DIÁRIO ELETRÔNICO DA JUSTIÇA FEDERAL DA 3ª REGIÃO
Edição nº 123/2015 - São Paulo, terça-feira, 07 de julho de 2015
TRIBUNAL REGIONAL FEDERAL DA 3ª REGIÃOPUBLICAÇÕES JUDICIAIS I – TRF
Subsecretaria da 4ª Turma
Expediente Processual 37445/2015 AGRAVO DE INSTRUMENTO Nº 0012701-46.2015.4.03.0000/SP
DECISÃO Trata-se de agravo de instrumento interposto pelo SINDICATO DA INDÚSTRIA DA ENERGIA NO ESTADO DE SÃO PAULO - SINDIENERGIA, contra as decisões de fls. 34/38 e 783 que, em sede de mandado de segurança, consideraram válido o ato da autoridade coatora. Alega o agravante, em síntese, que em caso idêntico o STF se manifestou no sentido de que os entes da Federação não podem interferir em relações jurídico-contratuais estabelecidas pela União Federal no que tange à concessão para exploração de serviços e instalações de energia elétrica. Aduz, ainda, que a competência para legislar sobre o tema de enterramento das redes é da União Federal e que o decreto impugnado não observou premissas básicas dos contratos administrativos, entre elas a existência do equilíbrio econômico-financeiro do contrato de concessão. Pede, de plano, a suspensão dos efeitos da Portaria n. 261 que deu cumprimento ao Decreto n. 47.816/06 e à Lei Municipal n. 14.023/05. É o relatório. Decido. O artigo 21, inciso XII, alínea b da Constituição Federal estabelece dentre as competências exclusivas da União Federal a exploração, diretamente ou mediante autorização, concessão ou permissão, dos serviços e instalações de energia elétrica. Ainda, o artigo 22 da Carta Magna, ao dispor sobre as competências privativas da União Federal prevê: Art. 22. Compete privativamente à União legislar sobre: I - direito civil, comercial, penal, processual, eleitoral, agrário, marítimo, aeronáutico, espacial e do trabalho; II - desapropriação; III - requisições civis e militares, em caso de iminente perigo e em tempo de guerra; IV - águas, energia, informática, telecomunicações e radiodifusão; As competências privativas podem ser objeto de delegação pela União Federal, a qual deverá ocorrer mediante lei complementar. Já as competências exclusivas não comportam delegação. A exploração de serviços e instalações elétricas encontram-se no âmbito das atividades que somente a União Federal pode regular. Nesse sentido, a Eletropaulo Metropolitana Eletricidade de São Paulo S.A. celebrou por meio da Agência Nacional de Energia Elétrica - ANEEL, contrato de concessão para distribuição de energia elétrica (fls. 183/289). O contrato estabelece direitos e deveres a concessionária, sendo válido por trinta anos, nos termos da cláusula terceira. Em que pesem as necessidades da cidade de São Paulo e as boas intenções dos governantes em reduzir riscos e prejuízos relativos ao uso de postes e cabos externos de transmissão de energia, é forçoso reconhecer que o Município não possui a autonomia necessária para determinar "novos deveres" à concessionária, máxime quando não é parte do contrato de concessão. Corroborando a competência da União Federal para definir a questão, o STF, na Ação Cautelar n. 3420, que trata de situação similar ocorrida no Rio de Janeiro, ponderou em sede de liminar que "Apenas a União pode estabelecer as formas de atuação das suas concessionárias e, portanto, definir os termos do contrato com ela firmado". Também, acompanhando tal entendimento, na ADIN 4.925 decidiu-se que a lei estadual n. 12.635/07, que obrigava as concessionárias de energia a removerem postes de sustentação à rede elétrica para diminuir transtornos e impedimentos causados a compromissários compradores de terrenos, era inconstitucional porque violava competências da União Federal. Ainda, a matéria foi abordada em outras ocasiões, conforme demonstram os seguintes julgados: CONSTITUCIONAL. ADMINISTRATIVO. TRIBUTÁRIO. ESTADO DO CEARÁ. LEI N.º 13.327/2003. COBRANÇA DE REMUNERAÇÃO ANUAL PELA OCUPAÇÃO DE FAIXAS DE DOMÍNIO PARA INSTALAÇÃO DE LINHAS DE TRANSMISSÃO OU DISTRIBUIÇÃO DE ENERGIA POR CONCESSIONÁRIA DE ENERGIA ELÉTRICA. INCONSTITUCIONALIDADE. COMPETÊNCIA PRIVATIVA DA UNIÃO. RECURSOS PROVIDOS. 1. Hipótese em que a COELCE - COMPANHIA ENERGÉTICA DO CEARÁ e a ANEEL - AGÊNCIA NACIONAL DE ENERGIA ELÉTRICA apelam pleiteando a inconstitucionalidade dos dispositivos legais insertos no art. 2º, II, "a" e art. 3º, parágrafos 2º e 3º da Lei Estadual n.º 13.327/2003, que estipulam o pagamento de remuneração anual para o uso das faixas de domínio das rodovias estaduais e federais delegadas ao Estado e de terrenos adjacentes a rodovias, para fins de realização de serviços de manutenção nas redes de distribuição de energia elétrica. 2. O Pleno deste Eg. TRF da 5ª Região, em 31 de agosto de 2011, nos autos do Incidente de Inconstitucionalidade na AC nº. 457605/CE, sob a Relatoria do Des. Francisco Barros Dias, já reconheceu a inconstitucionalidade do dispositivo legal inserto no art. 2º, II, "a" da Lei Estadual n.º 13.327/2003, aplicando interpretação conforme ao art. 3º, parágrafos 2º e 3º da Lei Estadual n.º 13.327/2003 para afastar a possibilidade de aplicação da norma apenas com relação a prestadora de serviços públicos federais. 3. Por força do art. 481, parágrafo único, do Código de Processo Civil, os órgãos fracionários dos tribunais não estão obrigados a submeter a argüição de inconstitucionalidade de lei ou de ato normativo do poder público ao colegiado especial - como determina o art. 97 da CF/88 (reserva de plenário) - quando já houver pronunciamento anterior deste ou do Plenário do Supremo Tribunal Federal. 4. O Eg. STF, em 27.05.2010, impediu município de cobrar por ocupação de solo e espaço aéreo na transmissão de energia elétrica. A Colenda Corte negou provimento ao Recurso Extraordinário (RE) 581947, no qual a cidade de Ji-Paraná (RO) recorria contra acórdão do Tribunal de Justiça de Rondônia que declarou nula uma cobrança feita pelo município à concessionária Centrais Elétricas de Rondônia S.A.(Ceron). O relator do RE, ministro Eros Grau, frisou em seu voto que a Constituição do Brasil define a competência exclusiva da União para explorar os serviços e instalações de energia elétrica (artigo 21, inciso XII, b) e a privativa para legislar sobre o assunto (artigo 22, inciso IV). Para ele, o município de Ji-Paraná invadiu o espaço de competência da União ao editar a Lei municipal 1.199/02, que institui a cobrança. 5. O Estado do Ceará invadiu a competência privativa da União, ao legislar acerca da exigência de pagamento de remuneração anual para o uso das faixas de domínio das rodovias estaduais e federais delegadas ao Estado e de terrenos adjacentes a rodovias, para fins de realização de serviços de manutenção nas redes de distribuição de energia elétrica, por parte da COELCE - COMPANHIA ENERGÉTICA DO CEARÁ. 6. A instituição de remuneração anual por parte do Estado para o uso e ocupação das referidas faixas constitui invasão de competência privativa da União. 7. A "remuneração anual" criada pelo Estado do Ceará, ao interferir direta e imediatamente no serviço da União (prestação de energia elétrica) atinge frontalmente o disposto no art. 21, XII, "b", da Constituição Federal, isso porque retira o tratamento uniforme que deve ser dado às concessionárias de energia elétrica, que são prestadoras de atribuição conferida privativamente à União. Ademais, adentra na competência da União para legislar sobre energia elétrica (art. 22, IV). 8. No caso, o texto legal impõe claramente a cobrança da remuneração anual para a "ocupação de faixas, transversais ou longitudinais, ou de áreas, para a instalação de linhas de transmissão ou distribuição de energia" (art. 2º, II, "a", da Lei Estadual n. 13.327/2003), daí a impossibilidade de ser mantido intacto. 9. "Desta feita, não deve ser cobrada a remuneração em questão em razão de incidir diretamente sobre bens essenciais à prestação do serviço público pela concessionária de energia elétrica, além de permitir auferição de renda às custas de um bem de uso comum do povo que não pertence ao Estado do Ceará, tendo este apenas os poderes de controle e administração sobre os bens". (Procuradoria Regional da República). 10. Reconhecimento da incompetência do Estado do Ceará para explorar os serviços e instalações de energia elétrica e para legislar sobre energia elétrica, em face dos ditames dos arts. 21, XII, b e 22, IV, da CF/88. 11. Provimento das apelações da COELCE e da ANEEL para: a) declarar a inconstitucionalidade do dispositivo legal inserto no art. 2º, II, "a" da Lei Estadual n.º 13.327/2003, aplicando interpretação conforme ao art. 3º, parágrafos 2º e 3º da Lei Estadual n.º 13.327/2003 para afastar a possibilidade de aplicação da norma apenas com relação a prestadora de serviços públicos federais; b) afastar o pagamento de remuneração anual por parte da COELCE para o uso das faixas de domínio das rodovias estaduais e federais delegadas ao Estado e de terrenos adjacentes a rodovias, para fins de realização de serviços de manutenção nas redes de distribuição de energia elétrica, que estava prevista na referida lei. Agravo retido provido para impedir ou sustar a cobrança dos valores em questão em sede de antecipação dos efeitos de tutela. (AC 200681000037318, Desembargador Federal Marco Bruno Miranda Clementino, TRF5 - Segunda Turma, DJE - Data::25/03/2013 - Página::388.) EMENTA: RECURSO EXTRAORDINÁRIO. RETRIBUIÇÃO PECUNIÁRIA. COBRANÇA. TAXA DE USO E OCUPAÇÃO DE SOLO E ESPAÇO AÉREO. CONCESSIONÁRIAS DE SERVIÇO PÚBLICO. DEVER-PODER E PODER-DEVER. INSTALAÇÃO DE EQUIPAMENTOS NECESSÁRIOS À PRESTAÇÃO DE SERVIÇO PÚBLICO EM BEM PÚBLICO. LEI MUNICIPAL 1.199/2002. INCONSTITUCIONALIDADE. VIOLAÇÃO. ARTIGOS 21 E 22 DA CONSTITUIÇÃO DO BRASIL. 1. Às empresas prestadoras de serviço público incumbe o dever-poder de prestar o serviço público. Para tanto a elas é atribuído, pelo poder concedente, o também dever-poder de usar o domínio público necessário à execução do serviço, bem como de promover desapropriações e constituir servidões de áreas por ele, poder concedente, declaradas de utilidade pública. 2. As faixas de domínio público de vias públicas constituem bem público, inserido na categoria dos bens de uso comum do povo. 3. Os bens de uso comum do povo são entendidos como propriedade pública. Tamanha é a intensidade da participação do bem de uso comum do povo na atividade administrativa que ele constitui, em si, o próprio serviço público [objeto de atividade administrativa] prestado pela Administração. 4. Ainda que os bens do domínio público e do patrimônio administrativo não tolerem o gravame das servidões, sujeitam-se, na situação a que respeitam os autos, aos efeitos da restrição decorrente da instalação, no solo, de equipamentos necessários à prestação de serviço público. A imposição dessa restrição não conduzindo à extinção de direitos, dela não decorre dever de indenizar. 5. A Constituição do Brasil define a competência exclusiva da União para explorar os serviços e instalações de energia elétrica [artigo 21, XII, b] e privativa para legislar sobre a matéria [artigo 22, IV]. Recurso extraordinário a que se nega provimento, com a declaração, incidental, da inconstitucionalidade da Lei n. 1.199/2002, do Município de Ji-Paraná. (RE 581947, EROS GRAU.) AÇÃO DIRETA DE INCONSTITUCIONALIDADE. CONSTITUIÇÃO DO ESTADO DE SANTA CATARINA. ART. 185. ENERGIA NUCLEAR. ARGÜIÇÃO DE INCONSTITUCIONALIDADE DE PRECEITO DE CONSTITUIÇÃO ESTADUAL, QUE SUBORDINA A CONSTRUÇÃO, NO RESPECTIVO TERRITÓRIO, DE INSTALAÇÕES INDUSTRIAIS PARA PRODUÇÃO DE ENERGIA NUCLEAR À AUTORIZAÇÃO DA ASSEMBLÉIA LEGISLATIVA, RATIFICADA POR PLEBISCITO. ALEGAÇÃO DE OFENSA À COMPETÊNCIA PRIVATIVA DA UNIÃO (CF, ART. 21, XXIII). 1 - Mantida a competência exclusiva da União para legislar sobre atividades nucleares de qualquer natureza (CF, art. 22, XXVI), aplicáveis ao caso os precedentes da Corte produzidos sob a égide da Constituição Federal de 1967. 2 - Ao estabelecer a prévia aprovação da Assembléia Legislativa Estadual, ratificada por plebiscito, como requisito para a implantação de instalações industriais para produção de energia nuclear no Estado, invade a Constituição catarinense a competência legislativa privativa da União 3 - Ação direta de inconstitucionalidade cujo pedido se julga procedente. (ADI 329, ELLEN GRACIE.) Ademais, outras questões necessitam de tratamento antes que a Lei n. 14.023/05 seja efetivada, como, por exemplo, o numerário disponível para a obra, os indicadores acerca da captação de recursos para que todo o projeto seja concluído, não se tornando uma obra inacabada, os repasses que serão feitos para o consumidor na medida da capacidade contributiva de cada um, os estudos ambientais desenvolvidos e as ações protetivas que deverão acompanhar o desenvolvimento do projeto e o projeto de lei n. 37 que trata do mesmo assunto abordado pela Lei Municipal. No que tange à manifestação de fls. 785, observo que a decisão agravada (fls. 700) considerou que há interesse da ANEEL no mandado de segurança originário, razão pela qual deferiu a inclusão da autarquia na lide, na condição de litisconsórcio passivo necessário, consignando que: "(...) a determinação efetuada pela autoridade impetrada no sentido de enterramento dos fios de energia afetará as concessões, mormente nos aspectos da continuidade, universalidade, eficiência, adequação e, especialmente, na exigência de modalidade tarifária, o que faz brotar o interesse jurídico desta Autarquia no deslinde da ação, em virtude de suas competências institucionais acima especificadas." Desse modo, defiro o ingresso da Agência Nacional de Energia Elétrica no polo ativo deste recurso na condição de litisconsorte ativo, em harmonia com a determinação exarada na ação mandamental. Diante de todo o exposto, defiro a concessão do efeito suspensivo pleiteado e determino a suspensão dos efeitos da Portaria n. 261, de 23/05/2015 editada pela Prefeitura Municipal de São Paulo até o trânsito em julgado do provimento jurisdicional que apreciar o MS n. 0007718-37.2015.403.6100, bem como determino a suspensão de qualquer processo administrativo concernente às obras de enterramento de fios na cidade de São Paulo até a referida decisão. Comunique-se ao juízo "a quo". Oportunamente, remetam-se os autos à Subsecretaria de Registros e Informações Processuais para retificação da autuação. Intime-se a agravada para que se manifeste nos termos e para os efeitos do art. 527, V do Código de Processo Civil. Publique-se. Intime-se.
São Paulo, 17 de junho de 2015.
MÔNICA NOBRE
Desembargadora Federal |