Diário Eletrônico

PODER JUDICIÁRIO

TRIBUNAL REGIONAL FEDERAL DA 3ª REGIÃO

D.E.

Publicado em 15/08/2012
APELAÇÃO/REEXAME NECESSÁRIO Nº 0014203-39.2004.4.03.6100/SP
2004.61.00.014203-2/SP
RELATOR : Desembargador Federal JOHONSOM DI SALVO
APELANTE : JACKSON MAURICIO - prioridade
ADVOGADO : MIRIAN DE FATIMA GOMES e outro
APELADO : Uniao Federal
ADVOGADO : GUSTAVO HENRIQUE PINHEIRO DE AMORIM
REMETENTE : JUIZO FEDERAL DA 9 VARA SAO PAULO Sec Jud SP
No. ORIG. : 00142033920044036100 9 Vr SAO PAULO/SP

EMENTA

DIREITO ADMINISTRATIVO. SERVIDOR MILITAR. DESENVOLVIMENTO DE ESQUIZOFRENIA DURANTE A PRESTAÇÃO DO SERVIÇO MILITAR OBRIGATÓRIO. FALTA DE COMPROVAÇÃO DO NEXO DE CAUSALIDADE ENTRE O DANO E QUALQUER AÇÃO OU OMISSÃO DO ESTADO. INEXISTÊNCIA DE DIREITO A INDENIZAÇÃO. APELAÇÃO IMPROVIDA.
1. Diante da existência de omissão, contradição ou obscuridade, os embargos de declaração podem ter efeitos infringentes, sendo manifestamente improcedente a insurgência do apelante em face do acolhimento dos embargos opostos pela União objetivando sanar obscuridade de sentença ultra petita.
2. O fato de o vínculo entre a Administração e o militar tratar-se de relação de Direito Administrativo não pode eximir o Estado de responder pelos danos causados ao servidor militar durante o serviço castrense.
3. No entanto, a fim de que surja para o Estado o dever de indenizar devem estar perfeitamente delineados e comprovados nos autos a ação ou omissão estatal, o dano e o nexo de causalidade entre eles, bem como a ausência de causa excludente de responsabilidade. Ou seja, não basta, para efeito de responsabilidade do Estado, que a doença tenha eclodido durante o período de prestação do serviço militar. É necessário que fique demonstrado que a doença decorreu da atividade militar. É dizer: deve haver prova de que a moléstia foi causada pela atividade militar.
4. O conjunto probatório não permite concluir que a doença mental apresentada pelo apelante tenha relação de causa e efeito com a atividade militar. É dizer: não há prova do nexo de causalidade entre a esquizofrenia desenvolvida pelo apelante e qualquer ação ou omissão imputável ao Estado, que refuja daquelas consideradas normais no contexto militar, como por exemplo a submissão a condições desumanas, maus-tratos, má alimentação, etc.
5. Diante da falta de comprovação de nexo etiológico entre a moléstia apresentada e a atividade militar desenvolvida, o apelante não faz jus a indenização por danos material e moral.
6. Os requisitos para a concessão da reforma, benefício de natureza previdenciária, e de indenização por ato ilícito são diferentes, sendo manifestamente improcedente o argumento segundo o qual a sentença - posteriormente corrigida na via dos embargos de declaração - seria ilógica ao lhe conceder o direito à reforma e julgar improcedente os pedidos de indenização.
7. Apelação improvida.


ACÓRDÃO

Vistos e relatados estes autos em que são partes as acima indicadas, decide a Egrégia Primeira Turma do Tribunal Regional Federal da 3ª Região, por unanimidade, negar provimento à apelação, nos termos do relatório e voto que ficam fazendo parte integrante do presente julgado.


São Paulo, 07 de agosto de 2012.
Johonsom di Salvo
Desembargador Federal


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APELAÇÃO/REEXAME NECESSÁRIO Nº 0014203-39.2004.4.03.6100/SP
2004.61.00.014203-2/SP
RELATOR : Desembargador Federal JOHONSOM DI SALVO
APELANTE : JACKSON MAURICIO - prioridade
ADVOGADO : MIRIAN DE FATIMA GOMES e outro
APELADO : Uniao Federal
ADVOGADO : GUSTAVO HENRIQUE PINHEIRO DE AMORIM
REMETENTE : JUIZO FEDERAL DA 9 VARA SAO PAULO Sec Jud SP
No. ORIG. : 00142033920044036100 9 Vr SAO PAULO/SP

RELATÓRIO

O Excelentíssimo Senhor Desembargador Federal Johonsom di Salvo, Relator:

Trata-se de ação ordinária proposta em 21.05.2004 por JACKSON MAURICIO em face da UNIÃO objetivando a condenação da ré a: (1) pagar-lhe pensão vitalícia em virtude da incapacidade laborativa, com base no último salário por ele auferido na empresa Bauruense, para a qual trabalhava quando ingressou no serviço militar; (2) indenizar-lhe os gastos com convênio médico, remédios e consultas, com a constituição de capital na forma do art. 602 do Código de Processo Civil; e (3) indenizar-lhe os danos morais sofridos em virtude da esquizofrenia, no valor estimado de R$ 100.000,00, ou outro que vier a ser fixado pelo Juízo.

Para tanto, narra que se alistou para prestar serviço militar obrigatório na Força Aérea Brasileira, no ano de 1994, em perfeito estado de saúde física e psíquica. No entanto, enfraquecido em virtude das precárias condições de trabalho, adquiriu uma forte gripe e foi internado no Hospital Militar. Diante da falta de cuidados em que se encontrava, o seu genitor o transferiu para o Hospital Nove de Julho, onde se constatou que estava intoxicado por um medicamento chamado ALDOL. Após a internação, reassumiu suas funções perante o Ministério da Aeronáutica, mas foi diagnosticado com esquizofrenia pela Tenente da Aeronáutica e médica, Dra. Maria Regina Rocha Ramos. Em 09.08.1995 foi considerado incapaz pela Junta de Inspeção de Saúde da Aeronáutica. Sustenta que a doença foi adquirida na prestação do serviço militar e que em virtude dela está incapacitado para a realização de qualquer trabalho.


Em 24.03.2011 o MM. Magistrado a quo proferiu a sentença de fls. 372/375, julgando parcialmente procedente o pedido para condenar a ré a proceder a reforma do autor, a partir da data em que foi julgado incapaz, com remuneração calculada com base no soldo do grau hierárquico imediato ao que possuía na ativa, devendo pagar as parcelas vencidas e vincendas, monetariamente corrigidas desde o respectivo vencimento, de acordo com os índices constantes do Manual de Orientação de Procedimentos para Cálculos da Justiça Federal, aprovado pela Resolução nº 134, de 21.12.2010, do CJF, acrescidas de juros de mora de 6% ao ano, a partir da citação. Rejeitou os pedidos de condenação em indenização por danos materiais e morais. Em face da sucumbência recíproca, as custas e despesas processuais serão rateadas entre as partes, que arcarão com os honorários dos respectivos patronos.

Em face da sentença a União opôs embargos de declaração sustentando padecer a sentença de obscuridade, tendo em vista que o pedido de reforma sequer foi formulado pelo autor.

Os embargos foram acolhidos para sanar obscuridade, passando a sentença a ter o seguinte dispositivo: "Ante o exposto, julgo improcedente o pedido, condenando o autor ao pagamento de custas processuais e honorários advocatícios, fixados em 10% sobre o valor da causa atualizado, devendo, no entanto, ser observadas as disposições da Lei nº 1.060/50, por se tratar de beneficiário da Justiça Gratuita".

Irresignado, JACKSON MAURICIO interpôs recurso de apelação sustentando, em síntese, que: (a) a sentença não poderia ter sido alterada em virtude da oposição de embargos de declaração, pois estes não se prestam a mudar o julgamento em seu mérito; (b) antes do início da prestação do serviço militar, gozava de boa saúde física e psíquica, sendo que após dois meses de caserna passou à condição de incapaz para qualquer trabalho; (c) é ilógica a sentença ao deferir-lhe o direito à reincorporação, com o recebimento de soldos de todo o período, e negar-lhe a indenização pleiteada. Assim, pugna pela reforma da sentença para que a União seja condenada a indenizá-lo pelos danos material e moral sofridos.

Contrarrazões às fls. 417/419.

O parecer da Procuradoria Regional da República é pelo provimento da apelação (fls. 423/427).

Dispensada a revisão, nos termos regimentais.

É o relatório.


Johonsom di Salvo
Desembargador Federal


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APELAÇÃO/REEXAME NECESSÁRIO Nº 0014203-39.2004.4.03.6100/SP
2004.61.00.014203-2/SP
RELATOR : Desembargador Federal JOHONSOM DI SALVO
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VOTO

O Excelentíssimo Senhor Desembargador Federal Johonsom Di Salvo, Relator:


Trata-se de recurso de apelação interposto pelo autor em face de sentença que julgou improcedente os pedidos de indenização de dano moral e material, por falta de comprovação do nexo de causalidade entre a natureza das tarefas militares e a doença do autor.

Inicialmente, destaco que diante da existência de omissão, contradição ou obscuridade, os embargos de declaração podem ter efeitos infringentes, sendo manifestamente improcedente a insurgência do apelante em face do acolhimento dos embargos opostos pela União objetivando sanar obscuridade de sentença ultra petita.

Adentrando no mérito, consigno que o fato de o vínculo entre a Administração e o militar tratar-se de relação de Direito Administrativo não pode eximir o Estado de responder pelos danos causados ao servidor militar durante o serviço castrense. Ademais, o C. STJ já firmou entendimento no sentido de que "a par da legislação específica que rege a relação militar, há responsabilidade do Estado pelos danos morais causados em decorrência de acidente sofrido durante as atividades castrenses" (AgRg no REsp 1.089.213/RS).

Nesse sentido:

PROCESSO CIVIL - RECURSOS ESPECIAIS - MILITAR - ACIDENTE - DANO MORAL - ACOLHIMENTO - RESPONSABILIDADE CIVIL DO ESTADO - PRETENDIDO AFASTAMENTO - DANO MORAL - REDUÇÃO - ELEVAÇÃO PRETENDIDA - ALEGADO JULGAMENTO EXTRA PETITA - NÃO OCORRÊNCIA - EMBARGOS DE DECLARAÇÃO - NÃO ACOLHIMENTO - ALEGADA AFRONTA AO ART. 535 DO CPC - RECURSO ESPECIAIS NÃO ACOLHIDOS.
1. Não há que se falar em afronta ao art. 535 do CPC se a prestação jurisdicional dada pela Corte de origem foi satisfatória.
2. O Estado não está isento de responder pelos danos causados a servidor militar por danos causados durante a atividade do Exército. Precedentes.
3. Em reexame necessário é possível o Tribunal alterar o valor fixado a título de dano moral, embora não requerido no apelo voluntário da Fazenda Pública. Precedente.
4. Inexiste divergência jurisprudencial se ausente a semelhança entre os casos confrontados.
5. Recurso especial da Fazenda Nacional conhecido integralmente, mas não provido.
6. Recurso especial de Diego Antonio da Silva, conhecido em parte e, nessa parte, não provido. (STJ, Segunda Turma, RESP 1166405, Rel. Min. Eliana Calmon, DJE 17.08.2010)
No entanto, a fim de que surja em desfavor do Estado o dever de indenizar devem estar perfeitamente delineados e comprovados nos autos a ação ou omissão estatal, o dano e o nexo de causalidade entre eles, bem como a ausência de causa excludente de responsabilidade.

Ou seja, não basta, para efeito de responsabilidade do Estado, que a doença tenha eclodido durante o período de prestação do serviço militar. É necessário que fique demonstrado que a doença decorreu da atividade militar. É dizer: deve haver prova de que a moléstia foi causada pela atividade militar.

No caso em tela, o apelante foi incorporado às fileiras da Força Aérea Brasileira, para prestar o Serviço Militar obrigatório, em 01.02.1995, para servir pelo prazo de onze meses (fl. 118).

Passados pouco mais de dois meses, apresentou um surto psicótico e foi internado no Hospital de Aeronáutica de São Paulo (fl. 116). Foi diagnosticada esquizofrenia (CID IX 295.9), em 25.04.1995 (fl. 47).

Em 09.08.1995, foi considerado "INCAPAZ C" por Junta Regular de Saúde do Hospital da Aeronáutica de São Paulo (fl. 50).

Foi isento do Serviço Militar, em 01.09.1995, "por estar compreendido no Regulamento LSM, Artigo Cento e Sessenta e Cinco, Parágrafo Segundo, Número Dois". (fl. 63).

A perícia realizada no processo concluiu que o apelante tem quadro de esquizofrenia residual (CID 10, F 20.5), que gera incapacidade laborativa. Ambas se iniciaram em 25.04.1995, data em que foi diagnosticada a esquizofrenia pela Médica da Aeronáutica. De acordo com o laudo, a doença é crônica e sem possibilidade de cura (resposta ao quesito nº 6 do autor), podendo ser desencadeada por fatores estressores diversos, tanto biológicos quanto ambientais, não se tratando de uma doença exclusiva e própria do ambiente militar (resposta aos quesitos nº 3 e 6 da União).

Por seu turno, a prova testemunhal colhida dá conta apenas de que o apelante começou a ter problemas de saúde depois de ter ingressado no Serviço Militar da Aeronáutica (fls. 307/309).

O conjunto probatório não permite concluir que a doença apresentada pelo apelante tenha relação de causa e efeito com a atividade militar. É dizer: não há prova do nexo de causalidade entre a esquizofrenia desenvolvida pelo apelante e qualquer ação ou omissão imputável ao Estado, que refuja daquelas consideradas normais no contexto militar, como por exemplo a submissão a condições desumanas, maus-tratos, má alimentação, etc.


Assim, diante da falta de comprovação de nexo etiológico entre a moléstia apresentada e a atividade militar desenvolvida, o apelante não faz jus à indenização por danos material e moral.


Nesse sentido:


DIREITO ADMINISTRATIVO. PROCESSUAL CIVIL. RECURSO ESPECIAL. MILITAR. DOENÇA MENTAL INCAPACITANTE. REFORMA. DANOS MORAIS. NEXO DE CAUSALIDADE ENTRE A DOENÇA E O SERVIÇO MILITAR. INEXISTÊNCIA. RECURSO ESPECIAL CONHECIDO E PROVIDO EM PARTE.
1. Para se caracterizar o dano moral decorrente do surgimento de doença mental incapacitante durante o serviço militar, faz-se necessária a comprovação do nexo causal entre a enfermidade e a atuação dos agentes militares que, de alguma forma, tenham submetido a vítima a condições desumanas, aviltantes ou ultrajantes capazes de afetar sua sanidade mental, e que, por sua vez, refujam àquelas consideradas normais no contexto militar ao qual esteve inserido.
2. Hipótese em que o Tribunal de origem, soberano das circunstâncias fáticas e probatórias da causa, expressamente reconheceu que o recorrido não se submeteu a nenhum tipo de tratamento que ultrapassasse a normalidade esperada da vida em caserna. 3. Ofensa ao art. 159 do CC/16 caracterizada. 4. Recurso especial conhecido e provido em parte.(RESP 200601036364, ARNALDO ESTEVES LIMA, STJ - QUINTA TURMA, DJE DATA:23/06/2008.)

Por fim, consigno que os requisitos para a concessão da reforma, benefício de natureza previdenciária dos militares, e de indenização por ato ilícito são diferentes, sendo manifestamente improcedente o argumento segundo o qual a sentença - posteriormente corrigida na via dos embargos de declaração - seria ilógica ao lhe conceder o direito à reforma e julgar improcedente os pedidos de indenização.


Ante o exposto, nego provimento à apelação.

É o voto.

Johonsom di Salvo
Desembargador Federal


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