Diário Eletrônico

PODER JUDICIÁRIO

TRIBUNAL REGIONAL FEDERAL DA 3ª REGIÃO

D.E.

Publicado em 25/09/2020
APELAÇÃO CRIMINAL Nº 0006592-39.2011.4.03.6181/SP
2011.61.81.006592-6/SP
RELATOR : Desembargador Federal JOSÉ LUNARDELLI
APELANTE : ALESSANDRO ANTONIO DA SILVA
ADVOGADO : SP303035 MIRELLA MARIE KUDO (Int.Pessoal)
: SP0000DPU DEFENSORIA PUBLICA DA UNIAO (Int.Pessoal)
APELADO(A) : Justica Publica
EXCLUIDO(A) : MANOEL SILVA PASSOS (desmembramento)
No. ORIG. : 00065923920114036181 5P Vr SAO PAULO/SP

EMENTA

PENAL E PROCESSUAL PENAL. DIVULGAÇÃO DE INFORMAÇÃO SIGILOSA SEM JUSTA CAUSA. SENHA INFOSEG. ART. 153 § 2º DO CÓDIGO PENAL. MATERIALIDADE COMPROVADA POR MATÉRIA JORNALÍSTICA EXIBIDA NO SBT. AUTORIA DELITIVA NÃO COMPROVADA EM JUÍZO SOB O CRIVO DO CONTRADITÓRIO E DA AMPLA DEFESA. ABSOLVIÇÃO DO RÉU. INTELIGÊNCIA DO ART. 155 DO CÓDIGO DE PROCESSO PENAL.
1. Segundo narra a denúncia, nos dias 28 e 29 de agosto de 2008, o programa jornalístico do Sistema Brasileiro de Televisão - SBT transmitiu reportagens relativas à venda ilegal de senhas privativas de acesso ao INFOSEG, sistema que reúne informações de segurança pública, justiça e fiscalização, de uso restrito e dependente de convênio e senha de acesso.
2. Materialidade comprovada pelas matérias jornalísticas documentadas em mídia "DVD", e pelo Laudo nº 01.060.61861/2008, elaborado pelo instituto de Criminalística, o qual corrobora a prática da conduta delituosa em questão, trazendo a descrição ds reportagens jornalísticas em comento.
3. Autoria delitiva não comprovada em Juízo. As imagens contidas na referida mídia "DVD" não são suficientes para identificar o apelante como autor do delito, uma vez que o rosto não é mostrado de forma precisa.
4. A confissão do acusado, na fase policial, não foi repetida em juízo, sob o crivo do contraditório e da ampla defesa. Ademais, o ora apelante não estava acompanhado de advogado em tal ocasião, bem como o termo de interrogatório sequer foi assinado por duas testemunhas.
5. Por fim, as únicas duas testemunhas ouvidas em juízo nada puderam esclarecer sobre os fatos, conforme se depreende da descrição dos depoimentos, feita pela própria sentença apelada.
6. Não há provas colhidas sob o crivo do contraditório e da ampla defesa que demonstrem, de forma insofismável, que o apelante foi autor do crime narrado na denúncia e descrito no art. 153, § 1º-A e § 2º, Código Penal. Não foram trazidas a juízo pela acusação testemunhas que apontassem elementos consistentes de autoria, bem como o réu não foi ouvido para confirmar sua confissão na fase policial.
7. Não obstante seja provável que o apelante tenha praticado os fatos narrados na denúncia (o que se extrai das provas produzidas na fase inquisitiva), inafastável a conclusão de que a acusação não se desincumbiu de seu ônus de comprovar, judicialmente, a autoria delitiva. Em vista de tais elementos, tem-se que a autoria delitiva não restou minimamente demonstrada em juízo, pelo que a sentença deve ser reformada.
8. Uma condenação, em especial na esfera criminal, deve estar lastreada em certeza, tanto no que se refere à ocorrência concreta de conduta típica (sob o prisma objetivo e sob o prisma subjetivo, e analisada eventual insignificância jurídico-penal do fato) nos termos da denúncia, quanto no que tange à autoria e à inexistência de excludentes de qualquer espécie. Um mero juízo de probabilidade, ainda que esta possa ser considerada "acentuada", "muito real", ou dotada de outras qualificações símiles, não basta para a condenação criminal de um réu, que apenas se legitima juridicamente frente a um juízo de certeza, devidamente escorado em conjunto fático-probatório coeso e firme no sentido da eventual condenação.
9. Inexistindo prova judicial que demonstre a autoria delitiva de forma indene de dúvida, não há que se falar em condenação, pois a dúvida deve ser revertida em favor do réu, em observância ao princípio do in dubio pro reo.
10. Apelação provida para absolver o réu.

ACÓRDÃO

Vistos e relatados estes autos em que são partes as acima indicadas, decide a Egrégia Décima Primeira Turma do Tribunal Regional Federal da 3ª Região, por unanimidade, dar provimento à apelação defensiva para absolver ALESSANDRO ANTONIO DA SILVA, com fundamento no art. 386, inciso VII, do Código de Processo Penal, nos termos do relatório e voto que ficam fazendo parte integrante do presente julgado.

São Paulo, 10 de setembro de 2020.
JOSÉ LUNARDELLI
Desembargador Federal


Documento eletrônico assinado digitalmente conforme MP nº 2.200-2/2001 de 24/08/2001, que instituiu a Infra-estrutura de Chaves Públicas Brasileira - ICP-Brasil, por:
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APELAÇÃO CRIMINAL Nº 0006592-39.2011.4.03.6181/SP
2011.61.81.006592-6/SP
RELATOR : Desembargador Federal JOSÉ LUNARDELLI
APELANTE : ALESSANDRO ANTONIO DA SILVA
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EXCLUIDO(A) : MANOEL SILVA PASSOS (desmembramento)
No. ORIG. : 00065923920114036181 5P Vr SAO PAULO/SP

RELATÓRIO


O EXCELENTÍSSIMO SENHOR DESEMBARGADOR FEDERAL JOSÉ LUNARDELLI:


Trata-se de Apelação Criminal interposta por Alessandro Antônio da Silva em face da r. sentença de fls. 688/727, proferida pela M.M Juíza Federal Maria Isabel do Prado, que o condenou à pena de 02 (dois) anos, 01 (um) mês e 15 (quinze) dias de detenção, em regime aberto, e ao pagamento de 144 (cento e quarenta e quatro) dias-multa, pela prática do crime previsto no art. 153, §§1º 1º-A e 2º do Código Penal.


Segundo narra a denúncia, nos dias 28 e 29 de agosto de 2008, o programa jornalístico do Sistema Brasileiro de Televisão - SBT transmitiu reportagens relativas à venda ilegal de senhas privativas de acesso ao INFOSEG, sistema que reúne informações de segurança pública, justiça e fiscalização, de uso restrito e dependente de convênio e senha de acesso.


Nas aludidas reportagens, Fábio Diamente (repórter do SBT) negociava a venda da senha do citado sistema com uma pessoa até então não identificada, bem como demonstrava o acesso a várias informações sigilosas, tais como antecedentes criminais, cadastro de veículos e armas, carteiras de habilitação, informações societárias e bases de dados da Receita Federal. Tais fatos foram noticiados à Polícia Civil, que iniciou investigações.


Durante diligência policial realizada na Rua Santa Ifigênia, São Paulo/SP, Renato Silva Marques foi detido em posse de softwares aparentemente contrafeitos. Indagado, Renato negou comercializar senhas do Sistema INFOSEG, mas indicou as pessoas de vulgos "Milão" e "Ódio" como as responsáveis por tal venda, posteriormente identificados como Alessandro e Manoel da Silva Passos.


Nestes termos, foi imputado a Alessandro e Manoel a prática do crime de divulgação de informações sigilosas, previsto no art. 153, §§1º -A e 2º, ambos do Código Penal (fls. 359/360).


A denúncia foi recebida em 25/03/2013 (fls. 361/363)

O feito foi desmembrado com relação a Manoel, oportunidade em que também houve a suspensão do processo e do curso do prazo prescricional, pois, apesar de citado por edital (fls. 437), o corréu não compareceu em Juízo e tampouco constituiu advogado (fls. 495/496.v).


A sentença condenatória foi publicada em 10/08/2018 (fls. 728).


Em suas razões de apelação, a defesa de Alessandro pleiteia: (i) absolvição por suposta ausência de provas da materialidade e da autoria delitivas; ou, subsidiariamente, (ii) a fixação da pena-base no mínimo legal; (iii) a aplicação da atenuante da confissão espontânea; (iv) a redução da pena de multa; (v) a substituição da pena privativa de liberdade por restritivas de direitos; e (vi) a isenção do pagamento de custas processuais (fls. 752/790).


Contrarrazões do Ministério Público Federal (fls. 792/797).


Parecer da Procuradoria Regional da República, pelo parcial provimento do recurso de apelação de Alessandro Antônio da Silva, apenas para que haja o reconhecimento da incidência da atenuante prevista no art. 65, III, "d", do Código Penal, bem como para, por consequência, a pena de multa seja fixada de forma proporcional à pena privativa de liberdade.


É relatório.


Dispensada a revisão.


JOSÉ LUNARDELLI
Desembargador Federal


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APELAÇÃO CRIMINAL Nº 0006592-39.2011.4.03.6181/SP
2011.61.81.006592-6/SP
RELATOR : Desembargador Federal JOSÉ LUNARDELLI
APELANTE : ALESSANDRO ANTONIO DA SILVA
ADVOGADO : SP303035 MIRELLA MARIE KUDO (Int.Pessoal)
: SP0000DPU DEFENSORIA PUBLICA DA UNIAO (Int.Pessoal)
APELADO(A) : Justica Publica
EXCLUIDO(A) : MANOEL SILVA PASSOS (desmembramento)
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VOTO

O EXCELENTÍSSIMO SENHOR DESEMBARGADOR FEDERAL JOSÉ LUNARDELLI:

Da materialidade delitiva

Segundo a sentença apelada, a materialidade foi devidamente comprovada pelas matérias jornalísticas documentadas em mídia "DVD" (fls. 10 do Apenso I) e pelo Laudo nº 01.060.61861/2008 (fls. 209/237), elaborado pelo instituto de Criminalística, o qual corrobora a prática da conduta delituosa em questão, trazendo a descrição ds reportagens jornalísticas em comento.

Com efeito, o citado laudo pericial destaca que:

"A reportagem mostra imagens da Rua Santa Ifigênia, e diz na rua Santa Ifigênia, no centro de São Paulo, por dois mil reais, quadrilhas vendem senhas do INFOSEG. A reportagem diz que com uma câmera escondida foram ao encontro de um dos vendedores. Registram a passagem pela frente da delegacia responsável pelo policiamento da região. A reportagem mostra as imagens de um bar, onde segundo a reportagem o negócio é fechado. Conforme a reportagem o vendedor passa o login, que é um número de CPF, e a senha é infoseg 01 e o "i" é em minúsculo". Segundo a reportagem, a senha funciona, e as imagens mostram o pagamento em dinheiro.
A reportagem continua agora, com imagem de um repórter, Fábio Diamante, em frente ao computador, onde aparentemente acessa o INFOSEG.
Segundo Fábio, na tela principal do INFOSEG é possível descobrir dados sigilosos da maioria dos brasileiros. As imagens mostram Fábio consultando a tela do computador, e Fábio diz que encontra os antecedentes criminais, os cadastros de veículos, armas, todas as carteieras de habilitação, e a base de dados da Receita Federal. Fábio didiga o nome de um dos principais empresários do país e diz que a vida toda dele está na tela, endereço, telefones, planos dos carros e o nome de todas as empresas que ele comanda, incluindo cada um dos sócios." (fls. 215).

Outrossim, em depoimento prestado perante a autoridade policial, o repórter Fábio Diamante confirmou que apresentou parte da reportagem cujo teor era a venda de senha para acesso ao sistema INFOSEG (fls. 284/285).

Nestes termos, tais elementos de prova teriam demonstrado a divulgação, sem justa causa, de informações sigilosas e/ou reservadas, assim definidas em lei, mediante venda ilícita de senha privativa de acesso ao banco de dados ao sistema informatizado da rede INFOSEG.

Da autoria delitiva

Por sua vez, a autoria delitiva teria sido demonstrada pelas imagens das reportagens contidas na mídia "DVD" (00:52 a 00:57; 1:02 a 1:18 e 1:22 a 1:24 do arquivo sbt infosegl.wmv) (fls. 10 do Apenso I), que revelam que o ora apelante Alessandro vendeu ilicitamente senha privativa de acesso ao banco de dados do sistema informatizado da rede INFOSEG.

Além disso, perante a autoridade policial, Alessandro admitira que vendeu 1 (uma) senha do sistema INFOSEG a um repórter do SBT, a qual teria sido obtida através do fornecedor "Washington", pelo valor de R$800,00 (oitocentos reais). Afirmou conhecer uma pessoa de alcunha "ÓDIO", que também vende programas de computador (fls. 82/83). Admitira também ter feito a intermediação da venda da senha, apontando como fornecedor "Washington". Ainda, reconhecera sua imagem ao assistir a reportagem questionada, na qual aparece com cabelos "rastafári", óculos escuros e a mesma camisa e estampa xadrez que usou por ocasião do interrogatório (fls. 69/70, 82/83 e 305/306).

Por sua vez, o corréu Manoel da Silva Passos (cujo processo foi desmembrado por ausência de citação e de nomeação de advogado), vulgo "Ódio", perante a autoridade policial, admitiu a venda de programas contrafeitos "(...) que uma senha, em 26 de agosto de 2008, vendeu através de um outro ambulante de nome "Milão", recebendo R$ 500,00 e que esta terceira vez foi passada no SBT, uma vez que foi um repórter o comprador, fato este desconhecido pelo interrogando; que se lembra que no dia 02, segunda feira, foi abordado por um jovem de cor branca, aparentando 22 anos e que se trajava de roupas comuns o qual disse que precisava comprar uma senha de INFOSEG; que disse a ele que não tinha, mas que conseguiria obter para o dia seguinte."

Além da confissão do réu, a testemunha Renato Silva Marques, em sede policial (fls. 31/32 do apenso I), declarou que vendia programas de computador contrafeitos na rua Santa Ifigênia, mas não aqueles contendo dados sigilosos da Receita Federal ou do INSS tampouco senhas para o INFOSEG. Esclareceu que tais programas de dados sigilosos de órgãos públicos federais e senhas para o INFOSEG eram comercializadas na Rua Santa Ifigênia por dois vendedores ambulantes. A esse respeito, transcreve-se:

(...) a saber, um senhor que atende pela alcunha "ÓDIO", Manoel "de tal", de características físicas, sexo masculino, branco (loiro), calvo, idade aparente 33 anos, gordo, e que reside no bairro do Itaim Paulista, não sabendo precisar seu endereço correto e, também uma outra pessoa de alcunha "Milão", de nome e qualificação ignorada, de características físicas, sexo masculino, negro, cabelos compridos, tipo "rastafári", idade aparente 27 anos, magro, de endereço ignorado, ambos são vistos constantemente perambulando pela Rua Sta Ifigênia e, comenta-se pela imediações da Rua Sta Ifigênia que tais pessoas possuem este tipo de programa contrafeito para vender e, quando alguém solicita este tipo de programa ao int. e a outros vendedores ambulantes é orientado a procurar "ÓDIO" ou "MILÃO". (...).

Ocorre que, na fase judicial, as provas de autoria delitiva não foram ratificadas. Vejamos.

De início, ressalte-se que as imagens contidas na mídia "DVD" (fls. 10 do apenso) não são suficientes para identificar Alessandro como autor do delito, uma vez que o rosto não é mostrado de forma precisa.

A confissão do acusado, na fase policial (fls. 82/83), não foi repetida em juízo, sob o crivo do contraditório e da ampla defesa. Ademais, o ora apelante não estava acompanhado de advogado em tal ocasião, bem como o termo de interrogatório sequer foi assinado por duas testemunhas.

Por fim, as únicas duas testemunhas ouvidas em juízo nada puderam esclarecer sobre os fatos, conforme se depreende da descrição dos depoimentos, feita pela própria sentença apelada (fls. 696-v/697), in verbis:

"Eis a Prova Oral colhida na Fase Judicial:
A testemunha Reinaldo Noronha Zacharvik, um dos policiais responsáveis pela operação realizada na Rua Santa Ifigênia na data dos fatos, declarou que foi solicitado pelo Delegado de Polícia para que fossem realizadas investigações na área, em virtude de reportagem transmitida pelo SBT, sobre a venda de CDs contendo senhas INFOSEG, e que, por conta disso, haviam logrado êxito em senhas prender alguns indivíduos que comercializavam tais senhas. Disse que na Santa Ifigênia havia várias pessoas vendendo tais CDs (fls. 584/585, e mídia de fls. 586).
A testemunha Renato Silva Marques informou que na época trabalhava na Santa Ifigênia, e que policiais o levaram, perguntando se ele conhecia os réus, e quem vendia tais senhas, porém ele não sabia quem eram tais pessoas; afirmou que, embora não tenha reconhecido os réus, soube das apreensões (fls. 665, e mídia de fls. 666)."

Como se vê, não há provas colhidas sob o crivo do contraditório e da ampla defesa que demonstrem, de forma insofismável, que o acusado Alessandro Antonio da Silva foi autor do crime narrado na denúncia e descrito no art. 153, § 1º-A e § 2º, Código Penal. Não foram trazidas a juízo pela acusação testemunhas que apontassem elementos consistentes de autoria, bem como o réu não foi ouvido para confirmar sua confissão na fase policial.

Como é cediço, elementos colhidos na fase de investigação, não corroborados por provas produzidas em juízo sob o crivo do contraditório e da ampla defesa, não são aptos a embasar condenação penal, consoante dispõe o art. 155 do Código de Processo Penal.

Nesse sentido, trago os seguintes precedentes:

"PENAL E PROCESSO PENAL. AGRAVO REGIMENTAL NO AGRAVO EM RECURSO ESPECIAL. CONTRARIEDADE AO ART. 155 DO CPP. CONDENAÇÃO BASEADA EM PROVAS COLHIDAS NA FASE INQUISITORIAL E EM JUÍZO. AUSÊNCIA DE ILEGALIDADE. ACÓRDÃO EM CONFORMIDADE COM A JURISPRUDÊNCIA DESTA CORTE. SÚMULA 568/STJ. AGRAVO REGIMENTAL A QUE SE NEGA PROVIMENTO. 1. "Nos termos do art. 155 do CPP, é vedada a condenação fundada exclusivamente em elementos informativos do inquérito policial, não submetidos ao crivo do contraditório e da ampla defesa. A existência de prova judicializada a amparar a condenação afasta a violação do art. 155 do Código de Processo Penal". (AgRg no AREsp 757.610/RJ, Rel. Ministro NEFI CORDEIRO, SEXTA TURMA, julgado em 13/12/2016, DJe 19/12/2016). Súmula 568 do STJ. 2. Agravo regimental a que se nega provimento." (AGARESP 201701112585, MARIA THEREZA DE ASSIS MOURA, STJ - SEXTA TURMA, DJE DATA:21/06/2017);
"PENAL E PROCESSO PENAL. RECURSO ESPECIAL. NEGATIVA DE VIGÊNCIA AO ART. 155 DO CPP. OCORRÊNCIA. CONDENAÇÃO FUNDAMENTADA EXCLUSIVAMENTE EM ELEMENTOS DO INQUÉRITO POLICIAL. IMPOSSIBILIDADE. OFENSA À GARANTIA DO DEVIDO PROCESSO LEGAL, DO CONTRADITÓRIO E DA AMPLA DEFESA. VIOLAÇÃO AO ART. 386, VII, DO CPP. OCORRÊNCIA. AUSÊNCIA DE PROVA SUFICIENTE PARA A CONDENAÇÃO. RECURSO ESPECIAL A QUE SE DÁ PROVIMENTO. 1. Segundo entendimento desta Corte, a prova idônea para arrimar sentença condenatória deverá ser produzida em juízo, sob o crivo do contraditório e da ampla defesa, de modo que se mostra impossível invocar para a condenação, somente elementos colhidos no inquérito, se estes não forem confirmados durante o curso da instrução criminal. 2. Não existindo, nos autos, prova judicializada suficiente para a condenação, nos termos do que reza o artigo 386, inciso VII, do Código de Processo Penal, impõe-se a absolvição do recorrente. 3. Recurso especial provido para, reconhecendo a violação aos artigos 155 e 386, inciso VII, ambos do Código de Processo Penal, absolver o recorrente."
(STJ. RESP 201100559720. Ministra Maria Thereza de Assis Moura. Sexta Turma. DJE 19/10/2011);
"HABEAS CORPUS. ROUBO CIRCUNSTANCIADO PELO CONCURSO DE PESSOAS. SENTENÇA ABSOLUTÓRIA. ACÓRDÃO CONDENATÓRIO EMBASADO EXCLUSIVAMENTE EM ELEMENTOS INFORMATIVOS COLHIDOS DURANTE O INQUÉRITO POLICIAL. OFENSA À GARANTIA DO DEVIDO PROCESSO LEGAL. CONSTRANGIMENTO ILEGAL EVIDENCIADO. ORDEM CONCEDIDA.
1. Em respeito à garantia constitucional do devido processo legal, a legitimidade do poder-dever do Estado aplicar a sanção prevista em lei ao acusado da prática de determinada infração penal deve ser exercida por meio da ação penal, no seio da qual ser-lhe-á assegurada a ampla defesa e o contraditório .
2. Visando afastar eventuais arbitrariedades, a doutrina e a jurisprudência pátrias já repudiavam a condenação baseada exclusivamente em elementos de prova colhidos no inquérito policial.
3. Tal vedação foi abarcada pelo legislador ordinário com a alteração da redação do artigo 155 do Código de Processo Penal, por meio da Lei n. 11.690/2008, o qual prevê a proibição da condenação fundada exclusivamente nos elementos informativos colhidos na investigação .
4. Constatado que o Tribunal de origem utilizou-se unicamente de elementos informativos colhidos no inquérito policial para embasar o édito condenatório em desfavor da paciente, imperioso o reconhecimento da ofensa à garantia constitucional ao devido processo legal.
[...]." (STJ. HC 118296 / SP. Ministro JORGE MUSSI. Quinta Turma. DJe 14/02/2011).

Destarte, não obstante seja provável que o apelante tenha praticado os fatos narrados na denúncia (o que se extrai das provas produzidas na fase inquisitiva), inafastável a conclusão de que a acusação não se desincumbiu de seu ônus de comprovar, judicialmente, a autoria delitiva. Em vista de tais elementos, tem-se que a autoria delitiva não restou minimamente demonstrada em juízo, pelo que a sentença deve ser reformada.

Faço um apontamento que me parece da maior relevância, conquanto seja de geral sabença. Uma condenação, em especial na esfera criminal, deve estar lastreada em certeza, tanto no que se refere à ocorrência concreta de conduta típica (sob o prisma objetivo e sob o prisma subjetivo, e analisada eventual insignificância jurídico-penal do fato) nos termos da denúncia, quanto no que tange à autoria e à inexistência de excludentes de qualquer espécie. Um mero juízo de probabilidade, ainda que esta possa ser considerada "acentuada", "muito real", ou dotada de outras qualificações símiles, não basta para a condenação criminal de um réu, que apenas se legitima juridicamente frente a um juízo de certeza, devidamente escorado em conjunto fático-probatório coeso e firme no sentido da eventual condenação.

Inexistindo prova judicial que demonstre a autoria delitiva de forma indene de dúvida, não há que se falar em condenação, pois a dúvida deve ser revertida em favor do réu, em observância ao princípio do in dubio pro reo.

Desse modo, verifica-se que o conjunto probatório é insuficiente para comprovar, com a certeza necessária, que o acusado praticou o crime previsto no art. 153, § 1º-A e § 2º, Código Penal, impondo-se a absolvição com fulcro no art. 386, inciso VII, do Código de Processo Penal.

Ante o exposto, dou provimento à apelação defensiva para absolver ALESSANDRO ANTONIO DA SILVA, com fundamento no art. 386, inciso VII, do Código de Processo Penal.

É o voto.

JOSÉ LUNARDELLI
Desembargador Federal


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