilização de uma delas para qualificar o delito e da outra como circunstância negativa, seja como agravante, seja como circunstância judicial desfavorável, residualmente" (5ª Turma, Rel. Min. Moura Ribeiro, RESP 201202629678, DJE: 07.10.2013). No mesmo sentido, os precedentes a seguir: STJ, 6ª Turma, Rel. Min. Maria Thereza de Assis Moura, HC 227727, DJE: 12.12.2013 e STJ, 5ª Turma, Rel. Min. Laurita Vaz, HC 255202, DJE: 09.04.2013.
Assim, mantenho a valoração negativa das circunstâncias do crime, promovida em função da qualificadora referente à fraude, eis que devidamente caracterizada no caso em apreço.
Da mesma forma, as consequências do crime devem ser consideradas desfavoráveis, haja vista a proporção do delito praticado, mediante emprego de procedimento fraudulento apto a atingir grande número de correntistas, o que ocasionou a necessidade de indenização pelas instituições financeiras lesadas. Assim, mantenho igualmente sua valoração negativa.
Em relação às demais circunstâncias judicias, não há elementos suficientes nos autos que permitam sua valoração - a culpabilidade é normal à espécie, o acusado não é portador de maus antecedentes, os motivos são inerentes ao tipo penal e nada há a respeito de sua personalidade e conduta social.
Desse modo, mantenho o julgamento negativo das circunstâncias e das consequências do crime. No entanto, entendo que a majoração operada na sentença de fato foi demasiada, considerando a existência de apenas duas circunstâncias judiciais desfavoráveis. Por esse motivo, de ofício, redimensiono a pena-base para exasperá-la em menor proporção que aquela promovida na sentença, e estabeleço a pena da primeira etapa em 03 (três) anos de reclusão e 15 (quinze) dias-multa, esta última fixada proporcionalmente à pena privativa de liberdade e em consonância ao sistema trifásico da dosagem penal.
Na segunda etapa da dosimetria, não há circunstâncias atenuantes ou agravantes, motivo pelo qual a pena intermediária permanece no patamar de 03 (três) anos de reclusão e 15 (quinze) dias-multa.
Na terceira fase, também não estão presentes causas de aumento ou de diminuição, e a pena é fixada em 03 (três) anos de reclusão e 15 (quinze) dias-multa.
Conforme reconheceu o Juízo, os crimes de furto qualificado em apreço foram cometidos em continuidade delitiva, já que praticados em condições semelhantes de lugar, tempo e modo de execução, e com o mesmo objetivo, o que caracteriza a continuidade delitiva.
Tais circunstâncias revelam a caracterização da ficção jurídica do crime continuado, nos termos do artigo 71 do Código Penal, que prescreve: "Quando o agente, mediante mais de uma ação ou omissão, pratica dois ou mais crimes da mesma espécie e, pelas condições de tempo, lugar, maneira de execução e outras semelhantes, devem os subseqüentes ser havidos como continuação do primeiro, aplica-se-lhe a pena de um só dos crimes, se idênticas, ou a mais grave, se diversas, aumentada, em qualquer caso, de um sexto a dois terços.".
Assim, presente a figura da continuidade delitiva, mantenho o patamar de 2/3 (dois terços) aplicado pelo magistrado a quo, tendo em vista a quantidade de crimes praticados - 83 (oitenta e três) infrações - e o entendimento dos Tribunais Superiores sobre o tema (STJ, 6ª Turma, AEARESP 267.637, Rel. Min. Assusete Magalhães, DJE 13/09/2013). A pena definitiva resta, portanto, fixada em 05 (cinco) anos de reclusão e 25 (vinte e cinco) dias-multa, no valor unitário mínimo legal.
Diante do novo quantum de pena fixado, e tratando-se de condenado não reincidente e que não ostenta maus antecedentes, mantenho o regime semiaberto para início do cumprimento da pena, nos termos do artigo 33, §2º, "b", do Código Penal.
A detração prevista no artigo 387, §2º, do Código de Processo Penal não aproveita ao réu no caso.
Incabível a substituição da pena privativa de liberdade por restritivas de direitos, eis que ausentes os requisitos exigidos pelo artigo 44 do Código Penal.
RAFAEL KNOLL
Quanto ao crime de furto qualificado, o réu foi condenado definitivamente à pena de 05 (cinco) anos e 10 (dez) meses de reclusão e ao pagamento de 220 (duzentos e vinte) dias-multa, no valor de 1/30 (um trigésimo) do salário mínimo vigente ao tempo dos fatos. A defesa do acusado pretende a aplicação da pena-base no mínimo legal, bem como o afastamento da qualificadora relativa ao concurso de agentes, a qual caracterizaria bis in idem em relação ao artigo 288 do Código Penal. Pois bem.
Na primeira fase da dosimetria, o juiz sentenciante fixou a pena-base em 03 (três) anos e 06 (seis) meses de reclusão e 30 (trinta) dias-multa, no valor unitário mínimo legal, por considerar desfavoráveis as circunstâncias e as consequências do crime, conforme fundamentação retro transcrita.
Consigno, como visto, que o magistrado a quo utilizou a qualificadora prevista no artigo 155, §4º, inciso II, do Código Penal (furto mediante fraude) como circunstância judicial negativa (circunstâncias do crime) e o concurso de pessoas (artigo 155, §4º, inciso IV, do Código Penal) como qualificadora objetiva.
A este respeito, o Superior Tribunal de Justiça já firmou o entendimento de que "Presentes duas qualificadoras, é possível a utilização de uma delas para qualificar o delito e da outra como circunstância negativa, seja como agravante, seja como circunstância judicial desfavorável, residualmente" (5ª Turma, Rel. Min. Moura Ribeiro, RESP 201202629678, DJE: 07.10.2013). No mesmo sentido, os precedentes a seguir: STJ, 6ª Turma, Rel. Min. Maria Thereza de Assis Moura, HC 227727, DJE: 12.12.2013 e STJ, 5ª Turma, Rel. Min. Laurita Vaz, HC 255202, DJE: 09.04.2013.
A tese defensiva de caracterização de bis in idem pelo reconhecimento da qualificadora do inciso IV, §4º, do artigo 155 do Código Penal e da configuração do crime do artigo 288 do Código Penal não merece prosperar. O concurso entre o crime de furto qualificado pelo concurso de pessoas e o delito de associação criminosa não caracteriza bis in idem, visto que os referidos tipos penais tutelam bens jurídicos distintos (patrimônio e paz pública, respectivamente), o que não impede a imputação concomitante de ambos os delitos. Ademais, deve-se consignar que foi reconhecida a extinção da punibilidade em relação ao crime do artigo 288 do Código Penal.
Assim, mantenho a valoração negativa das circunstâncias do crime, promovida em função da qualificadora referente à fraude, eis que devidamente caracterizada no caso em apreço.
Da mesma forma, as consequências do crime devem ser consideradas desfavoráveis, haja vista a proporção do delito praticado, mediante emprego de procedimento fraudulento apto a atingir grande número de correntistas, o que ocasionou a necessidade de indenização pelas instituições financeiras lesadas. Assim, mantenho igualmente sua valoração negativa.
Em relação às demais circunstâncias judicias, não há elementos suficientes nos autos que permitam sua valoração - a culpabilidade é normal à espécie, o acusado não é portador de maus antecedentes, os motivos são inerentes ao tipo penal e nada há a respeito de sua personalidade e conduta social.
Desse modo, em detrimento do pleito defensivo, mantenho o julgamento negativo das circunstâncias e das consequências do crime. No entanto, entendo que a majoração operada na sentença de fato foi demasiada, considerando a existência de apenas duas circunstâncias judiciais desfavoráveis. Por esse motivo, redimensiono a pena-base para exasperá-la em menor proporção que aquela promovida na sentença, e estabeleço a pena da primeira etapa em 03 (três) anos de reclusão e 15 (quinze) dias-multa, esta última fixada proporcionalmente à pena privativa de liberdade e em consonância ao sistema trifásico da dosagem penal.
Na segunda etapa da dosimetria, não há circunstâncias atenuantes ou agravantes, motivo pelo qual a pena intermediária permanece no patamar de 03 (três) anos de reclusão e 15 (quinze) dias-multa.
Na terceira fase, também não estão presentes causas de aumento ou de diminuição, e a pena é fixada em 03 (três) anos de reclusão e 15 (quinze) dias-multa.
Conforme reconheceu o Juízo, os crimes de furto qualificado em apreço foram cometidos em continuidade delitiva, já que praticados em condições semelhantes de lugar, tempo e modo de execução, e com o mesmo objetivo, o que caracteriza a continuidade delitiva.
Tais circunstâncias revelam a caracterização da ficção jurídica do crime continuado, nos termos do artigo 71 do Código Penal, que prescreve: "Quando o agente, mediante mais de uma ação ou omissão, pratica dois ou mais crimes da mesma espécie e, pelas condições de tempo, lugar, maneira de execução e outras semelhantes, devem os subseqüentes ser havidos como continuação do primeiro, aplica-se-lhe a pena de um só dos crimes, se idênticas, ou a mais grave, se diversas, aumentada, em qualquer caso, de um sexto a dois terços.".
Assim, presente a figura da continuidade delitiva, mantenho o patamar de 2/3 (dois terços) aplicado pelo magistrado a quo, tendo em vista a quantidade de crimes praticados - 83 (oitenta e três) infrações - e o entendimento dos Tribunais Superiores sobre o tema (STJ, 6ª Turma, AEARESP 267.637, Rel. Min. Assusete Magalhães, DJE 13/09/2013). A pena definitiva resta, portanto, fixada em 05 (cinco) anos de reclusão e 25 (vinte e cinco) dias-multa, no valor unitário mínimo legal.
Diante do novo quantum de pena fixado, e tratando-se de condenado não reincidente e que não ostenta maus antecedentes, mantenho o regime semiaberto para início do cumprimento da pena, nos termos do artigo 33, §2º, "b", do Código Penal.
A detração prevista no artigo 387, §2º, do Código de Processo Penal não aproveita ao réu no caso.
Incabível a substituição da pena privativa de liberdade por restritivas de direitos, eis que ausentes os requisitos exigidos pelo artigo 44 do Código Penal.
RODRIGO KNOLL
No que concerne ao crime de furto qualificado, o acusado foi condenado definitivamente à pena de 05 (cinco) anos e 10 (dez) meses de reclusão e ao pagamento de 220 (duzentos e vinte) dias-multa, no valor de 1/30 (um trigésimo) do salário mínimo vigente ao tempo dos fatos. A defesa do acusado pretende a aplicação da pena-base no mínimo legal, bem como o afastamento da qualificadora relativa ao concurso de agentes, a qual caracterizaria bis in idem em relação ao artigo 288 do Código Penal. Pois bem.
Na primeira fase da dosimetria, o juiz sentenciante fixou a pena-base em 03 (três) anos e 06 (seis) meses de reclusão e 30 (trinta) dias-multa, no valor unitário mínimo legal, por considerar desfavoráveis as circunstâncias e as consequências do crime, conforme fundamentação retro transcrita.
Consigno, como visto, que o magistrado a quo utilizou a qualificadora prevista no artigo 155, §4º, inciso II, do Código Penal (furto mediante fraude) como circunstância judicial negativa (circunstâncias do crime) e o concurso de pessoas (artigo 155, §4º, inciso IV, do Código Penal) como qualificadora objetiva.
A este respeito, o Superior Tribunal de Justiça já firmou o entendimento de que "Presentes duas qualificadoras, é possível a utilização de uma delas para qualificar o delito e da outra como circunstância negativa, seja como agravante, seja como circunstância judicial desfavorável, residualmente" (5ª Turma, Rel. Min. Moura Ribeiro, RESP 201202629678, DJE: 07.10.2013). No mesmo sentido, os precedentes a seguir: STJ, 6ª Turma, Rel. Min. Maria Thereza de Assis Moura, HC 227727, DJE: 12.12.2013 e STJ, 5ª Turma, Rel. Min. Laurita Vaz, HC 255202, DJE: 09.04.2013.
A tese defensiva de caracterização de bis in idem pelo reconhecimento da qualificadora do inciso IV, §4º, do artigo 155 do Código Penal e da configuração do crime do artigo 288 do Código Penal não merece prosperar. O concurso entre o crime de furto qualificado pelo concurso de pessoas e o delito de associação criminosa não caracteriza bis in idem, visto que os referidos tipos penais tutelam bens jurídicos distintos (patrimônio e paz pública, respectivamente), o que não impede a imputação concomitante de ambos os delitos. Ademais, deve-se consignar que foi reconhecida a extinção da punibilidade em relação ao crime do artigo 288 do Código Penal.
Assim, mantenho a valoração negativa das circunstâncias do crime, promovida em função da qualificadora referente à fraude, eis que devidamente caracterizada no caso em apreço.
Da mesma forma, as consequências do crime devem ser consideradas desfavoráveis, haja vista a proporção do delito praticado, mediante emprego de procedimento fraudulento apto a atingir grande número de correntistas, o que ocasionou a necessidade de indenização pelas instituições financeiras lesadas. Assim, mantenho igualmente sua valoração negativa.
Em relação às demais circunstâncias judicias, não há elementos suficientes nos autos que permitam sua valoração - a culpabilidade é normal à espécie, o acusado não é portador de maus antecedentes, os motivos são inerentes ao tipo penal e nada há a respeito de sua personalidade e conduta social.
Desse modo, em detrimento do pleito defensivo, mantenho o julgamento negativo das circunstâncias e das consequências do crime. No entanto, entendo que a majoração operada na sentença de fato foi demasiada, considerando a existência de apenas duas circunstâncias judiciais desfavoráveis. Por esse motivo, redimensiono a pena-base para exasperá-la em menor proporção que aquela promovida na sentença, e estabeleço a pena da primeira etapa em 03 (três) anos de reclusão e 15 (quinze) dias-multa, esta última fixada proporcionalmente à pena privativa de liberdade e em consonância ao sistema trifásico da dosagem penal.
Na segunda etapa da dosimetria, não há circunstâncias atenuantes ou agravantes, motivo pelo qual a pena intermediária permanece no patamar de 03 (três) anos de reclusão e 15 (quinze) dias-multa.
Na terceira fase, também não estão presentes causas de aumento ou de diminuição, e a pena é fixada em 03 (três) anos de reclusão e 15 (quinze) dias-multa.
Conforme reconheceu o Juízo, os crimes de furto qualificado em apreço foram cometidos em continuidade delitiva, já que praticados em condições semelhantes de lugar, tempo e modo de execução, e com o mesmo objetivo, o que caracteriza a continuidade delitiva.
Tais circunstâncias revelam a caracterização da ficção jurídica do crime continuado, nos termos do artigo 71 do Código Penal, que prescreve: "Quando o agente, mediante mais de uma ação ou omissão, pratica dois ou mais crimes da mesma espécie e, pelas condições de tempo, lugar, maneira de execução e outras semelhantes, devem os subseqüentes ser havidos como continuação do primeiro, aplica-se-lhe a pena de um só dos crimes, se idênticas, ou a mais grave, se diversas, aumentada, em qualquer caso, de um sexto a dois terços.".
Assim, presente a figura da continuidade delitiva, mantenho o patamar de 2/3 (dois terços) aplicado pelo magistrado a quo, tendo em vista a quantidade de crimes praticados - 83 (oitenta e três) infrações - e o entendimento dos Tribunais Superiores sobre o tema (STJ, 6ª Turma, AEARESP 267.637, Rel. Min. Assusete Magalhães, DJE 13/09/2013). A pena definitiva resta, portanto, fixada em 05 (cinco) anos de reclusão e 25 (vinte e cinco) dias-multa, no valor unitário mínimo legal.
Diante do novo quantum de pena fixado, e tratando-se de condenado não reincidente e que não ostenta maus antecedentes, mantenho o regime semiaberto para início do cumprimento da pena, nos termos do artigo 33, §2º, "b", do Código Penal.
A detração prevista no artigo 387, §2º, do Código de Processo Penal não aproveita ao réu no caso.
Incabível a substituição da pena privativa de liberdade por restritivas de direitos, eis que ausentes os requisitos exigidos pelo artigo 44 do Código Penal.
V - Do dispositivo
Ante o exposto, rejeito as preliminares arguidas pelas defesas e, no mérito:
(i) dou provimento ao recurso de MARCO AURÉLIO KLEMZ para reconhecer a prescrição da pretensão punitiva estatal em relação ao crime do artigo 288 do Código Penal e, consequentemente, extinguir sua punibilidade, entendendo aos demais corréus, e absolver o apelante, com fulcro no artigo 386, inciso VII, do Código de Processo Penal, da imputação do crime previsto no artigo 155, §4º, incisos II e IV, do Código de Processo Penal;
(ii) dou parcial provimento ao apelo de VALTER ANDRÉ, para estabelecer a pena-base em menor proporção que aquela prevista na sentença e, de ofício, reconheço a incidência da atenuante de confissão prevista no artigo 65, III, "d", do Código Penal, fixando a pena definitiva em 05 (cinco) anos e 10 (dez) meses de reclusão, no regime inicial semiaberto, e 28 (vinte e oito) dias-multa, no valor unitário mínimo legal;
(iii) nego provimento à apelação de MÁRCIO TAVARES PIRATH e, de ofício, estabeleço a pena-base em menor proporção que aquela prevista na sentença, e fixo a pena definitiva em 05 (cinco) anos de reclusão, no regime inicial semiaberto, e 25 (vinte e cinco) dias-multa, no valor unitário mínimo legal;
(v) dou parcial provimento ao recurso de apelação de RAFAEL KNOLL e RODRIGO KNOLL, para estabelecer a pena-base em menor proporção que aquela prevista na sentença, e fixo a pena definitiva em 05 (cinco) anos de reclusão, no regime inicial semiaberto, e 25 (vinte e cinco) dias-multa, no valor unitário mínimo legal.
É o voto.
Documento eletrônico assinado digitalmente conforme MP nº 2.200-2/2001 de 24/08/2001, que instituiu a Infra-estrutura de Chaves Públicas Brasileira - ICP-Brasil, por: | |
Signatário (a): | JOSE MARCOS LUNARDELLI:10064 |
Nº de Série do Certificado: | 11DE20030532761D |
Data e Hora: | 01/06/2020 12:42:55 |