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EMENTA
ACÓRDÃO
Vistos e relatados estes autos em que são partes as acima indicadas, decide a Egrégia Segunda Turma do Tribunal Regional Federal da 3ª Região, por unanimidade, dar parcial provimento ao recurso dos réus, apenas para reduzir a pena-base para 6 (seis) anos e aplicar a causa de diminuição de pena prevista no art. 33, §4º, da Lei 11.343/06, na fração de 1/6(um sexto), de maneira a fixar a privativa de liberdade em 5 (cinco) anos e 10 (dez) meses de reclusão, e a pena de multa em 486 (quatrocentos e oitenta e seis) dias-multa sobre o valor mínimo legal, nos termos do voto do Senhor Desembargador Federal Relator, acompanhado pelo voto da Senhora Desembargadora Federal Cecilia Mello e pelo voto do Senhor Desembargador Federal Peixoto Junior, este pela conclusão.
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RELATÓRIO
Descrição fática: Consta da denúncia, recebida em 17/01/2011 (fls. 155/156), que, em 14/10/2010, no Aeroporto Internacional de Guarulhos/SP, MARK RALPH HALEY e MARIA MANUELA MULLEN DA SILVA foram presos em flagrante delito quando estavam prestes a embarcar em vôo com destino a Tel Aviv/Israel, trazendo consigo 5.610g (cinco mil, seiscentos e dez gramas) de substância entorpecente conhecida como cocaína, escondida no fundo falso de uma mala que se encontrava no interior da bagagem despachada pelos réus.
Imputação: Art. 33, caput, c. c. art. 40, I, da Lei 11.343/06.
Sentença (fls. 308/390): Publicada em 11/07/2011, a r. sentença prolatada pelo Juízo da 2ª Vara Federal de Guarulhos/SP julgou procedente a pretensão punitiva estatal tal como aduzida na denúncia, a fim de condenar os réus às penas de 8 (oito) anos e 2 (dois) meses de reclusão, em regime inicial fechado, e 816 (oitocentos e dezesseis) dias-multa, fixado o valor do dia-multa em um trigésimo do salário mínimo vigente à época dos fatos.
Apelantes - MARK RALPH HALEY e MARIA MANUELA MULLEN DA SILVA (fls.405/426): pugnam pela absolvição por erro de proibição invencível, ou, ao menos, a redução da pena, por reconhecimento de erro de proibição inescusável.
Pleiteiam a redução da pena-base ao mínimo legal, por estar comprovada a posse de cocaína apenas com relação ao material periciado, estando ausentes outras circunstâncias judiciais desfavoráveis. Requer, também, a incidência da circunstância atenuante da confissão espontânea, ainda que sua aplicação conduza a pena para abaixo do mínimo legal, bem como a fixação da majorante do art. 40, I, da Lei 11.343/06, no patamar mínimo, e a aplicação da causa de diminuição de pena prevista no art. 33, §4º, da Lei 11.343/06 no seu grau máximo.
Por fim, postulam a não aplicação da pena de multa, a substituição da pena privativa de liberdade por restritivas de direitos, a imposição de regime menos severo de cumprimento da pena e a concessão do direito de recorrer em liberdade.
Contrarrazões apresentadas pelo Ministério Público Federal às fls. 429/475.
Parecer da Procuradoria Regional da República (Dra. Maria Iraneide Olinda Santoro Facchini - fls. 489/520): Opina pelo desprovimento do recurso.
É o relatório.
À revisão.
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VOTO
O EXCELENTÍSSIMO SENHOR DESEMBARGADOR FEDERAL RELATOR COTRIM GUIMARÃES:
A materialidade e a autoria delitiva, bem como o dolo do apelante, são incontroversos nesta etapa recursal, mas não custa repisar que ficaram comprovados na instrução criminal diante do auto de apresentação e apreensão (fls. 29/31), pelo laudo preliminar de constatação (fl. 09) e pelo laudo definitivo de exame em substância (fls. 150/153), que atestou que se trata de cocaína a massa líquida de 5.610 (cinco mil, seiscentos e dez) gramas encontrada na bagagem despachada por RALPH.
Não subsiste a insurgência da defesa de que não estaria devidamente demonstrada a materialidade pelo fato de que o exame pericial definitivo da substância foi realizado com uma singela amostra de sete gramas do material apreendido.
As fotos expostas no Laudo Preliminar de Constatação (fl. 09) evidenciam que a totalidade da substância entorpecente apreendida representava uma massa homogênea, sendo desnecessário e inviável o exame pericial de todo o volume de entorpecentes.
Outrossim, é do procedimento ordinário do núcleo de criminalística a separação de apenas uma pequena porção do material avaliado, suficiente para um exame de natureza laboratorial, estendendo-se as conclusões da perícia ao restante do objeto material.
Não merece prosperar a tese defensiva de erro de proibição, seja classificado como invencível como causa excludente da culpabilidade, seja cogitado como inescusável para a minoração da pena.
Disseram os réus em sede policial e perante o juízo que haviam sido contatados pelo esquadrão de combate às drogas da polícia sul-africana (SAPS) para que os informassem caso fossem procurados por organizações de tráfico internacional para alguma empreitada criminosa.
Aduzem que, após tratativas com traficantes nigerianos, aceitaram ir a Buenos Aires buscar um carregamento de drogas que teria como destino final Tel Aviv/Israel, mas que praticaram os ilícitos com o aval da polícia sul-africana, e sob a supervisão do coronel Lappies e do investigador Pierre, mas que, ao final, foram surpreendidos por não encontrar em São Paulo o policial brasileiro que estaria incumbido de lhes dar instruções, conforme havia sido combinado com as autoridades do seu país de origem.
Instada a se manifestar sobre a autenticidade das informações prestadas pelos réus, o Consulado-Geral da África do Sul em São Paulo/SP remeteu ao juízo da instrução um ofício (fl. 214) registrou que:
Conquanto a diligência tenha resultado na confirmação de que houve um contato prévio das autoridades policiais sul africanas com os acusados visando ao planejamento de uma ação monitorada, o documento esclarece que eles praticaram o ilícito ora apreciado sem a autorização os agentes oficiais e contra as suas orientações, agindo exclusivamente em nome próprio.
Ainda que houvesse tal autorização, é certo que o empreendimento de uma ação controlada de âmbito internacional exigiria a concordância da Polícia Federal brasileira, sem o que persiste a ofensa ao ordenamento jurídico pátrio.
Por fim, diante do exposto, não se cogita de má compreensão dos réus no sentido de que tivessem a falsa percepção de que a conduta fosse permitida, eis que o ofício consigna expressamente que eles foram advertidos a não realizá-la antes que fossem providenciados os trâmites da cooperação investigativa internacional.
Passo à análise dos pontos suscitados pelos apelantes concernentes à dosimetria da pena e à sua forma de cumprimento.
No exame da primeira etapa do sistema trifásico, cumpre assinalar que a cocaína estava escondida no fundo falso de uma maleta encontrada no interior da bagagem dos réus, o que não consiste em método mais sofisticado que o usual.
À exceção da quantidade expressiva de entorpecentes apreendidos, as circunstâncias descritas na sentença como negativas aos acusados para embasar a fixação da pena-base em 7 (sete) anos de reclusão são ínsitas à prática do delito em comento ou, no mínimo, estão adstritas à ordinariedade da sua verificação no cotidiano forense. Não servem, dessarte, para embasar o aumento da pena.
Em atenção à preponderância da natureza e da quantidade de drogas, imposta pelo art. 42 da Lei 11.343/06, e à míngua de outros aspectos desabonadores, entendo suficiente à prevenção e repressão do delito a redução da pena-base para 6 (seis) anos de reclusão.
Na segunda fase, pleiteia a reforma da decisão de mérito de primeira instância para que incida a circunstância atenuante da confissão espontânea.
Sem razão os recorrentes. Conforme discorrido anteriormente, os réus confessaram a prática do delito de forma qualificada, ou seja, acrescentando em suas versões elementos caracterizadores de tese exculpante para se esquivar da responsabilidade penal pelos fatos, não fazendo jus à benesse cujo propósito consiste em conferir certeza ao julgador para a condenação.
É o entendimento predominante no colendo Superior Tribunal de Justiça:
Adentrando à terceira etapa do método hungriano, pretende a defesa afastar a incidência da majorante prevista no art. 40, I, da Lei 11.343/06.
Mais uma vez, tal argumento não merece prosperar. Isso porque não há incompatibilidade entre a elementar "exportar", constante do caput do artigo 33, e a incidência da causa de aumento prevista no inciso I do artigo 40, ambos da Lei n.º 11.343/2006.
O caput do art. 33 trata de delito de ação múltipla ou de conteúdo variado. In casu, o réu foi denunciado porque "trazia consigo" substância entorpecente, sendo esta a conduta criminosa. Desta feita, é perfeitamente possível a incidência da causa de aumento pela transnacionalidade do tráfico, pois, como visto, o verbo praticado não foi "exportar", restando afastada a alegação de ocorrência de bis in idem. Este tem sido o entendimento desta Segunda Turma:
Por conseguinte, mantenho a aplicação causa de aumento de pena do art. 40, I, da Lei 11.343/06, no patamar de 1/6 (um sexto).
A seu turno, requer a defesa a aplicação da minorante prevista no art. 33, §4º, da Lei 11.343/06, e a sua fixação no patamar mais elevado.
Em se tratando de "mula", estando presentes os demais requisitos autorizativos, faz o recorrente jus ao benefício penal do mencionado dispositivo, em regra na fração mínima, reservando-se os patamares mais elevados às situações de periculosidade manifestamente reduzida, o que não ocorre na hipótese dos autos.
As demais circunstâncias do delito indicam que os acusados eram apenas elementos fungíveis dentro da estrutura traficante presente no caso, cooptados eventualmente para aplacar suas premências financeiras mediante promessa de pagamento de uma recompensa entre 50 a 60.000 rands (moeda nacional sul-africana).
No mais, embora a corré tenha registros em seu passaporte de viagens ao Brasil e à Argentina no ano de 2008, creio que não é indício suficiente à caracterização de seu envolvimento duradouro com a traficância internacional. Ademais, não foram encontrados apontamentos tanto nas folhas de antecedentes expedidas pelos órgãos brasileiros, como nas certidões enviadas pelo Ministério da Justiça de Portugal (país de origem da acusada - fl. 168) e pela Interpol (fl. 192).
Ausentes provas dos requisitos obstativos ao benefício penal, impõe-se a aplicação da minorante do art. 33, §4º, da Lei 11.343/06, porém em seu patamar mínimo.
Procedidos os cálculos para a definição da pena sob estes novos parâmetros, incidiria sobre a pena-base de 6 (seis) anos de reclusão o acréscimo decorrente da majorante do art. 40, I, da Lei 11.343/06, no patamar de 1/6 (um sexto), e, na sequência, aplica-se a causa de diminuição de pena do art. 33, §4º, da Lei 11.343/06, também à razão de 1/6 (um sexto), de modo a se obter a pena privativa de liberdade de 5 (cinco) anos e 10 (dez) meses de reclusão para ambos.
Feitos os mesmos cálculos com relação à pena de multa, reduzo-a para 486 (quatrocentos e oitenta e seis) dias-multa, calculados sobre o valor de um trigésimo do salário mínimo vigente à época dos fatos.
Em observância ao disposto na redação atual do art. 2º, §1º, da Lei 8.072/90, impõe-se a fixação obrigatória do regime inicial fechado para o cumprimento de pena privativa de liberdade.
Sobre a pena de multa, cumpre apreciar a alegação trazida pela defesa de que a sua imposição em elevado patamar, cotejada com a situação financeira precária do réu, obstaria o cumprimento integral da pena, de forma que ele prosseguiria preso por dívida, havendo infringência ao art. 5º, LXVII, da Constituição Federal.
Embora seja verdadeiro que, em princípio, o procedimento de expulsão do estrangeiro condenado pressuponha o cumprimento integral da sanção penal, cabe frisar que o art. 67 da Lei 6.815/1980 veicula expressamente a possibilidade de que a autoridade competente concretize a expulsão antes do exaurimento da pretensão executória. A conferir:
Deste modo, o regramento da situação jurídica do estrangeiro fornece meios para que não ocorra a aventada prisão civil por dívida, em caso da sua inexequibilidade, que não quedou demonstrada nos autos.
Ainda que assim não fosse, a alegação seria desarrazoada. É que nosso ordenamento jurídico, desde o advento da Lei 9.268/96, não mais prevê a conversão de multa em detenção. A multa, nos termos do art. 51 do CP, após o trânsito em julgado da sentença condenatória é considerada dívida de valor, aplicando-se-lhe as normas da legislação relativa à dívida ativa da Fazenda Pública. Isso, por si só, cumulado com o art. 5º, LXVII, da Constituição Federal, impede privação de liberdade por dívidas, salvo nas hipóteses permitidas pelo texto constitucional, dentre as quais não está a pena de multa.
Por igual, não procede o pedido de substituição da reprimenda corporal por restritivas de direitos.
Não custa recordar que o Supremo Tribunal Federal já decidiu pela inconstitucionalidade das expressões "vedada a conversão em penas restritivas de direitos", constante do § 4º do art. 33 da Lei 11.343/2006, e "vedada a conversão de suas penas em restritivas de direitos", contida no aludido art. 44 do mesmo diploma legal.
É certo, no entanto, que tal posicionamento jurisprudencial não tem o condão de afastar a análise em cada caso concreto dos requisitos do art. 44, do Código Penal, para a conversão da pena privativa de liberdade em restritivas de direitos:
Na presente hipótese, o critério objetivo da quantidade de pena aplicada não autoriza a concessão do benefício, nos termos do inciso I. Nada a deferir portanto.
Por fim, tendo em vista a ameaça à ordem pública e à aplicação da lei penal, aferidas pela gravidade concreta dos fatos apreciados e pelo fato de se tratar de réus estrangeiros sem qualquer vínculo com o Brasil, revela-se necessária a manutenção da excepcional segregação cautelar, com fulcro nos artigos 282 e 312 do Código de Processo Penal.
CONCLUSÃO
Diante do exposto, dou parcial provimento ao apelo dos réus, apenas para reduzir a pena-base para 6 (seis) anos e aplicar a causa de diminuição de pena prevista no art. 33, §4º, da Lei 11.343/06, na fração de 1/6(um sexto), de maneira a fixar a privativa de liberdade em 5 (cinco) anos e 10 (dez) meses de reclusão, e a pena de multa em 486 (quatrocentos e oitenta e seis) dias-multa sobre o valor mínimo legal, restando mantida, no mais, a sentença condenatória.
É o voto.
Documento eletrônico assinado digitalmente conforme MP nº 2.200-2/2001 de 24/08/2001, que instituiu a Infra-estrutura de Chaves Públicas Brasileira - ICP-Brasil, por: | |
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Data e Hora: | 28/05/2012 19:43:21 |