![]() DIÁRIO ELETRÔNICO DA JUSTIÇA FEDERAL DA 3ª REGIÃO
Edição nº 44/2019 - São Paulo, quinta-feira, 07 de março de 2019
TRIBUNAL REGIONAL FEDERAL DA 3ª REGIÃOPUBLICAÇÕES JUDICIAIS I – TRF
Subsecretaria da 2ª Turma
Acórdão 27193/2019 APELAÇÃO CÍVEL Nº 0001424-28.2013.4.03.6006/MS
EMENTA PROCESSUAL CIVIL. APELAÇÃO CÍVEL. REINTEGRAÇÃO DE POSSE. ESBULHO. INTERDITO PROIBITÓRIO IMPUGNANDO DEMARCAÇÃO DE TERRAS INDÍGENAS. INDENIZAÇÃO POR PERDAS E DANOS. IMPOSSIBILIDADE JURÍDICA DO PEDIDO. PROCESSO DEMARCATÓRIO TEM NATUREZA DECLARATÓRIA. DIREITO INDÍGENA PRÉ-EXISTENTE. BEM PÚBLICO DE PROPRIEDADE DA UNIÃO. INALIENABILIDADE E INDISPONIBILIDADE. APELO DESPROVIDO. I - No caso dos autos, ocorre, de fato, a impossibilidade jurídica do pedido, tendo em vista que o artigo 19, §2 º, da Lei nº 6.001/73 (Estatuto do Índio) veda a utilização do interdito possessório como forma de impugnar demarcação administrativa das terras originariamente ocupadas pelos indígenas, facultado aos interessados recorrerem à ação petitória ou à demarcatória. II - Por outro lado, a vedação é somente quanto às ações possessórias, não havendo óbice legal para a utilização de interditos possessórios visando coibir eventual turbação, esbulho ou ameaça à melhor posse em situações que não envolvessem o procedimento demarcatório, mesmo que desfavorável às comunidades indígenas, inclusive em respeito ao princípio da inafastabilidade da jurisdição ou do acesso à justiça (art. 5º, XXXV, CF). III - A posse indígena difere em sua caracterização da posse tal qual como estudada no direito civil, possuindo peculiaridades que lhe são próprias, devendo o operador do direito, por esse motivo, aplicar esse instituto de modo peculiar e de forma a exigir uma maior cautela. IV - Atualmente, o instituto do indigenato encontra previsão constitucional, no artigo 231, § 2º, segundo o qual "as terras tradicionalmente ocupadas pelos índios destinam-se a sua posse permanente, cabendo-lhes o usufruto exclusivo das riquezas do solo, dos rios e dos lagos nelas existentes", bem como na Lei nº 6001/73 (Estatuto do Índio), que estabelece, em seu artigo 25, que o reconhecimento do direito dos índios e grupos tribais à posse permanente das terras por eles habitadas independerá de sua demarcação. Deste modo, resta evidente que não é o processo demarcatório que cria uma posse imemorial, um habitat indígena, mas somente delimita a área indígena de ocupação tradicional. V - A própria Constituição Federal em seu artigo 20, inciso XI prevê que as terras tradicionalmente ocupadas pelos indígenas pertencem à União, bem como o tratamento especial conferido pelo legislador constituinte às essas terras - inclusive com a previsão de sua inalienabilidade e indisponibilidade -, demonstram que o instituto do interdito possessório não deve ser utilizado em sua pureza conceitual como concebido no Direito Civil. Trata-se de bem público de uso especial. VI - A demarcação de terra indígena é ato formal, de natureza declaratória, que tem por escopo o reconhecimento de um direito pré-existente (originário), tratando-se de ato administrativo que goza de presunção de legitimidade e veracidade. IV - Apelação desprovida.
ACÓRDÃO Vistos e relatados estes autos em que são partes as acima indicadas, decide a Egrégia Segunda Turma do Tribunal Regional Federal da 3ª Região, por unanimidade, negar provimento à apelação, nos termos do relatório e voto que ficam fazendo parte integrante do presente julgado.
São Paulo, 26 de fevereiro de 2019.
COTRIM GUIMARÃES
Desembargador Federal |