Diário Eletrônico

PODER JUDICIÁRIO

TRIBUNAL REGIONAL FEDERAL DA 3ª REGIÃO

D.E.

Publicado em 19/11/2010
REEXAME NECESSÁRIO CÍVEL Nº 0000407-52.2002.4.03.6002/MS
2002.60.02.000407-9/MS
RELATOR : Desembargador Federal HENRIQUE HERKENHOFF
PARTE AUTORA : Ministerio Publico Federal
PROCURADOR : EMERSON KALIF SIQUEIRA
PARTE RÉ : Uniao Federal
ADVOGADO : GUSTAVO HENRIQUE PINHEIRO DE AMORIM
PARTE RÉ : Instituto Nacional de Colonizacao e Reforma Agraria INCRA
ADVOGADO : NEZIO NERY DE ANDRADE
: PAULO SÉRGIO MIGUEZ URBANO
REMETENTE : JUIZO FEDERAL DA 2 VARA DE DOURADOS >2ªSSJ>MS

EMENTA

ADMINISTRATIVO. PROCESSUAL CIVIL. REMESSA OFICIAL. AÇÃO CIVIL PÚBLICA. LEGITIMIDADE ATIVA DO MINISTÉRIO PÚBLICO. INTERESSE SOCIAL. FINALIDADE INSTITUCIONAL. ART. 127, "CAPUT" E 129, AMBOS DA CF. DESAPROPRIAÇÃO PARA FINS DE REFORMA AGRÁRIA. NULIDADE DOS ATOS ADMINISTRATIVOS PRATICADOS DURANTE O PROCEDIMENTO DE DESAPROPRIAÇÃO. PRODUTIVIDADE DO IMÓVEL RURAL. CARACTERÍSTICAS EDAFOCLIMÁTICAS. RECLASSIFICAÇÃO DO IMÓVEL EM ZONA DE PECUÁRIA. POSSIBILIDADE. DECRETO EXPROPRIATÓRIO. INAPTIDÃO DAS TERRAS PARA O FIM DE ASSENTAMENTO DE TRABALHADORES RURAIS. DESVIO DE PODER. NULIDADE DECLARADA. REMESSA OFICIAL PROVIDA.
1. O Ministério Público Federal é parte legítima para a propositura da presente ação, vez que evidente o interesse social da demanda. O pedido de declaração de nulidade do procedimento administrativo, que culminou na expropriação da Fazenda Teijin, em razão da ausência dos requisitos constitucionais para a desapropriação para fins de reforma agrária, insere-se na finalidade institucional do "Parquet", conforme preceituam os artigos 127, "caput" e 129, ambos da Constituição Federal. A expropriação de imóvel produtivo gerará evidente prejuízo ao patrimônio público, vez que haverá dispêndio desnecessário de recursos públicos com o pagamento da indenização ao proprietário do imóvel, além de ofender os princípios constitucionais que regem a Administração Pública, especialmente o da legalidade.
2. Não configura análise de mérito do ato administrativo a apreciação da produtividade do imóvel rural para fins de desapropriação para reforma agrária. Aliás, tal questão pode ser objeto de contestação na própria ação expropriatória (art. 9º, LC 76/93), sendo vedada a discussão tão-somente pela via do mandado de segurança, já que depende de dilação probatória.
3. A Instrução Especial nº 19, de 28 de maio de 1980, do INCRA, dividiu o país em 5 (cinco) Zonas de Pecuária (ZP) conforme a homogeneidade de cada microrregião. O Município de Nova Andradina/MS, onde está situado o imóvel expropriado, está classificado na ZP 2.
4. A perícia judicial concluiu que o imóvel rural deve ser classificado como pertencente à ZP 3, tendo em vista as suas características edafoclimáticas, que se assemelham àquelas dos municípios classificados como ZP3. Como conseqüência, deve ser utilizado o índice de lotação de 0,46 (quarenta e seis décimos), previsto na IN 08/93 e mantido pela IN 11/03, obtendo-se, assim, o GEE de 122,93%.
5. De fato, o juiz não está adstrito ao laudo pericial (art. 436, CPC), vigorando o sistema da livre apreciação da prova. No caso dos autos, contudo, a conclusão dos peritos judiciais merece acolhida, pois o imóvel expropriado não possui capacidade de apascentamento de ZP2 e explora de forma racional e adequada todos os recursos naturais disponíveis.
6. O imóvel deve ser classificado como grande propriedade produtiva, insuscetível, pois, de desapropriação para fins de reforma agrária, bem como cumpre a sua função social, nos termos dos artigos 185, II, e 186, ambos da Constituição Federal.
7. Os elementos (competência, forma, objeto, motivo e finalidade) dos atos administrativos praticados no curso do procedimento da fase declaratória de desapropriação, inclusive o decreto expropriatório, podem ser analisados pelo Poder Judiciário (artigo 5º, XXXV, da Constituição Federal), pois não se trata de julgamento da oportunidade e da conveniência do ato administrativo, mas de exame de sua legalidade. Ademais, mesmo em relação ao ato discricionário, a Administração Pública está sujeita aos princípios da razoabilidade e da proporcionalidade (artigo 2º, caput, da Lei nº 9784/99), cuja análise não está vedada ao Poder Judiciário.
8. A reforma agrária, efetivada mediante o assentamento de trabalhadores rurais nas áreas desapropriadas, constitui a finalidade pública específica do decreto expropriatório. À luz dos princípios que regem a Administração Pública (artigo 37, caput, da Constituição Federal e artigo 2º, caput, da Lei nº 9784/99), os atos administrativos praticados durante a fase declaratória da desapropriação, inclusive o Decreto Presidencial expropriatório, devem guardar relação com a finalidade pública específica a que se destinam, sob pena de configurar desvio de poder.
9. O artigo 17, da Lei nº 8.629/93, estabelece que o assentamento de trabalhadores rurais deverá ser realizado em terras economicamente úteis e precedido de estudo sobre a viabilidade econômica e a potencialidade de uso dos recursos naturais. Este estudo é de extrema importância, principalmente no que tange à potencialidade de uso dos recursos naturais do imóvel, para o fim de se constatar a possibilidade de os trabalhadores rurais assentados realizarem, ao menos, a agricultura de subsistência. Ou seja, se a terra não se presta nem para a produção agrícola voltada para o próprio consumo do trabalhador assentado, não será economicamente útil.
10. No caso dos autos, tanto o laudo elaborado administrativamente pelos técnicos do INCRA, quanto a perícia judicial, constataram a inaptidão das terras do imóvel expropriado para a agricultura. Ainda, a estimativa do custo por família assentada foi considerado extremamente elevado.
11. O imóvel expropriado, além de ser produtivo, não se presta ao assentamento de trabalhadores rurais e, como conseqüência, os atos administrativos praticados durante a fase declaratória da desapropriação, inclusive o Decreto Presidencial expropriatório, devem ser declarados nulos.
12. Remessa oficial provida.

ACÓRDÃO

Vistos e relatados estes autos em que são partes as acima indicadas, decide a Egrégia Segunda Turma do Tribunal Regional Federal da 3ª Região, por unanimidade, dar provimento à remessa oficial, nos termos do relatório e voto que ficam fazendo parte integrante do presente julgado.


São Paulo, 09 de novembro de 2010.
Henrique Herkenhoff
Desembargador Federal


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: PAULO SÉRGIO MIGUEZ URBANO
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RELATÓRIO

O EXCELENTÍSSIMO SENHOR JUIZ FEDERAL CONVOCADO RENATO TONIASSO:

Trata-se de remessa oficial em face da sentença (fls. 1224/1236) que, nos autos da ação civil pública ajuizada em face da União Federal e do Instituto Nacional de Colônia Agrícola - INCRA, julgou extinto o processo, sem resolução de mérito, nos termos do artigo 267, VI, do Código de Processo Civil, por ilegitimidade ativa do Ministério Público Federal, para o pedido de declaração de nulidade do procedimento expropriatório com base na suposta produtividade do imóvel rural denominado Fazenda Teijin, situada no Município de Nova Andradina/MS, de propriedade da "Teijin Desenvolvimento Agro Pecuário Ltda", e julgou improcedente o pedido de declaração de nulidade do procedimento expropriatório em razão da inviabilidade econômica da futura implantação de projeto de assentamento rural no referido imóvel.

A liminar foi indeferida (fls. 278/284).

O MM. Juízo "a quo" não submeteu a sentença ao reexame necessário.

Os autos foram avocados pela Presidência desta E. Corte, nos termos do artigo 475, § 1º, do Código de Processo Civil, tendo em vista a aplicação analógica do artigo 19, da Lei nº 4717/64, conforme entendimento jurisprudencial do E. Superior Tribunal de Justiça (fls. 1257/1259).

A Procuradoria Regional da República opina seja dado provimento à remessa oficial (fls. 1263/1267).

Em 09.04.2010, foi proferida decisão monocrática julgando prejudicada a remessa oficial, em razão da perda de objeto, nos termos do artigo 33, XII, do Regimento Interno desta E. Corte (fls. 1269/1291).

Referida decisão foi anulada, de ofício, em 24.05.2010 (fl. 1299).

A Procuradoria Regional da República reiterou o parecer ofertado nos autos (fl. 1306).

É o relatório.

À revisão.



Renato Toniasso
Juiz Federal Convocado


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REEXAME NECESSÁRIO CÍVEL Nº 0000407-52.2002.4.03.6002/MS
2002.60.02.000407-9/MS
RELATOR : Desembargador Federal HENRIQUE HERKENHOFF
PARTE AUTORA : Ministerio Publico Federal
PROCURADOR : EMERSON KALIF SIQUEIRA
PARTE RÉ : Uniao Federal
ADVOGADO : GUSTAVO HENRIQUE PINHEIRO DE AMORIM
PARTE RÉ : Instituto Nacional de Colonizacao e Reforma Agraria INCRA
ADVOGADO : NEZIO NERY DE ANDRADE
: PAULO SÉRGIO MIGUEZ URBANO
REMETENTE : JUIZO FEDERAL DA 2 VARA DE DOURADOS >2ªSSJ>MS

VOTO

O EXCELENTÍSSIMO SENHOR DESEMBARGADOR FEDERAL HENRIQUE HERKENHOFF (Relator):


Inicialmente, reconheço a legitimidade do Ministério Público Federal para a propositura da presente ação, vez que evidente o interesse social da demanda.

O pedido de declaração de nulidade do procedimento administrativo, que culminou na expropriação da Fazenda Teijin, em razão da ausência dos requisitos constitucionais para a desapropriação para fins de reforma agrária, insere-se na finalidade institucional do "Parquet", conforme preceituam os artigos 127, "caput" e 129, ambos da Constituição Federal.

O enquadramento do imóvel em determinada Zona de Pecuária é essencial para a comprovação do descumprimento do requisito da produtividade. Isto porque a errônea classificação do imóvel em determinada Zona de Pecuária reflete diretamente no Grau de Eficiência na Exploração - GEE, podendo demonstrar que a Fazenda Teijin deve ser considerada como grande propriedade produtiva, insuscetível, pois, de desapropriação para fins de reforma agrária, nos termos do artigo 185, II, da Constituição Federal.

E a expropriação de imóvel produtivo gerará evidente prejuízo ao patrimônio público, vez que haverá dispêndio desnecessário de recursos públicos com o pagamento da indenização ao proprietário do imóvel, além de ofender os princípios constitucionais que regem a Administração Pública, especialmente o da legalidade.

O mérito da presente ação civil pública já foi decidido por esta E. Turma, nos autos da ação expropriatória (AC nº 2002.60.02.000510-2) e da ação declaratória de nulidade de ato administrativo (AC nº 2004.60.02.004675-7), em julgamento conjunto realizado em 15.06.2010, que adoto como razão de decidir, "verbis":


"Não configura análise de mérito do ato administrativo a apreciação da produtividade do imóvel rural para fins de desapropriação para reforma agrária. Aliás, tal questão pode ser objeto de contestação na própria ação expropriatória (art. 9º, LC 76/93), sendo vedada a discussão tão-somente pela via do mandado de segurança, já que depende de dilação probatória:

"DESAPROPRIAÇÃO. Imóvel rural. Reforma agrária. Produtividade do imóvel antes de estiagem. Presença de invasores nas proximidades. Fator de lotação de animais. Matérias factuais controversas. Discussão em mandado de segurança. Inadmissibilidade. Temas cabíveis na cognição da ação expropriatória. MS denegado. Precedentes. Não se admite, em mandado de segurança contra decreto de expropriação de imóvel rural, para fins de reforma agrária, discussão sobre matérias fáticas, como produtividade do bem, presença de invasores nas proximidades e fator de lotação de alimárias."

(STF, MS 24910, Tribunal Pleno, Rel. Min. Cezar Peluso, DJ 28.04.2006, p. 006).

"MANDADO DE SEGURANÇA. DESAPROPRIAÇÃO. REFORMA AGRÁRIA. SILÊNCIO DO INCRA ACERCA DO RESULTADO DA IMPUGNAÇÃO À VISTORIA. NULIDADE: NÃO-OCORRÊNCIA. EXCEDENTE DE ÁREAS DE PRESERVAÇÃO PERMANENTE DESCONSIDERADO PELO LAUDO; EQUÍVOCO QUANTO À DIFERENÇA ENTRE A ÁREA DE RESERVA LEGAL ADOTADA PELO INCRA E SUA EFETIVA DIMENSÃO; ERRO NA CONTAGEM DAS CABEÇAS DE GADO. INSUSCETIBILIDADE DE EXAME DESSAS MATÉRIAS EM MANDADO DE SEGURANÇA. 1. O silêncio do INCRA acerca do resultado da vistoria não é causa de nulidade do decreto presidencial, pois a matéria referente à produtividade do imóvel poderá ser objeto da ação de desapropriação disciplinada pela LC 76/93. Precedentes. 2. Questões controvertidas nos autos, em face da iliqüidez dos fatos, não são suscetíveis de análise em mandado de segurança, que exige provas pré-constituídas. Precedentes. Segurança denegada."

(STF, MS 24272, Tribunal Pleno, Rel. Min. Maurício Corrêa, DJ 06.12.2002, p. 053).


É constitucional a norma do artigo 6º, da Lei nº 8629/93, que estabelece os parâmetros de produtividade do imóvel rural, conforme o Grau de Utilização da Terra - GUT e o Grau de Eficiência na Exploração - GEE, sendo que o primeiro deve ser igual ou superior a 80% e, o segundo, a 100%:

"CONSTITUCIONAL. AGRÁRIO. REFORMA AGRÁRIA: DESAPROPRIAÇÃO. ENTIDADE REPRESENTATIVA DE CLASSE: COMUNICAÇÃO DA VISTORIA. Decreto 2.250/97, art. 2º. EXCLUSÃO DE ÁREA. CONTAGEM DO REBANHO BOVINO: CONTROVÉRSIA. ÍNDICES DE PRODUTIVIDADE.

(...) IV. - Índices de produtividade do imóvel rural: fato complexo, que reclama produção de prova. Constitucionalidade das disposições constantes do art. 6º e seus parágrafos da Lei 8.629/93. V. - Precedentes do S.T.F. VI. - M.S. indeferido."(STF, MS 23645, Tribunal Pleno, Rel. Min. Carlos Velloso, DJ 15.03.2002, p. 00034).

"Desapropriação de imóvel rural por interesse social, para fins de reforma agrária. Notificação administrativa apta à finalidade a que se destina. Constitucionalidade das disposições constantes do art. 6º, e seus parágrafos, da Lei nº 8.629-93. Alegação de haver-se procedido à vistoria por meio de um único técnico. Matéria ligada à conveniência interna do órgão, sem configurar ilegalidade, nem direito subjetivo oponível pelo proprietário impetrante."(STF, MS 22302, Tribunal Pleno, Rel. Min. Octavio Gallotti, DJ 19.12.1996, p. 51769).


No caso dos autos, tanto o INCRA, administrativamente (fl. 861, da AC nº 2002.60.02.000510-2), quanto os peritos judiciais (fl. 1640, da AC nº 2002.60.02.000510-2), consideraram que a Fazenda Teijin possui GUT superior a 80%.

O mesmo não ocorre em relação ao GEE.

Nos termos do artigo 6º, § 2º, da Lei nº 8629/93, o GEE será obtido da seguinte forma:

"I - para os produtos vegetais, divide-se a quantidade colhida de cada produto pelos respectivos índices de rendimento estabelecidos pelo órgão competente do Poder Executivo, para cada Microrregião Homogênea;

II - para a exploração pecuária, divide-se o número total de Unidades Animais (UA) do rebanho, pelo índice de lotação estabelecido pelo órgão competente do Poder Executivo, para cada Microrregião Homogênea;

III - a soma dos resultados obtidos na forma dos incisos I e II deste artigo, dividida pela área efetivamente utilizada e multiplicada por 100 (cem), determina o grau de eficiência na exploração."


A Instrução Especial nº 19, de 28 de maio de 1980, do INCRA, dividiu o país em 5 (cinco) Zonas de Pecuária (ZP) conforme a homogeneidade de cada microrregião. O Município de Nova Andradina/MS, onde está situado o imóvel expropriado, está classificado na ZP 2 (fl. 1759, da AC nº 2002.60.02.000510-2 e fls. 391/400, da AC n° 2004.60.02.004675-7).

No exercício de seu poder regulamentar, e dando operatividade ao disposto no artigo 6º, § 2º, inciso II, da Lei nº 8629/93, o INCRA estabeleceu os índices de lotação para cada Zona de Pecuária, ajustando-os periodicamente nos termos do artigo 11, da mesma norma.

Conforme o Quadro 5, do Anexo I, da Instrução Normativa nº 08/93, mantida pela Tabela nº 4, do Anexo da Instrução Normativa nº 11/03, ambas do INCRA, o índice de lotação para a ZP 2 é de 0,80 (oitenta décimos).

Desta forma, o GEE obtido pelo INCRA em sede administrativa foi de 69,98%, classificando a Fazenda Teijin, de ofício, como grande propriedade improdutiva (fls. 859/861, da AC nº 2002.60.02.000510-2).

Já os peritos judiciais (fls. 1603/1687, da AC nº 2002.60.02.000510-2) concluíram que o imóvel rural deve ser classificado como pertencente à ZP 3, tendo em vista as suas características edafoclimáticas. Como conseqüência, deve ser utilizado o índice de lotação de 0,46 (quarenta e seis décimos), previsto na IN 08/93 e mantido pela IN 11/03, obtendo-se, assim, o GEE de 122,93%. Portanto, a Fazenda Teijin deve ser considerada produtiva.

Relativamente às características edafoclimáticas da Fazenda Teijin, o laudo judicial descreve que:

"5.1. CLIMA

(...)

Dos dados apresentados podemos concluir que os riscos de insucesso com a atividade agrícola não irrigada nas terras da Fazenda Teijin são comprovadamente elevados, independentes dos altos gastos com a correção e fertilização química dos solos, em função da má distribuição de chuvas ocorridas entre os anos, entre os meses do ano e entre os dias do mês.

(...)

5.2 RELEVO

Situa-se na Região dos Planaltos Arenítico-Basálticos Inferior inserido na Bacia Sedimentar do Paraná. O relevo é suavemente ondulado a plano com ligeiro declive nas proximidades dos cursos d"água, esculpido sobre litologias areníticas cretácicas do grupo Bauru, que origina os Latossolos vermelhos escuros álicos onde desenvolveu vegetação de savana.

As análises de solo extraídas por ocasião da perícia georreferenciada em diferentes altitudes demonstram que a capacidade de troca catiônica - CTC cresce com a altitude. Logicamente que a necessidade de calcário por hectare é tanto maior para altitude mais elevada o que demonstra que em altitude mais baixas (sic) o solo tem menor capacidade de reação e resulta em menor quantidade de calcário.

A 321 m de altitude, o CTC é de 38 e a capacidade de calagem de 1,6 ton/ha enquanto a 372 m o CTC passa a ser 87 e a calagem 3,7 ton/ha, ou seja, mais que o dobro.

5.3 SOLOS

(...)

Os Latossolos ácidos, com baixa capacidade de troca catiônica - CTC e níveis de pH em tomo de 4,0 e 5,5 são típicos das terras da Fazenda Teijin.

(...)

5.4 RECURSOS HÍDRICOS

A Fazenda Teijin é bem servida de água natural.

(...)

Além das águas naturais, a propriedade possui dois poços artesianos que distribuem, por gravidade, com rede de encanamento, água em todos os bebedouros instalados nas pastagens.

5.5 VEGETAÇÃO

Originariamente toda a área da Fazenda estava coberta por vegetação característica de cerrado com formações herbáceas intercaladas por plantas lenhosas até arbóreas serpenteadas de floresta-de-galeria. A mata remanescente, numa área de 9.028,7 ha sendo 5.699,6 ha averbada como área de Reserva Legal e 3.329,1 ha de mata nativa. Todas conservam as características de mata primária, ou seja, ausência de ação antrópica.

No mapa de vegetação da SEPLAN-MS, a região da Fazenda Teijin é classificada como região da Savana (cerrado) de vegetação arbórea densa ou cerradão e Áreas Antrópicas resultante da interferência humana, com modificação de parte da área, com pastagens.

(...)

No quadrante das coordenadas geográficas acima do Rio Anhandui até o extremo norte o tipo de vegetação é REGIÃO DA SAVANA, variando de Arbórea Densa, Arbórea Aberta, Parque e Gramínea Lenhosa.

No quadrante 22° a 24° e 52°30" a 55°30" predomina REGIÃO DA FLORESTA ESTACIONAL SEMIDECIDUAL. Nas proximidades de Nova Andradina na direção de Anaurilândia-Bataguassu, também está inserida nessa Região, diferentemente da Fazenda Teijin que é Região de Savana.

5.5.1 PASTAGENS

Na Fazenda Teijin, a área de Pastagens Plantadas é de 17.750,.6 ha, sendo de Brachiárias decumbens, de Brachiária humidicola, de Brachiária dictyoneura e diversos.

As pastagens encontram em bom estado de conservação.

(...)

A comitiva pode constatar que não existe nenhum ponto de erosão. Os proprietários usam as pastagens de forma racional e adequada.

5.6 POTENCIAL GEOAMBIENTAL

O Mapa da SEPLAN - MS faz distinção clara entre a região abaixo do Rio Ivinhema, onde situa-se Angélica, Ivinhema, Deodápolis, Gloria de Dourados, Jateí, Naviraí entre as coordenadas geográficas LAT 22°00"00" e LONG 52°30"00" a 54°00"00" situa-se nas proximidades da cidade de Nova Andradina, Batayporã, Anaurilândia e Bataguassu. Toda essa região é denominada REGIÃO DAS SUB-BACIAS MERIDIONAIS. A região apresenta uma superfície inclinada para sudeste e clima Eumesaxérico "Subtropical do Sul de MS com precipitação entre 1.400 a 1.700 mm bem distribuído durante o ano".

O MAPA distingue a região onde está inserida a Fazenda Teijin entre o quadrante de LAT 22°00"00" e 21°00"00" e LONG 54°00"00" como sendo REGIÃO DOS PLANALTOS RAMPEADOS. Esta região se caracteriza pela marcante homogeneidade na morfoestrutura. A altimetria varia entre 320 e 700m foi esculpida em litologias do Grupo Bauru. O clima é caracterizado como "Tropical Brando de Transição". As temperaturas médias do mês mais frio são menores que 20° C e maiores que 18° C. O período seco estende-se de 4 a 5 meses. A precipitação anual varia de 1.200 a 1.500 m.m.

Pode-se verificar que no tocante a este item, as regiões apresentam-se com características diferenciadas da região da Fazenda Teijin.

5.7 APTIDÃO AGRÍCOLA DAS TERRAS

(...)

Quanto à APTIDÃO AGRÍCOLA DAS TERRAS está inserida em terras marginais 1 - TM1 a exemplo de áreas entre coordenadas 21° a 22°, parte da microrregião de Ribas do Rio Pardo, Santa Rita do Rio Pardo e áreas a Leste do Estado.

(...)

TM1: Terras marginais, riscos de insucesso para lavouras, risco de deficiência hídrica para uso com agricultura, aptidão restrita para lavoura e regular para pastagens plantadas.

(...)

10.0 CLASSE DE USO DO SOLO

Concordamos com as avaliações dos técnicos do INCRA:

Classe IV: 47% x 0,583 ="" 0,274

Classe V: 30% x 0,495 ="" 0,149

Classe VI: 20% x 0,421 ="" 0,084

Classe VIII 3% x 0,304 ="" 0,009

Nota Agronômica="" 0,516

A propriedade em questão possui classe de terras, que segundo sua capacidade de uso, não se prestam para cultivos contínuos ou regulares de culturas anuais. Podem ser cultiváveis ocasionalmente quando adequadamente protegidas. Possui nessa classe 47% da propriedade.

Na classe V e VI, estão 50% das terras, que segundo a Sociedade Brasileira de Ciência do Solo, não se prestam para culturas anuais, sendo especialmente adaptáveis para pastagens ou florestas. Podem apresentar impedimentos como muito baixa capacidade de armazenamento de água.

Na classe VI, as restrições de uso são maiores ainda." (fls. 1614/1623 e 1641, da AC nº 2002.60.02.000510-2).


Após análise comparativa de tais características com aquelas dos municípios próximos à Fazenda Teijin, os peritos concluíram que esta possui características edafoclimáticas típicas dos municípios classificados como ZP3, nos seguintes termos:

"No item 5.1 CLIMA, destacaremos uma particularidade inerente à região do imóvel: longos períodos de seca. O mapa da SEPLAN no item 5.6 POTENCIAL GEOAMBIENTAL ratifica a nossa argumentação: "o período seco estende-se de 4 a 5 meses."

O mesmo clima não se verifica nas proximidades de Nova Andradina no sentido Anaurilândia-Bataguassu. Lá chove com mais regularidade e a precipitação média anual é de 1400 a 1700 contra 1200 a 1500 mm da Fazenda Teijin, ou seja, o mesmo da região de Ribas do Rio Pardo com ZP3.

No item 5.5 VEGETAÇÃO, o mapa também mostra diferença marcante. A região da Fazenda Teijin é classificada como vegetação de savana a exemplo de Ribas do Rio Pardo, Santa Rita (ZP3), enquanto Nova Andradina na direção de Anaurilândia-Bataguassu é Floresta Estacional Semidecidual.

Na Aptidão Agrícola das Terras a Fazenda Teijin está inserida como TM1 a exemplo de todos outros municípios classificados como de ZP3, enquanto Nova Andradina, Anaurilândia, Bataguassu e outros de ZP2 são áreas mais indicadas para lavoura." (fl. 1625, da AC nº 2002.60.02.000510-2).


De fato, o juiz não está adstrito ao laudo pericial (art. 436, CPC), vigorando o sistema da livre apreciação da prova. No caso dos autos, contudo, a conclusão dos peritos judiciais merece acolhida.

Como se observa dos mapas de fls. 1759/1765, da AC nº 2002.60.02.000510-2, a Fazenda Teijin está localizada na parte norte do município de Nova Andradina/MS, próxima ao Rio Anhanduí-Guaçu, que estabelece a divisa entre os municípios de Nova Andradina/MS e Ribas do Rio Pardo/MS e também delimita as Zonas de Pecuária 2 (maior potencial produtivo) e 3 (menor potencial produtivo), nos termos da IE 19/80, do INCRA (fl. 1759, da AC nº 2002.60.02.000510-2).

Desta forma, desde já se percebe que o imóvel expropriado se situa em uma região fronteiriça, o que proporciona grande possibilidade de reclassificação, caso seja constatado que se assemelha às características edafoclimáticas típicas da Zona de Pecuária 3.

O mapa de potencial geoambiental (fl. 1762, da AC nº 2002.60.02.000510-2) demonstra que a Fazenda Teijin está situada na Região dos Planaltos Rampeados, que se estende desde a parte norte do Município de Nova Andradina até os municípios de Santa Rita do Pardo/MS, Ribas do Pardo/MS, Águas Claras/MS, Três Lagoas/MS, etc., todos localizados em ZP 3, na qual o período seco se prolonga de 4 a 5 meses e a precipitação anual varia de 1200 a 1500 mm.

Por tal razão, não pode ser comparada a municípios que se situam na Região das Sub-Bacias Meridionais como, por exemplo, Angélica/MS, a região sul de Nova Andradina/MS, Anaurilândia/MS, Naviraí/MS, etc., todos localizados em ZP 2, que, além de terem maior precipitação anual (de 1400 a 1700 mm), não possuem períodos de seca.

Por outro lado, pode ser comparada com municípios que se situam em regiões nas quais há período de seca. É o caso dos municípios da Região da Borda do Planalto Basáltico (período seco de 2 meses e mesma precipitação anual de 1200 a 1500 mm), como Terenos/MS, e municípios da Região da Serra do Aporé (período seco de 2 a 3 meses e precipitação anual de 1500 a 1700 mm), como Serviria/MS, todos localizados em ZP 3.

Outro ponto importante a ser destacado é a aptidão agrícola das terras da Fazenda Teijin, que está inserida como Terra Marginal 1 (riscos de insucesso para lavouras, risco de deficiência hídrica para uso com agricultura, aptidão restrita para lavoura e regular para pastagens plantadas).

O mapa de fl. 1763 (da AC nº 2002.60.02.000510-2) mostra que na parte do estado do Mato Grosso do Sul classificada como ZP 3 predominam as terras marginais (1 ou 2), com exceção de pequenas porções de terras aptas à lavoura inseridas como 2 (a)bc, 2 abc, 3 (abc) ou AC2. E, por outro lado, apesar da existência de pequenas porções de terras marginais (1 ou 2), quase a totalidade da área classificada como ZP 2 é formada por terras aptas à lavoura, como 1 ABC, 2 (a)bc, 2 abc, 3 (abc) ou AC2, inclusive a região sul do município de Nova Andradina/MS inserida como 2 (a)bc.

Neste ponto, merece destaque trecho do relatório elaborado pelos técnicos do INCRA, em sede administrativa:

"Unidades de Mapeamento TM1 - compreendem áreas constituídas de solos álicos ou distróficos, fortemente drenados, textura média, com relevo plano e suave ondulado, originados de arenitos. Possuem baixa a muito baixa reserva de nutrientes disponíveis à plantas e livres de sais tóxicos. Os riscos de erosão, quando existentes, podem ser controlados com práticas conservacionistas simples. As condições de relevo, profundidade, morfologia, ausência de pedregosidade, rochosidade e boa drenagem do solo, favorecem as práticas agrícolas. A baixa capacidade de retenção da água associada à baixa a muito baixa disponibilidade de nutrientes nos solos, são as maiores limitações à utilização agrícola. A granulometria com teores baixos e médios de argila aliado às propriedades morfológicas dos solos permitem uma percolação rápida a muito rápida da água, aumentando o período de deficiência hídrica, com prejuízo no desenvolvimento normal das plantas cultivadas. Os riscos de deficiência hídrica atingem uma proporção tal, que se torna temeroso a afirmativa de ser uma terra destinada à agricultura.

Num julgamento apenas teórico, essa unidade de mapeamento, poderia ter-se enquadrado no SubGrupo 3(abc) - terras com aptidão restrita para agricultura, já descrito anteriormente. Após observações de campo e entrevistas com agricultores e pecuaristas sediados nessas áreas, tendo sido por eles revelado, que muitas vezes se perdeu culturas plantadas nessas terras, daí a tendência natural deles, de mudança para a pecuária (pastagem); considerando, ainda, que grande parte dessas terras estão inseridas em regiões de clima com período seco bem definido de 4 a 5 meses, havendo no verão riscos de veranico, com previsão de ocorrência a cada 3 a 5 anos; optou-se, então, para a classificação de Terras Marginais - TM1 (terras com aptidão restrita para lavoura/aptidão regular para pastagem plantada). A classificação 3(abc), já mencionada, ficou somente para as áreas situadas mais ao sul do Estado, com menor período seco e possivelmente com melhor distribuição das chuvas." (grifei) (fls. 89/90, da AC nº 2002.60.02.000510-2).


O mesmo ocorre em relação à vegetação. A Fazenda Teijin está inserida na Região da Savana, com vegetação natural arbórea densa (Sd) e vegetação antrópica (Ap.S).

O mapa de fl. 1764 (da AC nº 2002.60.02.000510-2) demonstra que na parte do estado do Mato Grosso do Sul classificada como ZP 3 predomina a Região da Savana, com exceção de pequenas porções de terras de vegetação natural (SNc) e antrópica (Vs.2 ou Ap.2) da região de contato Savana/Floresta Estacional. E, por outro lado, apesar da existência de pequenas porções de terras de vegetação natural de Savana, bem como de vegetação natural (SNc) e antrópica (Ap.2) da região de contato Savana/Floresta Estacional, quase a totalidade da área classificada como ZP 2 é formada pela Região da Floresta Estacional Semidecidual, inclusive parte da região sul do município de Nova Andradina/MS.

Assim, conclui-se que a Fazenda Teijin possui características edafoclimáticas típicas dos municípios classificados como ZP3, diferenciando-se, inclusive, do potencial geoambiental, da aptidão agrícola das terras e da vegetação da região sul do próprio município de Nova Andradina/MS.

Observa-se, ainda, que o imóvel expropriado possui apenas sistema artificial de distribuição de água aos bebedouros instalados nas pastagens, o que não ameniza a falta de chuvas, bem como a má distribuição destas entre os meses do ano e entre os dias do mês.

Apenas um eficiente sistema artificial de irrigação das pastagens, associada à intensiva fertilização química do solo, poderia possibilitar a cultura de pastagens plantadas em maior área da Fazenda Teijin e, como conseqüência, maior capacidade de apascentamento. Mas não é esse o caso dos autos.

Aliás, os peritos judiciais foram categóricos em afirmar que a Fazenda Teijin não possui capacidade de apascentamento de Zona de Pecuária 2 e que explora de forma racional e adequada todos os recursos naturais disponíveis, mantendo conservadas as terras, as águas naturais, a fauna e a flora existentes, em resposta aos quesitos nº II e III/b, formulados pelo Ministério Público Federal (fls. 1678/1679, da AC nº 2002.60.02.000510-2) e quesito nº II/3, formulado pela expropriada (fl. 1681, da AC nº 2002.60.02.000510-2). Ou seja, o imóvel expropriado não é capaz de suportar um maior número de bovinos nos seus pastos.

Relativamente à conservação dos recursos naturais, os técnicos do INCRA igualmente concluíram que:

"Com referência à Reserva Legal, constatamos "in-loco" a sua existência e está devidamente averbada à margem da matrícula, conforme ditames da lei. Quanto à Preservação Permanente, esta é feita ao redor dos flúveos somente, uma vez não existir grandes inclinações na área do imóvel e, constatamos que estão devidamente preservadas, com a vegetação ao seu redor em boas condições.

Constatamos ainda que as áreas exploradas com pastagens no imóvel, podemos visualizar que está sendo feita de modo racional, no sentido de conter as erosões em decorrência da fragilidade dos solos, assim como, podemos notar que apesar das pastagens serem antigas, estas estão bem manejadas, pois estão viçosas, com aspecto vigoroso, apesar do grande pastejo que estão submetidas.

Por fim, informamos que pela dimensão do imóvel, inexiste processo erosivo de grande monta e sim, sedimentação de areias nos baixios naturais, advindo das áreas das estradas, sem cobertura vegetal, embora com sistema de contenção revitalizado todos os anos." (grifei) (fl. 93, da AC nº 2002.60.02.000510-2).


Desta forma, a Fazenda Teijin deve ser enquadrada em Zona de Pecuária 3, obtendo, como conseqüência, Grau de Eficiência na Exploração - GEE de 122,93 %. Portanto, deve ser classificada como grande propriedade produtiva, insuscetível, pois, de desapropriação para fins de reforma agrária, nos termos do artigo 185, II, da Constituição Federal.

Considerando, ademais, que todos os trabalhadores da expropriada possuem registro em Carteira de Trabalho e Previdência Social - CTPS (fls. 757/832 e 859/860, da AC nº 2002.60.02.000510-2) que, inclusive, residem em parte da área do imóvel, bem como a regularidade no pagamento das contribuições sociais e outros encargos (Relatório Técnico do INCRA - fl. 93, da AC nº 2002.60.02.000510-2), conclui-se que a Fazenda Teijin cumpre a sua função social, nos termos do artigo 186, da Constituição Federal.

Mas não é só.

Os elementos (competência, forma, objeto, motivo e finalidade) dos atos administrativos praticados no curso do procedimento da fase declaratória de desapropriação, inclusive o decreto expropriatório, podem ser analisados pelo Poder Judiciário (artigo 5º, XXXV, da Constituição Federal), pois não se trata de julgamento da oportunidade e da conveniência do ato administrativo, mas de exame de sua legalidade:

"AGRAVOS REGIMENTAIS NO RECURSO EXTRAORDINÁRIO. ATO ADMINISTRATIVO. CONTROLE JUDICIAL. REEXAME DE PROVAS. IMPOSSIBILIDADE EM RECURSO EXTRAORDINÁRIO. SÚMULA 279 DO STF.

1. É legítima a verificação, pelo Poder Judiciário, de regularidade do ato discricionário quanto às suas causas, motivos e finalidade. 2. A hipótese dos autos impõe o reexame de fatos e provas. Inviabilidade do recurso extraordinário. Súmula n. 279 do STF. Agravos regimentais aos quais se nega provimento."

(STF, RE 505439 AgR, 2ª Turma, Rel. Min. Eros Grau, DJe 29.08.2008, p. 00879).

"PROCESSUAL CIVIL. MANDADO DE SEGURANÇA. RECURSO ORDINÁRIO. DECRETO EXPROPRIATÓRIO. ART. 5º, ALÍNEA I, DO DECRETO-LEI 3.365/41. IMPLANTAÇÃO DE "UNIDADE" INDUSTRIAL. NULIDADE DO ATO VICIADO POR DESVIO DE FINALIDADE, POIS BENEFICIA UMA ÚNICA EMPRESA PRIVADA. AUTORIDADE COATORA INCOMPETENTE PARA A EXPEDIÇÃO DO ATO.

(...)

3. O exame da oportunidade e da conveniência do ato ora impugnado não se sujeita a controle judicial. Entretanto, a hipótese legal de desapropriação elencada pelo administrador como fundamento do decreto expropriatório - art. 5º, i, do Decreto-Lei 3.365/41, no caso dos autos - deverá ser compatível com o fim a que ele se destina, sob pena de se viciar o ato praticado.

4. Por distritos industriais deve-se entender "a área de concentração de indústrias e atividades complementares delas, ordenada pelo Poder Público mediante plano urbanístico especial de urbanificação do solo, com possibilidade de desapropriação da gleba e revenda ou locação dos lotes aos estabelecimentos industriais interessados" (SILVA, José Afonso da. "Direito Urbanístico Brasileiro", 4ª ed., rev. e atual., São Paulo: Malheiros, 2006, pág.

377).

5. O decreto expropriatório editado com fundamento no art. 5º, i, do Decreto-Lei 3.365/41, beneficiando uma única empresa privada, contém vício de finalidade que o torna nulo, na medida em que se desvia do interesse público, contrariando, ainda, os princípios da impessoalidade e da moralidade administrativa, consagrados no art. 37 da Constituição Federal.

(...)

8. A Primeira Turma desta Corte já se manifestou no sentido de que "é lícito ao Poder Judiciário declarar nulo decreto expropriatório onde se verifica desvio de poder" (REsp 36.611/SC, Rel. Min. Humberto Gomes de Barros, DJ de 22.8.1994).

9. Recurso provido para se conceder a segurança pleiteada, declarando-se a nulidade do Decreto 7.917/2001, expedido pelo Governador do Estado da Bahia."

(STJ, RMS 18.703/BA, 1ª Turma, Rel. Min. Denise Arruda, DJ 29/03/2007, p. 217).



Ademais, mesmo em relação ao ato discricionário, a Administração Pública está sujeita aos princípios da razoabilidade e da proporcionalidade (artigo 2º, caput, da Lei nº 9784/99), cuja análise não está vedada ao Poder Judiciário:

"PROCESSUAL CIVIL E TRIBUTÁRIO. VIOLAÇÃO AO ART. 535 DO CPC. INOCORRÊNCIA. IPI. ALÍQUOTA ZERO. NECESSIDADE DE COMPROVAÇÃO DA COMPOSIÇÃO QUÍMICA DA MATÉRIA-PRIMA UTILIZADA NA INDUSTRIALIZAÇÃO DE PRODUTOS. REQUERIMENTO DE PROVA PERICIAL NO PROCESSO ADMINISTRATIVO FISCAL. DEFERIMENTO OU INDEFERIMENTO. PODER DISCRICIONÁRIO DA ADMINISTRAÇÃO PÚBLICA. ART. 18 DO DECRETO N. 70.235/72. POSSIBILIDADE DE CONTROLE PELO JUDICIÁRIO.

1. Os órgãos julgadores não estão obrigados a examinar todas as teses levantadas durante um processo judicial, bastando que as decisões proferidas estejam devida e coerentemente fundamentadas, em obediência ao que determina o art. 93, inc. IX, da Lei Maior. Isso não caracteriza ofensa aos arts. 131, 458 e 535, inc. II, do CPC. Neste sentido, existem diversos precedentes desta Corte.

2. Hoje em dia, parte da doutrina e da jurisprudência já admite que o Poder Judiciário possa controlar o mérito do ato administrativo (conveniência e oportunidade) sempre que, no uso da discricionariedade admitida legalmente, a Administração Pública agir contrariamente ao princípio da razoabilidade. Lições doutrinárias.

3. Isso se dá porque, ao extrapolar os limites da razoabilidade, a Administração acaba violando a própria legalidade, que, por sua vez, deve pautar a atuação do Poder Público, segundo ditames constitucionais (notadamente do art. 37, caput).

(...)"

(STJ, REsp 778.648/PE, 2ª Turma, Rel. Min. Mauro Campbell Marques, DJe 01/12/2008)

"ADMINISTRATIVO E PROCESSO CIVIL - AÇÃO CIVIL PÚBLICA - OBRAS DE RECUPERAÇÃO EM PROL DO MEIO AMBIENTE - ATO ADMINISTRATIVO DISCRICIONÁRIO.

1. Na atualidade, a Administração pública está submetida ao império da lei, inclusive quanto à conveniência e oportunidade do ato administrativo.

2. Comprovado tecnicamente ser imprescindível, para o meio ambiente, a realização de obras de recuperação do solo, tem o Ministério Público legitimidade para exigi-la.

3. O Poder Judiciário não mais se limita a examinar os aspectos extrínsecos da administração, pois pode analisar, ainda, as razões de conveniência e oportunidade, uma vez que essas razões devem observar critérios de moralidade e razoabilidade.

4. Outorga de tutela específica para que a Administração destine do orçamento verba própria para cumpri-la.

5. Recurso especial provido."

(STJ, REsp 429.570/GO, 2ª Turma, Rel. Min. Eliana Calmon, DJ 22/03/2004, p. 277).



A reforma agrária, efetivada mediante o assentamento de trabalhadores rurais nas áreas desapropriadas, constitui a finalidade pública específica do decreto expropriatório.

À luz dos princípios que regem a Administração Pública (artigo 37, caput, da Constituição Federal e artigo 2º, caput, da Lei nº 9784/99), os atos administrativos praticados durante a fase declaratória da desapropriação da Fazenda Teijin, inclusive o Decreto Presidencial expropriatório, devem guardar relação com a finalidade pública específica a que se destinam, sob pena de configurar desvio de poder.

O artigo 17, da Lei nº 8.629/93, estabelece que:

"Art. 17. O assentamento de trabalhadores rurais deverá ser realizado em terras economicamente úteis, de preferência na região por eles habitada, observado o seguinte:

I - a obtenção de terras rurais destinadas à implantação de projetos de assentamento integrantes do programa de reforma agrária será precedida de estudo sobre a viabilidade econômica e a potencialidade de uso dos recursos naturais;

(...)." (grifei)


Ora, se a lei impõe a realização de tal estudo, não há dúvidas de que é obrigatório, ainda que não vinculativo. Ademais, a Administração Pública fica obrigada a motivar o ato administrativo que afastar estudo técnico desfavorável à obtenção de determinado imóvel rural para fins de implantação de projeto de assentamento de trabalhadores rurais (artigo 50, VII, da Lei nº 9784/99).

Observa-se, ainda, que este estudo é de extrema importância, principalmente no que tange à potencialidade de uso dos recursos naturais do imóvel, para o fim de se constatar a possibilidade de os trabalhadores rurais assentados realizarem, ao menos, a agricultura de subsistência.

Ou seja, se a terra não se presta nem para a produção agrícola voltada para o próprio consumo do trabalhador assentado, não será economicamente útil.

A própria Lei nº 8.629/93 estabelece, no § único do artigo 19, que terão prioridade, na aquisição do título de domínio e da concessão de uso de terras rurais, os chefes de família numerosa, cujos membros se proponham a exercer a atividade agrícola na área a ser distribuída.

Assim, a aptidão das terras para a agricultura é fundamental para o sucesso de projeto de assentamento de trabalhadores rurais.

No presente caso, os próprios técnicos do INCRA, em relatório elaborado em 15.12.00, concluíram que:

"Considerando que os recursos naturais, assim como o capital e o trabalho, constituem fatores essenciais de produção em qualquer exploração econômica. No meio rural, temos que o fator terra como principal recurso natural para o aproveitamento agropecuário e um instrumento essencial para se alcançar o sucesso de um projeto de assentamento. Entretanto, como de conhecimento de todos, sabemos que esta fonte se esgota, dependendo do nível tecnológico e da forma de exploração a que são submetidos, pela ação do homem.

Observa-se ainda que a terra inclui entre suas características não apenas o solo, mas também outros atributos físicas (sic), como a estrutura dos solos, o relevo, declividade, susceptibilidade a erosão, etc.

Na seqüência do raciocínio, temos que na prática, ao se querer considerar a fertilidade do solo, deve-se atentar também a aspectos como: conteúdo e disponibilidade de nutrientes essenciais à plantas (sic), as proporções ou não de elementos tóxicos, devendo também se considerar as condições ambientais, tais como clima, regularidade pluviométrica e água dos solos, ocorrência de pragas ou doenças, a estrutura radicular e a extensão e distribuição das raízes, a capacidade das plantas para absorver e translocar nutrientes, bem como a quantidade dos macro e micro nutrientes que as plantas necessitam em seus diversos estágios de desenvolvimento.

Temos ainda, em continuidade a retroposição, que os solos existentes no imóvel, serem o fator de maior preocupação por parte deste Engenheiro, senão vejamos:

Os Latossolo Vermelho-Escuro álico, estes solos ficam distantes de serem o ideal para a maioria das culturas, por possuir fertilidade baixa, com toxidade de alumínio sob a camada arável, de difícil correção, normalmente associada com a baixa capacidade de retenção de água disponível às plantas.

Os Podzólicos Vermelho-Escuro distróficos, estes solos mesmo quando eutróficos, bem drenados e profundo, tende a afastar-se de ser o ideal para a maioria das culturas, devido às limitações que podem apresentar destacando-se o alto risco de erosão, especialmente quando a diferença textural é muito grande entre os horizontes A e B (caráter abrúptico) tendo, se freqüentemente cultivados por alguns anos, sofrido erosão em grau severo e, também pela dificuldades (sic) à motomecanização impostos pelo declive acentuado e/ou irregularidades do terreno, em decorrência dos processos erosivos.

As Areias Quartzosas álicas, estes solos caracterizam-se por apresentar fertilidade baixa e pequena capacidade de retenção de água e nutrientes, além de alta susceptibilidade à erosão, estando mais distantes ainda do solo ideal para a maioria das culturas.

Assim, diante do exposto, caso a área seja classificada como GRANDE PROPRIEDADE IMPRODUTIVA, desaconselhamos o prosseguimento dos autos para fins de desapropriação, uma vez que as terras do imóvel oferecem sérias restrições relacionadas com o fator nutrientes e textura, que como conseqüência, limita severamente o seu uso com agricultura, havendo assim, a necessidade de se considerar o nível de manejo que estas terras necessitarão, que refletiria no alto grau de aplicação de tecnologia e capital para se alcançar algum sucesso, no caso de se querer implantar um projeto de reforma agrária nos moldes tradicionais, com os recursos oriundos somente do INCRA, que atualmente enfrenta sérias dificuldades até mesmo em fazer somente a sua parte prevista na legislação. Assim, entendemos que as terras do imóvel são recomendados (sic) para pastagens (bovinocultura de corte e/ou de leite) e/ou silvicultura, ressalvados decisão administrativa contrária, ditada por conveniência administrativa, resultante de opiniões técnicas divergentes, ou mesmo, o aparecimento de fatos externos ao INCRA, que viabilizem a implantação de um assentamento na área, para pequenos agricultores "sem-terras" com o seu sucesso garantido, pelo responsável técnico e administrativo da proposta." (grifei) (fls. 220/221, da AC nº 2004.60.02.004675-7).

E, ainda, em relação ao custo por família assentada na Fazenda Teijin, concluíram que, se estimado o custo médio de R$ 500,00 (quinhentos reais) por hectare e o parcelamento da área em 425 unidades de 50 (cinqüenta) hectares cada uma, o custo por família seria de R$ 32.446,29 (trinta e dois mil, quatrocentos e quarenta e seis reais e vinte e nove centavos), que foi considerado pelos técnicos como "bastante alto não só pela média do estado, para a região, como também temos a título de comparação, os valores médios que são cobrados dos parceleiros do PA Casa Verde na titulação do projeto, que é de R$ 14.391,80, cujo valor é duramente criticado como alto." (fl. 222, da AC nº 2004.60.02.004675-7).

Em que pese a manifestação contrária dos técnicos do INCRA, a Câmara Consultiva da Superintendência Regional do Mato Grosso do Sul do INCRA ofertou parecer favorável à desapropriação do imóvel em 17.07.01, tão-somente após análise formal do procedimento administrativo e sem qualquer motivação quanto à inaptidão do imóvel expropriado para a atividade agrícola (fls. 1357/1362, da AC nº 2004.60.02.004675-7), verbis:

"(...) tendo sido observado adequadamente o devido processo legal, com prévia comunicação da vistoria, franquia de amplas possibilidades de acompanhamento pelos proprietários, notificação sobre o não acatamento da impugnação, abertura de prazo para impugnação; e aferida a suscetibilidade da propriedade à desapropriação, pelo fato de revelar-se grande propriedade improdutiva e não se situar nas áreas vedadas pela Agenda Ambiental do MDA, a pretensão expropriatória da Administração encontra pleno respaldo no Capítulo III, Título VII, da Constituição Federal, da Lei Regulamentadora desses dispositivos e das Normas Internas do INCRA.".

Em 15.08.01, a Superintendência Regional do INCRA, considerando "os resultados retro expostos da vistoria, assim como a aquisição do imóvel pelo INCRA ser do maior interesse desta Administração", formulou quesitos ao engenheiro agrônomo responsável pelo relatório preliminar da Fazenda Teijin, que foram respondidos nos seguintes termos (fls. 1371/1372, da AC nº 2004.60.02.004675-7):

"Em qualquer imóvel localizado naquela região existe a possibilidade de se implantar um projeto de assentamento dependendo o sucesso do mesmo somente de como será feita, a exploração do projeto se com agricultura ou pecuária, a tecnologia que será aplicada, etc. Em meu laudo anexado aos autos, está bem claro que é possível a exploração com silvicultura e/ou pecuária de corte ou de leite.

Existe ao lado deste imóvel, separado unicamente pela estrada estadual MS 134, o Projeto de Assentamento Casa Verde, com área de 29.859,9889 ha, com bom desenvolvimento, e que segundo informações locais, a produção leiteira atinge a quantidade aproximada de 30.000 L de leite por dia.

Entendo que tanto P.A. Casa Verde, como a Fazenda Teijin estão localizados em região estratégica para o desenvolvimento deste Estado, uma vez que estão implantados num dos grandes vazios demográficos existentes neste Estado e, com a aquisição deste imóvel pelo INCRA, possibilitaria não só o assentamento de grande quantidade de famílias de pequenos trabalhadores rurais sem terra deste Estado, como também possibilitaria o surgimento rápido de uma cidade naquela localidade, uma vez que já existe o embrião formado, que é o distrito de Nova Casa Verde.

Entendo que caso o INCRA consiga adquirir o imóvel em tela, as famílias beneficiadas, que por serem de baixa renda, uma das alternativas seria que poderiam explorar as suas parcelas com bovinocultura de leite, aumentando assim a quantidade do produto, o que poderia propiciar até a implantação de uma indústria do ramo nas imediações, mesmo porque, já existe no P.A. Casa Verde, um laticínio.

As pessoas do município sede deste imóvel, e do distrito Nova Casa Verde que mantive contato, vêem com bons olhos e, esperam com grande expectativa a aquisição da propriedade pelo INCRA, porque entendem aumentaria o comércio tanto da sede do município quanto do distrito e uma cidade seria implantada com muita rapidez, beneficiando a todos, uma vez que acabaria também com o grande acampamento existente em volta do imóvel, diminuindo assim, a pressão social na região."(grifei)


Referido parecer foi aditado e a Câmara Consultiva novamente opinou pelo cabimento da desapropriação do ponto de vista formal e processual (fls. 1379/1380, da AC nº 2004.60.02.004675-7).

Em 05.10.01, a Fazenda Teijin foi declarada de interesse social, para fins de reforma agrária, por Decreto Presidencial (fl. 1397, da AC nº 2004.60.02.004675-7).

Como se percebe, o estudo sobre a viabilidade econômica e a potencialidade de uso dos recursos naturais da Fazenda Teijin, realizado pelo próprio INCRA, constatou a inaptidão das terras para a agricultura. Conforme já dito acima, os peritos judiciais igualmente concluíram que as terras não se prestam à atividade agrícola.

E os atos administrativos praticados no sentido de afastar tal estudo desfavorável estão desprovidos de motivação, já que tão-somente analisaram o aspecto formal do procedimento administrativo, sem qualquer manifestação sobre a inaptidão das terras para a agricultura.

Muito embora o engenheiro agrônomo responsável pelo relatório preliminar da Fazenda Teijin tenha afirmado que as terras poderiam ser exploradas com a silvicultura e/ou pecuária de corte ou de leite, também asseverou que o sucesso do assentamento dependeria da tecnologia aplicada.

Ainda que se entenda que um assentamento na Fazenda Teijin alcançaria algum sucesso com a exploração da pecuária extensiva, a exemplo da efetuada no assentamento "Casa Verde" situado em imóvel vizinho, e que este seria o motivo (pressuposto de fato) da manifestação favorável à desapropriação pela Administração Pública, não foi realizado estudo sobre a tecnologia a ser aplicada e, principalmente, do custo de tal investimento e se este seria repassado aos trabalhadores assentados, encarecendo ainda mais o custo por família.

Aliás, os técnicos do INCRA, em análise preliminar, estimaram o custo de R$ 32.446,29 (trinta e dois mil, quatrocentos e quarenta e seis reais e vinte e nove centavos) para o assentamento de 425 famílias em áreas de 50 (cinqüenta) hectares cada uma, valor já considerado extremamente elevado, inclusive em comparação ao assentamento "Casa Verde" (menos do que a metade deste valor).

Em 13.12.01 foi elaborado laudo de avaliação da terra nua e das benfeitorias pelos técnicos do INCRA (fls. 1409/1475, da AC nº 2004.60.02.004675-7). A terra nua foi avaliada em R$ 645,59 (seiscentos e quarenta e cinco reais e cinqüenta e nove centavos) e as benfeitorias em R$ 231,25 (duzentos e trinta e um reais e vinte e cinco centavos) por hectare, perfazendo a média de R$ 876,84 (oitocentos e setenta e seis reais e oitenta e quatro centavos) por hectare. Por fim, os técnicos ratificaram as conclusões do relatório preliminar, desaconselhando a desapropriação da Fazenda Teijin e, quanto ao custo por família assentada, acrescentaram que:

"Foi estimado um valor médio de R$ 500,00/ha, por ocasião da vistoria preliminar, entretanto após a conclusão do presente laudo de avaliação, onde se determinou que o valor de mercado do imóvel é de R$ 876,85/ha, resultou em um custo/família de R$ 56.900,00, elevando substancialmente essa relação.

Para finalizar, queremos ressaltar que o custo família obtido após a avaliação (R$ 56.900,00) extrapola o valor máximo para a região, constante da Planilha Referencial de Preços (R$ 31.500,00), em R$ 25.400,00 ou seja 80,63%." (fl. 1475, da AC nº 2004.60.02.004675-7).

Já em 18.12.01, os engenheiros agrônomos da Superintendência Regional do INCRA propuseram, como forma alternativa de exploração e viabilidade econômica do imóvel expropriado, que:


"(...) o imóvel seja dividido em quinhões a serem explorados coletivamente, quinhões esses que serão dimensionados conforme as características físico-químicas dos solos e disponibilidade de água.

O número de famílias que serão destinadas (sic) a explorar cada quinhão serão selecionadas conforme suas aptidões e, conseqüentemente, serão direcionadas para a exploração de agricultura ou pecuária.

Adotando esse critério, será possível viabilizar o assentamento de algo em torno de 700 (setecentas) famílias de trabalhadores rurais a um custo família de aproximadamente R$ 35.000,00 (trinta e cinco mil reais).

Faz-se necessário, entretanto que o anteprojeto de parcelamento ora elaborado seja respeitado nas suas proposições, haja vista que qualquer modificação acentuada no mesmo poderá causar interferências altamente comprometedoras nos resultados pretendidos.

É extremamente importante que se diga que a Planilha Referencial de Preços utilizada pelo INCRA, no Estado de Mato Grosso do Sul, encontra-se defasada e necessita ser atualizada, pois não reflete os preços atuais de mercado, já que houve um aumento no preço das terras em aproximadamente 30%, conforme as últimas pesquisas efetuadas.

Em conseqüência, se for adotado esse acréscimo em relação ao custo máximo/família para a Micro Região de Nova Andradina, teríamos:

R$ 31.500,00 x 1,3 ="" R$ 40.950,00 (quarenta mil, novecentos e cinqüenta reais).

Portanto, com o assentamento de 700 famílias a um custo/família de R$ 35.000,00 (trinta e cinco mil reais), esse valor estaria dentro dos parâmetros atuais de mercado." (grifei) (fl. 1546, da AC nº 2004.60.02.004675-7).


Porém, ainda que seja considerada a possibilidade de exploração das terras com pecuária extensiva, não foi realizado um estudo prévio quanto à viabilidade econômica de um assentamento a ser realizado nestes termos, muito menos em relação ao efetivo custo por família (dependendo da tecnologia aplicada) e o sucesso da eventual exploração em quinhões coletivos.

Ademais, a proposta de assentamento de 700 famílias em áreas menores tão-somente para reduzir o custo por família, sem qualquer estudo sobre a concreta possibilidade de assentamento desta quantidade de famílias no imóvel expropriado, é inadmissível.

Aliás, conforme foi certificado pelos Oficiais de Justiça do Juízo a quo, em 14.10.06 já se encontravam acampadas no imóvel mais de 1.000 famílias, num total de quase 6.000 pessoas (fl. 3477, da AC nº 2002.60.02.000510-2), extrapolando em muito o estudo inicialmente realizado para o assentamento de 425 famílias.

Frise-se, ainda, que mesmo a proposta de assentamento de um maior número de famílias na Fazenda Teijin não reduziu consideravelmente o custo por família, estimado em R$ 35.000,00 (trinta e cinco mil reais), que, além de ser extremamente elevado para a região, somente foi considerado "dentro dos parâmetros atuais de mercado" após a correção monetária da Planilha Referencial de Preços utilizada no estado do Mato Grosso do Sul em 30 %, efetuada de ofício pelos Engenheiros Agrônomos do INCRA, "já que houve um aumento no preço das terras em aproximadamente 30%, conforme as últimas pesquisas efetuadas." (fl. 1546, da AC nº 2004.60.02.004675-7).

Os peritos judiciais igualmente desaconselharam a desapropriação, pois "a Fazenda Teijin não é viável economicamente para assentamento de trabalhadores rurais", tanto pelas condições de clima e de solo, quanto pelo alto custo por família (fls. 1679 e 1682, da AC nº 2002.60.02.000510-2). A título de comparação, efetuaram pesquisa de campo no assentamento "Casa Verde" situado em imóvel vizinho à Fazenda Teijin, no qual foi implantada a pecuária de corte e de leite. Depois de calculado o valor líquido pago ao produtor de R$ 0,33 (trinta e três centavos de real) por litro de leite produzido, concluíram que:

"Uma criação altamente tecnificada poderia aumentar a taxa de desfrute, ganho de produção por meio de aumento do rebanho, mas a criação a pasto, em solo de baixa fertilidade e qualidade fisico-química inviabiliza inclusive a pecuária leiteira. Outra alternativa seria o aumento da produtividade por vaca com aplicação de capital em tecnologia inexistente.

(...)

Do total de 49 lotes pesquisados, 42 lotes não têm sustentabilidade. Isso representa 85,7%. As pessoas moradoras buscam trabalho fora da atividade agropecuária para sobreviverem; apenas 7 assentados, ou seja, 14,3% disseram que o sítio é auto-sustentável. Portanto, apenas a minoria consegue sobreviver unicamente do leite extraído na propriedade.

(...)

Dos 49 lotes visitados, 19 são assentados primitivos, ou seja 38,8%. A maioria dos 61,2% são sitiantes que compraram lotes dos primitivos.

A porcentagem toma-se maior quanto mais bem localizado encontra-se os lotes. À beira do asfalto mais de 80% dos lotes já foram adquiridos por terceiros.

Dentre os primitivos, apenas 1 disse que consegue ser auto-sustentável, portanto 98% dos primitivos não são auto-sustentáveis. Precisam da aposentadoria, carvoaria, trabalhar fora, enfim de outras fontes de recursos para sobreviverem." (grifei) (fls. 1633/1635, da AC nº 2002.60.02.000510-2).


Conclui-se, portanto, que o imóvel expropriado, além de ser produtivo, não se presta ao assentamento de trabalhadores rurais e, como conseqüência, os atos administrativos praticados durante a fase declaratória da desapropriação, inclusive o Decreto Presidencial expropriatório, devem ser declarados nulos."


Por fim, observo que, na mesma ocasião, esta E. Turma, tendo em vista a situação fática consolidada na Fazenda Teijin, que demonstrou a irreversibilidade da posse, bem como à luz dos princípios da celeridade e da economia processuais, e com o fim de se atingir o escopo da pacificação social dos conflitos, converteu a demanda em desapropriação indireta, com a consequente fixação do valor total da indenização em R$ 45.301.980,56 (quarenta e cinco milhões, trezentos e um mil, novecentos e oitenta reais e cinqüenta e seis centavos).

É o voto.


Henrique Herkenhoff
Desembargador Federal


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