D.E. Publicado em 12/07/2012 |
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EMENTA
PROCESSUAL CIVIL. SFH. AÇÃO CIVIL PÚBLICA. ASSOCIAÇÃO BRASILEIRA DOS MUTUÁRIOS DA HABITAÇÃO-ABMH. LEGITIMIDADE ATIVA. DISPENSA DO REQUISITO DO PRAZO DA PRÉ-CONSTITUIÇÃO SUPERIOR A UM ANO. RELEVÂNCIA DO PEDIDO. INTERESSE SOCIAL. ARTIGO 5º, §4º, DA LEI Nº 7.347/85. APELAÇÃO PROVIDA. SENTENÇA ANULADA.
I. Nas ações que tratam do financiamento regido pelo Sistema Financeiro de Habitação - SFH, pode o juiz dispensar o requisito da pré-constituição da associação há pelo menos um ano, nos termos do artigo 5°, § 4°, da Lei n 7.347/85.
II. Posiciona-se a jurisprudência no sentido de possuírem as ações referentes ao Sistema Financeiro da Habitação relevante interesse social, porquanto versam sobre o direito social à moradia. Precedentes do STJ, TRF1 e TRF4.
III. In casu, é de ser reconhecida, portanto, a legitimidade da Associação Brasileira dos Mutuários da Habitação - ABMH para ajuizar a demanda.
IV. Recurso de apelação provido para anular a sentença e determinar o retorno dos autos à Vara de origem para regular processamento.
ACÓRDÃO
Vistos e relatados estes autos em que são partes as acima indicadas, decide a Egrégia TURMA A do Tribunal Regional Federal da 3ª Região, por unanimidade, dar provimento ao recurso de apelação, nos termos do relatório e voto que ficam fazendo parte integrante do presente julgado.
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RELATÓRIO
1. Decisão recorrida: Sentença proferida na ação civil pública, autos nº 2000.60.00.004869-0, da 3ª Vara Federal de Campo Grande/MS, que indeferiu a inicial e julgou extinto o feito sem julgamento do mérito, a teor do disposto no artigo 295, II c/c art. 267, inc. VI, do Código de Processo Civil (fls. 53/54).
2. Razões da apelante: Pleiteia a reforma da r. sentença ao fundamento da dispensa do requisito temporal de sua constituição social em razão do manifesto interesse social que envolve a demanda, invocando em seu favor o contido no parágrafo 4º, do artigo 5º, da Lei nº 7.347/85. Esclarece que o fundamento da ação recai sobre a propaganda enganosa veiculada pela CEF no sentido de que "quem está dentro do imóvel não tem direito algum e que quem comprar o imóvel pode recorrer a justiça que o processo é rápido e o sucesso é garantido" (sic), defendendo que o feito deve ter o seu regular prosseguimento em decorrência da existência de dezenas de associações representativas dos mutuários e dos consumidores, bem como em razão de ser a ação direcionada ao maior agente financeiro do País, que é a empresa pública Caixa Econômica Federal - CEF. Discorre acerca do direito à moradia, nos termos do artigo 6º, da Constituição Federal, além das demais garantias contidas no artigo 5º da Carta Magna (fls. 57/61).
3. Contrarrazões da apelada: inexistentes, eis que não implementado o contraditório.
4. Parecer do Ministério Público Federal: Postulou pela manifestação da apelante quanto ao eventual interesse recursal (fls. 71), tendo esta reiterado o seu pedido de apreciação e provimento da apelação (fls. 75/76). Em seguida, foi aberta vista ao Parquet, que opinou pelo improvimento do recurso (fls. 79/83).
VOTO
Trata-se de apelação interposta pela Associação Brasileira dos Mutuários da Habitação - ABMH contra sentença proferida em ação civil pública, que indeferiu a inicial e julgou extinto o feito sem resolução de mérito em razão da sua ilegitimidade de parte.
À época da propositura da demanda, o art. 5º da Lei nº 7.347, de 24 de julho de 1985, preconizava o seguinte:
"Art. 5º A ação principal e a cautelar poderão ser propostas pelo Ministério Público, pela União, pelos Estados e Municípios. Poderão também ser propostas por autarquia, empresa pública, fundação, sociedade de economia mista ou por associação que: |
l - esteja constituída há pelo menos um ano, nos termos da lei civil; |
II - inclua entre suas finalidades institucionais a proteção ao meio ambiente ao consumidor, à ordem econômica, à livre concorrência, ou ao patrimônio artístico, estético, histórico, turístico e paisagístico; (Redação dada pela Lei nº 8.884, de 11.6.1994) |
(...) |
§ 4.° O requisito da pré-constituição poderá ser dispensado pelo juiz, quando haja manifesto interesse social evidenciado pela dimensão ou característica do dano, ou pela relevância do bem jurídico a ser protegido. (Incluído pela Lei nª 8.078, de 11.9.1990) |
No caso em apreço, verifico que a ação judicial foi ajuizada na data de 2.8.2000 (fls. 2) pela associação autora - ABMH, que, segundo consta dos documentos que acompanham a inicial, foi constituída em 13.2.2000 e levada a registro perante o respectivo Cartório em 14.3.2000, data que consta no cartão do Cadastro Nacional de Pessoa Jurídica-CNPJ como sendo a de sua abertura (fls. 42).
No que concerne à pertinência temática, observo que objetivos da associação encontram-se relacionados no artigo terceiro do Estatuto Social, sendo relevante ao presente feito o disposto no item a, verbis: "a) reunir, instruir, representar e defender em juízo ou fora dele, todos os proprietários de imóveis financiados pelo Sistema Financeiro de Habitação - SFH, Sistema Financeiro Imobiliário - SFI, Sistema Hipotecário, Sistema de Carta de Crédito, PAR - Programa de Arrendamento Mercantil, financiamentos diretos com construtoras e outras empresas ou agentes que operem nesta área e pessoas ou entidades relacionadas ao problema da casa própria em todo Território Nacional, visando a defesa de seus direitos assegurados pelo Código de Defesa do Consumidor, Código Civil, Constituição Federal, Código Penal e todos os demais diplomas que venham a ser violados, retirados ou negados, por qualquer agente financeiro, fiduciário, órgão, entidade, autarquia e pessoas físicas ou jurídicas, públicas ou particulares;".
Pois bem. O cerne da questão diz respeito à presença ou não do "manifesto interesse social" a afastar o requisito temporal da constituição e tornar a Associação parte legítima para propor a presente demanda. E, nestas condições, observo que a jurisprudência firma-se no sentido de que as ações referentes ao Sistema Financeiro da Habitação possuem relevante interesse social, porquanto versam sobre o direito social à moradia. Neste sentido, são os julgados proferidos pelo Superior Tribunal de Justiça:
AGRAVO REGIMENTAL. EMBARGOS DE DIVERGÊNCIA. PROCESSO CIVIL. JULGAMENTO MONOCRÁTICO. JURISPRUDÊNCIA PACÍFICA ACERCA DA MATÉRIA. AÇÃO CIVIL PÚBLICA. SISTEMA FINANCEIRO DA HABITAÇÃO (SFH). MINISTÉRIO PÚBLICO. LEGITIMIDADE ATIVA. PRECEDENTES. I - Encontra-se assente nesta Corte, conforme preceituado no art. 557, § 1º, do Código de Processo Civil, alterado pela Lei 9.756/98, a possibilidade de o relator decidir monocraticamente recurso quando a decisão recorrida estiver em manifesto confronto com jurisprudência dominante no Tribunal. II - O Ministério Público possui legitimidade para ajuizar ação civil pública na defesa de mutuários do Sistema Financeiro da Habitação (SFH), uma vez que os contratos para a aquisição da casa própria são firmados por pessoas hipossuficientes, restando caracterizado, assim o relevante interesse social. Precedentes da e. Corte Especial. Agravo regimental desprovido. |
(CORTE ESPECIAL - AERESP 200201271019 - Relator Min. FELIX FISCHER - DJ DATA:10/04/2006 PG:00107) (grifei) |
Processual civil e SFH. Recurso especial. Ação civil pública. Direitos individuais homogêneos. Ministério Público. Legitimidade. - Os interesses individuais homogêneos são considerados relevantes por si mesmos, sendo desnecessária a comprovação desta relevância. - O Ministério Público tem legitimidade para propor ação civil pública na defesa de interesses individuais homogêneos referentes aos contratos de mútuo vinculados ao Sistema Financeiro de Habitação, porquanto é interesse que alcança toda a coletividade a ostentar por si só relevância social. - O Código de Defesa do Consumidor incide nos contratos vinculados ao Sistema Financeiro de Habitação. - Recurso especial conhecido e provido. |
(TERCEIRA TURMA - RESP 635807 - Relatora Min. NANCY ANDRIGHI - DJ DATA:20/06/2005 PG:00277 LEXSTJ VOL.:00191 PG:00166 RSTJ VOL.:00194 PG:00400) (grifei) |
Na mesma esteira, posicionam-se as Cortes Regionais Federais:
PROCESSUAL CIVIL. AÇÃO CIVIL PÚBLICA. SHF. ASSOCIAÇÃO BRASILEIRA DOS MUTUÁRIOS DA HABITAÇÃO. LEGITIMIDADE ATIVA AD CAUSAM. PREENCHIMENTO DAS CONDIÇÕES PARA A DISPENSA DA PRÉ-CONSTITUIÇÃO. ART. 5º, § 4º DA LEI 7.347/85. SUBSTITUIÇÃO PROCESSUAL (LEGITIMAÇÃO EXTRAORDINÁRIA). DESNECESSIDADE DE APRESENTAÇÃO DE LISTA NOMINAL DOS SUBSTITUÍDOS. |
1. Em se tratando de financiamento sob a égide do SHF, o manifesto interesse social e a relevância do bem juridicamente protegido se justificam pela proteção conferida ao direito à moradia, previsto no caput do artigo 6° da Constituição Federal, pois é notória a grande quantidade de imóveis negociados no país sob a égide deste sistema, o que evidencia a possibilidade de dano a um número imensurável de pessoas. |
2. Presentes as condições necessárias à dispensa da pré-constituição da associação há pelo menos um ano, deverá o juiz concedê-la, nos termos do artigo 5°, § 4°, da Lei n 7.437/85. |
3. Nos casos de substituição processual (legitimação extraordinária) é desnecessária a autorização expressa por cada associado, através da apresentação de lista nominal com a relação dos substituídos processuais, sendo bastante a autorização constante no estatuto da associação. |
4. Apelação provida para anular a sentença e determinar a baixa dos autos à vara de origem para que a demanda seja processada regularmente. |
(TRF 1ª Região Proc. nº 200038020036231/MG, Quinta Turma, Relator Juiz Federal Convocado Pedro Francisco da Silva, e-DJF1DATA 17/12/2009, pág. 266) |
PROCESSUAL CIVIL. AÇÃO CIVIL PÚBLICA. MINISTÉRIO PÚBLICO. LEGITIMIDADE. INTERESSES INDIVIDUAIS HOMOGÊNEOS. SISTEMA FINANCEIRO DE HABITAÇÃO. 1. É corrente o entendimento na doutrina e na jurisprudência de que o Ministério Público possui legitimidade para a propositura de ação civil pública em defesa de interesses individuais homogêneos que apresentem relevância social. 2. Ao Ministério Público incumbe a defesa da ordem jurídica e dos interesses sociais e individuais indisponíveis, conforme art. 127, da Constituição Federal. 3. No caso dos financiamentos habitacionais regidos pelo Sistema Financeiro de Habitação (SFH), a relevância social e o interesse público - e por conseqüência, a indisponibilidade - estão bem caracterizados, uma vez que o direito à moradia constitui um direito básico de qualquer cidadão, um requisito mínimo de uma vida digna a que todos temos direito. 4. O reconhecimento da legitimidade do Ministério Público para a presente ação tem por finalidade, também, contribuir para uma óbvia diminuição de causas individuais com o mesmo objeto, em prol de uma prestação jurisdicional mais célere, eficiente e igualitária. |
(TRF 4ª Região - SEGUNDA SEÇÃO - EIAC 9504414885 - Relator VALDEMAR CAPELETTI - DJ 19/11/2003 PÁGINA: 660) (grifei) |
Ante ao exposto, na esteira da jurisprudência do E. STJ, reconhecendo a dispensa da pré-constituição da associação há pelo menos um ano, nos termos do artigo 5°, § 4°, da Lei n 7.437/85, e, em conseqüência, a legitimidade ativa da autora, DOU PROVIMENTO À APELAÇÃO, para o fim de anular a r. sentença e determinar o retorno dos autos à Vara de Origem para regular processamento.
É o voto.
Documento eletrônico assinado digitalmente conforme MP nº 2.200-2/2001 de 24/08/2001, que instituiu a Infra-estrutura de Chaves Públicas Brasileira - ICP-Brasil, por: | |
Signatário (a): | NELSON DE FREITAS PORFIRIO JUNIOR:10077 |
Nº de Série do Certificado: | 359FBD7F71FFC990 |
Data e Hora: | 03/07/2012 16:34:16 |