RECURSO INOMINADO CÍVEL (460) Nº 5000777-38.2020.4.03.6123
RELATOR: 17º Juiz Federal da 6ª TR SP
RECORRENTE: MARIA APARECIDA MARTINS MARCONDES
Advogados do(a) RECORRENTE: PAULO EDUARDO BORDINI - SP282686-N, CLAUDIA APARECIDA DARIOLLI - SP235767-N
RECORRIDO: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS
PROCURADOR: PROCURADORIA-REGIONAL FEDERAL DA 3ª REGIÃO
OUTROS PARTICIPANTES:
RECURSO INOMINADO CÍVEL (460) Nº 5000777-38.2020.4.03.6123 RELATOR: 17º Juiz Federal da 6ª TR SP RECORRENTE: MARIA APARECIDA MARTINS MARCONDES Advogados do(a) RECORRENTE: PAULO EDUARDO BORDINI - SP282686-N, CLAUDIA APARECIDA DARIOLLI - SP235767-N RECORRIDO: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS OUTROS PARTICIPANTES: R E L A T Ó R I O Trata-se de recurso interpostos por ambas as partes autora, em face de sentença que julgou improcedente/parcialmente procedente o pedido inicial. É o relatório.
PROCURADOR: PROCURADORIA-REGIONAL FEDERAL DA 3ª REGIÃO
RECURSO INOMINADO CÍVEL (460) Nº 5000777-38.2020.4.03.6123 RELATOR: 17º Juiz Federal da 6ª TR SP RECORRENTE: MARIA APARECIDA MARTINS MARCONDES Advogados do(a) RECORRENTE: PAULO EDUARDO BORDINI - SP282686-N, CLAUDIA APARECIDA DARIOLLI - SP235767-N RECORRIDO: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS OUTROS PARTICIPANTES: V O T O A r. decisão atacada decidiu a lide nos seguintes termos: Dispensado o relatório (art. 38 Lei 9099/95). Trata-se de ação ajuizada em face do INSS, objetivando a parte autora a concessão de aposentadoria por idade, mediante o reconhecimento de período de trabalho urbano e rural. Passo à apreciação do mérito. O benefício previdenciário de aposentadoria por idade está previsto no artigo 142, combinado com os artigos 25, II e 48, ambos da Lei nº 8.213/91. Nos termos dos dispositivos acima, o trabalhador urbano deve cumprir os seguintes requisitos legais para o benefício: Idade mínima prevista no artigo 48, caput e cumprimento da carência de 60 meses de contribuição, se implementou todas as condições até o ano de 1992. De 1993 em diante, a carência aumenta segundo o artigo 142, até chegar às 180 contribuições mensais no ano de 2011, exigidas no artigo 25, II. É importante anotar ser irrelevante o fato de o segurado ter deixado de trabalhar nos últimos meses ou anos anteriores ao requerimento administrativo de benefício ou ação judicial, desde que tenha preenchido os requisitos legais da aposentadoria quando completou a idade mínima exigida, embora somente tempos após ter deixado de trabalhar venha a solicitar a concessão de seu direito, pois nesta hipótese não perde o segurado o direito já adquirido ao benefício, conforme dispõe o § 1º do art. 102 da lei n. 8.213/91. Isso também é aplicável ao disposto no artigo 142 da mesma lei, que se refere àqueles segurados que se encontravam inscritos na Previdência Social quando da entrada em vigor da Lei nº 8.213, de 24/07/1991. A Lei nº 10.666, de 08/05/2003, em seu artigo 3º, §§1º e 2º, dispensou o requisito de condição de segurado para a obtenção da aposentadoria por idade, estabelecendo, porém, a regra de que o segurado deve contar “... com, no mínimo, o tempo de contribuição correspondente ao exigido para efeito de carência na data do requerimento do benefício.”. Note-se que a jurisprudência de longa data, com fulcro no art. 102, §1º da Lei nº 8.213/91, já havia consolidado o entendimento no sentido de ser prescindível a qualidade de segurado, quando preenchidos os requisitos legais (idade e carência), ainda que não simultaneamente, culminando no julgamento dos embargos de divergência abaixo colacionado: (...) Desse modo, a carência legal exigida deve ser computada na data em que o segurado completa a idade mínima para o benefício. Nesse sentido, os julgados colacionados abaixo: (...) Na busca de pacificação da jurisprudência e celeridade processual, acompanho este entendimento, mais consentâneo aos fins sociais da norma previdenciária e com o princípio da isonomia. DO RECONHECIMENTO DO PERÍODO COMUM - VÍNCULO URBANO O reconhecimento de tempo de serviço para os fins previdenciários exige início de prova material, vale dizer, início de prova documental do alegado tempo exercido de labor profissional, nos termos do art. 55, §3º, da Lei 8213/91, não bastando, para tanto, a prova exclusivamente testemunhal, relegada para um segundo momento. Os registros em CTPS são prova bastante do vínculo empregatício, ressalvada ao INSS a possibilidade de suscitar dúvida dos lançamentos, desde que haja fundada suspeita de irregularidade, cuja prova em Juízo, assim como a apuração administrativa, é atribuição que recai sobre a Previdência Social, nos termos do art. 125-A da Lei n. 8.213/91. Neste sentido já se manifestou a jurisprudência, conforme se observa no aresto abaixo colacionado: (...) No que tange à ausência de recolhimento das contribuições previdenciárias, a jurisprudência é pacífica no sentido de que, em se tratando em segurado empregado, essa obrigação é do empregador, devendo o INSS fiscalizar o cumprimento da norma. Logo, eventuais omissões ou incorreções quanto aos recolhimentos previdenciários não podem ser alegadas em detrimento do empregado que não deve ser penalizado pela conduta de outrem. Nesse sentido: (...) DO COMPUTO DO TEMPO DE SERVIÇO RURAL NA APOSENTADORIA POR IDADE URBANA Os trabalhadores rurais são classificados, na Lei 8.213, de 24.07.1991, em três categorias: empregados rurais (art. 11, inc. I, alínea “a”), contribuintes individuais (art. 11, inc. V, alínea “g”) e segurados especiais (art. 11, inc. VII). O empregado rural é aquele que presta serviço de natureza urbana ou rural à empresa, em caráter não eventual, sob sua subordinação e mediante a remuneração. O contribuinte individual é aquele que presta serviço em caráter eventual, a uma ou mais empresas sem relação de emprego. Enquadram-se nesta categoria os denominados “bóia-fria”, diarista ou volante, trabalhadores que prestam serviços eventuais a diversos proprietários rurais, mediante remuneração específica, seja por dia, ou por tarefa executada. (...) Também é considerado contribuinte individual a pessoa física, proprietária ou não, que explora atividade agropecuária em área superior a quatro módulos fiscais ou, em área menor, com auxílio de empregados ou por intermédio de prepostos. Por fim, o segurado especial é aquele que exerce atividade rural em regime de economia familiar, da qual provê subsistência própria e de seus dependentes, sem a utilização de empregados permanentes. No que tange às contribuições previdenciárias, a única categoria de trabalhador rural que é dispensada de contribuir na forma direta é o segurado especial, eis que este o faz de forma indireta ao vender seus produtos e receber o pagamento já deduzido da contribuição previdenciária, cujo recolhimento é obrigatório para empresas e cooperativas na condição de adquirentes, tal como previsto na Lei de Custeio da Previdência Social. Para as demais categorias, o reconhecimento de períodos laborados após o advento da Lei 8.213 de 24.07.1991, está condicionado ao recolhimento de contribuições individuais, ou à existência de vínculo empregatício registrado na CTPS. Portanto, o cômputo de períodos rurais sem contribuição previdenciária somente se aplica às atividades exercidas até 24/07/1991, exceto para os segurados especiais, hipótese em que a comprovação do labor rural deve dar-se mediante início de prova material, corroborada por prova testemunhal, nos termos da Súmula 149 do STJ. DOS EFEITOS DA QUALIFICAÇÃO “DO LAR” OU “PRENDAS DOMÉSTICAS” NOS DOCUMENTOS DA PARTE AUTORA PARA CONFIGURAÇÃO DO TRABALHADO RURAL A existência da qualificação de uma pessoa em um documento traz a presunção de que a atividade declarada, na ocasião da confecção deste, era a atividade realizada. Esta presunção não é absoluta. Assim, somente a análise do contexto em que se insere a pessoa permite que seja afastado aquilo que está expressamente consignado no documento. A presença dos termos “do lar” ou “prendas domésticas” nos documentos juntados aos autos para comprovação da atividade rural da autora tem diferentes efeitos conforme a modalidade de trabalho de seu cônjuge. Note-se que, nos casos em que o cônjuge consta como lavrador e seu trabalho é desenvolvido em regime de economia familiar, é plenamente possível que se presuma que sua esposa desenvolvesse trabalho rural. Isto porque o local em que se realiza o labor rural é o próprio imóvel no qual se encontra a residência da família. Esta condição permite que a cônjuge varoa concilie seus afazeres familiares diários com o trabalho rural na propriedade. Assim, nesta situação, a presunção relativa é afastada, o que possibilita que a atividade rural do marido se estenda à esposa. Na mesma linha do raciocínio acima consignado já se manifestou a jurisprudência pátria. (...) Solução diversa ocorre nos casos em que o cônjuge varão desenvolve suas atividades como avulso (bóia-fria ou volante) ou como empregado rural. Nestas situações o trabalho é desenvolvido em propriedade de terceiros, muitas vezes distantes da residência da família, de modo que se pode presumir a incompatibilidade do trabalho rural com os afazeres diários da mulher, devendo-se interpretar os termos “do lar” ou “prendas domésticas” como não realização de trabalho rural. Neste caso, mantém-se a presunção contida no documento; não se estendendo a condição de trabalhador rural do marido à mulher. Em síntese, as expressões “do lar” ou “prendas domésticas”, quando o marido detiver a condição de trabalhador rural no documento, somente permitirão que se conclua pelo trabalho rural da esposa quando houver situação de trabalho rural em regime de economia familiar. Nos demais casos, a qualificação presente no documento apresentado deve prevalecer. Tecidas as considerações acerca do tema, passo à análise dos períodos não reconhecidos pela autarquia ré. No caso concreto, a autora, nascida em 18/07/1958, protocolou requerimento administrativo em 31/08/2018 (Evento 02 –fls. 25), época em que contava com 60 (sessenta) anos de idade. Trata o presente caso sobre a aposentadoria híbrida. Esta deve ser concedida independentemente de qual tenha sido a última atividade profissional desenvolvida (rural ou urbana), considerando a decisão judicial proferida na Ação Civil Pública nº 5038261-15.2015.4.04.7100/RS que tem validade para todo o território nacional. O pedido veiculado na inicial compreende o reconhecimento do período rural de 1970 a 10/2008. Para efeito de comprovação do labor rural, a parte autora anexou aos autos os seguintes documentos: a) Certidão de casamento realizado em 22/01/1977, com anotação da profissão da autora como prendas domésticas e do cônjuge (Pedro Marcondes) como lavrador (Evento 02 – fls. 26); b) certidão de nascimento de filhos em 1977, 1979, 1985, 1988, 1990, 1992, em que consta a profissão do esposo da autora como lavrador (Evento 02 – fls. 27/33); c) Contrato de parceria rural firmado pelo esposo da autora, com vigência de 1992 a 1994 (Evento 02 – fls. 34/36); d) Certidão de óbito do esposo da autora, em 09/2008, constando ser lavrador (Evento 02 – fls. 37). Análise dos requisitos no caso concreto. A) DA IDADE Em 31/08/2018, data do requerimento administrativo, a parte autora contava com 60 anos de idade, razão pela qual restou cumprido o requisito etário. B) DA CARÊNCIA Após a análise do requerimento administrativo, o INSS apurou 101 meses de carência (Evento 22 – fl. 23). Tendo a autora implementado a idade em 2018, deve cumprir a carência de 180 meses, nos termos do artigo 142 da Lei de Benefícios. B.1) Período compreendido entre 1970 a 10/2008. Com efeito, em consonância com o depoimento das testemunhas, a autora teria trabalhado como parceira no terreno do pai da Testemunha Osmar e de 2000 a 2008, também no terreno do pai da testemunha Maria Gorete, não sabendo informar se havia parceria. Afirmaram, ainda, que em alguns períodos era diarista e em outros era mensalista e que após o falecimento do marido a autora passou a trabalhar na lavoura apenas como diarista. Entretanto, não há nos autos, efetivamente, qualquer documento em que a autora conste como lavradora, de modo que, nos termos da fundamentação supra, somente podem ser aproveitados em relação a esta os documentos que comprovem que seu esposo trabalhava em regime de economia familiar – documento (c) acima, que comprovam a existência de parceria agrícola para o período de 01/11/1992 a 01/ 11/1994. Note-se, todavia, que é inadmissível o reconhecimento da condição de trabalhador rural com base somente em depoimento testemunhal. Súmula 149 do Superior Tribunal de Justiça: (...) Portanto, somente o período de 01/11/1992 a 01/11/1994 deve ser reconhecido para fins de carência, resultando 24 meses de carência. Conforme Processo Administrativo juntado aos autos (Evento 22 – fl. 23), o INSS reconheceu 101 meses de carência. Conclusão: Considerando-se a soma do período reconhecido acima (24 meses) com o já reconhecido administrativamente pelo INSS (101 meses), a parte autora não cumpriu a carência exigida para o benefício, porquanto restando comprovada carência de apenas a 125 meses. Em síntese, não cumpridos, em sua integralidade, os requisitos para a aposentadoria por idade híbrida, é de rigor o indeferimento do benefício, razão pela qual o pedido formulado pela parte autora não deve ser acolhido. Posto isso, JULGO PARCIALMENTE PROCEDENTE o pedido, resolvendo o mérito, nos termos do art. 487, inciso I do Código de Processo Civil para, tão somente, reconhecer o labor urbano exercido pela autora no período de 01/11/1992 a 01/11/1994 e condenar o INSS a proceder a averbação do referido período nos assentos da autora MARIA APARECIDA MARTINS MARCONDES. Sem custas ou honorários advocatícios neste grau de jurisdição (art. 55 da Lei nº 9.099/1995, combinado com art. 1º da Lei nº 10.259/2001). Cientifiquem-se as partes de que, caso pretendam recorrer, seu prazo é de 10 (dez) dias, mediante representação por advogado. Transitada em julgado, arquivem-se. Sentença registrada eletronicamente. Publique-se. Intimem-se. No caso, insurge-se o autor quanto ao não reconhecimento do trabalho rural para os períodos de 01.01.1970 a 20.06.1992 e de 02.11.1994 a 31.10.2008. Relativamente ao primeiro período, consta dos autos a certidão de casamento da autora e as certidões de nascimento de seus filhos onde seu marido está qualificado como lavrador. No entanto, da documentação mencionada em conjunto com os depoimentos das testemunhas não é possível concluir se a autora e sua família prestavam serviços para terceiros ou se trabalhavam em regime de economia familiar. No que concerne ao segundo período autora não trouxe aos autos nenhuma prova documental do trabalho realizado. Além disso, os depoimentos são imprecisos. A testemunha Osmar afirmou que a autora teria trabalhado como parceira no terreno de seu pai (Sítio Boa esperança) entre os anos de 1995 a 2003, enquanto a testemunha Maria Gorete mencionou que a demandante prestava serviços para seu pai e tios (Sitio dos Bianquis) entre os anos 2000 e 2009 e referiu acreditar que autora trabalhava vezes como diarista vezes como mensalista. Em seguida, mencionou que não sabia afirmar ao certo se a autora poderia ter trabalhado em regime de parceria. Logo, incabível neste feito o reconhecimento do trabalho rural para os períodos de 01.01.1970 a 20.06.1992 e de 02.11.1994 a 31.10.2008. Ocorre que, ao julgar o REsp 1352721/SP, o Superior Tribunal de Justiça proferiu a seguinte tese (tema 629): “A ausência de conteúdo probatório eficaz a instruir a inicial, conforme determina o art. 283 do CPC, implica a carência de pressuposto de constituição e desenvolvimento válido do processo, impondo sua extinção sem o julgamento do mérito (art. 267, IV do CPC) e a consequente possibilidade de o autor intentar novamente a ação (art. 268 do CPC), caso reúna os elementos necessários à tal iniciativa.” (REsp 1352721/SP. Relator(a): Min. Napoleão Nunes Maia Filho. Julgamento: 16/12/2015. Órgão Julgador: Superior Tribunal de Justiça. DOU 28/04/2016. Assim, uma vez que a parte autora não carreou aos autos toda a documentação apta para comprovação do labor rural em regime de economia familiar, não há que se falar em improcedência do pedido, mas em extinção do feito sem resolução de seu mérito. Ante o exposto, dou parcial provimento ao recurso da parte autora, a fim de extinguir o feito sem resolução do mérito para os períodos de 01.01.1970 a 20.06.1992 e de 02.11.1994 a 31.10.2008, conforme fundamentação supra. Sem condenação em honorários, nos termos do art. 55 da Lei nº 9.099/95. É como voto.
PROCURADOR: PROCURADORIA-REGIONAL FEDERAL DA 3ª REGIÃO
E M E N T A
APOSENTADORIA POR IDADE. TRABALHO RURAL. AUSÊNCIA DE PROVA MATERIAL. TEMA 269 STJ. EXTINÇÃO DO FEITO SEM RESOLUÇÃO DO MÉRITO. RECURSO A QUE SE DÁ PARCIAL PROVIMENTO.