Diário Eletrônico

PODER JUDICIÁRIO

TRIBUNAL REGIONAL FEDERAL DA 3ª REGIÃO
 PODER JUDICIÁRIO
Tribunal Regional Federal da 3ª Região
8ª Turma

APELAÇÃO CÍVEL (198) Nº 5285680-34.2020.4.03.9999

RELATOR: Gab. 27 - DES. FED. THEREZINHA CAZERTA

APELANTE: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS

APELADO: FRANCISCO CARLOS ALVES

Advogado do(a) APELADO: LICELE CORREA DA SILVA FERNANDES - SP129377-N

OUTROS PARTICIPANTES:

 

 


 

  

APELAÇÃO CÍVEL (198) Nº 5285680-34.2020.4.03.9999

RELATOR: Gab. 27 - DES. FED. THEREZINHA CAZERTA

APELANTE: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS

 

APELADO: FRANCISCO CARLOS ALVES

Advogado do(a) APELADO: LICELE CORREA DA SILVA FERNANDES - SP129377-N

OUTROS PARTICIPANTES:

 

 

­R E L A T Ó R I O

 

 

Demanda proposta objetivando a concessão de aposentadoria por invalidez ou o restabelecimento de auxílio-doença, desde a data da cessação administrativa (18/5/2018).

O juízo a quo julgou parcialmente procedente o pedido formulado, reconhecendo à parte autora o direito ao restabelecimento de auxílio-doença, a partir da cessação. Deferiu a antecipação dos efeitos da tutela, consignando que: “deverá ser mantida até final julgamento ou ulterior decisão em sentido contrário, ficando a autora advertida da restituição dos valores em caso de reforma, por força do Tema n. 692, do STJ. Fixo a multa de R$5.000,00, a contar do 15.º dia seguinte à intimação da ordem, em caso de descumprimento.” (Id. 136848581)

O INSS apela, pleiteando a reforma da sentença, sustentando, em síntese, a dilação do prazo para cumprimento da tutela antecipada, bem como a redução da multa em caso de descumprimento.

Com contrarrazões, subiram os autos.

É o relatório.

 

 

THEREZINHA CAZERTA

Desembargadora Federal Relatora

 

 


APELAÇÃO CÍVEL (198) Nº 5285680-34.2020.4.03.9999

RELATOR: Gab. 27 - DES. FED. THEREZINHA CAZERTA

APELANTE: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS

 

APELADO: FRANCISCO CARLOS ALVES

Advogado do(a) APELADO: LICELE CORREA DA SILVA FERNANDES - SP129377-N

OUTROS PARTICIPANTES:

 

 

­V O T O

 

 

Tempestivo o recurso e presentes os demais requisitos de admissibilidade, passa-se ao exame da insurgência propriamente dita, considerando-se a matéria objeto de devolução.

 

DA APOSENTADORIA POR INVALIDEZ E DO AUXÍLIO-DOENÇA

 

Os requisitos da aposentadoria por invalidez encontram-se preceituados nos arts. 42 e seguintes da Lei n.° 8.213/91, consistindo, mais precisamente, na presença da qualidade de segurado, na existência de incapacidade total e permanente para o trabalho e na ocorrência do cumprimento da carência, quando exigida.

O auxílio-doença, por sua vez, tem seus pressupostos previstos nos art. 59 e seguintes do mesmo diploma legal, sendo concedido nos casos de incapacidade temporária.

Excepcionalmente, com base em entendimento jurisprudencial consolidado, admite-se a concessão de tais benefícios mediante comprovação pericial de incapacidade parcial e definitiva para o desempenho da atividade laborativa, que seja incompatível com a ocupação habitual do requerente e que implique em limitações tais que restrinjam sobremaneira a possibilidade de recolocação no mercado de trabalho, diante das profissões que exerceu durante sua vida profissional (STJ: AgRg no AREsp 36.281/MS, rel. Ministra ASSUSETE MAGALHÃES, 6.ª Turma, DJe de 01/03/2013; e AgRg no AREsp 136474/MG, rel. Ministro NAPOLEÃO NUNES MAIA FILHO, 1.ª Turma, DJe de 29/06/2012).

Imprescindível, ainda, o preenchimento do requisito da qualidade de segurado, nos termos dos arts. 11 e 15, ambos da Lei de Benefícios.

 

"Mantém a qualidade de segurado, independentemente de contribuições:

I - sem limite de prazo, quem está em gozo de benefício;

II - até 12 (doze) meses após a cessação das contribuições, o segurado que deixar de exercer atividade remunerada abrangida pela Previdência Social ou estiver suspenso ou licenciado sem remuneração;

III - até 12 (doze) meses após cessar a segregação, o segurado acometido de doença de segregação compulsória;

IV - até 12 (doze) meses após o livramento, o segurado retido ou recluso;

V - até 3 (três) meses após o licenciamento, o segurado incorporado às Forças Armadas para prestar serviço militar;

VI - até (seis) meses após a cessação das contribuições, o segurado facultativo.

§ 1º O prazo do inciso II será prorrogado para até 24 (vinte e quatro) meses se o segurado já tiver pago mais de 120 (cento e vinte) contribuições mensais sem interrupção que acarrete a perda da qualidade de segurado.

§ 2º Os prazos do inciso II ou do § 1º serão acrescidos de 12 (doze) meses para o segurado desempregado, desde que comprovada essa situação pelo registro no órgão próprio do Ministério do Trabalho e da Previdência Social.

§ 3º Durante os prazos deste artigo, o segurado conserva todos os seus direitos perante a Previdência Social.

§ 4º A perda da qualidade de segurado ocorrerá no dia seguinte ao do término do prazo fixado no Plano de Custeio da Seguridade Social para recolhimento da contribuição referente ao mês imediatamente posterior ao do final dos prazos fixados neste artigo e seus parágrafos."

 

A perda da qualidade de segurado, portanto, ocorrerá no 16.º dia do segundo mês seguinte ao término do prazo fixado no art. 30, II, da Lei n.º 8.212/91, salvo na hipótese do § 1.º do art. 102 da Lei n.º 8.213/91 – qual seja, em que comprovado que a impossibilidade econômica de continuar a contribuir decorreu da incapacidade laborativa.

Registre-se que, perdida a qualidade de segurado, imprescindível a existência de, pelo menos, seis meses de recolhimento, para que seja considerado novamente filiado ao regime, nos exatos termos do art. 27-A da Lei de Benefícios.

Por fim, necessário o cumprimento do período de carência, nos termos do art. 25 dessa mesma lei, a saber:

 

“Art. 25. A concessão das prestações pecuniárias do Regime Geral de Previdência Social depende dos seguintes períodos de carência, ressalvado o disposto no artigo 26:

I – auxílio-doença e aposentadoria por invalidez: 12 (doze) contribuições mensais;”

 

Em casos específicos, em que demonstrada a necessidade de assistência permanente de outra pessoa, possível, ainda, com base no art. 45 da Lei de Benefícios, o acréscimo de 25% ao valor da aposentadoria por invalidez porventura concedida.

 

DO CASO DOS AUTOS

 

In casu, a matéria devolvida à apreciação desta Corte cinge-se à análise do prazo para cumprimento da tutela antecipada deferida, bem como da razoabilidade do valor da multa imposta em caso de descumprimento, de R$ 5.000,00.

Em recentes julgamentos a respeito do tema, o Superior Tribunal de Justiça assim enfrentou o tema:

“O Superior Tribunal de Justiça, como guardião da legislação federal e da segurança jurídica, deve zelar pela credibilidade do Poder Judiciário como um todo, dele devendo partir as diretrizes que dão sustento à força cogente das decisões judiciais em qualquer instância, e não servir de inspiração para o desacato premeditado das ordens que emanam desse Poder, cabendo aqui a máxima de que ‘ordem judicial não se discute, se cumpre’. Em um Estado Democrático de Direito, as ordens judiciais não são passíveis de discussão, senão pela via dos recursos cabíveis.

O destinatário da ordem judicial deve ter em mente a certeza de que eventual desobediência lhe trará consequências mais gravosas que o próprio cumprimento da ordem, e não a expectativa de redução ou de limitação da multa a ele imposta, sob pena de tornar inócuo o instituto processual e de violar o direito fundamental à efetividade da tutela jurisdicional.”

(STJ, REsp 1819069/SC, Rel. Min. Ricardo Villas Bôas Cueva, Terceira Turma, j. 26/05/2020, DJe 29/05/2020184)

“A respeito do montante da multa diária, o Superior Tribunal de Justiça possui jurisprudência pacífica no sentido de que o valor das astreintes deve guardar relação de proporcionalidade com o interesse a ser protegido pela prestação da obrigação principal, evitando-se, assim, o desvirtuamento da medida coercitiva, que poderia i) ser mais atrativa ao demandado, por ser a transgressão mais lucrativa que o cumprimento da obrigação (insuficiência da penalidade), ou ii) ser mais vantajosa ao demandante, que enriqueceria abruptamente às custas do réu (penalidade excessiva).

Com efeito, a multa cominatória tem por finalidade constranger o devedor a adotar um comportamento tendente à implementação da obrigação, e não servir de compensação pela deliberada inadimplência.

Assim, para a apuração da razoabilidade e da proporcionalidade das astreintes, não é recomendável se utilizar apenas do critério comparativo entre o valor da obrigação principal e a soma total obtida com o descumprimento da medida coercitiva, sendo mais adequado, em regra, o cotejamento ponderado entre o valor diário da multa no momento de sua fixação e a prestação que deve ser adimplida pelo demandado recalcitrante.

A esse respeito, confiram-se: REsp nº 1.475.157/SC, Rel. Ministro Marco Aurélio Bellizze, DJe 6/10/2014, e AgRg no AREsp nº 394.283/SC, Rel. Ministro Moura Ribeiro, DJe 26/2/2016.

(...)

No julgamento do AgInt no AgRg no AREsp nº 738.682/RJ, o Ministro Luis Felipe Salomão, ao discorrer acerca dos parâmetros normalmente admitidos pela jurisprudência desta Corte Superior para fins de fixação da multa cominatória, constatou que, por vezes, eles apresentam certa incompatibilidade: (...)

Ao final de seu voto, destacou Sua Excelência que 'a vinculação das astreintes à obrigação principal ou à dimensão econômica do dever, apesar de parâmetro confiável, não é, por óbvio, critério absoluto, sendo apenas um dos elementos a ser levados em conta' (AgInt no AgRg no AREsp 738.682/RJ, Rel. p/ acórdão Ministro Luis Felipe Salomão, Quarta Turma, julgado em 17/11/2016, DJe 14/12/2016).

Nessa mesma ocasião, foram elencados os seguintes parâmetros para a adequada fixação do valor das astreintes: i) valor da obrigação e importância do bem jurídico tutelado; ii) tempo para cumprimento (prazo razoável e periodicidade); iii) capacidade econômica e capacidade de resistência do devedor e iv) possibilidade de adoção de outros meios pelo magistrado e dever do credor de mitigar o próprio prejuízo (duty to mitigate de loss).”

(STJ, REsp 1840693/SC, Rel. Min. Ricardo Villas Bôas Cueva, Terceira Turma, j. 26/05/2020, DJe 29/05/2020)

Esta 8.ª Turma entende que a multa diária na proporção de 1/30 do benefício atende tanto a intimidação do devedor para a força cogente das decisões judiciais quanto a relação de proporcionalidade com o interesse a ser protegido pela prestação da obrigação principal. Veja-se que, dado o prazo de 30 dias para o cumprimento da determinação de implantação do benefício, caso descumprido, o INSS passaria a pagar o valor correspondente a uma prestação do benefício previdenciário a mais por mês.

Trago à colação os precedentes desta Turma:

“PROCESSUAL CIVIL E PREVIDENCIÁRIO. AGRAVO DE INSTRUMENTO. CUMPRIMENTO DE SENTENÇA. MULTA DIÁRIA. POSSIBILIDADE DE MODIFICAÇÃO OU REVOGAÇÃO PELO MAGISTRADO. RETARDO INJUSTIFICADO OU DELIBERADO NO CUMPRIMENTO DA DECISÃO JUDICIAL. OCORRÊNCIA. INTIMAÇÃO NA PESSOA DO PROCURADOR CONSTITUÍDO NOS AUTOS. VEDAÇÃO AO ENRIQUECIMENTO SEM CAUSA. REDUÇÃO DA MULTA. ENTENDIMENTO DESTA CORTE.

- A legislação processual civil permite a imposição de multa como meio coercitivo, com vistas a assegurar a efetividade no cumprimento da ordem judicial expedida. Conforme entendimento firmado pela jurisprudência, essa multa pode ser a qualquer tempo revogada ou modificada, de acordo com o poder discricionário do magistrado.

- A jurisprudência do C. Superior Tribunal de Justiça firmou entendimento no sentido de ser possível a cominação de multa diária com o fim de compelir o INSS ao cumprimento de obrigação de fazer consistente na implantação de benefício previdenciário. No entanto, conforme entendimento firmado pela jurisprudência, essa multa pode ser a qualquer tempo revogada ou modificada, de acordo com o poder discricionário do magistrado. Precedentes

- No caso dos autos, o INSS foi intimado, na pessoa de seu procurador, deixando, contudo, de dar cumprimento à ordem judicial de cumprimento da obrigação de fazer determinada no título, caracterizando-se o decurso do prazo de 112 dias, entre o termo final estabelecido para cumprimento na decisão que arbitrou a multa e o efetivo cumprimento da obrigação em referência (de 11/11/2019 até 02/03/2020).

- A esse respeito, cumpre ressaltar que, a teor do disposto no art. 513, §2º, do CPC, a intimação foi realizada, na pessoa do procurador constituído nos autos, ficando superada a exigência de intimação pessoal do devedor, prevista na Súmula 410 do STJ, cuja edição ocorreu sob a égide do CPC de 1973. Nesse sentido: TRF 3ª Região, 8ª Turma, AI - AGRAVO DE INSTRUMENTO - 5024108-22.2019.4.03.0000, Rel. Desembargador Federal DAVID DINIZ DANTAS, julgado em 02/06/2020, Intimação via sistema DATA: 05/06/2020.

- Contudo, levando em consideração que a imposição de multa cominatória não pode servir ao enriquecimento sem causa, esta Oitava Turma possui o entendimento de que a multa diária deve ser fixada em 1/30 (um trinta avos) do valor do benefício, por dia de atraso.

- Desse modo, considerando que o valor de R$ 20.000,00 (vinte mil reais), a título de astreintes, mostra-se em descompasso com esse entendimento, impõe-se sua redução nos moldes acima delineados, não prosperando, contudo, o pedido de sua exclusão, porquanto caracterizado o atraso injustificado na implantação do benefício. 

- Agravo de instrumento parcialmente provido."

(TRF 3ª Região, 8ª Turma, AI - AGRAVO DE INSTRUMENTO, 5020142-17.2020.4.03.0000, Rel. Desembargador Federal LUIZ DE LIMA STEFANINI, julgado em 10/12/2020, e - DJF3 Judicial 1 DATA: 15/12/2020)

 

"PREVIDENCIÁRIO. PROCESSUAL CIVIL. AGRAVO DE INSTRUMENTO. MULTA POR DIA DE ATRASO. VALOR EXCESSIVO. REDUÇÃO. RAZOABILIDADE. PARCIAL PROVIMENTO DO RECURSO.

A imposição de multa pecuniária demanda obediência a determinados parâmetros, v. g., relacionados à função meramente intimidatória da astreinte, à impropriedade de se aplicá-la como mera reparadora de danos ou ao menor sacrifício ao sujeito passivo.

In casu, sua aplicação justifica-se em face da demora na implantação do benefício, considerada a data de intimação do INSS.

Seguindo o entendimento jurisprudencial, contudo, a multa diária imposta à entidade autárquica deve sofrer redução para 1/30 (um trinta avos) da RMI.

Agravo de instrumento parcialmente provido."

(TRF 3ª Região, 8ª Turma, AI - AGRAVO DE INSTRUMENTO, 5008272-72.2020.4.03.0000, Rel. Desembargador Federal DAVID DINIZ DANTAS, julgado em 20/10/2020, e - DJF3 Judicial 1 DATA: 22/10/2020)

Dessa forma, cabível a imposição de astreintes ao INSS, assim como a dilação do prazo para 30 dias para o cumprimento judicial e a redução do valor da multa diária fixada para 1/30 do valor do benefício.

Posto isso, dou parcial provimento à apelação, para fixar os critérios de incidência do prazo para cumprimento da tutela antecipada deferida e multa diária, nos termos da fundamentação, supra.

É o voto.

 

 

THEREZINHA CAZERTA

Desembargadora Federal Relatora



E M E N T A

 

PREVIDENCIÁRIO. APOSENTADORIA POR INVALIDEZ. AUXÍLIO-DOENÇA. ASTREINTES. OBRIGAÇÃO DE FAZER PELO INSS. MULTA DIÁRIA CORRESPONDENTE A 1/30 DO VALOR DO BENEFÍCIO. ATENDIMENTO AOS FINS DA IMPOSIÇÃO DA MULTA.  

- A imposição da multa diária como meio coercitivo para o cumprimento de obrigação de fazer tem respaldo nos arts. 536, § 1.º, e 537 do Código de Processo Civil.

- A jurisprudência também afirmou a possibilidade de cobrança de astreintes do INSS.

- Esta 8.ª Turma entende que a multa diária na proporção de 1/30 do benefício atende tanto a intimidação do devedor para a força cogente das decisões judiciais quanto a relação de proporcionalidade com o interesse a ser protegido pela prestação da obrigação principal.

 


  ACÓRDÃO

Vistos e relatados estes autos em que são partes as acima indicadas, a Oitava Turma, por unanimidade, decidiu dar parcial provimento à apelação, para fixar os critérios de incidência do prazo para cumprimento da tutela antecipada deferida e multa diária, nos termos do relatório e voto que ficam fazendo parte integrante do presente julgado.