Diário Eletrônico

PODER JUDICIÁRIO

TRIBUNAL REGIONAL FEDERAL DA 3ª REGIÃO
 PODER JUDICIÁRIO
Tribunal Regional Federal da 3ª Região
6ª Turma

APELAÇÃO CÍVEL (198) Nº 5484785-26.2019.4.03.9999

RELATOR: Gab. 18 - DES. FED. SOUZA RIBEIRO

APELANTE: ALMIR DE PAULA CARNEIRO, EDNA DE FATIMA BALDACINI

Advogado do(a) APELANTE: JOAO APARECIDO PEREIRA NANTES - SP59203-A
Advogado do(a) APELANTE: JOAO APARECIDO PEREIRA NANTES - SP59203-A

APELADO: UNIAO FEDERAL - FAZENDA NACIONAL

OUTROS PARTICIPANTES:

 

 


 

  

 PODER JUDICIÁRIO
Tribunal Regional Federal da 3ª Região
6ª Turma
 

APELAÇÃO CÍVEL (198) Nº 5484785-26.2019.4.03.9999

RELATOR: Gab. 18 - DES. FED. SOUZA RIBEIRO

APELANTE: ALMIR DE PAULA CARNEIRO, EDNA DE FATIMA BALDACINI

Advogado do(a) APELANTE: JOAO APARECIDO PEREIRA NANTES - SP59203-A
Advogado do(a) APELANTE: JOAO APARECIDO PEREIRA NANTES - SP59203-A

APELADO: UNIAO FEDERAL - FAZENDA NACIONAL

 

OUTROS PARTICIPANTES:

 

 

 

R E L A T Ó R I O

 

O SENHOR DESEMBARGADOR FEDERAL SOUZA RIBEIRO (Relator): Trata-se de agravo interno interposto por ALMIR DE PAULA CARNEIRO e Outra em face de decisão monocrática que rejeitou a matéria preliminar suscitada pelos ora agravantes e, no mérito, negou provimento ao recurso de apelação por eles ofertado, para manter a sentença que julgou improcedentes os embargos de terceiro, mantendo a constrição sobre a fração ideal de 3,3333% do imóvel de matrícula nº 5.100, do CRI da Comarca de Santa Cruz do Rio Pardo/SP, imposta nos autos da execução fiscal nº 0006478-91.2002.8.26.0539, ajuizada pela embargada em desfavor da empresa “ORTOEXPRESS COMÉRCIO E MATERIAL HOSPITALAR LTDA.” e Renata Abras.

A decisão ora impugnada (Id 125851533), foi exarada nos seguintes termos:

 

“Trata-se de embargos de terceiro opostos por Almir de Paula Carneiro e Edna de Fátima Baldacini Carneiro em face da União Federal (Fazenda Nacional), objetivando a desconstituição da constrição imposta sobre a fração ideal de 3,3333% do imóvel objeto da matrícula nº 5.100, do Cartório de Registro de Imóveis da Comarca de Santa Cruz de Rio Pardo/SP, nos autos da execução fiscal nº 0006478-91.2002.8.26.0539, ajuizada pela embargada em desfavor da empresa “ORTOEXPRESS COMÉRCIO E MATERIAL HOSPITALAR LTDA.” e Renata Abras, para cobrança de débitos tributários. Requereu, ainda, a concessão de tutela antecipada para suspender as hastas públicas já determinadas, até o julgamento do mérito da presente ação.

A parte embargante alegou, em síntese, ter adquirido o imóvel em questão, em 21/03/2007, por contrato de compromisso de venda e compra, em momento anterior à citação da alienante, tendo, apenas, a lavratura da respectiva escritura ocorrido em 30/07/2014. Ressalvou, também, que exercia a posse do aludido bem muito antes de adquirir sua propriedade.

Aduziu que a parte do imóvel objeto da constrição foi transmitida por herança à alienante, Renata Abras, cujo formal de partilha, expedido em 22/12/2003, foi registrado em 06/01/2005, consignando que, já em 08/08/2013 adquiriu a propriedade plena de parte ideal de 50% do imóvel, e após a partilha, os demais herdeiros lhe venderam mais 30% do bem, aos 27/08/2013, e, logo após os demais sucessores, membros da família da executada, em conjunto com esta, lhe transferiram o restante da propriedade.

Aduziu tratar-se de adquirente de boa-fé, uma vez que à época da aquisição não constava da respectiva matrícula qualquer registro de penhora ou restrição sobre aludido bem, razão pela qual não há falar-se em fraude à execução, nos termos da Súmula 375 do STJ.

Argumentou, ainda, a existência de excesso de penhora, uma vez que a avaliação do imóvel considerou sua integralidade e não apenas a fração ideal objeto da constrição, devendo, portanto, ser ajustada para não prejudicar o embargante (id 49338878). Valor da causa, fixado de ofício pelo Juízo a quo, no montante de R$ 21.666,45 (vinte e um mil, seiscentos e sessenta e seis reais e quarenta e cinco centavos) (id 49338920).

Decisão de recebimento dos embargos, com suspensão da execução em relação ao imóvel em discussão, em 03/04/2018 (id 49339006).

Citada, a União contestou o pedido, sustentando que a transferência do imóvel ocorreu depois da inscrição do débito na dívida ativa da União e da inclusão da coexecutada no polo passivo da execução, sendo flagrante, portanto, a ocorrência de fraude à execução, nos termos do art. 185, do CTN e entendimento jurisprudencial pacificado pelo STJ, no julgamento do REsp 1.141.990/PR, submetido à sistemática dos recursos repetitivos, e independentemente da boa-fé do adquirente.

Alegou, ainda, que, a despeito da irrelevância da existência ou não de boa-fé do adquirente para configuração da fraude à execução, uma vez tratar-se de execução fiscal, na espécie, não se vislumbra a alegada boa-fé tendo em vista a dispensa de certidão negativa de débitos fiscais, o que por si só contradiz o argumento do embargante no sentido de ter adotado as cautelas de praxe na aquisição do bem. Ao fim, requereu a improcedência do pedido (id 49339010).

Impugnação à contestação pela embargante (id 49339014).

A r. sentença recorrida, proferida em 24/10/2018, julgou improcedente o pedido inicial, extinguindo o processo com julgamento de mérito, nos termos do art. 487, inc. I, do CPC/2015, condenando a parte embargante ao pagamento de custas e despesas processuais, e honorários advocatícios, fixados em 10% (dez por cento) sobre o valor da causa. Determinou que, após o trânsito em julgado, fosse certificado o desfecho deste feito nos autos da execução, prosseguindo-se seu regular andamento (id 49339016).

A embargante apelou, pugnando pela reforma da sentença, alegando, em preliminar, a nulidade da sentença ante a ocorrência de cerceamento do direito de defesa e contraditório, decorrente da não realização de audiência de instrução para oitiva da testemunha arrolada. No mérito, reiterou os argumentos deduzidos na petição inicial, em especial no tocante à inexistência de fraude à execução em relação à aquisição da parte ideal do imóvel que pertencia à coexecutada Renata Abras, à ausência de registro de penhora na matrícula do imóvel por ocasião da efetivação do negócio jurídico, bem como à presunção de ter agido de boa-fé (id 49339019).

Certificado o decurso do prazo para contrarrazões (id 49339027), vieram os autos a este Tribunal;

É o relatório.

DECIDO.

De início, cumpre explicitar que o art. 932, incs. IV e V do CPC de 2015 confere poderes ao Relator para, monocraticamente, negar e dar provimento a recursos.

Ademais, é importante clarificar que, apesar de as alíneas dos referidos dispositivos elencarem hipóteses em que o Relator pode exercer esse poder, o entendimento da melhor doutrina é no sentido de que o mencionado rol é meramente exemplificativo.

Manifestando esse entendimento, asseveram Marinoni, Arenhart e Mitidiero:

 

"Assim como em outras passagens, o art. 932 do Código revela um equívoco de orientação em que incidiu o legislador a respeito do tema dos precedentes. O que autoriza o julgamento monocrático do relator não é o fato de a tese do autor encontrar-se fundamentada em "súmulas" e "julgamento de casos repetitivos" (leia-se, incidente de resolução de demandas repetitivas, arts. 976 e ss., e recursos repetitivos, arts. 1.036 e ss.) ou em incidente de "assunção de competência". É o fato de se encontrar fundamentado em precedente do Supremo Tribunal Federal ou do Superior Tribunal de Justiça ou em jurisprudência formada nos Tribunais de Justiça e nos Tribunais Regionais Federais em sede de incidente de resolução de demandas repetitivas ou em incidente de assunção de competência capaz de revelar razões adequadas e suficientes para solução do caso concreto. O que os preceitos mencionados autorizam, portanto, é o julgamento monocrático no caso de haver precedente do STF ou do STJ ou jurisprudência firmada em incidente de resolução de demandas repetitivas ou em incidente de assunção de competência nos Tribunais de Justiça ou nos Tribunais Regionais Federais. Esses precedentes podem ou não ser oriundos de casos repetitivos e podem ou não ter adequadamente suas razões retratadas em súmulas." ("Curso de Processo Civil", 3ª e., v. 2, São Paulo, RT, 2017)

 

Os mesmos autores, em outra obra, explicam ainda que "a alusão do legislador a súmulas ou a casos repetitivos constitui apenas um indício - não necessário e não suficiente - a respeito da existência ou não de precedentes sobre a questão que deve ser decidida. O que interessa para incidência do art. 932, IV, a e b, CPC, é que exista precedente sobre a matéria - que pode ou não estar subjacente a súmulas e pode ou não decorrer do julgamento de recursos repetitivos" ("Novo Código de Processo Civil comentado", 3ª e., São Paulo, RT, 2017, p. 1014, grifos nossos).

Também Hermes Zaneti Jr. posiciona-se pela não taxatividade do elenco do art. 932, incisos IV e V (Poderes do Relator e Precedentes no CPC/2015: perfil analítico do art. 932, IV e V, in "A nova aplicação da jurisprudência e precedentes no CPC/2015: estudos em homenagem à professora Teresa Arruda Alvim", Dierle José Coelho Nunes, São Paulo, RT, 2017, pp. 525-544).

Nessa linha, o STJ, antes mesmo da entrada em vigor do CPC/2015, aprovou a Súmula 568 com o seguinte teor: "O relator, monocraticamente e no Superior Tribunal de Justiça, poderá dar ou negar provimento ao recurso quando houver entendimento dominante acerca do tema". Veja-se que a expressão entendimento dominante aponta para a não taxatividade do rol em comento.

Além disso, uma vez que a decisão singular do relator é recorrível por meio de agravo interno (art. 1.021, caput, CPC/15), não fica prejudicado o princípio da colegialidade, pois a Turma pode ser provocada a se manifestar por meio do referido recurso. Nesse sentido:

 

"PREVIDENCIÁRIO. AGRAVO INTERNO (ART. 1.021, DO CPC). APOSENTADORIA ESPECIAL. APLICAÇÃO DO ART. 932 DO CPC PERMITIDA. TERMO INICIAL FIXADO NA DATA DA CITAÇÃO. ATIVIDADE ESPECIAL COMPROVADA COM LAUDO JUDICIAL. INTERPOSIÇÃO CONTRA DECISÃO SINGULAR DO RELATOR. CABIMENTO.

- O denominado agravo interno (artigo Art. 1.021 do CPC/15) tem o propósito de impugnar especificadamente os fundamentos da decisão agravada e, em caso de não retratação, possa ter assegurado o direito de ampla defesa, com submissão das suas impugnações ao órgão colegiado, o qual, cumprindo o princípio da colegialidade, fará o controle da extensão dos poderes do relator e, bem assim, a legalidade da decisão monocrática proferida, não se prestando, afora essas circunstâncias, à rediscussão, em si, de matéria já decidida, mediante reiterações de manifestações anteriores ou à mingua de impugnação específica e fundamentada da totalidade ou da parte da decisão agravada, objeto de impugnação.

- O termo inicial do benefício foi fixado na data da citação, tendo em vista que a especialidade da atividade foi comprovada através do laudo técnico judicial, não havendo razão para a insurgência da Autarquia Federal.

- Na hipótese, a decisão agravada não padece de qualquer ilegalidade ou abuso de poder, estando seus fundamentos em consonância com a jurisprudência pertinente à matéria devolvida a este E. Tribunal.

- Agravo improvido."

(TRF3, ApReeNec 00248207820164039999, Nona Turma, Relator Desembargador Federal GILBERTO JORDAN, e-DJF3 Judicial 1 de 02/10/2017)

 

Assim, passo a proferir decisão monocrática, com fulcro no artigo 932, IV e V do Código de Processo Civil de 2015.

No caso, cinge-se a controvérsia à verificação da ocorrência ou não de fraude à execução fiscal, relativamente à transferência da fração ideal correspondente a 3,3333% do imóvel objeto da matrícula nº 5.100, do CRI de Santa Cruz do Rio Pardo/SP, realizada por Renata Abras, coexecutada no executivo fiscal subjacente, em favor da parte embargante.

 

Preliminarmente

Conforme relatado, entendem os apelantes que a sentença padece de nulidade, tendo em vista a existência de cerceamento de defesa, decorrente da falta de realização de audiência de instrução para produção da prova oral requerida, a qual seria imprescindível à comprovação da posse do imóvel, desde antes da aquisição da totalidade da propriedade imobiliária objeto da discussão.

Sem razão os apelantes.

Com efeito, a prova da transferência da propriedade imóvel é eminentemente documental, decorrendo, nos termos do art. 1.245 do Código Civil, do registro do título translativo na matrícula do imóvel.

Todavia, à vista da realidade fática envolvendo inúmeras propriedades de imóveis sem o respectivo registro, a jurisprudência do C. Superior Tribunal de Justiça orientou-se no sentido de possibilitar a oposição de embargos de terceiro àqueles adquirentes de imóveis que não efetuaram a averbação do título aquisitivo, com base apenas no contrato de compromisso de compra e venda, tendo aludido entendimento restado consolidado na Súmula 84, segundo a qual "É admissível a oposição de embargos de terceiro fundados em alegação de posse advinda do compromisso de compra e venda de imóvel, ainda que desprovido do registro."

De outro lado, o art. 443, inc. II, do NCPC (art. 400, II, do CPC/73) autoriza o juiz a indeferir a prova testemunhal sobre fatos que só puderam ser provados por prova documental ou pericial.

Dessa forma, tratando-se de transferência de propriedade imóvel em que a prova é eminentemente documental, a prova oral pretendida pelos apelantes é desnecessária para a solução da controvérsia.

Saliente-se, ademais, que de acordo com o art. 370 do NCPC (art. 130 do CPC/1973), o magistrado na condução do processo, tem amplos poderes para ordenar a produção das provas que entender necessárias à solução da lide, indeferindo aquelas que entender inúteis ou meramente protelatórias.

Sendo assim, inocorrente o alegado cerceamento de defesa decorrente da não realização de audiência para produção da prova oral pleiteada pelos embargantes.

Nesse sentido, ementas dos seguintes julgados, verbis:

 

"APELAÇÃO CÍVEL. AÇÃO DE RESOLUÇÃO DE PROMESSA DE COMPRA E VENDA. AGRAVO RETIDO. PRODUÇÃO DE PROVA ORAL. DESNECESSIDADE.

Prova testemunhal pretendida pela parte requerente desnecessária para a solução da controvérsia. Prova da propriedade imóvel eminentemente documental, decorrendo da averbação do título aquisitivo junto ao Registro de Imóveis.

(...)

AGRAVO RETIDO DESPROVIDO. APELO PROVIDO EM PARTE. UNÂNIME."

(TJRS, AC 0164734-70.2014.8.21.7000, Vigésima Câmara Cível, Relator Desembargador Dilso Domingos Pereira, j. 28/05/2014, DJ de 06/06/2014)

 

"AGRAVO DE INSTRUMENTO. RESPONSABILIDADE CIVIL EM ACIDENTE DE TRÂNSITO. PROPRIEDADE. PROVA TESTEMUNHAL.

A propriedade é comprovada mediante registro - inteligência do art. 1245 do Código Civil -, sendo a prova testemunhal ineficaz para tanto. Poder do magistrado de indeferir as provas desnecessárias. Art. 130 do CPC.

AGRAVO DE INSTRUMENTO DESPROVIDO. UNÂNIME."

(TJRS, AI 0482181-32.2013.8.21.7000, Décima Primeira Câmara Cível, Relator Desembargador Antônio Maria Rodrigues de Freitas Iserhard, j. 26/03/2014, DJ 01/04/2014)

 

Nessa esteira, rejeito a matéria preliminar e passo ao exame do mérito.

Anoto, inicialmente, que na execução fiscal subjacente objetiva-se a cobrança de dívida relativa ao não recolhimento de contribuições ao PIS, relativamente às competências de 08/1994 a 10/1996 e 12/1996, inscrita em dívida ativa em 18/12/2001, CDA nº 80.7.01.008953-30, no valor originário de R$ 12.569,96 (id 49338965).

Nos termos da atual redação do art. 185 do CTN, é certo que nas execuções fiscais a fraude é caracterizada quando a alienação ocorrer após a inscrição do débito em dívida ativa e se o devedor não reservar bens suficientes para o seu pagamento, sendo irrelevante a boa-fé do terceiro adquirente.

A propósito, transcrevo o dispositivo supracitado, em sua redação originária e atual:

 

Art. 185. Presume-se fraudulenta a alienação ou oneração de bens ou rendas, ou seu começo, por sujeito passivo em débito para com a Fazenda Pública por crédito tributário regularmente inscrito como dívida ativa em fase de execução.

Parágrafo único. O disposto neste artigo não se aplica na hipótese de terem sido reservados pelo devedor bens ou rendas suficientes ao total pagamento da dívida em fase de execução.

 

Art. 185. Presume-se fraudulenta a alienação ou oneração de bens ou rendas, ou seu começo, por sujeito passivo em débito para com a Fazenda Pública, por crédito tributário regularmente inscrito como dívida ativa. (Redação dada pela Lcp nº 118, de 2005)

Parágrafo único. O disposto neste artigo não se aplica na hipótese de terem sido reservados, pelo devedor, bens ou rendas suficientes ao total pagamento da dívida inscrita. (Redação dada pela Lcp nº 118, de 2005)

 

De outro turno, o Superior Tribunal de Justiça, no julgamento do REsp nº 1.141.990, em 10/11/2010, DJe 19/11/2010, de relatoria do Ministro Luiz Fux, submetido ao regime dos Recursos Repetitivos, afastou a aplicação da Súmula nº 375 do STJ às execuções fiscais, consolidando o entendimento de que a alienação de bens pelo sujeito passivo, sem a reserva de meios para quitação do débito, gera presunção absoluta de fraude à execução, sem haver necessidade de registro da penhora ou mesmo diante da boa-fé do adquirente, salvo se o negócio jurídico ocorreu antes da vigência da Lei Complementar nº 118/2005, quando somente se considera fraudulenta a alienação ocorrida após a citação válida do devedor.

Aludido acórdão restou assim ementado, in verbis:

 

"PROCESSUAL CIVIL. RECURSO ESPECIAL REPRESENTATIVO DE CONTROVÉRSIA. ART. 543-C, DO CPC. DIREITO TRIBUTÁRIO. EMBARGOS DE TERCEIRO. FRAUDE À EXECUÇÃO FISCAL. ALIENAÇÃO DE BEM POSTERIOR À CITAÇÃO DO DEVEDOR. INEXISTÊNCIA DE REGISTRO NO DEPARTAMENTO DE TRÂNSITO - DETRAN. INEFICÁCIA DO NEGÓCIO JURÍDICO. INSCRIÇÃO EM DÍVIDA ATIVA. ARTIGO 185 DO CTN, COM A REDAÇÃO DADA PELA LC N.º 118/2005. SÚMULA 375/STJ. INAPLICABILIDADE.

1. A lei especial prevalece sobre a lei geral (lex specialis derrogat lex generalis), por isso que a Súmula n.º 375 do Egrégio STJ não se aplica às execuções fiscais.

2. O artigo 185, do Código Tributário Nacional - CTN, assentando a presunção de fraude à execução, na sua redação primitiva, dispunha que: "Art. 185. Presume-se fraudulenta a alienação ou oneração de bens ou rendas, ou seu começo, por sujeito passivo em débito para com a Fazenda Pública por crédito tributário regularmente inscrito como dívida ativa em fase de execução. Parágrafo único. O disposto neste artigo não se aplica na hipótese de terem sido reservados pelo devedor bens ou rendas suficientes ao total pagamento da dívida em fase de execução".

3. A Lei Complementar n.º 118, de 9 de fevereiro de 2005, alterou o artigo 185, do CTN, que passou a ostentar o seguinte teor: "Art. 185. Presume-se fraudulenta a alienação ou oneração de bens ou rendas, ou seu começo, por sujeito passivo em débito para com a Fazenda Pública, por crédito tributário regularmente inscrito como dívida ativa. Parágrafo único. O disposto neste artigo não se aplica na hipótese de terem sido reservados, pelo devedor, bens ou rendas suficientes ao total pagamento da dívida inscrita."

4. Consectariamente, a alienação efetivada antes da entrada em vigor da LC n.º 118/2005 (09.06.2005) presumia-se em fraude à execução se o negócio jurídico sucedesse a citação válida do devedor; posteriormente à 09.06.2005, consideram-se fraudulentas as alienações efetuadas pelo devedor fiscal após a inscrição do crédito tributário na dívida ativa.

5. A diferença de tratamento entre a fraude civil e a fraude fiscal justifica-se pelo fato de que, na primeira hipótese, afronta-se interesse privado, ao passo que, na segunda, interesse público, porquanto o recolhimento dos tributos serve à satisfação das necessidades coletivas.

6. É que, consoante a doutrina do tema, a fraude de execução, diversamente da fraude contra credores, opera-se in re ipsa, vale dizer, tem caráter absoluto, objetivo, dispensando o concilium fraudis. (FUX, Luiz. O novo processo de execução: o cumprimento da sentença e a execução extrajudicial. 1. ed. Rio de Janeiro: Forense, 2008, p. 95-96 / DINAMARCO, Cândido Rangel. Execução civil. 7. ed. São Paulo: Malheiros, 2000, p. 278-282 / MACHADO, Hugo de Brito. Curso de direito tributário. 22. ed. São Paulo: Malheiros, 2003, p. 210-211 / AMARO, Luciano. Direito tributário brasileiro. 11. ed. São Paulo: Saraiva, 2005. p. 472-473 / BALEEIRO, Aliomar. Direito Tributário Brasileiro. 10. ed. Rio de Janeiro: Forense, 1996, p. 604).

7. A jurisprudência hodierna da Corte preconiza referido entendimento consoante se colhe abaixo: "O acórdão embargado, considerando que não é possível aplicar a nova redação do art. 185 do CTN (LC 118/05) à hipótese em apreço (tempus regit actum), respaldou-se na interpretação da redação original desse dispositivo legal adotada pela jurisprudência do STJ". (EDcl no AgRg no Ag 1.019.882/PR, Rel. Ministro Benedito Gonçalves, Primeira Turma, julgado em 06/10/2009, DJe 14/10/2009) "Ressalva do ponto de vista do relator que tem a seguinte compreensão sobre o tema: [...] b) Na redação atual do art. 185 do CTN, exige-se apenas a inscrição em dívida ativa prévia à alienação para caracterizar a presunção relativa de fraude à execução em que incorrem o alienante e o adquirente (regra aplicável às alienações ocorridas após 9.6.2005);". (REsp 726.323/SP, Rel. Ministro Mauro Campbell Marques, Segunda Turma, julgado em 04/08/2009, DJe 17/08/2009) "Ocorrida a alienação do bem antes da citação do devedor, incabível falar em fraude à execução no regime anterior à nova redação do art. 185 do CTN pela LC 118/2005". (AgRg no Ag 1.048.510/SP, Rel. Ministra Eliana Calmon, Segunda Turma, julgado em 19/08/2008, DJe 06/10/2008) "A jurisprudência do STJ, interpretando o art. 185 do CTN, até o advento da LC 118/2005, pacificou-se, por entendimento da Primeira Seção (EREsp 40.224/SP), no sentido de só ser possível presumir-se em fraude à execução a alienação de bem de devedor já citado em execução fiscal". (REsp 810.489/RS, Rel. Ministra Eliana Calmon, Segunda Turma, julgado em 23/06/2009, DJe 06/08/2009)

8. A inaplicação do art. 185 do CTN implica violação da Cláusula de Reserva de Plenário e enseja reclamação por infringência da Súmula Vinculante n.º 10, verbis: "Viola a cláusula de reserva de plenário (cf, artigo 97) a decisão de órgão fracionário de tribunal que, embora não declare expressamente a inconstitucionalidade de lei ou ato normativo do poder público, afasta sua incidência, no todo ou em parte."

9. Conclusivamente: (a) a natureza jurídica tributária do crédito conduz a que a simples alienação ou oneração de bens ou rendas, ou seu começo, pelo sujeito passivo por quantia inscrita em dívida ativa, sem a reserva de meios para quitação do débito, gera presunção absoluta (jure et de jure) de fraude à execução (lei especial que se sobrepõe ao regime do direito processual civil); (b) a alienação engendrada até 08.06.2005 exige que tenha havido prévia citação no processo judicial para caracterizar a fraude de execução; se o ato translativo foi praticado a partir de 09.06.2005, data de início da vigência da Lei Complementar n.º 118/2005, basta a efetivação da inscrição em dívida ativa para a configuração da figura da fraude; (c) a fraude de execução prevista no artigo 185 do CTN encerra presunção jure et de jure, conquanto componente do elenco das "garantias do crédito tributário"; (d) a inaplicação do artigo 185 do CTN, dispositivo que não condiciona a ocorrência de fraude a qualquer registro público, importa violação da Cláusula Reserva de Plenário e afronta à Súmula Vinculante n.º 10, do STF.

10. In casu, o negócio jurídico em tela aperfeiçoou-se em 27.10.2005, data posterior à entrada em vigor da LC 118/2005, sendo certo que a inscrição em dívida ativa deu-se anteriormente à revenda do veículo ao recorrido, porquanto, consoante dessume-se dos autos, a citação foi efetuada em data anterior à alienação, restando inequívoca a prova dos autos quanto à ocorrência de fraude à execução fiscal.

11. Recurso especial conhecido e provido. Acórdão submetido ao regime do artigo 543-C do CPC e da Resolução STJ n.º 08/2008."

(REsp 1141990/PR, Rel. Ministro LUIZ FUX, PRIMEIRA SEÇÃO, julgado em 10/11/2010, DJe 19/11/2010).

 

No mesmo sentido, seguem julgados assim ementados:

 

"DIREITO PROCESSUAL CIVIL E TRIBUTÁRIO. FRAUDE À EXECUÇÃO. OCORRÊNCIA. ART. 185 DO CTN. PRESUNÇÃO ABSOLUTA. BOA-FÉ E AUSÊNCIA DE REGISTRO. IRRELEVÂNCIA. NÃO REDUÇÃO DO EXECUTADO À INSOLVÊNCIA. AUSÊNCIA DE PROVAS. ÔNUS DO EMBARGANTE. SENTENÇA REFORMADA. APELAÇÃO PROVIDA.

1. Os critérios para configuração da fraude à execução fiscal foram estabelecidos pelo C. Superior Tribunal de Justiça no julgamento do REsp nº 1141990/PR, proferido na sistemática dos recursos especiais repetitivos. Até o advento da Lei Complementar nº 118, de 09.06.2005, o entendimento jurisprudencial firmou-se no sentido de que não bastava a mera distribuição da execução fiscal para configuração da fraude à execução, sendo exigida a citação válida dos devedores, salvo prova de má-fé de alienantes e adquirentes, a cargo da Fazenda Pública. Esse entendimento se alterou apenas com a modificação promovida no artigo 185, do Código Tributário Nacional, pela mencionada Lei Complementar nº 118/05, que fez constar como exigência para a caracterização da fraude à execução tão somente a inscrição em Dívida Ativa dos créditos tributários. Contudo, essa exigência mais rigorosa aplica-se tão somente às alienações praticadas posteriormente à sua entrada em vigor, isto é, 09.06.2005.

2. No caso dos autos, o embargante adquiriu da empresa executada ALBA TURISMO LTDA, em 16/10/1995, o veículo ônibus marca SCANIA, modelo SCANIA BR 116, ano 1981, cor branca, chassi nº 3451163, RENAVAM nº 400992833, placa NW7882 (fl. 17), e registrou a transferência no DETRAN em 26/10/1995 (fl. 18). Contudo, a execução fiscal nº 2001.61.26.005429-4, na qual foi bloqueado o referido bem em 23/03/1995 (fl. 12 dos autos da execução fiscal, em apenso), já havia sido ajuizada em 01/02/1995 (fl. 02 dos autos da execução fiscal, em apenso) contra a pessoa jurídica devedora ALBA TURISMO LTDA, visando a cobrança de contribuições. A empresa executada foi citada por oficial de justiça em 23/03/1995 (fl. 11 dos autos da execução fiscal, em apenso).

3. Não há que se cogitar, ademais, da verificação da boa-fé do adquirente, tendo em vista a redação original do art. 185 do Código Tributário Nacional e o entendimento de que a presunção de fraude à execução deste artigo é absoluta, conforme o julgamento acima transcrito.

4. No mais, não há provas nos autos no sentido de que a alienação do bem penhorado não tenha reduzido o executado à insolvência, isto é, que o executado possuía rendas ou bens reservados e suficientes à garantia da dívida. Assim, o embargante, ora apelado, não produziu a prova que poderia afastar a presunção de fraude à execução e, portanto, a ineficácia da penhora, nos termos do parágrafo único do art. 185 do Código Tributário Nacional.

5. Encontram-se preenchidas todas as condições estipuladas em lei e consagradas no entendimento jurisprudencial a respeito da configuração da fraude à execução.

6. Assim, a sentença merece ser reformada para julgar improcedentes os presentes embargos de terceiro, determinando a ineficácia da alienação do ônibus em questão e a validade da penhora efetivada sobre ele nos autos da execução fiscal nº 2001.61.26.005429-4 e, em decorrência da procedência do recurso de apelação, o ônus sucumbencial deve ser invertido.

7. Recurso de apelação da União provido, para determinar a ineficácia da alienação do veículo ônibus marca SCANIA, modelo SCANIA BR 116, ano 1981, cor branca, chassi nº 3451163, RENAVAM nº 400992833, placa NW7882 e a validade da penhora efetivada sobre ele nos autos da execução fiscal nº 2001.61.26.005429-4, bem como para inverter o ônus sucumbencial, nos termos do voto."

(TRF3, AC nº 1387207, Quinta Turma, Rel. Des. Fed. Paulo Fontes, e-DJF3 Judicial 1 01/06/2016)

 

"PROCESSUAL CIVIL, CIVIL E TRIBUTÁRIO. EXECUÇÃO FISCAL. BEM MÓVEIS. FRAUDE À EXECUÇÃO. INOCORRÊNCIA.

1. Embora a titularidade do automóvel constasse em nome do agravado quando da citação do executivo fiscal, a transferência do bem móvel ocorre somente com a tradição e não com o registro junto ao órgão competente (inteligência dos arts. 1.226 e 1.267 do Código Civil) que apenas induz à presunção iuris tantum da propriedade, que pode ser elidida mediante prova da alienação.

2. Para a caracterização de fraude à execução faz-se mister que a alienação do bem tenha ocorrido após a concretização da citação válida do devedor, que não é o caso dos autos."

(TRF4, AG nº 200504010275159, Segunda Turma, Rel. Des. Fed. Marga Inge Barth Tessler, DJ 03/11/2005, pág. 521)

 

In casu, constata-se dos elementos constantes dos autos que a execução fiscal subjacente (processo nº 0006478-91.2002.8.26.0539) foi distribuída em 25/02/2002, contra a empresa “Ortoexpress Comércio de Material Hospitalar Ltda.” (id 49338965), constando da CDA que o débito foi inscrito na Dívida Ativa da União, em 18/12/2001. A coexecutada Renata Abras foi incluída no polo passivo em 26/03/2004, tendo sido citada em 14/05/2004. Conclui-se, portanto, que a citação antecedeu à vigência da Lei Complementar nº 118/05.

De outro lado, consoante se vê do contrato de compromisso de compra e venda id 49338882, a venda da fração ideal de 3,3333% do imóvel em questão pela coexecutada Renata aos ora embargantes deu-se em 21/03/2007, portanto, depois de ocorrida a citação da alienante na demanda executiva.

Nesse contexto, tendo em vista a orientação do C. STJ no julgamento do REsp nº 1.141.990/PR, retro destacado, constata-se que a transação do imóvel efetivada entre Renata Abras e os ora embargantes (21/03/2007), ocorreu em fraude à execução, uma vez que sucedeu à citação válida daquela no executivo fiscal (14/05/2004).

Acresça-se ainda que, nos termos da orientação firmada pelo C. Superior Tribunal de Justiça, por ocasião do julgamento do REsp nº 1.141.990, na hipótese de fraude à execução fiscal não se deve perscrutar acerca da boa-fé ou má-fé do adquirente, visto que a presunção materializada no art. 185 do CTN é de natureza objetiva, prescindindo de demonstração do "consilium fraudis" ou má-fé do adquirente para sua caracterização.

A propósito, o seguinte aresto do C. Superior Tribunal de Justiça:

 

"TRIBUTÁRIO E PROCESSUAL CIVIL. AGRAVO TREGIMENTAL NO RECURSO ESPECIAL. EMBARGOS DE TERCEIRO. RECONHECIMENTO DA FRAUDE À EXECUÇÃO, DECORRENTES DA ALIENAÇÃO DO BEM IMÓVEL, EFETIVADA ANTES DA ENTRADA EM VIGOR DA LEI COMPREMENTAR 118/2005, EM MOMENTO POSTERIOR À CITAÇÃO DO DEVEDOR NA EXECUÇÃO FISCAL. PRESUNÇÃO ABSOLUTA DE FRAUDE. DECISÃO EM CONSNÂNCIA COM O ENDENTIMANDO FIRMADO NO RESP 1.141.990/PR, JULGADO SOB O RITO DO ART. 543-C DO CPC. AGRAVO REGIMENTAL IMPROVIDO.

I. A Primeira Seção do Superior Tribunal de Justiça, no julgamento do Recurso Especial 1.141.990/PR, de relatoria do Ministro LUIZ FUX, sob o rito do art. 543-C do CPC, firmou o entendimento de que "a alienação efetivada antes da entrada em vigor da LC n.º 118/2005 (09.06.2005) presumia-se em fraude à execução se o negócio jurídico sucedesse a citação válida do devedor; posteriormente à 09.06.2005, consideram-se fraudulentas as alienações efetuadas pelo devedor fiscal após a inscrição do crédito tributário na dívida ativa". No referido julgado, restou consignado, ainda, que "a natureza jurídica tributária do crédito conduz que a simples alienação ou oneração de bens ou rendas, ou seu começo, pelo sujeito passivo por quantia inscrita em dívida ativa, sem a reserva de meios para quitação do débito, gera presunção absoluta (jure et de jure) de fraude à execução (lei especial que se sobrepõe ao regime do direito processual civil)".

II. É irrelevante a existência de boa-fé ou de má-fé do terceiro adquirente, ou mesmo a prova da existência de conluio, para caracterizar fraude à Execução Fiscal, já que se está diante da presunção absoluta, jure et de jure. Nesse sentido: STJ, AgRg no Ag 1.191.868/MG, Rel. Ministra ELIANA CALMON, SEGUNDA TURMA, DJe de 09/10/2013; AgRg no AREsp 241.691/PE, Rel. Ministro HUMBERTO MARTINS, SEGUNDA TURMA, DJe de 04/12/2012.

III. No caso dos autos, tendo ocorrido o ajuizamento da Execução Fiscal em março de 2000, a citação do executado em 2001 e a alienação do bem imóvel em 31/10/2002, é de se reconhecer a presunção absoluta de fraude à execução, na esteira do entendimento firmado nesta Corte.

IV. Agravo Regimental improvido."

(AgRg no REsp 1.519.994/PR, Segunda Turma, Rel. Ministra Assusete Magalhães, j. 10/03/2016, DJe de 17/03/2016) (g. n.)

 

Ressalte-se, ainda que, tratando-se de execução fiscal, não se exige o registro do gravame imposto sobre o bem - penhora na matrícula do imóvel, como seria no caso dos autos -, para a caracterização da fraude à execução decorrente de sua eventual alienação, pois nessa hipótese aplica-se o disposto no art. 185 do Código Tributário Nacional, em que a presunção de fraude é absoluta, não incidindo, na espécie, o teor da Súmula nº 375 do C. Superior Tribunal de Justiça, nos termos do entendimento assentado pela mesma Corte de Justiça, no âmbito do REsp nº 1.141.990, representativo de controvérsia. A propósito do tema, confira-se ementa do seguinte julgado da Corte Superior:

 

“PROCESSUAL CIVIL E TRIBUTÁRIO. RECURSO ESPECIAL. EXECUÇÃO FISCAL. EMBARGOS DE TERCEIRO. ALEGAÇÃO DE OFENSA AO ART. 535 DO CPC/1973. NÃO OCORRÊNCIA. ALIENAÇÃO DE BEM IMÓVEL. ADQUIRENTE DE BOA-FÉ. ALIENAÇÃO APÓS A CITAÇÃO. FRAUDE À EXECUÇÃO. PRESUNÇÃO ABSOLUTA. INAPLICABILIDADE DA SÚMULA 375/STJ.

(...)

2. Para hipótese ocorrida antes da vigência da referida Lei Complementar n. 118 (9/6/2005), considera-se absoluta a presunção de fraude à execução quando a alienação do bem se dá em momento posterior à mera citação da alienante nos autos de execução fiscal contra ela movida.

3. Com o advento da Lei Complementar n. 118/2005, que conferiu nova redação ao art. 185 do Código Tributário Nacional, convencionou-se que a mera alienação de bens pelo sujeito passivo com débitos inscritos na dívida ativa, sem a reserva de meios para a satisfação dos referidos débitos, pressupõe a existência de fraude à execução ante a primazia do interesse público na arrecadação dos recursos para o uso da coletividade.

4. Registre-se, por oportuno, que a Primeira Seção deste Superior Tribunal, no julgamento do Recurso Especial n. 1.141.990/PR, de relatoria do em. Ministro Luiz Fux, submetido ao rito dos recursos repetitivos, nos termos do art. 543-C do CPC e da Resolução STJ n. 8/2008, consolidou entendimento segundo o qual não se aplica à execução fiscal a Súmula 375/STJ: “O reconhecimento da fraude à execução depende do registro da penhora do bem alienado ou da prova de má-fé do terceiro adquirente”.

5. Recurso especial parcialmente provido, a fim de declarar a nulidade da alienação do bem imóvel em questão, tendo em vista a caracterização da fraude à execução.”

(REsp 1.353.295/PE, Segunda Turma, Relator Ministro Og Fernandes, j. 03/10/2017, DJe 11/10/2017)

 

Registro, ainda, ser incabível a alegação de excesso de penhora em sede de embargos de terceiro, os quais se destinam à defesa pelo proprietário-possuidor, ou apenas, possuidor do bem objeto de indevida constrição judicial (art. 1.046 do CPC/73), não se prestando para discussão de matérias exclusivas à defesa do executado, no âmbito da execução.

Ante o exposto, rejeito a matéria preliminar e, no mérito, com fulcro no art. 932, inc. IV, letra “b”, do CPC, NEGO PROVIMENTO ao recurso de apelação da embargante, para manter a r. sentença recorrida que julgou improcedentes os presentes embargos de terceiro, condenando-a ao pagamento de honorários advocatícios fixados em 10% (dez por cento) do valor atribuído à causa, na forma da fundamentação supra.

Decorrido o prazo legal para recursos, observadas as formalidades legais, remetam-se os autos à Vara de origem.

Publique-se. Intimem-se.”

 

Nas razões recursais (Id 128591011), a parte agravante pugna pela reconsideração da decisão atacada, ou a submissão do feito ao Colegiado para conhecimento e reforma do citado decisum, a fim de prover seu apelo e reconhecer necessidade de produção de prova oral, e/ou, desconstituir a constrição sobre aludido bem, argumentando, em resumo, a existência de cerceamento de defesa, visto que a prova testemunhal se destina à comprovação de sua posse, e, no mérito, ser legítimo proprietário e possuidor do referido imóvel, sendo sua aquisição anterior ao redirecionamento da execução contra a coexecutada/alienante.

Intimada, a União Federal ofertou contrarrazões, pelo desprovimento do recurso (Id 130966226).

É o relatório

 

 

 

 

 

 

 


 PODER JUDICIÁRIO
Tribunal Regional Federal da 3ª Região
6ª Turma
 

APELAÇÃO CÍVEL (198) Nº 5484785-26.2019.4.03.9999

RELATOR: Gab. 18 - DES. FED. SOUZA RIBEIRO

APELANTE: ALMIR DE PAULA CARNEIRO, EDNA DE FATIMA BALDACINI

Advogado do(a) APELANTE: JOAO APARECIDO PEREIRA NANTES - SP59203-A
Advogado do(a) APELANTE: JOAO APARECIDO PEREIRA NANTES - SP59203-A

APELADO: UNIAO FEDERAL - FAZENDA NACIONAL

 

OUTROS PARTICIPANTES:

 

 

 

V O T O

 

 

 

O SENHOR DESEMBARGADOR FEDERAL SOUZA RIBEIRO (Relator): Pois bem. Da análise apurada da matéria tratada nestes autos, não vislumbro motivos para alteração da decisão impugnada.

Com efeito, o tema ora em discussão – existência ou não de fraude à execução na transferência de bens pelo devedor tributário em momento posterior à inscrição do débito existente em seu nome na Dívida Ativa da União (art. 185, do CTN, na redação dada pela LC nº 118/2005) -, foi pacificado pelo Eg. Superior Tribunal de Justiça, por ocasião do julgamento do REsp 1.141.990, em 10/11/2010, DJe 19/11/2010, submetido ao regime dos Recursos Repetitivos, não havendo, portanto, que se falar em inviabilidade de julgamento do processo na forma do art. 932, inc. IV, “b”, do Novo CPC, bem como em contrariedade à jurisprudência pacificada sobre a matéria.

De outra banda, consoante se vê da decisão objurgada, a alegação da embargante quanto à necessidade da produção de prova oral para comprovação do exercício da posse do bem foi afastada diante do fato de que a prova da transferência de propriedade se dar por prova documental, e, no caso, em que a embargante defende seu direito com base na alegação de ser proprietário do bem, havendo, inclusive, averbação na respectiva matrícula, do título aquisitivo, não se faz necessária comprovar sua posse, visto que esta advém do direito de propriedade.

Por outro lado, quanto ao mérito, a decisão objurgada assinalou que a coexecutada/alienante do imóvel foi incluída no polo passivo da execução em 26/03/2004, tendo sido citado aos 14/05/2004. No entanto, a venda da parte ideal pertencente à codevedora (3,3333%) aos embargantes, deu-se em 21/03/2007, após, portanto, à citação válida daquela para integrar o polo passivo da execução.

Ademais, no que respeita à interposição de agravo interno, a vedação insculpida no art. 1.021, § 3º, do CPC/2015 contrapõe-se ao dever processual estabelecido no § 1º do mesmo dispositivo processual, que assim determina:

 

“Art. 1.021. Contra decisão proferida pelo relator caberá agravo interno para o respectivo órgão colegiado, observadas, quanto ao processamento, as regras do regimento interno do tribunal.

§ 1º Na petição de agravo interno, o recorrente impugnará especificadamente os fundamentos da decisão agravada.”

 

Assim, se a parte agravante apenas reitera os argumentos oferecidos na peça anterior, sem atacar com objetividade e clareza os pontos trazidos na decisão que ora se objurga, com fundamentos novos e capazes de infirmar a conclusão ali manifestada, decerto não há que se falar em dever do julgador de trazer novas razões para rebater alegações genéricas ou repetidas, que foram amplamente discutidas.

E, no caso, a parte agravante deduz alegações que configuram nítida reiteração dos argumentos apresentados na apelação, a fim de submeter a demanda à apreciação do Colegiado.

Nesse sentido, ementas dos seguintes julgados, verbis:

 

“PROCESSUAL CIVIL. MANDADO DE SEGURANÇA, INDEFERIMENTO LIMINAR, AUSÊNCIA DE TERATOLOGIA OU FLAGRANTE LEGALIDADE. AGRAVO INTERNO. ARGUMENTAÇÃO GENÉRICA. DECISÃO AGRAVADA NÃO ATACADA ESPECIFICAMENTE. ART. 1.021, § 1º, DO CPC/2015. SÚMULA 182/STJ.

1. Trata-se de Agravo Interno interposto contra decisão monocrática (fls. 430-433, e-STJ) que indeferiu liminarmente o Mandado de Segurança, considerando que não há teratologia ou flagrante ilegalidade no ato judicial impugnado.

2. Ressaltou-se que a pretensão do impetrante é reformar o acórdão proferido pela Terceira Turma do STJ que, motivadamente, rejeitou os Embargos de Declaração opostos no AREsp 1.274.529/GO, explicitando que “os aclaratórios não se prestam à manifestação de inconformismo ou de rediscussão do julgado que negou provimento ao agravo interno em razão da inviabilidade do agravo em recurso especial apresentado em desacordo com os requisitos preconizados pelo art. 932, III, do NCPC (544, § 4º, I, do CPC/73) (incidência da Súmula nº 7 do STJ e ausência de obscuridade, contradição, omissão ou erro)”.

3. O agravante repisa os argumentos da petição inicial e afirma que, “ao indeferir liminarmente o presente mandamus, o Ministro Relator NÃO analisou AS NULIDADES apontadas pelo Agravante (especialmente as nulidades evidentes) e apreciou o pedido sob um ponto de vista equivocado acerca das pretensões do recorrente (...)”.

4. A parte agravante deixou de observar a determinação do art. 1.021, § 1º, do CPC/2015, pois não impugnou especificamente os fundamentos da decisão agravada. Limita-se a deduzir argumentação genérica, sem indicar de forma completa, objetiva e pormenorizada os supostos equívocos perpetrados pelo de decisum recorrido.

5. A jurisprudência do Superior Tribunal de Justiça consolidou que não se conhece de Agravo contra decisão monocrática que deixa de atacar especificamente os fundamentos da decisão recorrida, de forma a demonstrar que o entendimento esposado merece modificação. Incidência do enunciado da Súmula 182/STJ: “É inviável o agravo do art. 545 do CPC que deixa de atacar especificamente os fundamentos da decisão agravada”. Precedentes: AgInt no MS 23.478/DF, Rel. Min. Raul Araújo, Corte Especial, DJe 28.11.2018; AgInt no RE no AgInt no REsp 1.672.975/SP, Rel. Min. Humberto Martins, Corte Especial, DJe 22.8.2018; AgInt nos EDv nos EREsp 1.420.809/SC, Rel. Min. Og Fernandes, Corte Especial, DJe 10.5.2018; AgInt no MS 23.380/SC, Rel. Min. Mauro Campbell Marques, Segunda Turma, DJe 29.6.2017; AgRg no MS 21.781/DF, Rel. Min. Felix Fischer, Corte Especial, DJe 2.2.2016.

6. É assente no STJ no STJ que “é incabível o mandado de segurança quando impetrado contra decisão judicial sujeita a recurso específico ou transitada em julgado, mormente porque tal remédio constitucional não representa panaceia para toda e qualquer situação, nem é sucedâneo do recurso específico ou da ação rescisória” (AgInt no RMS 51.888/RS, Rel. Min. Luis Felipe Salomão, Quarta Turma, DJe 26.5.2017). Nesse sentido: AgInt no MS 24.477/DF, Rel. Min. Humberto Martins, Corte Especial, DJe 6.2.2019; AgRg no MS 22.619/DF, Rel. Min. Luis Felipe Salomão, Corte Especial, DJe 21.10.2016.

7. Agravo Interno não conhecido.”

(STJ, AgInt no MS 24.803/DF (2018/0325508-5), Corte Especial, Relator Ministro Herman Benjamin, DJe 23/09/2019)

 

“PROCESSUAL CIVIL. AGRAVO INTERNO NO RECURSO ESPECIAL. CÓDIGO DE PROCESSO CIVIL DE 2015. APLICABILIDADE. EXECUÇÃO DE SENTENÇA. AUSÊNCIA DE PREQUESTIONAMENTO. INCIDÊNCIA DA SÚMULA N. 211/STJ. APLICABILIDADE. ART. 1.025 DO CÓDIGO DE PROCESSO CIVIL. ARGUMENTOS INSUFICIENTES PARA DESCONSTITUIR A DECISÃO ATACADA. HONORÁRIOS RECURSAIS. CABIMENTO. APLICAÇÃO DE MULTA. ART. 1.021, § 4º, DO CÓDIGO DE PROCESSO CIVIL DE 2015. DESCABIMENTO.

I - Consoante o decidido pelo Plenário desta Corte na sessão realizada em 09.03.2016, o regime recursal será determinado pela data da publicação do provimento jurisdicional impugnado. In casu, aplica-se o Código de Processo Civil de 2015.

(...)

IV – A agravante não apresenta, no agravo, argumentos suficientes para desconstituir a decisão recorrida.

V – Honorários recursais. Cabimento.

VI – Em regra, descabe a imposição da multa prevista no art. 1.021, § 4º, do Código de Processo Civil de 2015 em razão do mero desprovimento do Agravo Interno em votação unânime, sendo necessária a configuração da manifesta inadmissibilidade ou improcedência do recurso a autorizar sua aplicação, o que não ocorreu no caso.

VII – Agravo interno improvido.”

(STJ, AgInt no REsp 1.682.293/PB, Primeira Turma, Relatora Ministra Regina Helena Costa, DJe 10/11/2017)

 

Diante do exposto, NEGO PROVIMENTO ao agravo interno.

É o voto.

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 



E M E N T A

 

AGRAVO INTERNO. ART. 1.021, §§ 1º E 3º DO NOVO CPC. REITERAÇÃO. RECURSO DESPROVIDO.

1. O tema ora em discussão – existência ou não de fraude à execução na transferência de bens pelo devedor tributário em momento posterior à inscrição do débito existente em seu nome na Dívida Ativa da União (art. 185, do CTN, na redação dada pela LC nº 118/2005) -, foi pacificado pelo Eg. Superior Tribunal de Justiça, por ocasião do julgamento do REsp 1.141.990, em 10/11/2010, DJe 19/11/2010, submetido ao regime dos Recursos Repetitivos.

2. Dessa forma, não há que se falar em inviabilidade de julgamento do processo na forma do art. 932, inc. IV, “b”, do Novo CPC, bem como em contrariedade à jurisprudência pacificada sobre a matéria.

3. Além disso, a vedação insculpida no art. 1.021, § 3º, do CPC/2015 contrapõe-se ao dever processual estabelecido no § 1º do mesmo dispositivo processual.

4. Se a parte agravante apenas reitera os argumentos ofertados na peça anterior, sem atacar com objetividade e clareza os pontos trazidos na decisão impugnada, com fundamentos novos e capazes de infirmar a conclusão ali externada, decerto não há que se falar em dever do julgador de trazer novas razões para rebater alegações genéricas ou repetidas, que já foram amplamente discutidas. Precedentes.

5. Agravo interno desprovido.

 


  ACÓRDÃO

Vistos e relatados estes autos em que são partes as acima indicadas, a Sexta Turma, por unanimidade, negou provimento ao agravo interno, nos termos do relatório e voto que ficam fazendo parte integrante do presente julgado.