Diário Eletrônico

PODER JUDICIÁRIO

TRIBUNAL REGIONAL FEDERAL DA 3ª REGIÃO

D.E.

Publicado em 02/03/2012
APELAÇÃO/REEXAME NECESSÁRIO Nº 0003218-73.2011.4.03.6000/MS
2011.60.00.003218-6/MS
RELATOR : Desembargador Federal MAIRAN MAIA
APELANTE : Uniao Federal
ADVOGADO : GUSTAVO HENRIQUE PINHEIRO DE AMORIM
APELADO : CACILDO GIMENES DE MORAES
ADVOGADO : ALCEU DE ALMEIDA REIS FILHO e outro
REMETENTE : JUIZO FEDERAL DA 1 VARA DE CAMPO GRANDE > 1ªSSJ > MS
No. ORIG. : 00032187320114036000 1 Vr CAMPO GRANDE/MS

EMENTA

CONSTITUCIONAL E ADMINISTRATIVO - CURSO DE RECICLAGEM DE FORMAÇÃO DE VIGILANTE - APLICAÇÃO DO ´PRINCÍPIO DA PRESUNÇÃO DE INOCÊNCIA.
1. Segundo orientação do STF e do STJ, não se deve considerar como antecedente criminal a circunstância de alguém figurar como indiciado em inquérito policial ou mesmo denunciado em ação penal ainda em curso, mas tão somente a condenação por fato criminoso, transitada em julgado.
2. Viola o princípio constitucional da presunção da inocência, previsto no art. 5º, inciso LVII , da Constituição Federal, ato administrativo que indefere registro de curso de reciclagem de vigilante que responde a inquérito ou ação penal sem trânsito em julgado da sentença condenatória. Precedentes.


ACÓRDÃO

Vistos e relatados estes autos em que são partes as acima indicadas, decide a Egrégia Sexta Turma do Tribunal Regional Federal da 3ª Região, por unanimidade, negar provimento à apelação e à remessa oficial, nos termos do relatório e voto que ficam fazendo parte integrante do presente julgado.


São Paulo, 23 de fevereiro de 2012.
Mairan Maia
Desembargador Federal Relator


Documento eletrônico assinado digitalmente conforme MP nº 2.200-2/2001 de 24/08/2001, que instituiu a Infra-estrutura de Chaves Públicas Brasileira - ICP-Brasil, por:
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APELAÇÃO/REEXAME NECESSÁRIO Nº 0003218-73.2011.4.03.6000/MS
2011.60.00.003218-6/MS
RELATOR : Desembargador Federal MAIRAN MAIA
APELANTE : Uniao Federal
ADVOGADO : GUSTAVO HENRIQUE PINHEIRO DE AMORIM
APELADO : CACILDO GIMENES DE MORAES
ADVOGADO : ALCEU DE ALMEIDA REIS FILHO e outro
REMETENTE : JUIZO FEDERAL DA 1 VARA DE CAMPO GRANDE > 1ªSSJ > MS
No. ORIG. : 00032187320114036000 1 Vr CAMPO GRANDE/MS

RELATÓRIO

Cuida-se de mandado de segurança impetrado com o objetivo de assegurar o direito à participação do impetrante no curso de reciclagem de vigilantes, para fins de renovação da Carteira Nacional de Vigilante.


A sentença julgou procedente o pedido. Sem condenação em honorários advocatícios, a teor do artigo 25da lei 12.016/2009. Reexame necessário na forma da lei.


Em apelação, a União Federal pugnou pela reforma da sentença.


Com contrarrazões, os autos foram remetidos a esta Corte.


O Ministério Público Federal opinou pela manutenção da sentença.


Dispensada a revisão, na forma regimental.


É o relatório.



Mairan Maia
Desembargador Federal Relator


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APELAÇÃO/REEXAME NECESSÁRIO Nº 0003218-73.2011.4.03.6000/MS
2011.60.00.003218-6/MS
RELATOR : Desembargador Federal MAIRAN MAIA
APELANTE : Uniao Federal
ADVOGADO : GUSTAVO HENRIQUE PINHEIRO DE AMORIM
APELADO : CACILDO GIMENES DE MORAES
ADVOGADO : ALCEU DE ALMEIDA REIS FILHO e outro
REMETENTE : JUIZO FEDERAL DA 1 VARA DE CAMPO GRANDE > 1ªSSJ > MS
No. ORIG. : 00032187320114036000 1 Vr CAMPO GRANDE/MS

VOTO

O artigo 5º da Constituição Federal prevê em seu inciso LVII o princípio da não-culpabilidade, ou da presunção de inocência, segundo o qual ninguém será considerado culpado até o trânsito em julgado de sentença penal condenatória.


Assim sendo, a existência de inquérito policial e a mera expectativa de eventual sentença penal condenatória não tem o condão de causar os seus obstáculos e feitos. Nesse sentido, decidiu o Supremo Tribunal Federal no julgamento do HC n 89.501, cujo relator foi o Ministro Celso de Mello:


"O postulado constitucional da não-culpabilidade impede que o Estado trate, como se culpado fosse, aquele que ainda não sofreu condenação penal irrecorrível.
A prerrogativa jurídica da liberdade - que possui extração constitucional (CF, art. 5º, LXI e LXV) - não pode ser ofendida por interpretações doutrinárias ou jurisprudenciais, que, fundadas em preocupante discurso de conteúdo autoritário, culminam por consagrar, paradoxalmente, em detrimento de direitos e garantias fundamentais proclamados pela Constituição da República, a ideologia da lei e da ordem.
Mesmo que se trate de pessoa acusada da suposta prática de crime hediondo, e até que sobrevenha sentença penal condenatória irrecorrível, não se revela possível - por efeito de insuperável vedação constitucional (CF, art. 5º, LVII) - presumir-lhe a culpabilidade.
Ninguém pode ser tratado como culpado, qualquer que seja a natureza do ilícito penal cuja prática lhe tenha sido atribuída, sem que exista, a esse respeito, decisão judicial condenatória transitada em julgado.
O princípio constitucional da não-culpabilidade, em nosso sistema jurídico, consagra uma regra de tratamento que impede o Poder Público de agir e de se comportar, em relação ao suspeito, ao indiciado, ao denunciado ou ao réu, como se estes já houvessem sido condenados, definitivamente, por sentença do Poder Judiciário. Precedentes.". (HC 89.501), relator Ministro Celso de Mello, DJ: 16/03/2007)

A respeito do tema, manifestou-se a jurisprudência:


"CONSTITUCIONAL. ADMINISTRATIVO. CONCURSO PÚBLICO. POLÍCIA MILITAR. CANDIDATO. ELIMINAÇÃO. INVESTIGAÇÃO SOCIAL. ART. 5º, LVII, DA CF. VIOLAÇÃO.
I - Viola o princípio constitucional da presunção da inocência, previsto no art. 5º, LVII, da Constituição Federal, a exclusão de candidato de concurso público que responde a inquérito ou ação penal sem trânsito em julgado da sentença condenatória . Precedentes.
II - Agravo regimental improvido."
(STF, RE-AgR 559135, Ministro Ricardo Lewandowski, julgado em 20/05/2008)

"Por força do disposto no artigo 5.º, inc. LVII, da CR/1988, que não limita a aplicação do princípio da presunção de inocência ou da não-culpabilidade ao âmbito exclusivamente penal, também na esfera administrativa deve ser referido princípio observado.
(STJ, Mandado de Segurança n.º 11.396/PR, relatora Ministra Maria Thereza de Assis Moura, (DJe 3/12/2007)

DIREITO CONSTITUCIONAL. DIREITO ADMINISTRATIVO. DIREITO PROCESSUAL CIVIL. MANDADO DE SEGURANÇA. AUSÊNCIA DE INTIMAÇÃO PESSOAL DO REPRESENTANTE DA UNIÃO FEDERAL. VIGILANTE . ANTECEDENTES CRIMINAIS. PROCESSO CRIMINAL EM ANDAMENTO. EXERCÍCIO DA PROFISSÃO. CURSO DE RECICLAGEM E LEI Nº 7.102/1983. POSSIBILIDADE. PRINCÍPIO DA PRESUNÇÃO DE INOCÊNCIA. DIREITO AO EXERCÍCIO DA PROFISSÃO. DESFECHO DA AÇÃO PENAL COM SENTENÇA ABSOLUTÓRIA TRANSITADA EM JULGADO. CONCESSÃO DA SEGURANÇA.
1. Não há que se falar em nulidade do processo, sob a alegação de ausência de intimação pessoal do representante da União, pois, no caso dos autos, em que pese não ter sido a instituição intimada, não decorreu disso qualquer prejuízo para a defesa de interesse público a oferecer justa causa para a anulação de qualquer ato processual. Com efeito, a Advocacia Geral da União teve conhecimento da sentença proferida, em face de vista dos autos, tendo apresentado, tempestivamente e sem nenhuma dificuldade, o recurso de apelação. Portanto, restou sanada a falta de intimação pessoal da União, de modo que não adveio disso qualquer prejuízo, sendo aplicável ao caso o princípio pas de nulittè sans grief, pois, frise-se, não se justifica a anulação de qualquer ato processual quando não restar demonstrado dano capaz de legitimar a providência requerida.
2. No mérito da causa, pretende o impetrante obter ordem judicial para determinar à autoridade impetrada que não objete a sua participação em curso de reciclagem para vigilantes, necessário para o exercício pleno de sua profissão, ainda que respondesse, quando da impetração, a processo criminal.
3. De fato, em que pese o apelado de fato ter respondido aos termos de ação penal, em trâmite quando do ajuizamento deste mandamus, foi absolvido, porém, de qualquer forma, não teria aquela o condão de obstar o livre exercício de sua profissão, em face do princípio da presunção de inocência, que se consubstancia no direito da pessoa de não ser declarada culpada senão após o trânsito em julgado da decisão condenatória , sendo certo que, in casu, frise-se, sobreveio sentença absolutória naquele feito, já transitada em julgado.
4. Com efeito, dispõe o artigo 5º, inciso LVII, da Constituição Federal de 1988, que "ninguém será considerado culpado até o trânsito em julgado da sentença penal condenatória ", consagrando, assim, o princípio da inocência, que se constitui num dos pilares do estado democrático de direito e direito fundamental da pessoa humana.
5. Quanto ao disposto na Lei nº 7.102, de 20 de junho de 1983, que dispõe, dentre outros assuntos, sobre a prestação de serviços de vigilância, de fato o artigo 12, caput, exara que os diretores e demais empregados das empresas especializadas não poderão ter antecedentes criminais registrados e, com relação ao vigilante , a lei trata dos requisitos para o exercício da profissão no artigo 16 e, no inciso VI, da mesma forma exige a inexistência de registro de antecedentes criminais.
6. Ora, trata-se de lei anterior à promulgação da Carta Política de 1988, que consagra o princípio da presunção da inocência como um dos pilares do edifício dos direitos e garantias individuais, sendo de rigor, portanto, afastar a interpretação literal de tais dispositivos legais, pois, sob essa ótica, estariam em clara colidência com a norma constitucional, sendo, no entanto, possível asseverar que são compatíveis com o disposto na Constituição quando se entender que os antecedentes criminais decorrem de decisão transitada em julgado, hipótese em que o requisito se funda em justa causa, restando, assim, atendida a finalidade social da aplicação da lei.
7. Em suma, afastadas as preliminares argüidas pela União Federal, no mérito, o impetrante tem direito líquido e certo de participar do curso de reciclagem para vigilante s, pois, em que pese responder a processo criminal quando do ajuizamento do presente mandado de segurança, não existia nenhuma condenação criminal transitada em julgado, devendo ser considerado inocente, por incidência no caso do princípio da presunção de inocência, o que já é plenamente suficiente para manter a sentença que concedeu a segurança e garantiu sua participação no referido curso, acrescentando-se, apropriadamente nessa ocasião, para reforçar o direito do impetrante, o fato de sua absolvição posterior na referida ação penal, impondo-se, pois, a confirmação da sentença fustigada.
8. Precedentes da Corte e demais Tribunais Regionais Federais.
9. Apelação e remessa oficial a que se nega provimento.
(TRF3, AMS 200861040064499, relator Juiz Federal Convocado Valdeci dos Santos, DJF3 CJ1: 02/08/2010)

"MANDADO DE SEGURANÇA. REMESSA OFICIAL. CURSO DE RECICLAGEM DE FORMAÇÃO DE VIGILANTE . REGISTRO. PRESUNÇÃO DE INOCÊNCIA. POSSIBILIDADE.
É ilegal o ato administrativo que indefere registro de curso de reciclagem de vigilante , antes que venha a transitar sentença penal condenatória .
Remessa oficial improvida."
(TRF4, APELREEX 00056794820094047200, relator Desembargador Federal Nicolau Konkel Júnior, D.E. 10/03/2010)

"Constitucional. Administrativo. Apelação Cível. vigilante . Curso de reciclagem. Impedimento à efetivação da matrícula. Ação penal ainda em curso. Decreto 89.056/83. Portaria nº 387/2006-DG/DPF, art. 32, parágrafo 8º. Impossibilidade. Ofensa aos princípios da presunção da inocência, da reserva legal e da estabilidade nas relações de emprego. Apelação provida."
(TRF5, AC 2009.83.00.011215-2, Desembargador Federal Frederico Dantas, DJE: 29/01/2010)

"ADMINISTRATIVO. PROFISSÃO DE VIGILANTE . PORTE DE ARMA. INQUÉRITO POLICIAL. NEGATIVA DE REGISTRO. NEGATIVA DE EXPEDIÇÃO DO CERTIFICADO DO CURSO DE RECICLAGEM DE VIGILANTE .
O princípio constitucional da não-culpabilidade, inscrito no art. 5º, LVII, da Carta Política não permite que se formule, contra o réu, juízo negativo de maus antecedentes, fundado na mera instauração de inquéritos policiais em andamento.
A exigência legal que estabelece como requisito para o porte de armas de vigilante s a condição de não estarem respondendo a processo criminal ou inquérito policial deve ser interpretada em conformidade com a Constituição, sem redução de texto, no sentido de que tal exigência não impeça o exercício da profissão, embora possa a Administração, com base nessa informação, exigir laudos psicológicos ou técnicos do profissional."
(TRF4, APELREEX 2008.72.08.003674-5, relator Desembargador Federal Sérgio Renato Tejada Garcia, D.E. 10/08/2009)

"ADMINISTRATIVO. VIGILANTE . CURSO DE RECICLAGEM. MATRÍCULA. ANTECEDENTES CRIMINAIS. LEI N. 7.102/1983. DECRETO N. 89.056/1983. PORTARIA N. 387/2006-DG/DPF.
1. Na hipótese, o impetrante exerce a profissão de vigilante ,, para cuja continuidade se exigem a frequência e o aproveitamento - a cada período de dois anos - de curso de reciclagem (art. 32, §8º, e, Decreto 89.056/83), com registro do certificado sob a responsabilidade da Polícia Federal.
2. Tendo profissão definida, não pode o Poder Público privar o impetrante de seu exercício, sob a mera alegação de que responde a inquérito por denúncia, sem conclusão processual penal com trânsito em julgado. Impõe-se-lhe, primeiro, prestigiar os princípios do estado de inocência e da estabilidade nas relações de emprego.
3. Apelação e remessa oficial, tida por interposta, desprovidas. Sentença concessiva da segurança confirmada."
(TRF1, relator Juiz Federal Convocado Carlos Augusto Pires Brandão, e-DJF1: 21/09/2009)

In casu, embora o impetrante esteja réu em ação penal não houve condenação com trânsito em julgado e, portanto, não pode sofrer qualquer tipo de restrição aos seus direitos em virtude desse fato.


Destarte, não se pode obstar sua participação no curso de reciclagem de vigilantes, que lhe é essencial, sob pena de ofensa ao princípio da presunção de inocência e da estabilidade nas relações de emprego.


Como observado pelo juiz singular, ao proferir a sentença:


No presente caso, o impetrante comprova ter concluído o curso de formação de vigilantes (fls. 23), bem como demonstra ter sido impedido de participar do curso de reciclagem, em razão de figurar como réu em ação penal, ainda em trâmite (fls. 18-19). Dessa forma, verifica-se que ele foi privado do exercício de sua profissão sem que houvesse sentença condenatória, transitada em julgado, prolatada em seu desfavor, o que atenta contra os princípios do estado de inocência e da estabilidade das relações de emprego.
(...)
Por outro lado, quanto à arguição, apresentada pela autoridade impetrada, no sentido da impossibilidade de o impetrante utilizar-se de arma de fogo, no desempenho do seu trabalho, há que se ressaltar que exigência legal contida no Estatuto do Desarmamento (Lei nº 10.826/03), que estabelece como requisito para o porte de armas de vigilantes, a condição de não estarem respondendo a processo criminal ou inquérito policial, não se coaduna com a ordem constitucional vigente, e deve ser interpretada em conformidade com a Constituição, sem redução de texto, no sentido de que tal exigência não impeça o exercício da profissão, embora a Administração possa tomar as providências que entender cabíveis, para a averiguação da aptidão do profissional.

Ante o exposto, voto por negar provimento à apelação e à remessa oficial.



Mairan Maia
Desembargador Federal Relator


Documento eletrônico assinado digitalmente conforme MP nº 2.200-2/2001 de 24/08/2001, que instituiu a Infra-estrutura de Chaves Públicas Brasileira - ICP-Brasil, por:
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Data e Hora: 23/02/2012 16:31:41