Diário Eletrônico

PODER JUDICIÁRIO

TRIBUNAL REGIONAL FEDERAL DA 3ª REGIÃO

D.E.

Publicado em 25/09/2020
APELAÇÃO CRIMINAL Nº 0001317-70.2012.4.03.6118/SP
2012.61.18.001317-0/SP
RELATOR : Desembargador Federal NINO TOLDO
APELANTE : Justica Publica
APELADO(A) : LUCIANA KOTAKI BOTELHO
ADVOGADO : SP174688 RODRIGO GALHARDO DE MORAES MANZANETE e outro(a)
No. ORIG. : 00013177020124036118 1 Vr GUARATINGUETA/SP

EMENTA

PENAL E PROCESSUAL PENAL. APELAÇÃO CRIMINAL. CRIME CONTRA ORDEM TRIBUTÁRIA. DEPÓSITOS SEM COMPROVAÇÃO DE ORIGEM. OMISSÃO EM DIRPJ. ART. 1º, I, DA LEI Nº 8.137/90. MATERIALIDADE, AUTORIA E DOLO COMPROVADOS. CONDENAÇÃO. DOSIMETRIA DA PENA. REGIME ABERTO. SUBSTITUIÇÃO DA PENA POR RESTRITIVAS.
1. Materialidade comprovada. Os documentos que compõem a representação fiscal para fins penais que embasou a denúncia demonstram a existência de diversos depósitos, sem comprovação de origem, em contas bancárias de titularidade da empresa administrada pela ré, omitidos das autoridades competentes, motivo pelo qual ficou caracterizada a supressão de tributos mediante omissão.
2. Autoria demonstrada. A ré era sócia administradora de fato da empresa, sendo a representante em audiências trabalhistas, além de ser a responsável por contratos e emissão de certidões negativas de débitos, o que demonstra seu conhecimento a respeito da situação fiscal da empresa.
3. O elemento subjetivo do tipo penal é o dolo genérico, ou seja, a vontade livre e consciente de omitir informação ou prestar declaração falsa às autoridades fazendárias, o que, por consequência, acarreta a supressão ou a diminuição dos tributos devidos.
4. Reforma da sentença para condenar a apelada pela prática do crime previsto no art. 1º, I, da Lei nº 8.137/90.
5. Dosimetria da pena. Pena-base fixada no mínimo legal. Ausentes circunstâncias agravantes ou atenuantes, bem como causas de diminuição de pena.
6. Aplicada a causa de aumento do art. 12, I, da Lei nº 8.137/90 porque o elevado valor de tributos reduzidos revela o grave dano causado à coletividade.
7. Reconhecida a caracterização da continuidade delitiva, pois as omissões configuram apenas um delito, ainda que delas resulte a supressão de vários tributos. Assim, é incabível a aplicação do concurso formal. Assim, é incabível a aplicação do concurso formal.
8. A prática delitiva estendeu-se por dois exercícios financeiros, em continuidade delitiva. Aumento de um quinto. Precedentes.
9. Fixado o regime aberto para início do cumprimento da pena privativa de liberdade (CP, art. 33, § 2º, "c"), que fica substituída por duas penas restritivas de direitos (CP, art. 44).
10. Apelação provida.

ACÓRDÃO

Vistos e relatados estes autos em que são partes as acima indicadas, decide a Egrégia Décima Primeira Turma do Tribunal Regional Federal da 3ª Região, por unanimidade, DAR PROVIMENTO à apelação para, reformando a sentença, condenar LUCIANA KOTAKI BOTELHO à pena de 3 (três) anos, 2 (dois) meses e 12 (doze) dias de reclusão, em regime inicial aberto, e 15 (quinze) dias-multa pela prática do crime previsto no art. 1º, I, da Lei nº 8.137/90, em continuidade delitiva, ficando a pena privativa de liberdade substituída por duas restritivas de direitos, nos termos do relatório e voto que ficam fazendo parte integrante do presente julgado, tendo o Desembargador Federal Fausto de Sanctis acompanhado com ressalva de seu entendimento pessoal acerca do critério de fixação da pena de multa.


São Paulo, 27 de agosto de 2020.
NINO TOLDO
Desembargador Federal


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APELAÇÃO CRIMINAL Nº 0001317-70.2012.4.03.6118/SP
2012.61.18.001317-0/SP
RELATOR : Desembargador Federal NINO TOLDO
APELANTE : Justica Publica
APELADO(A) : LUCIANA KOTAKI BOTELHO
ADVOGADO : SP174688 RODRIGO GALHARDO DE MORAES MANZANETE e outro(a)
No. ORIG. : 00013177020124036118 1 Vr GUARATINGUETA/SP

VOTO-VISTA

O EXCELENTÍSSIMO SENHOR DESEMBARGADOR FEDERAL JOSÉ LUNARDELLI. Cuida o caso, consoante relatório da lavra do e. Des. Fed. Nino Toldo (fl. 671/371v), ao qual me reporto para fins descritivos, de apelação interposta pelo Ministério Público Federal (MPF) em face da sentença proferida pela 1ª Vara Federal de Guaratinguetá/SP que, com fundamento no art. 386, V, do Código do Processo Penal (CPP), absolveu LUCIANA KOTAKI BOTELHO da imputação da prática do crime tipificado no art. 1º, I, da Lei nº 8.137/90.

Pedi vista dos autos para melhor analisar o conjunto probatório.

Após apreciar detidamente as provas amealhadas aos autos, acompanho integralmente as conclusões do e. Relator.

É o voto.

JOSÉ LUNARDELLI
Desembargador Federal


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APELAÇÃO CRIMINAL Nº 0001317-70.2012.4.03.6118/SP
2012.61.18.001317-0/SP
RELATOR : Desembargador Federal NINO TOLDO
APELANTE : Justica Publica
APELADO(A) : LUCIANA KOTAKI BOTELHO
ADVOGADO : SP174688 RODRIGO GALHARDO DE MORAES MANZANETE e outro(a)
No. ORIG. : 00013177020124036118 1 Vr GUARATINGUETA/SP

RELATÓRIO

O SENHOR DESEMBARGADOR FEDERAL NINO TOLDO (Relator): Trata-se de apelação interposta pelo Ministério Público Federal (MPF) em face da sentença proferida pela 1ª Vara Federal de Guaratinguetá/SP que, com fundamento no art. 386, V, do Código de Processo Penal, absolveu LUCIANA KOTAKI BOTELHO da imputação de prática do crime previsto no art. 1º, I, da Lei nº 8.137/90.


A denúncia (fls. 262/267), oferecida originalmente nos autos nº 0001892-54.2007.403.6118 e recebida em 26.06.2009 (fls. 268), narra:


Consta dos autos do incluso inquérito policial que, nos anos de 2000 e 2001, no município de Lorena/SP, Joaquim Mariano da Silva Neto e Luciana Kotaki Botelho, na qualidade de sócios da empresa "Vaptrans Transporte Rodoviário Ltda.", CNPJ nº 03.036.770/0001, conscientes e com livre propósito de suas vontades, reduziram imposto de renda pessoa jurídica (IRPJ) contribuição para o programa de integração social (PIS), contribuição social sobre o lucro líquido (CSLL) e contribuição para financiamento da seguridade social (COFINS), mediante a omissão de informações às autoridade fazendárias consistentes créditos bancários em favor da referida empresa. (...)
Com efeito, no exercício de suas atividades comerciais, a empresa acima citada, representada pelos denunciados, no ano de 2000, foi beneficiada com créditos bancários no montante de R$ 11.550.000,00 (onze milhões, quinhentos e cinquenta mil reais), os quais não tiveram origem comprovada. O valor foi creditado mediante o depósito, na conta nº 0024-8-04.000.594-0 da "Nossa Caixa S.A.", de cheques emitidos por Roberto Fuglini.
Ademais, no ano de 2001, a empresa foi novamente beneficiada com depósitos bancários no montante de R$ 57.85.000,58 (cinquenta e sete milhões, oitocentos e quinze mil reais e cinquenta e oito centavos), os quais não tiveram origem comprovada. (...) Em atenção a estes fatos, a Delegacia da Receita Federal em Taubaté/SP instaurou o procedimento administrativo fiscal nº 16045.000341/2006.01 (fs. 05/103) ao fim do qual foi lavrado auto de infração em desfavor da empresa "Vaptrans Transporte Rodoviário Ltda.", no qual foi apurado o montante de R$ 1.387.299,96 (um milhão, trezentos e oitenta e sete mil, duzentos e noventa e nove reais e noventa e seis centavos) devido a título de IRPJ, de R$ 450.872,44 (quatrocentos e cinquenta mil, oitocentos e setenta e dois reais e quarenta e quatro centavos) devido a título de PIS, de R$ 745.781,96 (setecentos e quarenta e cinco mil, setecentos e oitenta e um reais e noventa e seis centavos) devido a título de CSLL, e de R$ 2.080.949,96 (dois milhões, oitenta mil, novecentos e quarenta e nove reais e noventa e seis centavos) devido a título de COFINS, perfazendo o total de R$ 4.66.904,32 (quatro milhões seiscentos e sessenta e quatro mil, novecentos e quatro reais e trinta e dois centavos).

Houve o desmembramento do feito em relação à apelada, ante as infrutíferas tentativas de sua citação (fls. 549), o que gerou o presente feito. A sentença (fls. 645/648v) foi publicada em 10.12.2018 (fls. 649).


Em seu recurso (fls. 653/656), o MPF sustenta que as provas produzidas são suficientes para comprovar a autoria e o dolo, uma vez que a acusada era responsável pela gestão de contratos, pela obtenção de certidão negativa de débitos tributários e representava a empresa perante a Justiça Trabalhista, o que denota sua ativa participação na administração, sendo sua a responsabilidade pela omissão de depósitos feitos na conta bancária da empresa e, portanto, pela prática do crime previsto no art. 1º, I, da Lei nº 8.137/90.


Contrarrazões a fls. 659/665.


A Procuradoria Regional da República opinou pelo provimento da apelação (fls. 667/669).


É o relatório. À revisão.


NINO TOLDO
Desembargador Federal


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Data e Hora: 29/06/2020 19:01:18



APELAÇÃO CRIMINAL Nº 0001317-70.2012.4.03.6118/SP
2012.61.18.001317-0/SP
RELATOR : Desembargador Federal NINO TOLDO
APELANTE : Justica Publica
APELADO(A) : LUCIANA KOTAKI BOTELHO
ADVOGADO : SP174688 RODRIGO GALHARDO DE MORAES MANZANETE e outro(a)
No. ORIG. : 00013177020124036118 1 Vr GUARATINGUETA/SP

VOTO

O SENHOR DESEMBARGADOR FEDERAL NINO TOLDO (Relator): Trata-se de apelação interposta pelo Ministério Público Federal (MPF) em face da sentença que, com fundamento no art. 386, V, do Código de Processo Penal, absolveu LUCIANA KOTAKI BOTELHO da imputação de prática do crime previsto no art. 1º, I, da Lei nº 8.137/90.


O juízo a quo fundamentou a absolvição na insuficiência de provas da participação da ré na efetiva administração da empresa, pois teria sido incluída como sócia apenas formalmente.


O apelante pede a reforma da sentença, argumentando que as provas produzidas são suficientes para demonstrar a autoria e o dolo e, em razão disso, pugna pela condenação da ré pela prática do crime de sonegação fiscal.


Procede o recurso.


A materialidade está devidamente comprovada pela representação fiscal para fins penais (fls. 02/05), pelos autos de infração (fls. 16/18, 24/26, 32/34 e 40/41), pelo relatório fiscal e pelo julgamento da impugnação administrativa do contribuinte (fls. 77/95), em que se constata a existência de diversos depósitos, sem comprovação de origem, em contas bancárias de titularidade da empresa "Vaptrans Transporte Rodoviário Ltda.", omitidos das autoridades competentes nos anos de 2000 e 2001.


Intimada a comprovar a origem dos valores omitidos da Declaração de Imposto de Renda de Pessoa Jurídica, a empresa deixou de apresentar provas, gerando um crédito tributário de R$ 1.159.299,96 (um milhão, cento e cinquenta e nove mil duzentos e noventa e nove reais e noventa e seis centavos) a título de IRPJ; R$ 450.872,44 (quatrocentos e cinquenta mil oitocentos e setenta e dois reais e quarenta e quatro centavos) a título de PIS; R$ 2.080.949,96 (dois milhões e oitenta mil novecentos e quarenta e nove reais e noventa e seis centavos) a título de COFINS e R$ 745.781,96 (setecentos e quarenta e cinco mil setecentos e oitenta e um reais e noventa e seis centavos) a título de CSLL.


A autoria está igualmente comprovada. Em seu interrogatório em juízo, a apelada afirmou que desconhecia os depósitos feitos nas contas bancárias da empresa, asseverando que era sócia apenas no papel e, na prática, atuava como funcionária de Joaquim Mariano da Silva, cuidando apenas da logística do transporte de combustíveis. Alegou que não sabia de problemas com a Receita Federal nem tinha acesso à contabilidade da empresa (CD fls. 608).


A testemunha de defesa Almir Jorge da Silva corroborou em parte as alegações da ré, uma vez que confirmou que a administração da empresa era atribuição de Joaquim Mariano da Silva, bem como que todas as questões de manutenção eram tratadas diretamente com ele (CD fls. 608).


No entanto, a versão da ré não encontra amparo nos demais elementos probatórios constantes nos autos. Ainda que as declarações da testemunha de defesa sejam coerentes com a narrativa da acusada e com a disposição do contrato social de que a administração da sociedade era incumbência de Joaquim Mariano da Silva Neto (fls. 56), observa-se que a testemunha era funcionário responsável pela manutenção e, por isso, não tinha conhecimento da administração da empresa propriamente dita, tanto que assumiu não ter nenhum contato com a gerência.


De todo modo, confirmou que a apelada cuidava dos contratos da empresa, fato também assumido por ela em seu interrogatório, o que denota que detinha conhecimento de clientes e montantes negociados pela empresa. Portanto, tinha ciência dos valores que transitavam pelas contas bancárias.


Ademais, é inverossímil a que a acusada atuasse como mera funcionária, pois representou a empresa "Vaptrans Transporte Rodoviário Ltda." em diversas audiências trabalhistas, perante o Tribunal Regional do Trabalho da 15ª Região, consoante extratos de fls. 615/618v.


A própria ré também assumiu que era de sua responsabilidade a emissão de certidão negativa de débitos, necessária para fechamento de contratos. Logo, não é crível que ignorasse a situação do pagamento de tributos da empresa.

Assim, a defesa não se desincumbiu do ônus de provar suas alegações, nos termos do que dispõe o art. 156, primeira parte, do Código de Processo Penal.


O elemento subjetivo do crime tipificado no art. 1º, I, da Lei nº 8.137/90 é o dolo genérico, ou seja, a vontade livre e consciente de omitir informação ou prestar declaração falsa às autoridades fazendárias, o que, por consequência, acarreta a supressão ou a diminuição dos tributos devidos. Nesse sentido:


AGRAVO REGIMENTAL NO RECURSO ESPECIAL. CRIME CONTRA A ORDEM TRIBUTÁRIA. FRAUDE. SONEGAÇÃO. NULIDADE. PROCEDIMENTO ADMINISTRATIVO-FISCAL. SÚMULA 7/STJ. DOLO ESPECÍFICO. DESNECESSIDADE. PENA-BASE. MAJORAÇÃO. EXPRESSIVO VALOR SONEGADO. SÚMULA 83/STJ. AGRAVO REGIMENTAL DESPROVIDO.
1. O processo criminal não é a via adequada para a impugnação de eventuais nulidades ocorridas no procedimento administrativo de lançamento do crédito tributário. Súmula 7/STJ. Precedentes.
2. Em crimes de sonegação fiscal e de apropriação indébita de contribuição previdenciária, este Superior Tribunal de Justiça pacificou a orientação no sentido de que sua comprovação prescinde de dolo específico sendo suficiente, para a sua caracterização, a presença do dolo genérico consistente na omissão voluntária do recolhimento, no prazo legal, dos valores devidos.
(...)
6. Agravo Regimental desprovido.
(STJ, AgRg no REsp 1.553.252/PR, Quinta Turma, Rel. Min. Reynaldo Soares da Fonseca, j. 07.11.2017, DJe 13.11.2017)

No caso, à luz das provas constantes dos autos, é certo que a apelada era administradora de fato da "Vaptrans Transporte Rodoviário Ltda." e tinha plena ciência dos valores que transitaram na conta bancária da empresa entre 2000 e 2001, cuja origem não foi comprovada, nem o montante declarado em Declaração de Imposto de Renda Pessoa Jurídica.


Portanto, comprovadas a materialidade, a autoria e o dolo, provejo o recurso do MPF para reformar a sentença e condenar LUCIANA KOTAKI BOTELHO pela prática do crime previsto no art. 1º, I, da Lei nº 8.137/90.


Passo à dosimetria da pena.


Na primeira fase, fixo a pena-base no mínimo legal, ou seja, 2 (dois) anos de reclusão e 10 (dez) dias-multa, pois não verifico circunstâncias judiciais do art. 59 do Código Penal desfavoráveis à acusada. O valor de tributos sonegados será avaliado na terceira fase da dosimetria da pena.


Na segunda fase, não reconheço a circunstâncias agravantes nem atenuantes, permanecendo inalterada a pena intermediária.


Na terceira fase, não verifico causa de diminuição da pena a ser aplicada, mas aplico as causas de aumento previstas no art. 12, I, da Lei nº 8.137/90 (grave dano à coletividade decorrente do valor do tributo sonegado) e no art. 71 do Código Penal (continuidade delitiva).


Embora a supressão ou redução do tributo seja elementar do tipo penal, o expressivo valor sonegado pode, validamente, amparar a majoração da pena pela aplicação do art. 12, I, da Lei nº 8.137/90. No caso, os expressivos valores de tributos ilegalmente reduzidos (R$ 450.872,44 a título de PIS; R$ 2.080.949,96 a título de COFINS; R$ 745.781,96 a título de CSLL e R$ 1.159.299,96 a título de IRPJ) revelam o grave dano causado à coletividade, pois o montante sonegado deixou de ingressar nos cofres públicos para que pudesse ser aplicado pelo Estado no exercício de suas atividades financeiras, o que atinge a sociedade como um todo. Em razão disso, aumento a pena em 1/3 (um terço), resultando em 2 (dois) anos e 8 (oito) meses de reclusão e 13 (treze) dias-multa.


O MPF pede na denúncia a condenação da ré por quatro vezes, na forma do art. 70 do Código Penal, pelo ano de 2000 e por quatro vezes pelo ano de 2001. No entanto, reconheço a caracterização da continuidade delitiva, pois as omissões configuram apenas um delito, ainda que delas resulte a supressão de vários tributos. Assim, é incabível a aplicação do concurso formal.


Anoto que a continuidade delitiva está descrita na denúncia e, portanto, não há inovação no reconhecimento do art. 71 Código Penal.


Quanto à fração aplicável, deve ser proporcional à quantidade de ações perpetradas, conforme a jurisprudência deste Tribunal (ACR 0000040-45.2005.4.03.6124/SP. Segunda Turma. Rel. Des. Federal Nelton dos Santos. j. 15.05.2012. e-DJF3 Judicial 1 24.05.2012).


No caso, a prática delitiva estendeu-se por dois exercícios financeiros, 2000 e 2001, de modo que, em razão da continuidade delitiva, aplico o aumento à razão de 1/5 (um quinto), totalizando a pena de 3 (três) anos, 2 (dois) meses e 12 (doze) dias de reclusão e 15 (quinze) dias-multa, a qual torno definitiva, fixando o valor unitário do dia-multa no mínimo legal, ante a situação econômica declarada pela ré (CD fls. 608).


Considerando o montante da pena aplicado e as circunstâncias favoráveis à acusada (CP, art. 59), fixo o regime aberto para início do cumprimento da pena privativa de liberdade (CP, art. 33, §§ 2º e 3º).


Presentes os requisitos do art. 44 do Código Penal, substituo a pena privativa de liberdade por duas penas restritivas de direitos, consistentes em: i) prestação pecuniária, no valor de um salário mínimo vigente na data do pagamento, em favor de entidade pública ou privada com destinação social (CP, art. 45, § 1º) a ser indicada pelo juízo da execução penal; e ii) prestação de serviços à comunidade ou a entidades públicas, pelo prazo da pena corporal substituída, em instituição a ser indicada pelo juízo da execução penal.


Posto isso, DOU PROVIMENTO à apelação para, reformando a sentença, condenar LUCIANA KOTAKI BOTELHO à pena de 3 (três) anos, 2 (dois) meses e 12 (doze) dias de reclusão, em regime inicial aberto, e 15 (quinze) dias-multa pela prática do crime previsto no art. 1º, I, da Lei nº 8.137/90, em continuidade delitiva, ficando a pena privativa de liberdade substituída por duas restritivas de direitos, nos termos da fundamentação supra.


É o voto.


NINO TOLDO
Desembargador Federal


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Data e Hora: 28/07/2020 09:03:55