Diário Eletrônico

PODER JUDICIÁRIO

TRIBUNAL REGIONAL FEDERAL DA 3ª REGIÃO

D.E.

Publicado em 24/05/2012
APELAÇÃO CRIMINAL Nº 0003792-34.2009.4.03.6108/SP
2009.61.08.003792-0/SP
RELATOR : Desembargador Federal ANDRÉ NEKATSCHALOW
APELANTE : LUIZ FERNANDO COMEGNO
ADVOGADO : LUIZ FERNANDO COMEGNO e outro
APELADO : Justica Publica
No. ORIG. : 00037923420094036108 1 Vr BAURU/SP

EMENTA

PROCESSUAL PENAL. COMPETÊNCIA. CÓDIGO DE PROCESSO PENAL, ART. 85. EXCEÇÃO DA VERDADE. PRERROGATIVA DE FUNÇÃO. DIFAMAÇÃO. INAPLICABILIDADE. EXCEÇÃO DA VERDADE. VERSÃO DO EXCIPIENTE QUE RESTOU ISOLADA NOS AUTOS. IMPROCEDÊNCIA.
1. Entende-se que o art. 85 do Código de Processo Penal, que estabelece o foro por prerrogativa de função para a exceção da verdade em delitos contra a honra, não é aplicável quando se tratar de difamação, pois esta não exige, para sua tipificação, que tenha sido atribuído ao ofendido fato definido como crime que, por seu turno, ensejaria aquela competência (NUCCI, Guilherme de Souza, Código de Processo Penal comentado, 8ª ed., São Paulo, Revista dos Tribunais, 2008, p. 257, n. 9).É nesse sentido a jurisprudência dos Tribunais Superiores (STF, EV 601, Rel. Min. Paulo Brossard, j. 26.08.93; EV 541 QO, Rel. Min. Sepúlveda Pertence, j. 22.10.92; STJ, HC n. 29862, Rel. Min. Paulo Gallotti, j. 21.09.04).
2. Não cabe aqui discutir o ânimo que teria orientado a conduta do recorrente, isto é, se teria ele o dolo exigível pelo tipo. Também não é pertinente debater a eficácia de sua retratação. Também não se deve perquirir a respeito de uma suposta necessidade de o recorrente averiguar, previamente, se os fatos teriam ocorrido ou não como mencionados em sua petição. Tudo isso é matéria que comporta melhor apreciação na ação penal. O que aqui interessa é saber se é verdadeiro o fato atribuído pelo recorrente à Magistrada. Nesse ponto, força convir que os elementos de prova não revelam que, efetivamente, a estagiaria Karla teria interrogado o acusado "Chico Moura". Para assim concluir, não é imprescindível decidir se este teria "mentido" ou não, devendo-se sopesar sobretudo as declarações da própria estagiária. Nesse sentido, não vinga a objeção de que ela se "incriminaria" ou de que de qualquer modo ela "se prejudicaria". Como visto, todos os elementos de prova coligidos nos autos apóiam suas declarações, de sorte que não se sustenta a objeção.
3. Preliminar rejeitada. Recurso desprovido.

ACÓRDÃO

Vistos e relatados estes autos em que são partes as acima indicadas, decide a Egrégia Quinta Turma do Tribunal Regional Federal da 3ª Região, por unanimidade, rejeitar a preliminar deduzida e negar provimento ao recurso, nos termos do relatório e voto que ficam fazendo parte integrante do presente julgado.


São Paulo, 14 de maio de 2012.
Andre Nekatschalow
Desembargador Federal Relator


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APELAÇÃO CRIMINAL Nº 0003792-34.2009.4.03.6108/SP
2009.61.08.003792-0/SP
RELATOR : Desembargador Federal ANDRÉ NEKATSCHALOW
APELANTE : LUIZ FERNANDO COMEGNO
ADVOGADO : LUIZ FERNANDO COMEGNO e outro
APELADO : Justica Publica
No. ORIG. : 00037923420094036108 1 Vr BAURU/SP

RELATÓRIO

Trata-se de apelação criminal interposta contra a decisão de fls. 236/239, que rejeitou exceção da verdade oposta por Luiz Fernando Comegno com relação aos fatos que estão sendo apurados na Ação Penal n. 2008.61.08.001840-3.

Apela o excipiente com as seguintes razões:

a) merece reforma a decisão que rejeitou a exceção da verdade, para que seja determinado que o processo, o qual já se encontra com instrução concluída, seja remetido ao Tribunal Regional Federal, dado que a excepta, ora recorrida, ocupa o cargo de Juiz Federal, ensejando portanto o foro privilegiado, o que implica carecer ao MM. Juízo a quo de jurisdição para a espécie;
b) a decisão proferida pelo MM. Juízo a quo deve ser declarada nula;
c) o recorrente ajuizou esta exceção da verdade para provar o crime de prevaricação praticado pela Dra. Elidia Aparecida de Andrade Correia, que deixou a sala de audiências no momento do interrogatório do réu Francisco Alberto de Moura e Silva na 2ª Vara Federal Criminal de Bauru;
d) restou provado que a Magistrada não assinou o termo de interrogatório, tampouco o Procurador da República oficiante no feito e os advogados de defesa;
e) consta do termo somente a assinatura do réu e da escrevente de sala, a estagiária Karla Valverde;
f) o MM. Juízo a quo rejeitou o que já havia sido admitido, pois se a exceção não pudesse ter curso, não deveria ter sido processada;
g) o recorrente ajuizou esta exceção uma vez que foi denunciado pelo delito de difamação;
h) ajuizada, foi aceita pelo MM. Juízo a quo, tendo sido devidamente processada, com produção da prova relativa ao mérito;
i) ao término da instrução, esperava-se que os autos fossem remetidos ao Tribunal Regional, sobrevindo surpreendente decisão que rejeitou a exceção, sob o fundamento de que, por referir-se a exceção ao delito de difamação, não haveria razão para remeter os autos ao Tribunal;
j) no entanto, a exceção foi ajuizada para apurar o delito de prevaricação perpetrado por Juíza Federal, de modo que, acima da vontade desta de processar o recorrente, paira o interesse de apurar o crime de prevaricação;
k) o Ministério Público Federal, nos Autos n. 2001.61.08.001588-2 (2ª Vara Federal de Bauru), ao enviar o Ofício de fls. 454/455 à Juíza Federal Dra. Elida, disse textualmente que esta, em tese, ao deixar a sala de audiência, teria cometido o crime de prevaricação;
l) na perspectiva do MM. Juízo a quo, não devem ser enviados os autos ao Tribunal, já que a hipótese não estaria albergada pelo art. 85 do Código de Processo Penal;
m) na difamação, tanto faz os fatos serem verdadeiros ou não; mas isso se a "ofendida" não fosse funcionária pública, condição que exige o julgamento do fato a ela imputado pelo Tribunal;
n) o art. 139, parágrafo único, do Código Penal admite a exceção da verdade quando o ofendido for funcionário público e a ofensa for relativa ao exercício de suas funções;
o) reconhecida a existência do crime de prevaricação, tal elidiria o delito de difamação;
p) postula o recorrente que a decisão recorrida seja reformada, uma vez que falta jurisdição ao MM. Juízo a quo, bem como para que seja julgada a exceção da verdade, a qual está devidamente instruída, reconhecendo-se que a MMa. Juíza Federal não se encontrava na sala de audiência quando o réu Francisco Alberto Moura e Silva foi interrogado, seja por não constar sua assinatura no auto, seja porque lá também não estiveram o Procurador da República e o advogado do réu, os quais igualmente não firmaram o interrogatório, do qual constam somente as assinaturas do réu e da estagiária Karla Valverde (fls. 251/259).

O recorrente havia nominado sua impugnação como recurso em sentido estrito, a qual porém foi recebida como apelação (fl. 260.)

O Ministério Público Federal ofereceu contrarrazões (fls. 263/267).

A Ilustre Procuradora Regional da República, Dra. Paula Bajer Fernandes Martins da Costa, manifestou-se pelo não provimento do recurso (fls. 274/281).

O feito fora relatado pela Eminente Juíza Federal Convocada Louise Filgueiras (fls. 283/284) e enviado à revisão do Eminente Des. Fed. Luiz Stefanini (fl. 286).

Requerido o adiamento do julgamento do feito pelo recorrente (fls. 288/290), foi indeferido tal pedido (fl. 292).

Foi requerida reconsideração dessa decisão (fl. 294/295).

Aditado o julgamento (fl. 297).

Dada vista ao defensor constituído (fl. 298).

O feito foi retirado de pauta (fl. 301).

Juntado instrumento de mandato do defensor (fls. 302/303) e pedido de reconsideração (fls. 305/306).

À revisão.

É o relatório.






Andre Nekatschalow
Desembargador Federal Relator


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APELAÇÃO CRIMINAL Nº 0003792-34.2009.4.03.6108/SP
2009.61.08.003792-0/SP
RELATOR : Desembargador Federal ANDRÉ NEKATSCHALOW
APELANTE : LUIZ FERNANDO COMEGNO
ADVOGADO : LUIZ FERNANDO COMEGNO e outro
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VOTO



Imputação. O recorrente foi denunciado pelo delito de difamação, como segue:

Aos 05 de dezembro de 2006 nos autos da Ação criminal de nº 2001.61.08.001588-2, em trâmite na 2ª Vara Federal de Bauru/SP, o acusado imputou fato ofensivo à honra da Juíza Federal Dra. Elidia Aparecida de Andrade Corrêa, pois em petição (cópia às fls. 16/19), juntada àqueles autos, afirmou que referida magistrada abandonou a sala de audiência durante o interrogatório do co-réu Francisco Alberto de Moura Silva, deixando sua estagiária Karla Valverde Castilho a presidir o ato processual, confirmando tal fato a ausência de sua assinatura no termo de interrogatório do réu.
Conforme se verifica no terceiro parágrafo do documento de fl. 17, afirmou o denunciado, textualmente que:
"Já em relação ao co-réu Francisco, parece-nos, data máxima vênia, que este foi "interrogado" pela Estagiária de Direito "Karla", eis que a Magistrada - Dra. Elidia Aparecida Corrêa - houvera deixado a sala de audiência (mesmo que temporariamente), tanto que deixou de assinar o termo de interrogatório"
Ante tal afirmação o Juiz Federal Dr. Heraldo Garcia Vila (que sucedeu a Dra. Elídia na condução do citado processo), determinou, em decisão datada de 04 de junho de 2007 (cópia às fls. 22/26), que fosse a vítima cientificada da imputação ofensiva a sua honra.
Outrossim. a Juíza Federal, Ora. Elídia. tomando ciência do fato, representou, mediante o Ofício nº 84/2007 - GAB01, de 14 de agosto de 2007 (fl. 06), ao Ministério Público Federal, para adoção das providências pertinentes, tendo em vista as imputações a ela feitas de fatos inverídicos e desonrosos à sua conduta profissional.
Instaurado o competente inquérito policial, foi ouvida a estagiária Karla Valverde Castilho, que à época dos fatos assessorava a Juíza Federal Elídia Aparecida de Andrade Corrêa, nas audiências, tendo declarado à fl. 113, em síntese, que nunca realizou interrogatório de Francisco Alberto sem a presença da Exma. Juíza, sendo esta muito dedicada em seu labor. Por fim, concluiu que não tinha condições de conduzir a um interrogatório sozinha por ser estagiária e estar em formação.
O denunciado ao prestar declarações à 11. 128 afirmou que agiu de acordo com sua profissão como defensor do réu Ézio Rahal e que não presenciou o fato imputado vez que foi o co-réu Francisco Alberto que narrou-lhe o ocorrido. Ademais, asseverou que não teve a intenção de ofender a Juíza e que se retrata caso a magistrada tenha se sentido ofendida.
Ocorre que Francisco Alberto de Moura e Silva, ouvido às fls. 1 32/133, não confirmou a versão do denunciado, mas ao contrário, relatou, em síntese, que em momento algum a Juíza Federal Elídia se retirou da sala em que ocorria seu interrogatório e deixou outra pessoa conduzindo o ato. Afirmou também que Luiz Fernando nunca foi seu advogado e que nunca conversaram sobre o fato em tela. No mais, asseverou que a ausência de assinatura da Exma. Juíza no Termo de seu interrogatório ocorreu devido a quantidade de interrogatórios que ocorreram no mesmo dia.
De maneira que o denunciado fez tal afirmação calcado tão somente na mera irregularidade da ausência de assinatura da Magistrada no temo de interrogatório. Depois ainda tentou eximir-se de responsabilidade afirmando que o interrogado é que teria lhe informado sobre a ausência da Juíza, versão que não foi confirmada.
Como é cediço, cumpre aos magistrados presidir e exercer a polícia das audiências, inclusive determinando o que for conveniente à manutenção da ordem e se necessário requisitando-se a força pública, que ficará exclusivamente à sua disposição - artigos 791 a 797 do Código de Processo Penal.
Assim, a afirmação levada a efeito pelo denunciado atinge a honra objetiva da Juíza Federal pois imputa-lhe fato que, por desidioso, ofende-lhe a reputação. Deveras, pois se verdadeiro fosse o fato imputado pelo denunciado, poderia inclusive gerar a nulidade do ato processual e dos subsequentes. Não é por outro motivo que incumbe ao juiz, na forma como disciplina o artigo 251 do Código de Processo Penal prover à regularidade do processo e manter a ordem no curso dos respectivos atos.
Portanto, a postura do denunciado amolda-se ao tipo penal da difamação, definido no artigo 139 do Código Penal: Difamar alguém, imputando-lhe fato ofensivo à sua reputação.
Vale pontuar, outrossim, que no caso não se aplica a excludente de ilicitude expressa no art. 141, I do Código Penal, vez que a ofensa irrogada contra a Juíza da causa e, em tal hipótese, o advogado não se encontra amparado pela imunidade judiciária e, nem tampouco pela imunidade profissional disciplinada no art. 7º, § 2° da Lei 8.906/94 (Estatuto da OAB).
Cumpre também ressaltar que a pseudo-retratação feita pelo denunciado, em suas dec1arações à autoridade policial (fl. 128), não tem o condão de extinguir a punibilidade de delito, nos termos do art. 107, VI, c/c art. 143 do Código Penal.
Deveras, pois tratando-se na difamação, como é o caso, é a honra objetiva que é atingida, de maneira que somente a retratação cabal, com a reconsideração do que foi afirmado, gera tal efeito. Ocorre que, no caso, o denunciado, em seu interrogatório, não retificou a afirmação anterior para deixar claro e expresso que o fato, por ele imputado à Magistrada Federal, não ocorreu, limitando-se a dizer que se retratava caso a magistrada se sentisse ofendida, como se o fato, por ele imputado à ela, tivesse atingido somente a honra subjetiva.
Posto isso, presentes indícios suficientes de autoria e comprovada a materialidade delitiva, é oferecida a presente DENÚNC1A (art. 145, par. único, Código Penal), requerendo-se que seja instaurada a necessária ação penal, com citação e intimação para apresentação de defesa escrita e acompanhamento dos demais atos processuais, até o final julgamento, sob pena de revelia, sendo, ao final, impostas ao denunciado as sanções legais cominadas pelo artigo 139, c/c art. 141, II, ambos do Código Penal, ouvindo-se no momento processual oportuno seguintes testemunhas (...). (Fls. 120/123)

Competência. Exceção da verdade. Prerrogativa. Difamação. Entende-se que o art. 85 do Código de Processo Penal, que estabelece o foro por prerrogativa de função para a exceção da verdade em delitos contra a honra, não é aplicável quando se tratar de difamação, pois esta não exige, para sua tipificação, que tenha sido atribuído ao ofendido fato definido como crime que, por seu turno, ensejaria aquela competência:


Aplicação do art. 85 à hipótese da difamação: a respeito do cabimento ou não da exceção da verdade, quanto ao crime de difamação, em foro especial, somente porque o ofendido é parte privilegiada, preferimos a posição que restringe o alcance do art. 85. Assim, somente no tocante à calúnia é de se admitir que a exceção da verdade seja julgada pela Instância Superior, constituinte do foro privilegiado do querelante. Tal se dá porque admitida a exceção, deverá ser julgado o detentor do foro especial pelo crime cometido, o que somente poderá ocorrer de acordo com as normas constitucionais a respeito. Por outro lado, tratando de difamação, não há razão para deslocar-se a competência para foro privilegiado, uma vez que nenhum julgamento de delito se fará.
(NUCCI, Guilherme de Souza, Código de Processo Penal comentado, 8ª ed., São Paulo, Revista dos Tribunais, 2008, p. 257, n. 9)

É nesse sentido a jurisprudência dos Tribunais Superiores:


EMENTA: EXCEÇÃO DA VERDADE. Crime contra a honra: Calunia e Difamação, arts. 324 e 325 Código Eleitoral. COMPETÊNCIA originaria do STF. Art. 102, I, "b" e "c", da CF. c/c. art. 85 do CPP. Foro por prerrogativa de função restrito as infrações penais comuns, sejam elas veiculadas por meio de ação ou por meio de exceção. Exceção admitida tão somente na parte em que veicula imputação do crime de calunia e nessa parte julgada improcedente. Incompetencia da Corte para conhecer da "exceptio veritate" relacionada a difamação. Remessa dos autos ao juízo de origem competente para, nessa parte, dela conhecer.
(STF, EV 601, Rel. Min. Paulo Brossard, j. 26.08.93)
Ementa - STF: competência originaria: julgamento da exceção da verdade da imputação da pratica de fato criminoso oposta a titular do foro do STF por prerrogativa de função. 1. Reafirmação, por maioria de votos, da jurisprudência que extrai, da competência penal originaria do STF para julgar determinadas autoridades (CF, art. 102, I, "b" e "c"), a legitimidade constitucional do art. 85 C. Pr. Pen., quando lhe atribui competência para julgar a exceção da verdade oposta aqueles dignitarios. 2. Dado, porem, esse fundamento da validade constitucional essa competência do STF se restringe a hipótese em que a exceção da verdade tenha por objeto a imputação da pratica de fato criminoso a titular de foro por prerrogativa de função, ou seja, quando O excipiente esteja a responder por calunia e não por simples difamação.
(STF, EV 541 QO, Rel. Min. Sepúlveda Pertence, j. 22.10.92)
HABEAS CORPUS. DIFAMAÇÃO PRATICADA POR ADVOGADO CONTRA JUIZ DE DIREITO. ARTIGOS 21 E 23, II, DA LEI Nº 5.250/67. EXCEÇÃO DA VERDADE. OFENDIDO COM PRERROGATIVA DE FORO ESPECIAL. INAPLICABILIDADE DO ARTIGO 85 DO CÓDIGO DE PROCESSO PENAL. (...).
1. Conforme entendimento pacificado no Supremo Tribunal Federal, ainda que o ofendido goze de foro especial por prerrogativa de função, não se aplica o disposto no artigo 85 do Código de Processo Penal quando o fato imputado não for definido como crime, mas apenas ofensivo à sua reputação.
(...)
3. Ordem denegada.
(STJ, HC n. 29862, Rel. Min. Paulo Gallotti, j. 21.09.04)

Do caso dos autos. O recorrente foi denunciado pelo delito difamação, em virtude da seguinte afirmação:


"(...) em relação ao co-réu Francisco, parece-nos, data máxima vênia, que este foi 'interrogado' pela Estagiária de Direito 'Karla', eis que a Magistrada - Dra Elidia Aparecida de Andrade Corrêa - houvera deixado a sala de audiência (mesmo que temporariamente), tanto que deixou de assinar o termo de interrogatório do réu" (fl. 35).

Na petição inicial desta exceção da verdade, contudo, entende que haveria crime supostamente perpetrado pela Magistrada:


Trata-se da apuração de crime perpetrado pela Excepta, merecendo ser processada a presente exceção da verdade, já que todos a Excepta, que se diz ofendida, é funcionária pública e a ofensa é relativa ao exercício de suas funções" (parágrafo único do art. 139 do Código Penal). Tem, pois, a Administração Pública o interesse em saber a verdade, pois o funcionário deve ser digno do cargo que ocupa." (Sic, fl. 8)

Constata-se uma certa exacerbação na qualificação jurídica dos fatos atribuídos à Magistrada, de modo a ensejar por via transversa a desclassificação do delito pelo qual o recorrente é acusado para outro mais grave e, reflexamente, ensejar a competência do Tribunal para apurar a verdade dos fatos. No entanto, não se divisa narrativa fática que enseje a competência por prerrogativa de função no âmbito criminal. Ainda que seja do interesse da Administração Pública velar para que os servidores desempenhem suas funções de modo honroso, nem todo desvio dessa norma implica, a fortiori, crime. Na espécie, a denúncia entreviu, na conduta atribuída à Magistrada, uma nulidade processual, cuja declaração efetivamente era o objetivo visado pelo recorrente:


Assim, a afirmação levada a efeito pelo denunciado atinge a honra objetiva daJuíza Federal pois, imputa-lhe fato que, por desidioso, ofende-lhe a reputação. Deveras, pois se verdadeiro fosse o fato imputado pelo denunciado, poderia inclusive gerar a nulidade do ato processual e dos subseqüentes. Não é por outro motivo que incumbe ao juiz, na forma como disciplina o art. 251 do Código de Processo Penal prover à regularidade do processo e manter a ordem no curso dos respectivos atos.
Portanto, a postura do denunciado amolda-se ao tipo penal da difamação, definido no art. 139 do Código Penal: Difamar alguém, imputando-lhe fato ofensivo à sua reputação. (Fl. 122)

Tratando-se, portanto, de ação penal relativa ao delito de difamação, segue-se a inaplicabilidade do art. 85 do Código de Processo Penal, cumprindo apenas esclarecer que o MM. Juízo a quo, ao dizer "rejeito" está, evidentemente, "julgando improcedente" a exceção.

Mérito. O excipiente não logrou comprovar a verdade dos fatos atribuídos à Magistrada.

Conforme se verifica da petição protocolizada em 05.12.06 (fls. 34/37), a estagiária de Direito "Karla" teria interrogado o acusado Francisco Alberto de Moura Silva, o que explicaria não ter sido subscrito o termo do respectivo interrogatório judicial realizado em 18.11.02 (fls. 28/32).

Contudo, a própria estagiária, Karla Valverde Castilho, afirmou na fase extrajudicial ter inquirido o referido acusado enquanto que a Magistrada responsável pelo processo-crime não se encontrava na sala de audiências (fl. 68). Negou novamente que semelhante fato tenha ocorrido, quando ouvida na fase judicial (mídia, fl. 167).

O mencionado correu daquele feito, Francisco Alberto de Moura Silva, negou perante a Autoridade Policial que tenha sido interrogado nos termos em que esse ato processual foi descrito pelo recorrente (fls. 87/88).

Do mesmo modo, o advogado Luiz Celso de Barros, ouvido na fase judicial deste procedimento, não confirma a versão do recorrente, no sentido de que a Magistrada deixava o recinto de audiências enquanto os interrogatórios seriam colhidos pela estagiária (mídia, fl. 190).

A testemunha Fabrício Carrer, Procurador da República, limita-se a fazer referências às peças processuais concernentes ao processo-crime em questão, não tendo confirmado a versão oferecida pelo recorrente (mídia, fl. 189).

A Magistrada, Dra. Elidia Aparecida de Andrade Correa, a par de negar ter permitido que a estagiária procedesse ao interrogatórios dos acusados, esclareceu que, em verdade, havia uma parte inicial das respectivas declarações que eram aproveitadas de outros interrogatórios já colhidos, uma vez que diziam respeito ao histórico pessoal do acusado, sendo que a segunda parte de cada qual dos interrogatórios era específico ao processo-crime em questão: foram instaurados diversos deles e, em relação a cada um, o acusado era indagado a respeito. Aduz que pode ter ocorrido, por lapso, a falta de assinatura no termo do interrogatório do acusado Francisco Alberto de Moura Silva, mas a presença da Magistrada é de todo modo demonstrada pelo termo de deliberação por ela subscrito (mídia, fl. 206; cfr. fls. 28/32, 33).

O próprio excipiente, a rigor, não confirma os fatos. Ao ser ouvido pelo MM. Juízo a quo, não chega a dizer, expressamente, que os fatos teriam ocorrido tal qual descritos em sua petição, isto é, que a estagiária Karla foi quem interrogara Francisco Alberto de Moura Silva ou "Chico Moura", como é referido várias vezes nos autos. Esclareceu que entrevistou-se com esse acusado e com seu cliente, Ézio Rahal Melillo, vindo assim a tomar conhecimento de que a Juíza não se encontrava na sala de audiências por ocasião do interrogatório daquele, dando ensejo então a que, no exercício de sua atividade profissional e sem a intenção de denegrir a reputação da Magistrada, protocolizar petição pela qual postulava a anulação do processo. Manifestou ainda sua retratação por eventual ofensa irrogada (mídia, fl. 206; cfr. interrogatório policial, fl. 83).

Não cabe aqui discutir o ânimo que teria orientado a conduta do recorrente, isto é, se teria ele o dolo exigível pelo tipo. Também não é pertinente debater a eficácia de sua retratação. Também não se deve perquirir a respeito de uma suposta necessidade de o recorrente averiguar, previamente, se os fatos teriam ocorrido ou não como mencionados em sua petição. Tudo isso é matéria que comporta melhor apreciação na ação penal. O que aqui interessa é saber se é verdadeiro o fato atribuído pelo recorrente à Magistrada. Nesse ponto, força convir que os elementos de prova não revelam que, efetivamente, a estagiaria Karla teria interrogado o acusado "Chico Moura". Para assim concluir, não é imprescindível decidir se este teria "mentido" ou não, devendo-se sopesar sobretudo as declarações da própria estagiária. Nesse sentido, não vinga a objeção de que ela se "incriminaria" ou de que de qualquer modo ela "se prejudicaria". Como visto, todos os elementos de prova coligidos nos autos apóiam suas declarações, de sorte que não se sustenta a objeção.

Ante o exposto, REJEITO a preliminar e NEGO PROVIMENTO ao recurso.

É o voto.







Andre Nekatschalow
Desembargador Federal Relator


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