APELAÇÃO CÍVEL (198) Nº 0004531-72.2016.4.03.6104
RELATOR: Gab. 34 - DES. FED. BAPTISTA PEREIRA
APELANTE: ZORAIDE NUNES DO ROSARIO
APELADO: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS
OUTROS PARTICIPANTES:
APELAÇÃO CÍVEL (198) Nº 0004531-72.2016.4.03.6104 RELATOR: Gab. 34 - DES. FED. BAPTISTA PEREIRA APELANTE: ZORAIDE NUNES DO ROSARIO APELADO: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS OUTROS PARTICIPANTES: R E L A T Ó R I O Trata-se de apelação interposta nos autos de ação de conhecimento em que se objetiva seja declarada a inexigibilidade do valor de R$60.755,35, recebido a título de benefício assistencial no período de 13/12/07 a 01/04/15, bem como a não inscrição do nome da autora em dívida ativa. O MM. Juízo a quo extinguiu o feito sem resolução de mérito em relação ao pedido de não inscrição do nome em dívida ativa e julgou improcedente o pedido de declaração de inexigibilidade, condenando a autora em honorários advocatícios de 10% sobre o valor da causa, observando tratar-se de beneficiária da justiça gratuita. Determinou, ainda, a remessa dos autos ao Ministério Público Federal diante de indícios de crime. Inconformada, apela a autora, pleiteando a reforma da r. sentença. Sem contrarrazões, subiram os autos. É o relatório.
APELAÇÃO CÍVEL (198) Nº 0004531-72.2016.4.03.6104 RELATOR: Gab. 34 - DES. FED. BAPTISTA PEREIRA APELANTE: ZORAIDE NUNES DO ROSARIO APELADO: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS OUTROS PARTICIPANTES: V O T O A autora, com 82 anos de idade (nascida em 07/06/37), era titular de benefício assistencial, que recebeu no período de 13/12/07 a 01/04/15. A apelante, quando do requerimento do benefício assistencial, declarou que estava separada de fato, mas o INSS apurou, quando da revisão do benefício, que ela sempre residiu com o marido. Todavia, na certidão de casamento da autora, que instruiu o processo administrativo de concessão do benefício, não consta qualquer averbação (ID 90160107, p. 76). Se a autarquia, com estas informações, ainda tivesse dúvidas sobre as declarações prestadas pela autora quando do requerimento do benefício assistencial, lhe restava indeferir ou requerer mais provas. Contudo, assim não o fez e deferiu o benefício. A autarquia dispõe de toda a informação constante do CNIS para averiguar o preenchimento dos requisitos, tendo se mantido inerte. Acresça-se que não se pode olvidar que cabe à autarquia previdenciária, a cada dois anos, reavaliar as condições do beneficiário, a fim de verificar a manutenção dos requisitos necessários e determinar a manutenção ou não do benefício assistencial e, no presente caso, a reavaliação somente foi realizada em 18/05/2015 (ID 90160107, p. 21). Ademais, independentemente da autora estar ou não separada de fato, o critério da renda per capita do núcleo familiar não é o único a ser utilizado para se comprovar a condição de miserabilidade do deficiente ou idoso que pleiteia o benefício. Há outros fatores que podem demonstrar se na residência da autora a família vive em situação de penúria, por não ser a renda auferida suficiente para suprir as necessidades vitais do grupo familiar. Assim, pelo que consta dos autos, os valores foram recebidos de boa-fé e por erro da Administração. Em razão da natureza alimentar do benefício recebido, não há que se falar em restituição desses valores. Restou pacificado pelo e. Supremo Tribunal Federal, ser desnecessária a restituição dos valores recebidos de boa fé, devido ao seu caráter alimentar, em razão do princípio da irrepetibilidade dos alimentos. Confira-se: "MANDADO DE SEGURANÇA. ATO DO TRIBUNAL DE CONTAS DA UNIÃO QUE CONSIDEROU ILEGAL APOSENTADORIA E DETERMINOU A RESTITUIÇÃO DE VALORES. ACUMULAÇÃO ILEGAL DE CARGOS DE PROFESSOR. AUSÊNCIA DE COMPATIBILIDADE DE HORÁRIOS. UTILIZAÇÃO DE TEMPO DE SERVIÇO PARA OBTENÇÃO DE VANTAGENS EM DUPLICIDADE (ARTS. 62 E 193 DA LEI N. 8.112/90). MÁ- FÉ NÃO CONFIGURADA. DESNECESSIDADE DE RESTITUIÇÃO DOS VALORES PERCEBIDOS. INOCORRÊNCIA DE DESRESPEITO AO DEVIDO PROCESSO LEGAL E AO DIREITO ADQUIRIDO. 1. A compatibilidade de horários é requisito indispensável para o reconhecimento da licitude da acumulação de cargos públicos. É ilegal a acumulação dos cargos quando ambos estão submetidos ao regime de 40 horas semanais e um deles exige dedicação exclusiva. 2. O § 2º do art. 193 da Lei n. 8.112/1990 veda a utilização cumulativa do tempo de exercício de função ou cargo comissionado para assegurar a incorporação de quintos nos proventos do servidor (art. 62 da Lei n. 8.112/1990) e para viabilizar a percepção da gratificação de função em sua aposentadoria (art. 193, caput, da Lei n. 8.112/1990). É inadmissível a incorporação de vantagens sob o mesmo fundamento, ainda que em cargos públicos diversos. 3. O reconhecimento da ilegalidade da cumulação de vantagens não determina, automaticamente, a restituição ao erário dos valores recebidos, salvo se comprovada a má- fé do servidor, o que não foi demonstrado nos autos. 4. A jurisprudência do Supremo Tribunal Federal tem-se firmado no sentido de que, no exercício da competência que lhe foi atribuída pelo art. 71, inc. III, da Constituição da República, o Tribunal de Contas da União cumpre os princípios do contraditório, da ampla defesa e do devido processo legal quando garante ao interessado - como se deu na espécie - os recursos inerentes à sua defesa plena. 5. Ato administrativo complexo, a aposentadoria do servidor, somente se torna ato perfeito e acabado após seu exame e registro pelo Tribunal de Contas da União. 6. Segurança parcialmente concedida. (STF , MS 26085, Relatora Min. Cármen Lúcia, Tribunal Pleno, julgado em 07/04/2008, DJe-107 divulg 12-06-2008 public 13-06-2008 ement vol-02323-02 PP-00269 RTJ VOL-00204-03 PP-01165)". Ainda, no julgamento do RE 587.371, o Pleno do STF ressaltou, conforme excerto do voto do Ministro Relator: "... 2) preservados, no entanto, os valores da incorporação já percebidos pelo recorrido, em respeito ao princípio da boa - fé , (...)" ( STF , RE 587371, Relator: Min. Teori Zavascki, Tribunal Pleno, julgado em 14/11/2013, acórdão eletrônico Repercussão Geral - Mérito, DJe-122 divulg 23.06.2014, public 24.06.2014). E, mais recentemente, o Pleno do STF, ao julgar o RE 638115, novamente decidiu pela irrepetibilidade dos valores recebidos de boa fé, conforme a ata de julgamento de 23.03.2015, abaixo transcrita: "Decisão: Preliminarmente, o Tribunal, por maioria, apreciando o tema 395 da repercussão geral, conheceu do recurso extraordinário, vencidos os Ministros Rosa Weber, Luiz Fux, Cármen Lúcia e Celso de Mello. Em seguida, o Tribunal, por maioria, deu provimento ao recurso extraordinário, vencidos os Ministros Luiz Fux, Cármen Lúcia e Celso de Mello. O Tribunal, por maioria, modulou os efeitos da decisão para desobrigar a devolução dos valores recebidos de boa-fé pelos servidores até esta data, nos termos do voto do relator, cessada a ultra-atividade das incorporações concedidas indevidamente, vencido o Ministro Marco Aurélio, que não modulava os efeitos da decisão. Impedido o Ministro Roberto Barroso. Presidiu o julgamento o Ministro Ricardo Lewandowski. Plenário, 19.03.2015. (RE 638115, Relator Min. Gilmar Mendes, Tribunal Pleno, julgado em 19/03/2015, processo eletrônico Repercussão Geral - Mérito DJe-151 divulg 31-07-2015 public 03-08-2015)". De sua vez, o e. Superior Tribunal de Justiça firmou entendimento no sentido de ser indevida a restituição de valores recebidos de boa fé em decorrência de erro da Administração: "PROCESSUAL CIVIL E PREVIDENCIÁRIO. AUSÊNCIA DE PREQUESTIONAMENTO. SÚMULA 211/STJ. DEFICIÊNCIA NA FUNDAMENTAÇÃO. SÚMULA 284/STF. PENSÃO POR MORTE. FILHA MAIOR SOLTEIRA NÃO OCUPANTE DE CARGO PÚBLICO. UNIÃO ESTÁVEL. CONDIÇÃO DE SOLTEIRA. AUSÊNCIA DE REQUISITO LEGAL. DESCARACTERIZAÇÃO. IRREPETIBILIDADE DAS VERBAS ALIMENTARES RECEBIDAS DE BOA-FÉ. ENTENDIMENTO CONSOLIDADO DO STJ. PRECEDENTES. SÚMULA 83 DO STJ. 1. ... "omissis". 2. ... "omissis". 3. Na hipótese dos autos, a jurisprudência pacífica do STJ é no sentido da impossibilidade de devolução, em razão do caráter alimentar aliado à percepção de boa-fé, dos valores percebidos por beneficiário da Previdência Social, por erro da Administração, aplicando ao caso o princípio da irrepetibilidade dos alimentos. 4. Recurso Especial parcialmente conhecido e, nessa parte, não provido. (REsp 1721750/RN, Rel. Ministro HERMAN BENJAMIN, SEGUNDA TURMA, julgado em 19/04/2018, DJe 23/05/2018); AGRAVO INTERNO. PREVIDENCIÁRIO. DESCONTO DE VALORES RECEBIDOS DE BOA-FÉ DA APOSENTADORIA DO SEGURADO. IMPOSSIBILIDADE. CARÁTER ALIMENTAR DO BENEFÍCIO. RESTITUIÇÃO. PRECEDENTES: RESP 1.550.569/SC, REL. MIN. REGINA HELENA COSTA, DJE 18.5.2016; RESP 1.553.521/CE, REL. MIN. HERMAN BENJAMIN, DJE 2.2.2016; AGRG NO RESP 1.264.742/PR, REL. MIN. NEFI CORDEIRO, DJE 3.9.2015. AGRAVO DESPROVIDO. 1. Esta Corte tem o entendimento de que, em face da hipossuficiência do segurado e da natureza alimentar do benefício, e tendo a importância sido recebida de boa-fé por ele, mostra-se inviável impor ao benefíciário a restituição das diferenças recebidas. Precedentes: REsp. 1.550.569/SC, Rel. Min. REGINA HELENA COSTA, DJe 18.5.2016; REsp. 1.553.521/CE, Rel. Min. HERMAN BENJAMIN, DJe 2.2.2016; AgRg no REsp. 1.264.742/PR, Rel. Min. NEFI CORDEIRO, DJe 3.9.2015. 2. Ressalta-se que o presente julgamento debate tema distinto daquele sedimentado na apreciação do REsp. 1.401.560/MT, representativo de controvérsia, não se referindo à devolução de verbas conferidas por decisão precária, a título de tutela antecipada. 3. Agravo Interno do INSS desprovido. (AgInt no REsp 1441615/SE, Rel. Ministro NAPOLEÃO NUNES MAIA FILHO, PRIMEIRA TURMA, julgado em 09/08/2016, DJe 24/08/2016)". Destarte, é de se reformar em parte a r. sentença para declarar a inexigibilidade da cobrança dos valores recebidos a título de benefício assistencial. Todavia, não há que se falar em condenação da autarquia em honorários advocatícios em favor da Defensoria Pública da União, pois o INSS, por ser integrante da Administração Pública Federal Indireta, é vinculado à União Federal, tal qual a DPU, ambos custeados por recursos federais, sob pena de configuração de confusão entre credor e devedor, na forma do Art. 381, do CC, e da Súmula 421, do STJ. Nesse sentido, os julgados abaixo transcritos: "ADMINISTRATIVO. PROCESSUAL CIVIL. RECURSO ESPECIAL REPRESENTATIVO DE CONTROVÉRSIA REPETITIVA. RIOPREVIDÊNCIA. HONORÁRIOS ADVOCATÍCIOS. PAGAMENTO EM FAVOR DA DEFENSORIA PÚBLICA DO ESTADO DO RIO DE JANEIRO. NÃO CABIMENTO. RECURSO CONHECIDO E PROVIDO. 1. 'Os honorários advocatícios não são devidos à Defensoria Pública quando ela atua contra a pessoa jurídica de direito público à qual pertença' (Súmula 421/STJ). 2. Também não são devidos honorários advocatícios à Defensoria Pública quando ela atua contra pessoa jurídica de direito público que integra a mesma Fazenda Pública. 3. Recurso especial conhecido e provido, para excluir da condenação imposta ao recorrente o pagamento de honorários advocatícios." (STJ, REsp 1199715/RJ, Rel. Min. ARNALDO ESTEVES LIMA, CORTE ESPECIAL, julgado em 16/02/2011, DJe 12/04/2011) e "PREVIDENCIÁRIO. AGRAVO. CONDENAÇÃO DO INSS. DEFENSORIA PÚBLICA DA UNIÃO. HONORÁRIOS ADVOCATÍCIOS INDEVIDOS. I. A parte autora é representada pela Defensoria Pública da União em ação ajuizada em face do INSS, ambos os órgãos inseridos no conceito de Fazenda Pública. II. Assim, não há que se falar em honorários advocatícios devidos à Defensoria pelo INSS, uma vez que resta configurada a hipótese de confusão entre a pessoa do credor e a do devedor, nos termos do artigo 381 do Código Civil e Súmula n.º 421 do STJ. III. Agravo a que se nega provimento." (TRF3, AC 1874/SP - 0001874-33.2011.4.03.6105, Rel. Des. Fed. WALTER DO AMARAL, Décima Turma, data de julgamento: 15/01/2013). A autarquia previdenciária está isenta das custas e emolumentos, nos termos do Art. 4º, I, da Lei 9.289/96, do Art. 24-A da Lei 9.028/95, com a redação dada pelo Art. 3º da MP 2.180-35/01, e do Art. 8º, § 1º, da Lei 8.620/93. Ante o exposto, dou provimento à apelação. É o voto.
PREVIDENCIÁRIO. BENEFÍCIO ASSISTENCIAL RECEBIDO DE BOA FÉ. ERRO DA ADMINISTRAÇÃO. NATUREZA ALIMENTAR. IRREPETIBILIDADE DOS VALORES.
1. Restou pacificado pelo e. Supremo Tribunal Federal, ser desnecessária a restituição dos valores recebidos de boa fé, devido ao seu caráter alimentar, em razão do princípio da irrepetibilidade dos alimentos (MS 26085, Relatora Ministra Cármen Lúcia, Tribunal Pleno; RE 587371, Relator Ministro Teori Zavascki, Tribunal Pleno; RE 638115, RE 638115, Relator Ministro Gilmar Mendes, Tribunal Pleno).
2. De sua vez, o e. Superior Tribunal de Justiça firmou entendimento no sentido de ser indevida a restituição de valores recebidos de boa fé em decorrência de erro da Administração.
3. Não há que se falar em condenação da autarquia em honorários advocatícios em favor da Defensoria Pública da União, pois o INSS, por ser integrante da Administração Pública Federal Indireta, é vinculado à União Federal, tal qual a DPU, ambos custeados por recursos federais, sob pena de configuração de confusão entre credor e devedor, na forma do Art. 381, do CC, e da Súmula 421, do STJ.
4. A autarquia previdenciária está isenta das custas e emolumentos, nos termos do Art. 4º, I, da Lei 9.289/96, do Art. 24-A da Lei 9.028/95, com a redação dada pelo Art. 3º da MP 2.180-35/01, e do Art. 8º, § 1º, da Lei 8.620/93.
5. Apelação provida.