RECURSO INOMINADO CÍVEL (460) Nº 0000807-97.2020.4.03.6305
RELATOR: 14º Juiz Federal da 5ª TR SP
RECORRENTE: MARCELO COELHO GONCALVES
Advogado do(a) RECORRENTE: EDUARDO MASSARU DONA KINO - SP216352-N
RECORRIDO: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS
OUTROS PARTICIPANTES:
RECURSO INOMINADO CÍVEL (460) Nº 0000807-97.2020.4.03.6305 RELATOR: 14º Juiz Federal da 5ª TR SP RECORRENTE: MARCELO COELHO GONCALVES Advogado do(a) RECORRENTE: EDUARDO MASSARU DONA KINO - SP216352-N RECORRIDO: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS OUTROS PARTICIPANTES: R E L A T Ó R I O 1. Trata-se de pedido de benefício por incapacidade. 2. O pedido de auxílio-doença/aposentadoria por invalidez foi julgado improcedente. O Juízo de primeiro grau não reconheceu a incapacidade da parte autora, Marcelo Coelho Gonçalves, 39 anos, HIV soropositivo e doença neurológica. 3. Recorre a parte autora aduzindo que comprovou a incapacidade por meio dos documentos anexados. Pleiteia a nulidade da sentença por cerceamento de defesa, alegando que a perícia médica não fora realizada por especialista na área das patologias apresentadas.
RECURSO INOMINADO CÍVEL (460) Nº 0000807-97.2020.4.03.6305 RELATOR: 14º Juiz Federal da 5ª TR SP RECORRENTE: MARCELO COELHO GONCALVES Advogado do(a) RECORRENTE: EDUARDO MASSARU DONA KINO - SP216352-N RECORRIDO: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS OUTROS PARTICIPANTES: V O T O 4. Consta da perícia médica, realizada com médico clínico geral, que a parte autora não possui incapacidade, destacando o perito que “Análise e Discussãodos Resultados: -periciando portador de HIV foi acometido por infecções oportunistas no passado e foi devidamente tratado. -hoje faz acompanhamento regular com infectologista e neurologista. -apresenta como sequela crises convulsivas, controladas com uso de medicação disponibilizada pelo SUS. -neurologista apresenta relatório médico atestando incapacidade, porém, não descreve quais os motivos da incapacidade. Descreve que fez tratamento para neurossífilis e que fazuso de anticonvulsivante. -o anticonvulsivante é disponibilizado gratuitamente no SUS -realizo exame neurológico no paciente e não encontro evidência de incapacidade, seja devido sequela motora, seja devido sequela sensitiva, seja por sequela neurológica em que haja dificuldade na capacidade de compreensão e execução de tarefas. -portanto, após anamnese e exame físico, não encontro evidência de incapacidade. Com base nos elementos expostos e analisados conclui-se: Está capacitadopara atividade que lhe garanta a subsistência”. 5. Em razão do que dispõem os artigos 371 e 479, ambos do CPC/15, o juiz apreciará livremente a prova, atendendo aos fatos e circunstâncias constantes dos autos, “independentemente do sujeito que a tiver promovido”, podendo “considerar ou deixar de considerar as conclusões do laudo”. Os artigos citados correspondem aos artigos 131 e 436 do CPC revogado, que representam “a consagração do princípio do livre convencimento ou persuasão racional (que se contrapõe radicalmente aos sistemas da prova legal e do juízo pela consciência). Decorre do princípio um grande poder e um grande dever. O poder concerne à liberdade de que dispõe o juiz para valorar a prova (já que não existe valoração legal prévia nem hierarquia entre elas, o que é próprio do sistema da prova legal); o dever diz respeito à inafastável necessidade de o magistrado fundamentar sua decisão, ou seja, expressar claramente o porquê de seu convencimento (...).” (Antônio Cláudio da Costa Machado, in “Código de Processo Civil Interpretado”, Editora Saraiva, São Paulo, 9ª Edição, 2010, página 156/157, comentários ao artigo 131, do CPC). Ocorre que não há elementos para se afastar as conclusões da perícia em que há informações convincentes de que a doença da parte autora não acarreta incapacidade laborativa. Além disso, o exame médico detalhou de forma objetiva a situação da parte autora, com base no exame físico e nos documentos apresentados, não havendo qualquer mácula ou cerceamento à produção de prova, não havendo um direito subjetivo à realização de perícia médica com determinado profissional especialista, devendo ser respeitado o conhecimento técnico dos profissionais credenciados pelos Juizados Especiais Federais para a realização dos exames médicos periciais. 6. Tenho entendimento de que, ““(...)ainda que a questão do preconceito sofrido pelo portador de HIV seja praticamente notória, entendo que a segregação pura e simples do portador da moléstia, em todos os casos, alijando-o do mercado de trabalho, não contribui para a solução desse grave problema. Ao contrário, a segregação do portador da moléstia assintomático ou com leves seqüelas do meio social acabaria por agravar o preconceito, uma vez que chancelaria estado de isolamento que em nada contribui, em primeira análise, para a diminuição desse preconceito. 8. Importante ressaltar que os argumentos da dificuldade de reinserção no mercado de trabalho e da imprevisibilidade da manifestação de doenças oportunistas em virtude da baixa imunidade, poderiam fazem concluir que todo e qualquer portador de HIV é incapaz para o trabalho, independentemente de sua condição clínica no momento da realização do laudo pericial. Com efeito, essas questões certamente não podem ser ignoradas, mas tampouco constituem uma presunção absoluta de que todo o portador do mencionado vírus é incapaz, mesmo que não apresente quaisquer doenças oportunistas. Tais conclusões, todavia, podem ser alteradas em caso de piora no estado clínico da parte autora, o que certamente autorizará a propositura de nova demanda visando à concessão do mesmo benefício, vez que estamos, induvidosamente, diante de uma relação jurídica continuativa” (PEDILEF nº 00212758020094036301, TNU, Relatora Juíza Kyu Soon Lee, DOU 21/06/2013, pág. 105/162). 7. Embora o entendimento da Súmula nº 77 da TNU dispense a análise das condições sociais e pessoais em caso de ausência de incapacidade, verifico que no caso dos autos, mesmo consideradas essas condições da parte autora, não há como se reconhecer que as doenças alegadas acarretam a incapacidade laborativa. Note-se ainda que enfermidade e incapacidade são dois conceitos que não se confundem; aquela não confere direito ao benefício perseguido nos autos, sendo reconhecida a incapacidade apenas em tempo pretérito. 8. Por fim, defiro o pedido de gratuidade, formulado pela parte autora. 9. Recurso da parte autora a que se nega provimento, para manutenção da sentença. 10. Condeno a autora recorrente em honorários advocatícios que fixo em 10% (dez por cento) sobre o valor da causa atualizado, nos termos do art. 85, §4º, III, do CPC. Considerando que a parte autora é beneficiária da gratuidade da justiça, deverá ser observado o disposto no §3º do art. 98 do CPC, ficando a obrigação decorrente da sucumbência sob condição suspensiva de exigibilidade. É como voto.
E M E N T A
PREVIDENCIÁRIO. BENEFÍCIO POR INCAPACIDADE. SENTENÇA DE IMPROCEDÊNCIA. CONCLUSÃO DO LAUDO PERICIAL. PRINCÍPIO DA LIVRE APRECIAÇÃO DAS PROVAS. DOENÇA X INCAPACIDADE. RECURSO DA PARTE AUTORA DESPROVIDO.