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Diário Eletrônico

DIÁRIO ELETRÔNICO DA JUSTIÇA FEDERAL DA 3ª REGIÃO
Edição nº 76/2018 - São Paulo, quarta-feira, 25 de abril de 2018

TRIBUNAL REGIONAL FEDERAL DA 3ª REGIÃO


PUBLICAÇÕES JUDICIAIS I – TRF


Subsecretaria da 3ª Turma


Acórdão 23998/2018


APELAÇÃO CÍVEL Nº 0007886-26.2008.4.03.6119/SP
2008.61.19.007886-8/SP
RELATOR : Desembargador Federal NELTON DOS SANTOS
APELANTE : Defensoria Publica da Uniao
ADVOGADO : SP302889 FERNANDO DE SOUZA CARVALHO e outro(a)
: SP234670 JUAN MIGUEL CASTILLO JUNIOR
APELANTE : BANDEIRANTE ENERGIA S/A
ADVOGADO : SP186458A GUSTAVO ANTONIO FERES PAIXÃO e outro(a)
: SP234670 JUAN MIGUEL CASTILLO JUNIOR
APELANTE : Agencia Nacional de Energia Eletrica ANEEL
ADVOGADO : SP257343 DIEGO PAES MOREIRA
: SP234670 JUAN MIGUEL CASTILLO JUNIOR
APELADO(A) : OS MESMOS
No. ORIG. : 00078862620084036119 6 Vr GUARULHOS/SP
EMENTA
CONSTITUCIONAL E ADMINISTRATIVO. DPU. ANEEL. CONCESSIONÁRIA. SERVIÇO DE FORNECIMENTO DE ENERGIA ELÉTRICA. RESOLUÇÃO 456/00 ANEEL. FRAUDE. SUSPENSÃO NO FORNECIMENTO. COBRANÇA. MULTA ADMINISTRATIVA. LEGITIMIDADE ATIVA. DIREITOS INDIVIDUAIS HOMOGÊNEOS. ADI 3943. DPU. LEGITIMIDADE PARA DEFENDER HIPOSSUFICIENTES JURÍDICOS. PRECLUSÃO PRO JUDICATO. INOCORRÊNCIA. MATÉRIA DE ORDEM PÚBLICA. PROCEDIMENTO PARA APURAÇÃO DE FRAUDES. VIOLAÇÃO AO ART. 51, IV, CDC. CRITÉRIOS DO ARTIGO 72, IV, DA RESOLUÇÃO 456/00. MULTA ADMINISTRATIVA. VALOR MÁXIMO DE 2% SOBRE O VALOR DA DÍVIDA. ART. 52 CDC. DEVOLUÇÃO EM DOBRO DOS VALORES COBRADOS. IMPOSSIBILIDADE. PRAZO DE 30 DIAS PARA CUMPRIMENTO DA TUTELA ANTECIPADA. SUCUMKBÊNCIA. NÃO IMPOSIÇÃO. APELAÇÕES DA BANDEIRANTES S/A E DA ANEEL NÃO PROVIDAS E APELAÇÃO DA DPU PARCIALMENTE PROVIDA.
1. Dentre as atribuições constitucionalmente atribuídas à Defensoria Pública está a de tutelar interesses transindividuais, valendo-se, para tanto, inclusive da propositura de ações civis públicas. ADI 3943.
2. Necessitado é não só o hipossuficiente econômico, como também o hipossuficiente jurídico. Precedentes do STJ e deste Tribunal.
3. A legitimidade é questão de ordem pública, que pode ser analisada a qualquer tempo e em qualquer grau de jurisdição, e não está sujeita à preclusão pro judicato. Precedentes.
4. Não há nenhuma ilegalidade formal de competência na Resolução 456/00 ANEEL ao regulamentar a relação entre os agentes do setor elétrico e os consumidores, pois dentre as atribuições da ANEEL está a de editar resoluções com caráter de generalidade e abstração a fim de regulamentar o setor elétrico.
5. A Resolução 456/00, ao estabelecer o procedimento para apuração de fraudes nos medidores de energia elétrica do modo como o fez, acabou por violar o artigo 51, IV, do Código de Defesa do Consumidor e estabelecer algumas obrigações iníquas e abusivas.
6. O critério contido no artigo 72, IV, alínea "b" (identificação do maior valor de consumo de energia elétrica e/ou demanda de potência ativas e reativas excedentes, ocorridos em até 12 ciclos completos de medição normal imediatamente anteriores ao início da irregularidade) traz uma hipótese excessivamente onerosa ao consumidor, uma vez que o maior valor de consumo de energia elétrica não reproduz, com precisão, o seu consumo médio.
7. O critério previsto no artigo 72, IV, alínea "c" estabelece o cálculo por meio da estimativa de consumo das cargas instaladas no momento da constatação da irregularidade, o que também denota uma desvantagem exagerada ao consumidor, pois não permite determinar, com clareza, qual o consumo efetivo de energia elétrica.
8. É cediço que, havendo um conflito aparente de normas de diferentes graus de hierarquia, a de nível superior deve prevalecer sobre a de nível inferior.
9. Por via de consequência, deve prevalecer o disposto no artigo 52, §1º, do Código de Defesa do Consumidor em detrimento do previsto no artigo 73 da Resolução 456/00 ANEEL, sendo a multa limitada a 2% (dois por cento) do valor do débito.
10. Não se admite suspensão como meio de coerção para obter o pagamento pelos serviços de fornecimento de energia elétrica; tendo a concessionária meios previstos em lei para conseguir satisfazer o seu crédito, constitui exercício de natureza privada suspender o fornecimento de energia elétrica - cuja natureza jurídica é de serviço público essencial. Precedentes do STJ.
11. Em que pese o disposto no artigo 42, parágrafo único, do CDC, sua aplicação fica condicionada à comprovação de má-fé ou de engano injustificável por parte do fornecedor, o que não se deu no caso em comento.
12. Deve ser mantido o prazo de 30 (trinta) dias para cumprimento da tutela antecipada, pois para o restabelecimento do fornecimento de energia elétrica não se exige a verificação prévia das condições das unidades usuárias. Princípio da razoabilidade.
13. Não é cabível condenação em honorários advocatícios, pois em ação civil pública, só é cabível a condenação da parte vencida nos casos de comprovada litigância de má-fé.
14. Por critério de simetria em relação ao disposto no art. 18 da Lei 7.347/85, a Defensoria Pública da União não pode ser beneficiada quando se sagrar vencedora, uma vez que essa condenação não lhe é exigível em caso de derrota.
15. Apelações da Bandeirantes Energia S/A e da ANEEL não providas. Apelação da Defensoria Pública da União parcialmente provida.





ACÓRDÃO
Vistos e relatados estes autos em que são partes as acima indicadas, decide a Egrégia Terceira Turma do Tribunal Regional Federal da 3ª Região, por unanimidade, negar provimento às apelações da Bandeirantes Energia S/A e da ANEEL e dar parcial provimento à apelação da Defensoria Pública da União para afastar a aplicação das alíneas "b" e "c" do artigo 72, IV, da Resolução 456/00 ANEEL, bem como para vedar a suspensão do fornecimento de energia elétrica em razão de dívidas fundadas na Resolução 456/00 ANEEL e para limitar a imposição de multa administrativa a no máximo 2% (dois por cento) do valor do débito, de acordo com o disposto no artigo 52 do Código de Defesa do Consumidor, nos termos do relatório e voto que ficam fazendo parte integrante do presente julgado.



São Paulo, 18 de abril de 2018.
NELTON DOS SANTOS
Desembargador Federal Relator


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