![]() DIÁRIO ELETRÔNICO DA JUSTIÇA FEDERAL DA 3ª REGIÃO
Edição nº 160/2013 - São Paulo, sexta-feira, 30 de agosto de 2013
TRIBUNAL REGIONAL FEDERAL DA 3ª REGIÃOPUBLICAÇÕES JUDICIAIS I – TRF
Subsecretaria da 5ª Turma
Acórdão 9767/2013 APELAÇÃO CÍVEL Nº 0024428-89.2002.4.03.6100/SP
EMENTA PROCESSUAL CIVIL. DIREITO CONSTITUCIONAL E CIVIL. APELAÇÃO. AÇÃO CIVIL PÚBLICA. LICENCIAMENTO DE PROGRAMA DE COMPUTADOR. ABUSIVIDADE DE CLÁUSULA CONTRATUAL. INTERESSES DO CONSUMIDOR. LEGITIMIDADE DO MPF. GARANTIA DE ASSISTÊNCIA TÉCNICA DA MICROSOFT. DEVER ANEXO AO DA RESPONSABILIDADE CIVIL. EXONERAÇÃO POUCO TRANSPARENTE. VIOLAÇÃO AO DEVER DE INFORMAÇÃO. DANOS MATERIAIS CONFIGURADOS. CONDENAÇÃO GENÉRICA. LIQUIDAÇÃO E EXECUÇÕES INDIVIDUAIS. RECURSO DO MPF PARCIALMENTE PROVIDO. I. A ação civil pública objetiva a declaração de nulidade de cláusula de licenciamento de programa de computador e o reconhecimento de dever de informação sobre a exclusão de responsabilidade técnica. Os interesses pertencem aos adquirentes de direitos de uso de software - detentores de relação jurídica com a Microsoft -, que deles compartilham uniformemente. II. Configura-se direito coletivo em sentido estrito, para cuja defesa está habilitado o Ministério Público (artigos 81, parágrafo único, II e 82, I, da Lei n° 8.078/1990). As condições da ação presentes. III. A cláusula que exonera a Microsoft do dever de assistência técnica e o atribui exclusivamente ao fabricante ou integrador viola os direitos do consumidor e do usuário de programa de computador. IV. A fim de que o consumidor possa exercer os direitos previstos no CDC, o fornecedor deve fazer a análise técnica e apontar a impropriedade encontrada, responsabilizando-se por sua erradicação ou dela se eximindo, mediante a detecção de mau uso ou de comportamento de outro integrante da cadeia produtiva. V. Os usuários de software previamente instalado no computador, ao não contarem com a assistência técnica da Microsoft, correm o risco de não exercer os direitos que a Lei n° 8.078/1990 historicamente assegurou. Basta que o fabricante ou integrador desapareça, negue o problema de fornecimento ou o atribua ao criador do programa digital. VI. A Lei n° 9.609/1998, quando dispõe acerca da comercialização dos programas de computador, prevê que tanto o titular quanto o comercializador respondem pela garantia técnica do produto no prazo de validade da versão comercializada. VII. Mesmo que se considerasse válida a disposição contratual, a forma de transmissão da restrição ao consumidor não seguiu o dever de transparência, de informação (artigo 6°, III, do CDC). VIII. De acordo com a própria Microsoft, o adquirente apenas se inteiraria da exclusão de assistência técnica no momento da abertura da embalagem e do funcionamento da máquina digital. Em outras palavras: o consumidor desembolsaria o capital necessário à aquisição, mas apenas conheceria a cláusula na própria ocasião de uso do produto. IX. Cada consumidor que não pôde usar a assistência técnica da Microsoft teve prejuízos específicos, que retratam a perda do investimento e as despesas adicionais com o apoio operacional de terceiros. Outras singularidades são admissíveis, como, por exemplo, a impossibilidade de exercício de profissão ou de um trabalho acadêmico em razão de pane do computador. X. Trata-se de interesses individuais homogêneos, cuja reparação segue a sistemática do Capítulo II, Título III, da Lei n° 8.078/1990, ou seja, profere-se uma condenação genérica, com possibilidade de liquidação e execução individuais (artigos 95 e 97). XI. O inadimplemento contratual, por envolver, a princípio, interesses materiais, não tem potencial para comprometer em níveis intoleráveis a incolumidade moral de eventuais prejudicados. Danos morais inexistentes. XII. Apelação do Ministério Público Federal a que se dá parcial provimento.
ACÓRDÃO Vistos e relatados estes autos em que são partes as acima indicadas, decide a Egrégia Quinta Turma do Tribunal Regional Federal da 3ª Região, por unanimidade, rejeitar a matéria preliminar e, no mérito, por maioria, dar parcial provimento à apelação do Ministério Público Federal, para declarar a abusividade da cláusula do contrato de licenciamento e condenar a Microsoft a prestar assistência técnica a todos os usuários de software previamente instalado no computador, nos termos do voto do Relator, acompanhado pelo Desembargador Federal Paulo Fontes. Vencido o Desembargador Federal André Nekatschalow que dava parcial provimento ao recurso do Ministério Público Federal, em menor extensão, para julgar parcialmente procedente o pedido inicial, declarando a nulidade da Cláusula 7ª do EULA OEM, bem como da inscrição contida na caixa do computador adquirido com software Microsoft pré-instalado ("Ao abrir este pacote você concorda que leu e entendeu o contrato de distribuição e pré-instalação Microsoft incluído neste pacote e que concorda com seus termos e condições"), e, em conseqüência, condenar a ré a prestar suporte técnico aos usuários de softwares da Microsoft pré-instalado em equipamentos fabricados ou integrados por sociedades, posto que não sejam dela representantes, e que tenham adquirido tais equipamentos sob a injunção das cláusulas acima referidas. Condenava também a indenizar por danos materiais eventualmente sofridos por tais usuários, a serem apurados em execução, na forma do Capítulo II, Título III, da Lei nº 8.078/90, promovida coletivamente ou pelos próprios usuários acima discriminados ou seus sucessores. Condenando, ainda, a ré, em custas e honorários advocatícios, arbitrados em R$ 10.000,00 (dez mil reais), tendo em vista a natureza da demanda e do preceito condenatório.
São Paulo, 19 de agosto de 2013.
Antonio Cedenho
Desembargador Federal |