Diário Eletrônico

PODER JUDICIÁRIO

TRIBUNAL REGIONAL FEDERAL DA 3ª REGIÃO

HABEAS CORPUS (307) Nº 5003328-61.2019.4.03.0000

RELATOR: Gab. 15 - DES. FED. ANDRÉ NEKATSCHALOW

IMPETRANTE: TAINA CARPES, ALEXSANDRA ROSA DA SILVA LOPES
PACIENTE: PATRICK LUCAS FERREIRA

Advogados do(a) PACIENTE: ALEXSANDRA ROSA DA SILVA LOPES - MS21209-A, TAINA CARPES - MS17186

IMPETRADO: SUBSEÇÃO JUDICIÁRIA DE PONTA PORÃ/MS - 2ª VARA FEDERAL

 


 

  

HABEAS CORPUS (307) Nº 5003328-61.2019.4.03.0000

RELATOR: Gab. 15 - DES. FED. ANDRÉ NEKATSCHALOW

IMPETRANTE: TAINA CARPES, ALEXSANDRA ROSA DA SILVA LOPES
PACIENTE: PATRICK LUCAS FERREIRA

Advogados do(a) PACIENTE: ALEXSANDRA ROSA DA SILVA LOPES - MS21209-A, TAINA CARPES - MS17186

IMPETRADO: SUBSEÇÃO JUDICIÁRIA DE PONTA PORÃ/MS - 2ª VARA FEDERAL

 

 

R E L A T Ó R I O

Trata-se de habeas corpus impetrado em favor de Patrick Lucas Ferreira contra ato do Juízo da 2ª Vara Federal de Ponta Porã (MS) objetivando realização de novo exame pericial, toxicológico, nos autos da Ação Penal n. 0000443-26.2018.4.03.6005, com a finalidade de comprovar a dependência química do paciente e sua consequente inimputabilidade.

Alega-se, em síntese, o seguinte:

a) o paciente foi preso em 10.04.18, juntamente com mais 5 (cinco) pessoas, incluindo um adolescente, suspeitos de terem se associado para cometerem o crime de tráfico de drogas, no qual o paciente estaria atuando como “batedor” no transporte de drogas do Paraguai, acondicionada no veículo, que seria produto de crime, conduzido pelo menor Rodrigo;

b) ainda, foram acusados de terem instalado e utilizado aparelho de telecomunicações clandestinas, corrompido um menor e com ele praticado infrações penais e, após aditamento da denúncia, pelo crime de receptação;

c) a defesa técnica já havia formulado pedido de realização de exame toxicológico na audiência de custódia (Id. n. 31384479);

d) na apresentação de defesa prévia, o paciente reiterou o pedido de realização de exame toxicológico, a fim de comprovar dependência química. A decisão da magistrada indeferiu o pedido;

e) na fase do art. 402 do Código de Processo Penal, o paciente repetiu o pedido, que foi concedido pelo Juízo, tendo este nomeado dois peritos, Dr. Raul Grigoletti e Roberto Merida Aspetti (médico da unidade prisional) para determinarem a realização de exame toxicológico e atestar eventual inimputabilidade decorrente do uso de drogas;

f) as partes apresentaram seus quesitos e a defesa juntou documentos e pen drive para análise pericial conjunta, especialmente relatórios de atendimentos precedentes aos fatos apurados nos autos;

g) o laudo foi apresentado, constando que apenas o médico da unidade prisional avaliou o paciente. Não houve avaliação pelo perito Raul Grigolett nem realização do exame toxicológico, exame de sangue;

h) a defesa impugnou a avaliação pericial apresentada sob os fundamentos de que o exame não fora realizado por médico psiquiatra, uma vez que o Dr. Roberto é clínico geral lotado na Unidade Prisional de Ponta Porã, sendo responsável pelo paciente enquanto segregado; o perito foi intimado a realizar o exame pericial e mesmo ciente de seu munus, deixou de proceder; “houve parcialidade médica quando, no relatório, afirma o perito que o paciente teria respondido que não fazia uso de drogas dentro do estabelecimento, quando na audiência de interrogatório afirmou de modo diverso em frente à magistrada; e as respostas aos quesitos são superficiais e pouco técnicas, evidenciando exame fora dos padrões exigidos;

i) o perito não especificou o tipo de dependência do periciado, física, psíquica, bem como os efeitos e comprometimentos do uso prolongado, especialmente considerando a potencialidade do crack, que causam paranoia, delírios e outros complicadores irreversíveis, como grau de comprometimento mental;

j) a perícia demonstrou-se contraditória na medida em que, de um lado, relatou os efeitos nefastos do crack, reconhecendo o uso por parte do acusado, e de outro, sem fundamentar, afirmou capacidade plena deste, sem detalhar como isso seria por meio de conceituações médicas atinentes ao uso prologando da substância;

k) após manifestação do Ministério Público Federal, contrário à declaração de nulidade do exame pericial, por entender desnecessária realização de exame toxicológico diante do transcurso do tempo, o Juízo analisou o pedido de nulidade de laudo pericial e rejeitou o pedido de nova perícia médica, homologando o laudo de exame toxicológico realizado;

l) o magistrado encerrou a instrução processual e encaminhou os autos ao Ministério Público Federal para apresentação de Alegações Finais;

m) diferentemente do que fora argumentado pelo magistrado, autoridade ora impetrada, todos os documentos que comprovam que o Paciente recebia tratamento no CAPS, sendo inclusive reconhecido como dependente químico, fazem parte integrante dos autos, inclusive a prescrição do médico (perito), Dr. Roberto Aspetti, encaminhando o paciente ao CAPS;

n) patente o constrangimento ilegal causado ao paciente, uma vez que é usuário de crack por considerável período de tempo, fazendo, inclusive, tratamento junto ao CAPS, sendo de rigor a avaliação capaz de atestar sua inimputabilidade ou não;

o) apontada a ofensa aos direitos do paciente, encontra-se presente, in casu, o fumus boni iuris;

p) verifica-se a ocorrência do periculum in mora, pois os autos estão em fase de Memoriais, prestes a encerrar-se, o que pode acarretar prejuízos imensuráveis ao paciente, posto que corre o risco de ser condenado e cumprir a pena em local inadequado devido a sua incapacidade mental. Local que, inclusive, vem sendo mantido arbitrariamente, diante de todo o conjunto probatório que se produziu ao longo da instrução, e das inúmeras tentativas de que ele fosse submetido adequadamente ao exame para aferir sua verdadeira capacidade, além da evidente dependência química que se alastra de período anterior à data dos fatos;

q) trata-se de prova imprescindível para o julgamento do processo, uma vez que, atestada a inimputabilidade do Paciente, ou mesmo sua semi-inimputabilidade, eventual aplicação de pena deverá ser modulada, impondo ao juiz que aprecie a prova pericial;

r) requer, assim, concessão da presente ordem para a declaração de nulidade do referido Laudo Pericial, porquanto além de ineficiente e superficial, fora elaborado por perito vedado nos termos do Código de Ética.;

s) requer, igualmente, a procedência do pedido de habeas corpus, liminarmente, para reformar a decisão proferida pelo Juízo da 2ª Vara da Comarca de Ponta Porã e determinar a urgente realização de exame pericial (Laudo Psicológico forense para fins de Esclarecimentos à Justiça) realizado por médico habilitado (psiquiatra), tanto para fins de atestar a inimputabilidade ao tempo da ação, quanto os danos causados ao cérebro para todos os atos, efeitos imediatos e os permanentes (CRACK), os quais também devem ser observados ainda que o periciado ao tempo da ação não esteja sob os efeitos da droga;

t) requer, outrossim, seja o presente pedido de habeas corpus julgado procedente ao final, confirmando-se a decisão liminar, visto que presentes os requisitos do periculum in mora e do fumus boni iuris.

Foram juntados documentos (Id. n. 31384478, Id. n. 31384479, Id. n. 31384481, Id n. 31385975, Id. n. 31385938 e Id. n. 40244020)

O pedido liminar foi indeferido (Id n. 31678782).

A autoridade impetrada prestou informações (Id n. 33433342).

O Ilustre Procurador Regional da República, Dr. Márcio Domene Cabrini, manifestou-se pela denegação da ordem (Id n. 38725664).

É o relatório.

 

 


HABEAS CORPUS (307) Nº 5003328-61.2019.4.03.0000

RELATOR: Gab. 15 - DES. FED. ANDRÉ NEKATSCHALOW

IMPETRANTE: TAINA CARPES, ALEXSANDRA ROSA DA SILVA LOPES
PACIENTE: PATRICK LUCAS FERREIRA

Advogados do(a) PACIENTE: ALEXSANDRA ROSA DA SILVA LOPES - MS21209-A, TAINA CARPES - MS17186

IMPETRADO: SUBSEÇÃO JUDICIÁRIA DE PONTA PORÃ/MS - 2ª VARA FEDERAL

 

 

 

 V O T O
 

Não se verifica abuso ou ilegalidade na decisão impugnada.

Em 29.01.19, o Juízo da 2ª Vara de Federal de Ponta Porã (MS), nos Autos n. 0000443-26.2018.4.03.6005, rejeitou o pedido de realização de novo exame toxicológico, considerando que a prisão em flagrante ocorreu há 9 (nove) meses e não seria possível detectar a presença de substância entorpecente consumida há tanto tempo. Refutou a obrigatoriedade de que o exame fosse realizado por médico psiquiatra e registrou que o médico responsável pelo laudo é especializado em Perícia Médica. Ainda, fundamentou que o laudo elaborado pelo profissional, por si só, não tem o condão de vincular o julgador às suas conclusões, vez que será analisado conjuntamente com os demais elementos probatórios constantes nos autos, compartilhando do entendimento do Ministério público federal, de que foi analisada a regularidade formal do exame a que foi submetido o réu, e que tal fato não torna a perícia nula. A decisão encontra-se fundamentada nos seguintes termos:

 

Trata-se de pedido de nulidade de Laudo Pericial realizado para averiguar eventual inimputabilidade do réu PATRICK LUCAS FERREIRA, decorrente de seu vício em drogas. Sustenta o requerente que o exame não foi realizado por médico psiquiatra; a perícia se mostrou contraditória e insuficiente; o segundo perito nomeado apenas deu sua ciência acerca do laudo elaborado, sem analisar pessoalmente o réu, ferindo o Código de Ética da Medicina, motivos pelo qual o laudo apresentado deve ser declarado nulo. Por fim, requer a realização de novo laudo pericial, a ser realizado por médico psiquiatra e a realização de exame toxicológico, a fim de atestar a natureza de eventual substância entorpecente encontrada no sangue do réu (fls. 531/536).O Ministério Público Federal manifestou-se contrário à declaração de nulidade do exame pericial à realização de exame toxicológico (fls. 539/566).É o relatório. DECIDO.O pedido não merece prosperar.O requerente foi preso em flagrante em 10.04.2018 por supostamente atuar como "batedor de estrada" para o transporte de 1.128,3 kg (mil cento e vinte e oito quilos e trezentos gramas) de maconha em um veículo contendo aparelho radiotransmissor oculto e ativo. Nota-se que a prisão ocorreu a aproximadamente nove meses, de modo que a realização de exame toxicológico, seja por meio da análise de amostra de sangue, urina ou fios de cabelo do requerente não terá nenhum efeito prático, por não ser possível detectar a presença de substância entorpecente consumida há tanto tempo. Pesquisas em sites especializados indicam que a análise de amostra de sangue e urina detectam substâncias tóxicas consumidas no máximo trinta dias antes do exame, ao passo que a análise de fios de cabelo é capaz de detectar entorpecentes consumidos há mais tempo (por volta de seis meses). Deste modo, diante da inviabilidade de detectar o consumo de substâncias tóxicas no momento do crime, REJEITO o pedido de realização de exame toxicológico.Acerca da realização de novo laudo pericial a fim de avaliar eventual inimputabilidade do réu devido ao consumo de drogas, destaco, inicialmente, não há obrigatoriedade legal de que o exame seja realizado por médico psiquiatra. É necessário que o responsável pela análise do paciente seja médico, entretanto, não há qualquer determinação de que o exame seja realizado especificamente por profissional de determinado ramo da medicina. Além disso, nota-se que o responsável pela elaboração do laudo pericial é capacitado para tal, por ser especialista, dentre outras áreas da medicina, em Perícia Médica (fl. 495).Ademais, vigora em nosso ordenamento jurídico o princípio do livre convencimento motivado, segundo o qual o magistrado julga a causa de acordo com a sua convicção a respeito das provas produzidas legalmente no processo, em decisão devidamente fundamentada (Art. 371 CPC - O juiz apreciará a prova constante dos autos, independentemente do sujeito que a tiver promovido, e indicará na decisão as razões da formação de seu convencimento), de modo que o julgador não está adstrito às conclusões do laudo pericial, podendo formar seu convencimento com outros elementos de prova (Art. 479 CPC - O juiz apreciará a prova pericial de acordo com o disposto no art. 371, indicando na sentença os motivos que o levaram a considerar ou a deixar de considerar as conclusões do laudo, levando em conta o método utilizado pelo perito). Assim, seja o exame realizado por médico psiquiatra ou não, o laudo elaborado pelo profissional, por si só, não tem o condão de vincular o julgador às suas conclusões, vez que será analisado conjuntamente com os demais elementos probatórios constantes nos autos. Pelas mesmas razões afasto a alegação de que o laudo elaborado é insuficiente para a análise de eventual inimputabilidade, vez que suas conclusões não serão analisadas isoladamente. Acrescento que o médico responsável pela realização do exame pericial está lotado na Unidade Prisional de Ponta Porã/MS, logo, não é medico particular do réu, bem como não há qualquer notícia de que tenha prescrevido ou acompanhado qualquer tipo tratamento médico prescrito ao requerente em outras ocasiões, de modo que a alegação de parcialidade do profissional não se sustenta. Por fim, quanto à alegação de o segundo perito não analisou pessoalmente o réu, e apenas deu ciência do exame anteriormente realizado, compartilho do entendimento do Ministério público federal, de que foi analisada a regularidade formal do exame a que foi submetido o réu, e que tal fato não torna a perícia nula. Importante relembrar que o exame não será analisado isoladamente, mas dentro do conjunto de provas produzidas durante a regular instrução processual. Ante o exposto, não verifico qualquer nulidade no exame pericial questionado, motivo pelo qual REJEITO a realização de nova perícia médica. (...) (Id. n. 3135938)

 

Em 31.01.19, o mesmo Juízo da 2ª Vara de Federal de Ponta Porã (MS), homologou o laudo de exame toxicológico realizado no paciente e declarou encerrada a instrução processual (Id. n. 31385939)

A decisão de rejeitar nova perícia médica encontra-se satisfatoriamente fundamentada e encontra amparo legal, pois a verificação da inimputabilidade do paciente não será analisada unicamente pela prova pericial, mas sim do conjunto probatório encartado aos autos.

Fundamentada adequadamente a prescindibilidade do exame toxicológico com a finalidade de investigar o estado de inimputabilidade do paciente no momento dos fatos, diante do tempo transcorrido.

Não existe obrigação legal de que laudos toxicológicos devam ser realizados por psiquiatra, de forma que o laudo produzido por médico habilitado não configura constrangimento ilegal.

Ainda, o laudo produzido é claro em definir o paciente como estando no pleno gozo de suas faculdades mentais, não sendo considerado dependente químico (ID. n. 31385937).

Ainda, o médico responsável pela emissão do laudo não pode ser caracterizado como médico do paciente apenas por atuar na unidade prisional em que aquele se encontra recolhido.

Ante o exposto, DENEGO a ordem de habeas corpus.

É o voto.



E M E N T A

 

PENAL. PROCESSUAL PENAL. HABEAS CORPUS. ORDEM DENEGADA.

1. A decisão de rejeitar nova perícia médica encontra-se satisfatoriamente fundamentada e encontra amparo legal, pois a verificação da inimputabilidade do paciente não será analisada unicamente pela prova pericial, mas sim do conjunto probatório encartado aos autos.

2. Não existe obrigação legal de que laudos toxicológicos devam ser realizados por psiquiatra, de forma que o laudo produzido por médico habilitado não configura constrangimento ilegal.

3. Ainda, o laudo produzido é claro em definir o paciente como estando no pleno gozo de suas faculdades mentais, não sendo considerado dependente químico (ID. n. 31385937), além disso, o médico responsável pela emissão do laudo não pode ser caracterizado como médico do paciente apenas por atuar na unidade prisional em que aquele se encontra recolhido.

4. Ordem denegada.


  ACÓRDÃO

Vistos e relatados estes autos em que são partes as acima indicadas, RESULTADO: a Turma, por unanimidade, decidiu DENEGAR a ordem de habeas corpus , nos termos do relatório e voto que ficam fazendo parte integrante do presente julgado.