D.E.

Publicado em 30/09/2022
APELAÇÃO CRIMINAL Nº 0002687-79.2018.4.03.6181/SP
2018.61.81.002687-3/SP
RELATOR : Desembargador Federal MAURICIO KATO
APELANTE : Justica Publica
APELANTE : CAIQUE SOUZA DA SILVA
ADVOGADO : SP0000DPU DEFENSORIA PUBLICA DA UNIAO (Int.Pessoal)
APELADO(A) : Justica Publica
APELADO(A) : CAIQUE SOUZA DA SILVA
ADVOGADO : SP0000DPU DEFENSORIA PUBLICA DA UNIAO (Int.Pessoal)
No. ORIG. : 00026877920184036181 8P Vr SAO PAULO/SP

EMENTA

PENAL. PROCESSUAL PENAL. APELAÇÃO CRIMINAL. ROUBO MAJORADO. ARTIGO 157, § 2º, INCISO II DO CÓDIGO PENAL. REDAÇÃO ANTERIOR À LEI 13.654/2018. DOSIMETRIA. CIRCUNSTÂNCIAS ATENUANTES. SÚMULA 231 DO SUPERIOR TRIBUNAL DE JUSTIÇA. TRANSPORTE DE VALORES. ARTIGO 157, § 2º, INCISO III DO CÓDIGO PENAL.
1. O reconhecimento de circunstâncias agravantes ou atenuantes não autoriza a fixação da pena além do máximo ou aquém do mínimo legal cominado, em razão da ausência de limites legais prefixados para a segunda fase de dosimetria e excessiva discricionariedade que seria conferida ao juiz, o que não se coaduna com o princípio da reserva legal.
2. A incidência da causa de aumento disposta no artigo 157, § 2º, III do Código Penal é reservada para a situação em que a atividade exercida pela vítima é exclusivamente de transporte de valores e em que o agente tem ciência dessa circunstância.
3. Recurso de apelação do Ministério Público Federal provido em parte. Recurso de defesa não provido.

ACÓRDÃO

Vistos e relatados estes autos em que são partes as acima indicadas, decide a Egrégia Quinta Turma do Tribunal Regional Federal da 3ª Região, por unanimidade, negar provimento ao recurso da Defensoria Pública da União em favor de Caique Souza da Silva e dar parcial provimento ao recurso de apelação do Ministério Público Federal para aplicar a Súmula 231 do Superior Tribunal de Justiça na segunda fase da dosimetria, do que resultam as penas definitivas de 6 (seis) anos, 2 (dois) meses e 20 (vinte) dias de reclusão, em regime semiaberto e pagamento de 15 (quinze) dias-multa, no valor unitário de 1/30 (um trigésimo) do salário mínimo vigente ao tempo dos fatos pela prática do delito do artigo 157, § 2º, II, c.c. o artigo 70, ambos do Código Penal, vedada a substituição da sanção corporal por restritiva de direitos, nos termos do relatório e voto que ficam fazendo parte integrante do presente julgado.


São Paulo, 19 de setembro de 2022.
LOUISE FILGUEIRAS
Juíza Federal Convocada


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APELAÇÃO CRIMINAL Nº 0002687-79.2018.4.03.6181/SP
2018.61.81.002687-3/SP
RELATOR : Desembargador Federal MAURICIO KATO
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APELANTE : CAIQUE SOUZA DA SILVA
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No. ORIG. : 00026877920184036181 8P Vr SAO PAULO/SP

RELATÓRIO

Trata-se de apelações criminais interpostas pelo Ministério Público Federal e Caique Souza da Silva em face da r. sentença das fls. 221/227, v., que julgou procedente a denúncia para condenar o réu a 5 (cinco) anos e 20 (vinte) dias de reclusão, em regime inicial semiaberto, e 15 (quinze) dias-multa, cada qual fixado em 1/30 (um trigésimo) do salário-mínimo vigente ao tempo do fato, pela prática do delito previsto no art. 157, § 2º, II, do Código Penal, com a redação anterior à Lei nº 13.654/2018.


Nas razões recursais das fls. 235/242, o Ministério Público Federal requer, em suma:

a) afastamento da redução da pena aquém do mínimo legal, pelo reconhecimento de circunstâncias atenuantes;

b) reconhecimento da causa de aumento de pena prevista no art. 157, § 2º, III, do Código Penal;

c) provimento do recurso de apelação interposto às fls. 150/160 dos autos em face da absolvição sumária do réu, da imputação de prática do crime previsto no art. 244-B da Lei nº 8.069/90.


Já nas razões recursais das fls. 245/249, a defesa de Caique Souza da Silva pleiteia, em síntese, o afastamento da causa de aumento de pena prevista no art. 70 do Código Penal.


Contrarrazões apresentadas às fls. 250/258 e 261/269 dos autos.

A Procuradoria Regional da República opinou pelo provimento do recurso interposto pelo Ministério Público Federal e pelo não provimento do recurso da defesa (fls. 278/282, v.).

É o relatório.

À revisão, nos termos regimentais.



MAURICIO KATO
Desembargador Federal


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APELAÇÃO CRIMINAL Nº 0002687-79.2018.4.03.6181/SP
2018.61.81.002687-3/SP
RELATOR : Desembargador Federal MAURICIO KATO
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APELANTE : CAIQUE SOUZA DA SILVA
ADVOGADO : SP0000DPU DEFENSORIA PUBLICA DA UNIAO (Int.Pessoal)
APELADO(A) : Justica Publica
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No. ORIG. : 00026877920184036181 8P Vr SAO PAULO/SP

VOTO

Caique Souza da Silva foi denunciado pela prática dos delitos previstos no artigo 157, § 2º, I, II e III c. c. o artigo 62, I, ambos do Código Penal e artigo 244-B, da Lei nº 8.069/90, por três vezes, porque, em 01/03/2018, por volta das 10h00min, na Rua Frei Claude Dauberville, nº 115, em São Paulo/SP, em companhia dos menores E.M.S.L., A.S.S. e H.L.S.A., previamente combinados, com unidade de desígnios, repartição de tarefas e vontade livre e consciente, mediante grave ameaça exercida com simulação de arma de fogo, abordou empregados da Empresa Brasileira de Correios e Telégrafos (EBCT) que efetuavam entregas de Sedex no bloco 7 do referido endereço. Na abordagem, o réu teria subtraído, para ele e seus comparsas, 4 (quatro) encomendas, a aliança de casamento de uma das vítimas e 3 (três) encomendas que estavam no interior do veículo Renault Kangoo de placas FAQ 5087, de propriedade dos Correios.

Narra a denúncia que na ocasião, o denunciado, após avistar os funcionários dos Correios, convenceu os menores a acompanhá-lo na abordagem e assim os corrompeu. Conclui que exerceu a liderança do grupo e, acompanhado de E.M.S.L. e H.L.S.A., o qual simulava portar uma arma de fogo, abordou os carteiros Aparecido Ribeiro e Leandro Nunes, enquanto A.S.S. lhes dava cobertura pelo lado de fora do edifício.

Em seguida, Caique Souza da Silva e o menor E.M.S.L. teriam avançado sobre os funcionários dos Correios e, com vontade livre e consciente, subtraído 4 (quatro) encomendas de Sedex que eram carregadas pelas vítimas, a aliança de Leandro Nunes e a chave do veículo dos Correios, enquanto H.L.S.A. simulava portar arma de fogo. De posse da chave do veículo, o acusado, junto a E.M.S.L. e H.L.S.A., dirigiram-se ao veículo e dele subtraíram outras 3 (três) encomendas, entregando uma delas a A.S.S., que dava guarida à ação. Após, todos saíram correndo com as mercadorias.

Os funcionários dos Correios registraram boletim de ocorrência no 75º Distrito Policial e acionaram o serviço de rastreamento de encomendas, que identificou que um dos objetos subtraídos estava em outro bloco do endereço referido. Em diligências realizadas no local, policiais militares conseguiram localizar o objeto rastreado, uma caixa acústica e a aliança da vítima Leandro Nunes, ambas em posse de Caique Souza da Silva, assim como os menores E.M.S.L. e A.S.S. Questionado pelos policiais militares a respeito dos outros objetos subtraídos, o denunciado disse tê-los levado à sua residência, localizada no bloco 3, apartamento 22, daquele conjunto residencial, onde foram encontrados outros 3 (três) itens.

A denúncia foi recebida em 15/10/2018 (fls. 111/112, v.) e, quanto ao crime do artigo 244-B da Lei 8.069/1990, Caique Souza da Silva foi absolvido sumariamente, com fundamento no artigo 397, III, do Código de Processo Penal (fls. 124/127).

O Ministério Público Federal interpôs recurso de apelação (fls. 150/160) e foram apresentadas contrarrazões pela Defensoria Pública da União (fls. 162/167).

Após o regular processamento do feito, sobreveio sentença que condenou Caique Souza da Silva às penas de 5 (cinco) anos e 20 (vinte) dias de reclusão, em regime inicial semiaberto e pagamento de 15 (quinze) dias-multa, cada qual fixado em 1/30 (um trigésimo) do salário-mínimo vigente ao tempo do fato, pela prática do delito previsto no artigo 157, § 2º, II, do Código Penal (redação anterior à Lei nº 13.654/2018).

Passo às matérias devolvidas.

De início, verifico que a materialidade, autoria e dolo e são pontos incontroversos entre a partes e entendo que foram suficientemente demonstradas durante a instrução processual.

De fato, a materialidade delitiva está apoiada nos seguintes elementos de convicção principais: a) Boletim de Ocorrência nº 485/2018 (fls. 18/23; b) Auto de Apreensão de Adolescente (fls. 24/27); c) Auto de Exibição e Apreensão (fls. 28/29); e, d) Auto de Reconhecimento Pessoal Positivo (fls. 30/31).

Na mesma linha, a autoria delitiva e o dolo defluem das provas coligidas durante a instrução processual que confirmam elementos probatórios coletados durante a fase inquisitiva. Senão vejamos:

As testemunhas Rafael Hidalgo de Santi e André Solferini Terazan, policiais civis que abordaram o réu e o conduziram à delegacia de polícia, confirmaram as declarações prestadas na fase investigativa, no sentido de que, por volta das 12h30, atenderam na delegacia funcionários dos Correios que afirmavam terem sofrido roubo e que o mecanismo de rastreamento de carga indicava que uma das encomendas roubadas estava no condomínio situado na Rua Claude Dalberville, altura do nº 115, bloco 1, em São Paulo/SP, por isso para lá se dirigiram e constataram forte odor característico de maconha em uma das unidades do andar térreo do edifício e nela ingressando, encontraram o réu Caique acompanhado dos menores A.S.S. e E.M.S.L., que utilizava o rádio equipado com o rastreador de mercadorias, além de encontrar parte do que tinha sido roubado e a aliança de uma das vítimas. Relataram que o réu disse que os demais itens roubados estavam na unidade onde reside, no bloco 3, apartamento 22, local onde foi encontrada a mochila roubada, bem como o réu ainda indicou um terceiro local em que foram descartadas as caixas que continham as encomendas. Disseram que os menores foram reconhecidos pelas vítimas e que um terceiro menor foi identificado como H.L.S.A., mas não foi encontrado no local dos fatos, assim como parte das encomendas (fls. 03/05, 185/186 e mídia de fls. 189).

As testemunhas Aparecido Ribeiro e Leandro Nunes, funcionários dos Correios e vítimas do roubo, narraram que realizavam entregas destinadas a diversas unidades do Conjunto Cingapura situado na Rua Frei Claude Dalberville, altura do número 115, em São Paulo, quando foram abordados por três indivíduos no bloco 7, sendo que o réu Caique estava acompanhado de um menor de "cabelo amarelado" que identificaram como A.S.S., avançando sobre eles e as encomendas, inclusive pegaram a aliança de casamento do depoente Leandro e também a chave do veículo onde havia mais encomendas. Relataram que atrás do réu e do menor A.S.S. havia um terceiro que depois identificaram como H.L.S.A. que portava uma arma de fogo e mais um outro indivíduo que ficou do lado de fora do bloco, identificado como E.M.S.L. Após pegarem as encomendas que estava com eles, foram até o veículo e retiraram mais três encomendas, fugindo do local em direção ao bloco 1, pois os moradores dos outros blocos ameaçaram reagir. Os depoentes foram ao 75º Distrito Policial para registrar o ocorrido e acionaram a empresa de rastreamento que encaminhou funcionário que acompanhou os policiais em diligência, sendo que permaneceram na delegacia e depois reconheceram os indivíduos presos pelos policiais como os responsáveis pelo roubo, embora não souberam precisar o papel que coube a cada um na ação criminosa. Relataram que três das encomendas não foram recuperadas (fls. 06/09, 183/184 e mídia de fls. 189).

Finalmente, o próprio réu Caique Souza da Silva admitiu o crime tanto perante à autoridade policial, quanto em seu interrogatório judicial. Disse que estava sentado na frente do bloco 1 do Condomínio Cingapura juntamente com seus amigos, os menores A.S.S. e E.M.S.L., quando viram funcionários dos Correios entrarem no bloco 7 para entregar encomendas, por isso chamou os amigos para abordar os carteiros, mas que não estavam armados. Relatou que mandaram as vítimas entregar as encomendas, a aliança de um deles e chave do carro dos Correios, de onde retiraram mais caixas e correram para trás do prédio, onde abriram as embalagens e pegaram as mercadorias, seguindo para o apartamento de A.S.S. para jogar videogame, sendo que um tempo depois apareceram os policiais, tendo-os levado para seu apartamento no bloco 3 - unidade 22 - onde tinha deixado a mochila que roubara. Negou que já tivesse praticado outro roubo e a participação de quarta pessoa, sendo que conhece H.L.S.A. apenas de vista e disse que as mercadorias que roubou foram recuperadas pelos policiais, mas não sabe das demais que não foram encontradas (fls. 10/11 e 187/188).

As evidências coligidas comprovam que Caique Souza da Silva, em concurso de agentes com os menores A.S.S., E.M.S.L. e H.L.S.A., mediante grave ameaça exercida com simulação de arma de fogo, subtraiu 7 (sete) encomendas postais e a aliança de casamento de uma das vítimas, de modo que mantenho a sua condenação pela prática do crime previsto no artigo 157, § 2º, II, do Código Penal (redação anterior à Lei nº 13.654/2018).

As partes insurgem-se contra a dosimetria da pena operada pelo juízo de primeira instância, razão por qual a transcrevo a seguir:


[...] Com efeito, as circunstâncias judiciais subjetivas inseridas no caput do art. 59 do Código Penal brasileiro não podem ser valoradas desfavoravelmente ao acusado CAIQUE SOUZA DA SILVA.
A culpabilidade - juízo de reprovação que se faz pela opção que escolheu - não desborda da normalidade. Os motivos do crime são aqueles próprios ao tipo penal em questão.
Por tais razões, fixo a pena-base no mínimo legal, em 4 (quatro) anos de reclusão e de 10 (dez) dias-multa.
Na segunda fase de aplicação da pena, no que concerne às circunstâncias agravantes e atenuantes, constato incidir na espécie a circunstância atenuante da confissão espontânea, consignada no art. 65, III, alínea "d", do Código Penal, haja vista que o réu admitiu a prática dolosa do crime de roubo descrito na denúncia. Outrossim, reconheço incidir também na espécie a circunstância atenuante da menoridade relativa, consignada no art. 65, inciso I, do Código Penal, haja vista que o réu CAIQUE SOUZA DA SILVA era menor de vinte e um anos na data do fato, já que nascido em 08 de junho de 1999.
Nesse contexto, ressalto, por oportuno, que não desconheço o teor da Súmula 231 do Superior Tribunal de Justiça. Todavia, reputo que o entendimento nela assinalado contrasta com o princípio da individualização da pena, bem como não encontra suporte no texto legal pertinente. Senão, vejamos.
Com efeito, a Constituição Federal determina que a pena deverá ser individualizada, conforme regulação prevista na lei (art. 5º, XLVI).
De início, observo não haver dispositivo de lei que veda expressamente a redução da pena aquém do mínimo legal em face do reconhecimento da presença de circunstância atenuante. Outrossim, não vislumbro no arcabouço normativo que disciplina a matéria qualquer óbice implícito a tal diminuição.
Ademais, o art. 65 do Código Penal não assinala qualquer ressalva à sua aplicação nas hipóteses em que a pena-base tenha sido fixada no mínimo legal. Ao contrário, a norma em comento estabelece que estas consistem em circunstâncias que sempre atenuam a pena.
Pondero ainda que o art. 68 do Código Penal estabeleceu o sistema trifásico de aplicação da pena, aduzindo que a pena-base será fixada à luz dos critérios do art. 59 do CP; em seguida, serão consideradas as atenuantes e agravantes e, por último, as causas de aumento e diminuição.
Assim, se a lei ordena que agravantes e atenuantes devem ser consideradas na segunda fase de aplicação da pena, significa que caberá ao magistrado não apenas verificar a sua respectiva ocorrência no caso concreto, mas também fazê-la efetivamente incidir sobre o quantum fixado na fase anterior; caso contrário, implicaria retirar a efetividade da norma na situação concreta.
Além disso, no que diz respeito especificamente à confissão, aludido óbice à incidência da atenuante ensejaria arrefecimento de potencial colaboração do acusado com a verdade real e a assunção livre e espontânea da prática do fato perante o Poder Judiciário, conduta esta que deve ser estimulada. Por fim, a vedação em comento implicaria dispensar tratamento idêntico a pessoas que se encontram em situação diversa, de molde a violar a isonomia.
Pelo exposto, reduzo a pena provisória para 3 (três) anos e 3 (três) meses de reclusão e 10 (dez) dias-multa.
Na terceira fase de aplicação da pena, constato que a prova colhida na instrução revelou claramente que a prática delitiva operou-se mediante o concurso de duas ou mais pessoas.
Destarte, há incidência da causa de aumento prevista no 2, inciso II, do art. 157 do CP, razão pela qual elevo a pena em 1/3 (um terço), acarretando uma pena de 4 (quatro) anos e 4 (quatro) meses de reclusão e de 13 (treze) dias-multa.
Outrossim, verifico a existência de concurso formal entre os 2 (dois) crimes de roubo praticados, conforme fundamentação supra, nos termos do art. 70 do Código Penal. Assim, há de incidir o aumento de pena no patamar mínimo previsto na norma em questão, razão pela qual elevo a pena em 1/6 (um sexto).
Dessa forma, fixo a pena definitiva em 5 (cinco) anos e 20 (vinte) diasde reclusão e de 15 (quinze) dias-multa, pela prática do crime de roubo circunstanciado, previsto no art. 157, 2º, inciso II, do Código Penal c.c. artigo 70 do Código Penal.
Cada dia-multa fixado na condenação corresponderá a 1/30 (um trigésimo) do valor do salário-mínimo mensal vigente na época dos fatos, pois não verifico no réu a presença de capacidade econômica apta a justificar eventual aumento. O valor da multa será atualizado a partir da data do fato.
Nos termos do art. 33, 2º, "b", do Código Penal, fixo o regime inicial semiaberto para o cumprimento da pena, observado o disposto no art. 34 do mesmo diploma legal.
Em se tratando de delito praticado mediante grave ameaça à pessoa e, ainda, considerando o quantum da pena privativa de liberdade não é cabível a conversão da pena privativa de liberdade em restritiva de direitos (art. 44, I, CP).

Na primeira fase da dosimetria, o artigo 59, do Código Penal estabelece as circunstâncias judiciais que devem ser consideradas na fixação da pena-base: culpabilidade, antecedentes, conduta social, personalidade do agente, motivos, circunstâncias e consequências do crime e comportamento da vítima.

O magistrado sentenciante fixou a pena-base no mínimo legal (4 anos de reclusão e 10 dias-multa), o que mantenho.

De fato, a culpabilidade, circunstâncias, motivação e consequências da prática delitiva são as que normalmente se verificam nos crimes da espécie, dos autos não surgem elementos que permitam avaliar de modo desfavorável a personalidade e a conduta social do réu que não ostenta maus antecedentes e, embora identificada, o comportamento da vítima não interferiu na conduta criminosa, por isso, é circunstância neutra no caso.

Portanto, mantenho a pena-base de 4 (quatro) anos de reclusão e 10 (dez) dias-multa.

Na segunda fase da dosimetria, o magistrado a quo reconheceu as atenuantes da confissão e da menoridade (art. 65, I e III, "d" do Código Penal e ao fazê-lo consignou que o comando contido na Súmula 231 do Superior Tribunal de Justiça viola o princípio constitucional da individualização da pena, além de não possuir amparo legal, por isso, estabeleceu as penas intermediárias de 3 (três) anos, 3 (três) meses de reclusão e 10 (dez) dias-multa.

Aqui, o Ministério Público Federal requer a aplicação da Súmula 231 do Superior Tribunal de Justiça, no que lhe assiste razão.

A Súmula 231, do Superior Tribunal de Justiça tem sua aplicação consolidada nesta turma julgadora e está, em linhas gerais, de acordo com a interpretação sistemática e teleológica dos artigos 59, 67 e 68, todos do Código Penal.

A razão da vedação da fixação de pena aquém do mínimo legal na segunda fase de dosimetria reside no fato de que, nesta etapa, o aumento ou redução da pena está limitado somente pelo livre convencimento motivado do juiz, discrição que não oferece suficiente previsibilidade sobre a sanção aplicável e que, portanto, não se coaduna com o princípio da reserva legal.

Deveras, diferentemente das causas especiais de aumento ou diminuição de pena, em que a variação da sanção encontra-se vinculada pelo quantum estabelecido previamente pelo legislador, o reconhecimento de circunstâncias agravantes ou atenuantes não possui limite legal.

A ausência de limites legais preestabelecidos conjugada a uma excessiva discricionariedade conferida ao juiz levariam a distorções da pena, eis que possibilitariam o seu agravamento muito além do máximo cominado ou o seu total esvaziamento (a chamada "pena zero"). Se não haveria celeumas para o direito individual à liberdade quanto à redução da pena nesses moldes (art. 5º, caput, da Constituição Federal), o mesmo não pode ser dito em relação ao seu aumento.

Além disso, a ausência de marcos legais daria azo a graves infrações ao princípio da igualdade (art. 5º, caput, CF), que deve contrabalancear-se com o princípio da individualização da pena (art. 5º, XLVI, CF), uma vez que poderiam ser aplicadas penas muito díspares a réus que praticaram crimes em situações semelhantes.

Por esses fundamentos, conservo a incidência das circunstâncias atenuantes previstas no art. 65, I e III, "d", do Código Penal e fixo a pena do réu em 4 (quatro) anos de reclusão e 10 (dez) dias-multa.

Na terceira fase da dosimetria, o Ministério Público Federal pleiteia o reconhecimento da causa de aumento de pena prevista no artigo 157, § 2º, III, do Código Penal e a Defensoria Pública da União requer o afastamento do concurso formal, porque a acusação denunciou o réu por um único crime de roubo em suposto concurso material com crime de corrupção de menores, não requereu a aplicação do concurso formal, o qual, se mantido, infringiria o princípio da correlação entre a denúncia e a sentença e, consequentemente, os princípios do contraditório e da ampla defesa.

Primeiramente, observo que o pedido da acusação não prospera, pois a causa de aumento em questão é reservada para a situação em que a atividade exercida pela vítima é exclusivamente de transporte de valores e em que o agente tem ciência dessa circunstância.

A Empresa Brasileia de Correios e Telégrafos oferece serviços de mensagens, encomendas, financeiros e de conveniência, de forma que o transporte de valores é apenas parte da extensa gama das atividades exercida pela empresa pública. Ademais, não há nos autos prova de que os agentes soubessem previamente que as vítimas transportavam objetos de valor.

Assim sendo, mantenho a majoração de 1/3 (um terço) e fixo a pena do réu em 5 (cinco) anos e 4 (quatro) meses de reclusão e 13 (treze) dias-multa.

Por outro lado, preservo o reconhecimento do concurso formal, pois é cediço o entendimento de que o réu se defende dos fatos narrados na denúncia, e não da capitulação jurídica nela apontada.

No presente caso, o Ministério Público Federal descreveu com suficientes detalhes a ação delitiva do réu, voltada contra duas vítimas distintas, como demonstra o excerto a seguir:


[...] o denunciado CAIQUE SOUZA e o menor E. M. avançaram sobre os empregados da empresa pública federal e, com vontade livre e consciente, subtraíram, para eles 04 (quatro) encomendas Sedex que as vítimas carregavam, a aliança de casamento de Leandro Nunes e a chave do veículo acima mencionado, enquanto H.L simulava portar arma de fogo. De posse da chave, CAIQUE SOUZA DA SILVA, acompanhado dos menores E.M e H.L, dirigiu-se ao veículo dos Correios e subtraíram, em comunhão de ações, outras 03 (três) encomendas, entregando uma delas a A. da S, que vigiava a ação. Após, todos saíram correndo com as mercadorias em direção ao bloco 1 do referido conjunto habitacional. [...] [fl. 67; destaquei].

Está claro, portanto, que o Ministério Público imputou ao réu a subtração de encomendas postais que se encontravam em posse de funcionários dos Correios, mas que pertenciam à empresa pública, e de uma aliança de casamento da vítima Leandro Nunes, bem particular que não tinha qualquer relação com a empresa pública.

Com duas vítimas distintas, era previsível que poderia ser aplicada sobre a pena uma das regras de concurso de crimes, isto é, de concurso material (art. 69, CP), concurso formal (art. 70, CP) ou crime continuado (art. 71, CP).

Assim sendo, a defesa do réu estava suficiente munida de informações para exercer adequadamente o contraditório e a ampla defesa e não há falar em inobservância ao princípio da correlação entre a denúncia e a sentença.

Por esses fundamentos, conservo o aumento da pena em 1/6 (um sexto) pelo reconhecimento do concurso formal de crimes, com o qual fixo as penas definitivas de 6 (seis) anos, 2 (dois) meses e 20 (vinte) dias de reclusão e 15 (quinze) dias-multa, mantido o valor unitário de 1/30 (um trigésimo) do salário mínimo vigente ao tempo dos fatos, à míngua de recurso da acusação e porque nos autos não há elementos concretos da efetiva capacidade econômica do réu.

Para a fixação do regime, devem ser observados os seguintes fatores: modalidade de pena de privativa de liberdade, ou seja, reclusão ou detenção (art. 33, caput, Código Penal); quantidade de pena aplicada (art. 33, §2º, alíneas "a", "b" e "c", Código Penal); caracterização ou não da reincidência (art. 33, §2º, alíneas "b" e "c", Código Penal) e circunstâncias do artigo 59 do Código Penal (art. 33, §3º, do Código Penal).

Aqui, considerando que as circunstâncias judiciais subjetivas do réu (antecedentes, conduta social, personalidade e motivo do crime) não foram valoradas negativamente, o regime inicial de cumprimento de pena deve ser estabelecido com base na pena fixada em concreto (6 anos, 2 meses e 20 dias de reclusão), a qual mesmo com o redimensionamento a maior ainda autoriza o estabelecimento do regime inicial semiaberto.

Finalmente, agiu com acerto o magistrado sentenciante quanto à impossibilidade de substituição da pena privativa de liberdade por restritivas de direitos, pois o delito em questão foi praticado com grave ameaça à pessoa (uso de arma de fogo) e a pena fixada em concreto extrapola os limites fixados no artigo 44 do Código Penal.

Mantidos, no mais, os demais termos da r. sentença de 1º grau.

Ante o exposto, nego provimento ao recurso da Defensoria Pública da União em favor de Caique Souza da Silva e dou parcial provimento ao recurso de apelação do Ministério Público Federal para aplicar a Súmula 231 do Superior Tribunal de Justiça na segunda fase da dosimetria, do que resultam as penas definitivas de 6 (seis) anos, 2 (dois) meses e 20 (vinte) dias de reclusão, em regime semiaberto e pagamento de 15 (quinze) dias-multa, no valor unitário de 1/30 (um trigésimo) do salário mínimo vigente ao tempo dos fatos pela prática do delito do artigo 157, § 2º, II, c. c. o artigo 70, ambos do Código Penal, vedada a substituição da sanção corporal por restritiva de direitos.

É como voto.


LOUISE FILGUEIRAS
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