Diário Eletrônico

PODER JUDICIÁRIO

TRIBUNAL REGIONAL FEDERAL DA 3ª REGIÃO

HABEAS CORPUS (307) Nº 5022742-79.2018.4.03.0000

RELATOR: Gab. 17 - DES. FED. MAURICIO KATO

IMPETRANTE: VITOR TEDDE DE CARVALHO
PACIENTE: JAIRO LUIZ MAY

Advogado do(a) PACIENTE: VITOR TEDDE DE CARVALHO - SP245678

IMPETRADO: SUBSEÇÃO JUDICIÁRIA DE SÃO PAULO/SP - 5ª VARA FEDERAL CRIMINAL

 


 

  

 

 

HABEAS CORPUS (307) Nº 5022742-79.2018.4.03.0000

RELATOR: Gab. 17 - DES. FED. MAURICIO KATO

IMPETRANTE: VITOR TEDDE DE CARVALHO
PACIENTE: JAIRO LUIZ MAY

Advogado do(a) PACIENTE: VITOR TEDDE DE CARVALHO - SP245678

IMPETRADO: SUBSEÇÃO JUDICIÁRIA DE SÃO PAULO/SP - 5ª VARA FEDERAL CRIMINAL

 

 

  

 

R E L A T Ó R I O

 

Trata-se de habeas corpus, com pedido de liminar, impetrado por Vitor Tedde Carvalho em favor de JAYRO LUIZ MAY, em face de ato ilegal de decreto de prisão preventiva proferido pelo Juízo Federal da 5ª Vara Federal Criminal de São Paulo/SP, nos autos  nº 0004084-76.2018.403.6181.

O impetrante alega, em síntese, que:

a) o paciente foi preso preventivamente em 20/09/2017, pois nos Autos do IP nº 70115/2016 da Polícia Civil do Paraná, foi investigado pela suposta prática de crime contra o consumidor e contra a saúde pública, por corrupção ativa e por lavagem de dinheiro;

b) a denúncia foi apresentada pelo MPE/PR, todavia, o Juízo Estadual do Paraná não a recebeu, e determinou que fossem excluídos os denunciados sem nenhuma qualificação, pois haviam grosseiras falhas de qualificação de alguns acusados;

c) foi impetrado a época, habeas corpus perante o TJ/PR, com nº 0045731-73.2017.8.16.0000, onde em sede de liminar foi deferida a liberdade provisória do paciente, por extensão de ofício à todos os demais réus. No julgamento do mérito foram declarados absolutamente nulos todos os atos decisórios praticados pela justiça estadual em Londrina/PR;

d) encaminhados então perante a 5ª Vara Federal Criminal da Capital paulista, a magistrada reconheceu a competência jurisdicional federal, com amparo na Súmula 122 do STJ, pois ela entendeu que há envolvimento de policiais federais;

e) apesar do Parquet Federal ter ratificado a denúncia errada, a qual haviam réus sem qualificação, e ainda encontram-se sem qualificações que possam embasar uma denúncia de forma que preencha seus requisitos básicos, ainda assim foi ratificada e recebida pelo Juízo da 5ª Vara Federal Criminal de São Paulo;

f) transcorrido 9 (nove) meses, desde a liberdade concedida nos termos do v. Acórdão prolatado em votação unânime pelos Desembargadores paranaenses, sem contudo, haver fatos novos, sem que o MPF – SP, em sua ratificação, viesse acrescentar pedidos de prisões, sem haver nenhuma alteração fática, violando todos os requisitos legais do Art. 312 do CPP, a autoridade impetrada decretou prisão preventiva de todos os denunciados, inclusive do paciente;

g) a decisão carece de fundamentação idônea, vez que não há motivação para garantir a ordem pública, ordem econômica, instrução criminal, ou assegurar a aplicação da lei penal, pois toda a investigação já foi exaurida, todos os acusados demonstraram residência fixa, atividades lícitas, e nenhum deles praticou ato criminoso;

h) o paciente nunca se furtou do distrito de culpa, não demonstrou deslealdade com a justiça, atua no comércio há anos e não há nenhum ínfimo indício de crime e, ainda assim, o Juízo coator fundamentou o decreto prisional em: gravidade da infração; poderio econômico dos réus; a probabilidade de fuga, de destruir provas, de obstruir a investigação, de alienar bens;

i) não estão presentes os requisitos autorizadores da prisão preventiva previstos no art. 312, do Código de Processo Penal;

Requer, assim, a concessão de medida liminar para a imediata liberdade ao paciente, ante a ausência de fundamentação de sua manutenção quando da prolação da sentença penal condenaria, aplicando-se medidas cautelares diversas da prisão, se for o caso, nos termos do art. 319, do CPC. No mérito, pleiteia a concessão da ordem para declarar a nulidade da manutenção do decreto imposto ao paciente.

A liminar foi deferida.

Informações prestadas pela autoridade coatora.

O Procurador Regional da República, Dr. José Ricardo Meirelles, manifestou-se pela concessão da ordem.

É o relatório.

 

 

 


 

 

HABEAS CORPUS (307) Nº 5022742-79.2018.4.03.0000

RELATOR: Gab. 17 - DES. FED. MAURICIO KATO

IMPETRANTE: VITOR TEDDE DE CARVALHO
PACIENTE: JAIRO LUIZ MAY

Advogado do(a) PACIENTE: VITOR TEDDE DE CARVALHO - SP245678

IMPETRADO: SUBSEÇÃO JUDICIÁRIA DE SÃO PAULO/SP - 5ª VARA FEDERAL CRIMINAL

 

 

 

 

V O T O

 

 

Está configurado o alegado constrangimento ilegal.

A ação de habeas corpus tem pressuposto específico de admissibilidade, consistente na demonstração primo ictu oculi da violência atual ou iminente, qualificada pela ilegalidade ou pelo abuso de poder, que repercuta, mediata ou imediatamente, no direito à livre locomoção, conforme previsão do art. 5º, LXVIII, da Constituição Federal, e do art. 647 do Código de Processo Penal.

É sob esse prisma, pois, que se analisa a presente impetração.

O paciente foi denunciado pelo Ministério Público Estadual do Paraná em 06/10/2017, por ter supostamente praticado os delitos previstos no art. 2º, caput, da Lei 12.850/2013, art. 7º, inciso IX c.c art. 12, I, ambos da Lei 8.137/90 c.c art. 18, § 6º, II, do Código de Defesa do Consumidor, c.c art. 29 do Código Penal, em razão da “Operação Sem Filtro”, deflagrada inicialmente pela Justiça Estadual do Paraná, que investigava organização criminosa responsável pela fabricação clandestina de cigarros falsificados, os quais eram produzidos e distribuídos no mercado sem qualquer tipo de autorização ou fiscalização pelas autoridades competentes e ao arrepio das normas sanitárias, consumeristas, e tributárias sobre o tema.

Consta dos autos que todo o processo de produção acontecia dentro do território nacional, vez que as fábricas clandestinas de cigarro estavam localizadas na Bahia e depois foram transferidas para cidades do estado de Minas Gerais. As gráficas que fabricavam os componentes e as embalagens contrafeitas de cigarros encontravam-se na cidade de São Paulo e receberam duas tentativas de fiscalização, sendo que em uma delas os denunciados Clodoaldo José Siqueira, Percival Colatrella e Paulo Birkman prometeram vantagens indevidas a policiais federais, consistente em propina de R$ 1.500.000,00 (um milhão e meio) de reais.

Em razão da incompetência absoluta da Justiça Estadual do Paraná diante da suposta existência de crime que afeta interesses da União, reconhecida nos autos do habeas corpus nº 0045371-73.2017.8.16.0000, impetrado perante o E. TJ/PR, os autos foram encaminhados à Justiça Federal de São Paulo e redistribuídos ao Juízo da 5ª Vara Federal Criminal de SP, que ratificou o recebimento da denúncia, convalidou todas as decisões proferidas pelo juízo paranaense e decretou a prisão de todos os réus. 

Inicialmente não há falar em inépcia da denúncia se a peça acusatória satisfaz todos os requisitos do art. 41 do Código de Processo Penal, sendo que a elucidação dos fatos em tese delituosos descritos na peça inaugural só poderá ser verificada à luz do contraditório e da ampla defesa, durante o regular curso da instrução criminal.

Dessa forma, eventual participação do paciente como integrante ou não de organização criminosa  é matéria que depende de prova e não pode ser analisada por meio de habeas corpus.

 A decisão que decretou a prisão preventiva do paciente está assim fundamentada:

“(...) Após detida apreciação do caso, considero extremamente necessária a adoção de medida cautelar capaz de garantir a cessação das atividades criminosas noticiadas, cuja certeza de descontinuação não consta dos autos, bem como para afastar os concretos riscos de evasão dos acusados.

(...) A revelada estrutura da mencionada organização criminosa, dividida em três núcleos, com elevado número de integrantes voltados à produção de toneladas de cigarros falsificados, auferindo vultosos ganhos financeiros com a prática de tal atividade ilícita, inclusive com grande poder econômico efetivamente capaz de impedir a atuação da Polícia Judiciária, além do concreto risco de evasão dos réus, sendo certo que muitos se encontram foragidos, mostra-se evidentemente hostil à ordem pública e  à aplicação da lei penal.

Em decisão proferida por este Juízo, em 18/06/2018 (fls. 110/1120 dos autos principais), foi ratificada e convalidada a r. decisão de recebimento da denúncia, proferida em 24/10/2017 (fls. 123/140 dos mesmos autos), aproveitando-se todos os atos processuais dela decorrentes.

No presente caso, exorbitam indícios de atuação dos réus na apontada organização criminosa voltada à produção, em grande quantidade, de cigarros falsificados, sendo notável a gravidade da infração, a repercussão social do delito e o risco concreto de reiteração criminosa.

Tais circunstâncias, especialmente o poderio econômico somado à revelada tendência de subornar agentes públicos, autorizam vislumbrar o perigo que representa a liberdade dos investigados para o meio social, justificando-se a decretação e manutenção da custódia cautelar com fundamento na garantia da ordem pública, garantia da aplicação da lei penal e conveniência da instrução criminal.

Os pontos acima destacados e os demais fatos detalhados na investigação revelam que a liberdade dos réus ocasiona iminente risco à atividade probatória, considerando a evidente probabilidade de, em liberdade, destruírem provas, obstruírem a investigação, alienarem bens produtos do ilícito e praticarem outros delitos, além da possibilidade de fuga, justificando-se, portanto, a prisão cautelar para a garantia da ordem pública, da aplicação da lei penal e para a conveniência da instrução criminal.

Conforme exposto nesta decisão, verifico que se encontram presentes os requisitos para a decretação da prisão preventiva, estabelecido no art. 312 do Código de Processo Penal, consubstanciados na prova da existência dos crimes (materialidade delitiva) e indícios suficientes de autoria dos denunciados.

Dentre os fatos imputados aos réus, vislumbram-se os crimes previstos no art. 2º, caput, e § 3º, da Lei  nº 12.850/2013 e artigo 333, parágrafo único, do Código penal, afigurando-se, em ambos, o dolo como elemento da conduta, bem como a cominação de pena de reclusão.

O periculum libertatis está presente, posto que os réus, conforme acima ponderado, oferecem risco concreto á ordem pública, à aplicação da lei penal e à instrução criminal.

Ante o exposto, DECRETO A PRISÃO PREVENTIVA dos réus: (...) JAYRO LUIZ MAY (...)”

Inicialmente, cabe ressaltar que a prisão cautelar deve ser considerada exceção, já que, por meio desta medida, priva-se o réu de sua liberdade antes do pronunciamento condenatório definitivo, consubstanciado na sentença transitada em julgado.

É por isso que tal medida constritiva só se justifica caso demonstrada sua real indispensabilidade para assegurar a ordem pública, a instrução criminal ou a aplicação da lei penal, ex vi do artigo 312 do Código de Processo penal.

A prisão preventiva, portanto, enquanto medida de natureza cautelar, não pode ser utilizada como instrumento de punição antecipada do indiciado ou do réu, nem permite complementação de sua fundamentação pelas instâncias superiores.

Convém salientar, entretanto, que a presunção de inocência não é incompatível com a prisão processual e nem impõe ao paciente uma pena antecipada, porque não deriva do reconhecimento da culpabilidade, mas aos fins do processo, como medida necessária à garantia da ordem pública, à conveniência da instrução criminal e/ou para assegurar a aplicação da lei penal.

Assim, ao atestar o juízo a excepcionalidade da segregação cautelar, a medida deve pautar-se em decisão fundamentada, em obediência às prescrições do artigo 93, inciso IX da Constituição Federal e artigo 315 do Código de Processo Penal.

Em conformidade com o artigo 312 do Código de Processo Penal, a legitimidade da prisão cautelar exige a demonstração da prova da materialidade e indícios suficientes de autoria ou de participação, e sua concreta indispensabilidade para garantia da ordem pública, da ordem econômica, por conveniência da instrução criminal ou para assegurar a aplicação da lei penal.

No caso concreto, o requisito autorizador da necessidade de garantia da ordem pública, descrito no art. 312 do Código Processual Penal, não foi concretamente demonstrado pela autoridade impetrada.

Verifica-se do decreto que fundamenta a prisão que o juízo a quo não indicou, concretamente, de que forma a liberdade do paciente colocaria em risco a ordem pública ou a ordem econômica, a conveniência da instrução criminal ou a aplicação da lei penal, tendo o juízo monocrático alicerçado a medida constritiva na mera necessidade da segregação cautelar, mencionando tão somente, e de forma abstrata, a gravidade do crime e a ameaça à ordem pública em razão de risco de reiteração criminosa.

Da mesma forma não ficou demonstrado concretamente na referida decisão o risco de destruição de provas ou obstrução da investigação, bem como não há menção de qualquer documento ou relato que indique a intenção de fuga do paciente. A determinação de prisão está baseada apenas em meras suposições e conjecturas, o que, não constitui fundamentação idônea.

Ademais, nos termos do art. 319 do CPP, o juiz dispõe de outras medidas cautelares de natureza pessoal diversas da prisão a serem escolhidas diante das circunstâncias e peculiaridades do caso concreto, o que permite, mesmo que cautelarmente,  uma resposta justa e proporcional ao delito praticado.

Em face do exposto, CONCEDO a ordem de habeas corpus para revogar o decreto de prisão preventiva expedido em desfavor do paciente, substituindo a constrição por medidas cautelares diversas da prisão, nos termos do art. 319, do Código de Processo Penal:

a) comparecimento pessoal e obrigatório em juízo, mensalmente, para informar e justificar suas atividades;

b) proibição de mudar de residência sem informar ao Juízo o local onde poderá ser encontrado;

c) proibição de ausentar-se da comarca onde reside, por mais de trinta dias, sem autorização do Juízo;

d) proibição de ausentar-se do País, devendo o paciente entregar o passaporte na Secretaria do Juízo impetrado, nos termos do art. 320, do Código de Processo Penal.

É o voto.

 

 

 

 

 

 

 

 

 



E M E N T A

 

PENAL. PROCESSO PENAL. HABEAS CORPUS. FALTA DE INDICAÇÃO DE FATO CONCRETO PARA FUNDAMENTAR A PRISÃO PREVENTIVA. NECESSIDADE DA MEDIDA NÃO JUSTIFICADA. FUNDAMENTAÇÃO INIDÔNEA . ORDEM CONCEDIDA.

1. A prisão cautelar deve ser considerada exceção, já que, por meio desta medida priva-se o réu de sua liberdade antes do pronunciamento condenatório definitivo, consubstanciado na sentença transitada em julgado. É por isso que tal medida constritiva só se justifica caso demonstrada sua real indispensabilidade para assegurar a ordem pública, a instrução criminal ou a aplicação da lei penal, ex vi do artigo 312 do Código de Processo penal.

2. Ao atestar a excepcionalidade da segregação cautelar, o juízo deve proferir decisão fundamentada, em obediência às prescrições do artigo 93, inciso IX da Constituição Federal e artigo 315 do Código de Processo Penal.

3. Ante a ausência de fundamentação lastreada em elementos concretos a justificar a prisão cautelar, mantém-se a decisão que deferiu o pedido liminar para revogar o decreto de prisão preventiva, substituindo a constrição por medidas cautelares diversas da prisão.

4 - Ordem concedida.


  ACÓRDÃO

Vistos e relatados estes autos em que são partes as acima indicadas, a Turma, por unanimidade, decidiu, conceder a ordem de habeas corpus para revogar o decreto de prisão preventiva expedido em desfavor do paciente, substituindo a constrição por medidas cautelares diversas da prisão, nos termos do art. 319, do Código de Processo Penal: a) comparecimento pessoal e obrigatório em juízo, mensalmente, para informar e justificar suas atividades; b) proibição de mudar de residência sem informar ao Juízo o local onde poderá ser encontrado; c) proibição de ausentar-se da comarca onde reside, por mais de trinta dias, sem autorização do Juízo; d) proibição de ausentar-se do País, devendo o paciente entregar o passaporte na Secretaria do Juízo impetrado, nos termos do art. 320, do Código de Processo Penal , nos termos do relatório e voto que ficam fazendo parte integrante do presente julgado.