D.E. Publicado em 05/07/2012 |
|
|
|
|
|
EMENTA
ACÓRDÃO
Vistos e relatados estes autos em que são partes as acima indicadas, decide a Egrégia Quinta Turma do Tribunal Regional Federal da 3ª Região, por unanimidade, negar provimento à apelação da defesa, dar parcial provimento à apelação ministerial, para aumentar a pena-base da ré em um terço, fixando-a definitivamente em 3 (três) anos, 10 (dez) meses e 20 (vinte) dias de reclusão e pagamento de 600 (seiscentos dias-multa, e para afastar a substituição da pena privativa de liberdade por restritivas de direitos e a concessão do direito de apelar em liberdade, nos termos do relatório e voto que ficam fazendo parte integrante do presente julgado.
Documento eletrônico assinado digitalmente conforme MP nº 2.200-2/2001 de 24/08/2001, que instituiu a Infra-estrutura de Chaves Públicas Brasileira - ICP-Brasil, por: | |
Signatário (a): | ANTONIO CARLOS CEDENHO:10061 |
Nº de Série do Certificado: | 07ED7848D1F21816 |
Data e Hora: | 01/07/2012 19:38:08 |
|
|
|
|
|
RELATÓRIO
O EXCELENTÍSSIMO SENHOR DESEMBARGADOR FEDERAL ANTONIO CEDENHO:
Trata-se de apelações criminais interpostas pela JUSTIÇA PÚBLICA e por DEBORAH GERHARD, natural da Alemanha, contra sentença que condenou a ré por infração ao artigo 33 caput , combinado com o artigo 40, I, ambos da Lei nº 11.343/06.
Consta da denúncia que, no dia 09 de abril de 2011, nas dependências do Aeroporto Internacional de Guarulhos/SP, Deborah Gerhard foi presa em flagrante delito ao tentar embarcar em vôo com destino a Tóquio/Japão, com conexão em Londres/Inglaterra, trazendo consigo, para fins de comércio ou entrega de qualquer forma a consumo de terceiros, no exterior, 4.000 g. (quatro mil gramas- peso líquido) de cocaína, sem autorização, armazenada em três sacos plásticos transparentes, que se encontravam em um fundo falso de sua bagagem.
No dia dos fatos, o agente da polícia federal Fernando Peixinho Gomes Correa foi acionado para comparecer ao setor de esteira de bagagens despachadas da Companhia Aérea TAM, em virtude de uma das malas parecer suspeita. Comparecendo ao local, verificou que a bagagem estava em nome da passageira Deborah Gerhard, que iria para Londres, com destino final ao Japão.
Em seguida, a autoridade policial analisou a bagagem na imagem do Raio-X do porão e constatou a presença de matéria orgânica, motivo que o levou a dirigir-se ao portão de embarque e solicitar que a acusada o acompanhasse à Delegacia de Polícia Federal do Aeroporto, onde a bagagem foi aberta, encontrando-se a presença da droga em um fundo falso.
Após regular instrução, foi proferida a sentença de fls. 153/165, que condenou a ré à pena de 3 (três) anos e 6 (seis) meses de reclusão, a ser cumprida em regime inicial fechado, e ao pagamento de 600 (seiscentos) dias-multa no valor de 1/30 do salário mínimo vigente à época dos fatos, por infração ao artigo 33 caput, combinado com o artigo 40, I, ambos da Lei nº. 11.343/06.
A pena privativa de liberdade foi substituída por duas penas restritivas de direitos, consistentes em prestação pecuniária a ser paga à União, no valor de três salários mínimos vigentes à data do pagamento, e prestação de serviços à comunidade em instituição a ser determinada pelo Juízo das Execuções.
Foi concedido à ré o direito de apelar em liberdade, mediante o compromisso de comparecimento mensal em Juízo, a fim de justificar e informar atividades, residência e ocupação, proibição de ausentar-se da Comarca e de modificação de residência sem autorização do Juízo, mantendo seu passaporte retido.
Inconformados, apelaram a Justiça Pública e a ré condenada.
Às fls. 193/200, o representante do "Parquet" Federal requer a reforma parcial da sentença para:
1 . o aumento da pena-base para no mínimo oito anos;
2 . a incidência da causa de aumento prevista no inciso I do artigo 40 da Lei 11.343/06 no patamar máximo ou próximo a ele;
3 . a expedição de mandado de prisão logo após a reforma da sentença e aumento de pena por esta Corte;
4 . o afastamento da substituição da pena privativa de liberdade por restritivas de direitos.
Contrarrazões da defesa às fls. 207/212.
A Defensoria Pública da União, às fls. 213/223, apresentou as razões de apelação da ré, requerendo a reforma da sentença para:
1 . absolver a apelante com fundamento no artigo 386, VII do CPP (ausência de provas da materialidade delitiva) ou, ao menos, a não utilização da quantidade de entorpecente como critério para a elevação da pena;
2 , absolver a apelante em razão de ter praticado o fato em evidente erro de tipo;
3 . aplicar a pena-base no mínimo legal;
4 . afastar a causa de aumento derivada da transnacionalidade do delito;
5 . aplicar o benefício previsto no § 4º do artigo 33 da lei 11.343/06 no patamar máximo;
6 . determinar o regime de cumprimento inicial da pena no semi-aberto ou aberto, concedendo-se à ré o direito de apelar em liberdade, tendo em vista a inconstitucionalidade da prisão cautelar como antecipação do cumprimento da pena;
7 . afastar a aplicação da pena de multa.
Contrarrazões do Ministério Público Federal às fls. 231/ 239.
A Procuradoria Regional da República, no parecer de fls. 273/282, opina seja dado parcial provimento à apelação ministerial, para que seja afastada a substituição da pena privativa de liberdade por restritivas de direitos e seja negado provimento à apelação da defesa.
É o relatório.
À revisão.
Documento eletrônico assinado digitalmente conforme MP nº 2.200-2/2001 de 24/08/2001, que instituiu a Infra-estrutura de Chaves Públicas Brasileira - ICP-Brasil, por: | |
Signatário (a): | ANTONIO CARLOS CEDENHO:10061 |
Nº de Série do Certificado: | 07ED7848D1F21816 |
Data e Hora: | 29/05/2012 11:38:23 |
|
|
|
|
|
VOTO
O EXCELENTÍSSIMO SENHOR DESEMBARGADOR FEDERAL ANTONIO CEDENHO:
Débora Gerhard foi condenada, pela prática do crime previsto no artigo 33, caput, c/c o artigo 40, I, ambos da Lei nº 11.343/06, à pena de 3 (três) anos e 6 (seis) meses de reclusão, a ser cumprida em regime inicial fechado, e ao pagamento de 600 (seiscentos) dias-multa, por ter sido presa em flagrante no Aeroporto Internacional de Guarulhos/SP quando prestes a embarcar em vôo com destino ao Japão, com conexão na Inglaterra, trazendo consigo, oculta em um fundo falso de sua bagagem, 4.000 g. (quatro mil gramas) de cocaína.
Os elementos dos autos permitem atribuir seguramente à ré a prática do delito pelo qual foi condenada.
MATERIALIDADE DELITIVA:
Está consubstanciada pelo auto de apreensão (fls.13/14), laudo de constatação (fls. 11/12) e laudo de Exame Toxicológico (fls. 63/66), segundo o qual os testes realizados na substância apreendida em poder da ré foram positivos para cocaína.
A defesa sustenta que a ré deve ser absolvida pela ausência de provas da materialidade delitiva, pois o laudo toxicológico foi elaborado após a realização de exames em apenas um grama de uma amostra de 7,5 gramas de cocaína, de forma que não teria sido demonstrado que a totalidade do material apreendido se tratava de quatro quilos de cocaína.
Em primeiro lugar, consigno que, consoante se pode observar pela fotografia de fls. 11, a balança em que foi pesada a droga acusou o peso bruto de 4.160 gramas. Após a retirada das embalagens, o perito constatou que a massa líquida totalizou 4.000 gramas, consoante consta do laudo preliminar, realizado por um perito federal em uma amostra da droga.
E o laudo toxicológico de fls. 63/66, que foi elaborado e assinado por mais dois peritos criminais federais, confirmou que o material submetido a exames se tratava de cocaína.
Por outro lado, sabe-se que as perícias não são realizadas na totalidade da droga, mas sim em amostras, e os exames são realizados por peritos criminais federais, funcionários públicos cujas conclusões possuem presunção de veracidade e de legitimidade.
Consoante ressaltado nas contrarrazões ministeriais:
Comprovada a materialidade delitiva, e não havendo dúvidas acerca da quantidade da droga, não prospera o pleito da defesa para que essa circunstância não seja considerada como critério para a fixação da pena-base, o que será analisado quando da análise da dosimetria da pena.
AUTORIA DELITUOSA:
Está devidamente comprovada, inicialmente pela prisão em flagrante da acusada, que portava a droga oculta em sua bagagem.
A corroborar a autoria, há o depoimento da testemunha de acusação, Fernando Gomes Correa, que participou da prisão da ré e que, em seu depoimento na fase judicial, narrou os fatos tais como descritos na denúncia e no auto de prisão em flagrante. Acerca do comportamento da acusada, informou que ela permaneceu calma e não forneceu nenhuma informação sobre possíveis pessoas envolvidas no crime.
Consoante consta da sentença (fls. 154v.) , a acusada, ao depor em Juízo, forneceu a seguinte versão dos fatos:
Declarou que não sabia estar transportando drogas, pois uma amiga, de nome Liwia Teips, lhe propôs que viesse ao Brasil para passar férias e buscar uma pasta com documentos importantes a serem entregues para a empresa na qual trabalhava, empresa da qual não soube informar o nome. Afirmou que Liwia dissera que deveriam ser entregues pessoalmente em Tóquio/Japão e, em troca, a acusada teria sua passagem aérea custeada por aquela empresa, receberia seiscentos euros para despesas com hotel e transporte e, quando chegasse ao Japão, receberia três mil euros pelo serviço, dos quais seriam descontados os gastos com a viagem. Não estranhou tal proposta, pois um amigo, de nome Oliver, já havia realizado o mesmo serviço tempos atrás e havia retornado à Alemanha sem problemas, e não imaginou que sua amiga iria enganá-la, pois esta também já havia realizado o mesmo serviço diversas vezes.
Disse que, chegando no Brasil, pegou um táxi e deu o endereço do hotel Íbis ao motorista; permaneceu no País por nove dias; fez compras em um shopping próximo ao hotel; perguntou a Liwia se ela poderia indicar alguém que a levasse para um tour pela cidade, mas não obteve resposta.
No último dia da viagem, um homem negro, de nome Jefrey, foi buscá-la no hotel e, quando apanhou sua mala, a alça quebrou. Jefrey disse que lhe daria uma mala nova. Passearam de carro pela cidade, até que chegaram na casa desse homem, que lhe entregou uma mala nova, vazia. Colocou ali seus pertences, bem como a pasta com os documentos que deveria entregar no Japão a um homem que iria procurá-la no hotel em que se hospedaria.
Declarou que não suspeitou da mala nem estranhou o peso excessivo; dormiu um pouco e, quando acordou, foi ao Aeroporto e já estava no avião quando foi abordada.
Por fim, informou que trabalha como dançarina em um clube alemão; nunca se envolveu com drogas; não conhece detalhes sobre Liwia, pois são amigas há aproximadamente um ano e iniciaram a amizade através do facebook, e que os documentos e alguns objetos pessoais não estavam na mala quando foi aberta na delegacia, acreditando que Jefrey havia mexido em sua bagagem enquanto ela dormia.
DO ALEGADO ERRO DE TIPO:
A defesa, nas razões de apelação e com base nessas declarações da ré, afirma que ela foi enganada, pois pensava estar transportando documentos e não drogas, razão pela qual estaria isenta de pena, nos termos do artigo 20, § 1º do Código Penal.
É certo que parte dos delitos são praticados tendo como causa erros, juízos falsos, que levam seus autores a realizar condutas tipificadas no Código Penal como crime, e que muitas vezes tais enganos não são espontâneos, mas provocados por terceiras pessoas que se interpõem na mesma relação. Decorre, portanto, a necessidade de se apreciar cuidadosamente os fatos para verificar o dolo, elemento subjetivo, a fim de solucionar a questão da forma mais adequada, prevista na Lei Penal.
Porém, sabe-se ser imprescindível que a defesa comprove a caracterização do erro sobre elementar do tipo penal, que apenas ocorre em circunstâncias extraordinárias, quando há prova irrefutável da ausência de consciência da ilicitude da conduta, não sendo suficiente meras alegações do réu acerca do desconhecimento da existência da droga.
No caso, a alegação de erro de tipo, além de inverossímil, não tem correspondência com as demais provas e indícios constantes nos autos. Nesse aspecto, merece ser integralmente transcrita a acurada análise do dolo na conduta da ré, inclusive na modalidade eventual, brilhantemente realizada pelo MM. Juiz de 1º grau e exposta na fundamentação da sentença, à qual nada mais é preciso acrescentar a fim de solucionar a questão:
Portanto, demonstradas a materialidade e autoria pela acusação, e diante da ausência de elementos aptos a ilidi-los, resta também evidente o dolo na conduta do apelante que, na condição de "mula", com consciência e vontade, transportava a droga entre países, razão pela qual mantenho sua condenação pela prática do crime previsto no artigo 33, caput, c/c o artigo 40, I, ambos da Lei 11.343/06.
DOSIMETRIA DA PENA:
A pena-base foi fixada em um ano acima do mínimo legal (seis anos de reclusão). O MM. Juiz justificou a elevação pela natureza da droga (cocaína), considerando-a como psicotrópico de elevado efeito nocivo ao organismo dos usuários,bem como pela grande quantidade, considerando que as demais circunstâncias judiciais não eram relevantes em concreto para afetar a pena-base.
Nesse aspecto, o Ministério Público Federal requer a elevação para, no mínimo, oito anos de reclusão, enquanto a defesa pede a fixação no mínimo legal.
Sabe-se que o julgador, na individualização da pena, deve examinar detidamente os elementos que dizem respeito ao fato, segundo os critérios estabelecidos pelo artigo 59 do CP. No caso de tráfico de drogas, há ainda que observar o comando expresso no artigo 42 da Lei 11.343/06, o qual determina expressamente que o Juiz, na fixação da pena, deve considerar, com preponderância sobre as circunstâncias judiciais previstas no artigo 59 do CP, a natureza e quantidade da droga, bem como a personalidade e conduta do agente.
No caso, não prospera a alegação da defesa, de que não se poderia utilizar de características inerentes ao próprio tipo penal para a elevação da pena pois, consoante já ressaltado, não foram tidas como relevantes.
Também não se há de falar que a quantidade da droga não poderia ser tida como critério para elevação da pena, como afirma a defesa, " já que transportava somente quantidade enquadrável na quota nacional de um único passageiro de cocaína."
De fato, não pode ser considerada pequena a quantidade apreendida nestes autos (quatro quilos), ainda mais quando comparada às quantidades normalmente portadas pelo criminoso no tráfico urbano de varejo, quando é vendida diretamente aos consumidores pelos pequenos traficantes.
É certo, também, que, como no caso, não foi a ré, na qualidade de "mula" do tráfico que decidiu acerca da quantidade da droga que transportaria. Contudo, é inegável que evidentemente possuía consciência, por agir mediante promessa de pagamento, que estava colaborando com a atuação de uma organização voltada ao tráfico de entorpecentes, e não como os denominados "aviõezinhos", que repassam pequenas quantidades de drogas aos usuários.
Tampouco assiste razão à defesa ao requerer a redução da pena-base ao mínimo legal sob o argumento de que a natureza da droga (cocaína) não é tão maléfica ao organismo quanto as demais que são usualmente traficadas (crack, ecstasy, anfetamina, heroína, LSD, etc). De fato, sabe-se que a cocaína é uma droga que vicia facilmente, sendo alta sua lesividade à saúde dos usuários, pois pode levar a óbito ainda que consumida em pequena quantidade. Por outro lado, a cocaína que é normalmente exportada possui grau de pureza altíssimo, sendo misturada a outras substâncias antes da entrega ao consumidor para elevar o rendimento.
No que se refere ao pleito ministerial, entendo que a argumentação, no que se refere aos motivos do crime, relacionam-se a uma característica inerente ao próprio tipo legal, razão pela qual não justifica a elevação da pena-base.
Todavia, embora o Juiz tenha justificado a exasperação da pena-base pela natureza e a quantidade da droga, e que não haja previsão legal do "quantum" a ser aplicado em virtude dessas circunstâncias legais especiais, entendo que assiste parcial razão ao representante do "Parquet" Federal, ao argumentar com a necessidade de fixação em patamar um pouco maior, por não ter sido estabelecido de forma proporcional e compatível com a quantidade e natureza da droga que era transportada, que denota lesão mais intensa ao bem jurídico tutelado (saúde pública).
Por esses motivos, considerando que a ré é primária e possui bons antecedentes, mas tendo em vista a natureza e a grande quantidade da droga, que repercutem na gravidade e consequências do delito em questão, elevo a pena-base em um terço, fixando-a em 6 (seis) anos e 8 (oito) meses de reclusão, por entendê-la justa, proporcional e suficiente para atingir, nessa fase, ao caráter retributivo e preventivo da sanção penal, nos termos das regras previstas no artigo 42 da lei de drogas e do artigo 59 do CP.
Na segunda etapa da individualização da pena, não há circunstâncias atenuantes ou agravantes a serem consideradas.
TRANSNACIONALIDADE DO TRÁFICO:
Na terceira fase, o MM. Juiz aplicou a causa de aumento da transnacionalidade do tráfico ( art. 40, I, da Lei 11.343/06) no patamar mínimo legal (um sexto), sob os seguintes fundamentos:
Não procede a alegação da defesa, no sentido de que não deve incidir essa causa de aumento sob pena de "bis in idem", ante o argumento de que a conduta de "exportar" está contida no núcleo do art. 33 da Lei 11.343/06.
De fato, o crime previsto no artigo 33, caput, da Lei de drogas é de ação múltipla, e à ré foi imputada a conduta de transportar substância entorpecente apreendida em seu poder, quando estava em vias de embarcar para o exterior.
Desde a vigência da lei anterior, é pacífico o entendimento de que a causa de aumento derivada da internacionalidade do tráfico é aplicável em todas as modalidades do crime, sem que isso implique em dupla valoração pelo mesmo fato, pois o objetivo da majorante é o de punir com maior rigor o comércio com o exterior, com finalidades lucrativas, e não apenas a exportação sem essa finalidade, razão pela qual não há se falar em identidade de elementares do tipo.
Nesse sentido:
Portanto, deve ser mantida a aplicação da majorante prevista no inciso I, do artigo 40, da Lei 11.343/06.
A Justiça Pública insurge-se quanto à aplicação no mínimo legal e requer que seja aplicada no patamar máximo ou ao menos na extensão média entre um sexto e dois terços, em razão da expressiva quantidade da droga, à maior periculosidade da conduta e ao maior espectro espacial a ser atingido por ela.
Apesar desse entendimento estar referendado em algumas decisões, o entendimento desta Turma é no sentido de que a simples distância entre países não justifica a aplicação dessa causa de aumento em patamar acima do mínimo, admitindo-se apenas nos casos em que a droga deixe o território nacional para ser distribuída em mais de um país no exterior.
Ademais, o legislador previu, nos incisos do artigo 40, da Lei 11.343/06, uma série de causas de aumento de pena, que justificam um aumento variável de um a dois terços, porém não estabeleceu os parâmetros para a quantificação do percentual.
À míngua desses critérios, o índice de aumento deve ser calculado de acordo com as circunstâncias especificamente relacionadas com a causa de aumento, (e não às do crime), e variar de acordo com a quantidade de majorantes que estiverem presentes, de forma que na incidência de apenas um inciso não se justifica a elevação do percentual mínimo. Não se deve olvidar ainda a regra do artigo 42 do mesmo texto legal, que determina a consideração da natureza e quantidade da droga para a fixação da pena.
No caso, porém, há que ser considerado que a ré foi presa com a droga ainda em território brasileiro e, em que pese sua intenção de levá-la a outro continente, não está comprovado nos autos que pretendesse difundi-la em mais de um país.
Portanto, penso ser razoável a exasperação da pena no mínimo legal (um sexto), considerando-se a natureza e quantidade da droga e a rota planejada por mais de um continente, não estando evidenciadas outras circunstâncias que justifiquem o agravamento da causa de aumento.
A respeito, confira-se os seguintes excertos de alguns julgados desta Turma:
Por esses motivos, mantenho a aplicação da causa de aumento de pena prevista no artigo 40, I , da Lei 11.343/06 no percentual de um sexto. Dessa forma, a pena anteriormente fixada em seis anos e oito meses de reclusão, com o acréscimo fica estabelecida em 7 (sete) anos, 9 (nove) meses e 10 (dez) dias de reclusão,
CAUSA DE DIMINUIÇÃO DE PENA: § 4º DO ART. 33 DA LEI Nº 11.343/06:
Ainda na terceira etapa da individualização da pena, não foi aplicado o benefício previsto no artigo 33, § 4º da Lei de drogas.
A defesa requer a aplicação no patamar máximo e, para tanto, afirma que, não obstante a presença de todos os requisitos exigidos, o benefício foi negado sem fundamentação, não havendo elementos nos autos que façam crer que a ré integre uma organização criminosa voltada ao tráfico de drogas.
Alega que, além de ser uma vítima da sociedade, não passa também de vítima do tráfico, pois os aliciadores se aproveitam de seus problemas financeiros, de saúde, inocência e ignorância, e sequer conhecem a quantidade ou o destino da droga que transportam. Sustenta ainda que a ré é primária, de bons antecedentes, não se dedica ao crime, agiu sob erro de tipo e contribuiu com a Justiça, fornecendo informações sobre os aliciadores.
Sustenta ainda que a Convenção de Palermo, da qual o Brasil é signatário, estabelece que, para a configuração de uma organização criminosa, é preciso comprovar a existência conjunta de elementos de ordem quantitativa (três ou mais agentes), subjetiva (unidade de desígnios) e temporal (atuação prolongada no tempo), o que não restou comprovado.
Por fim, aduz que a natureza e a quantidade da droga, por já terem sido utilizadas para a exasperação da pena, não podem ser consideradas como limitadoras para a aplicação do benefício, sob pena de "bis in idem", consoante recentes decisões do STF.
Não procedem todos esses argumentos.
De fato, o benefício previsto no parágrafo 4º do artigo 33 da Lei de drogas exige a presença de quatro requisitos, que devem ser preenchidos cumulativamente, ou seja, que o agente "seja primário, de bons antecedentes, não se dedique a atividades criminosas nem integre organização criminosa".
Como a lei utilizou a conjunção "NEM", deduz-se que há uma diferença substancial entre "se dedicar a atividades criminosas" e "integrar uma organização criminosa". A dedicação a atividades criminosas exige habitualidade, permanência, conjunção de propósitos, divisão de tarefas, ou seja, que o réu faça do crime seu meio de vida. Por outro lado, para que se afirme que o réu integra uma organização criminosa, basta a prova de que participou da empreitada criminosa de alguma forma.
Assim, quando o parágrafo 4º do artigo 33 da Lei 11.343/06 exige que o agente "não integre organização criminosa", significa que não é necessário, para esse fim, que esteja incurso no crime de associação para o tráfico. A reiteração de condutas criminosas no passado, ou o ânimo de reiterá-las futuramente, é elemento caracterizador da estabilidade e permanência, exigíveis para a configuração do crime autônomo de associação para o tráfico (antigo artigo 14 da Lei nº 6.368/75 e atual artigo 35, da Lei nº. 11.343/06).
Contudo, no parágrafo 4º do artigo 33, da Lei 11.343/06, não é necessário esse ânimo para que se caracterize a integração em organização criminosa, já que está presente em outro requisito, que é o "não se dedicar a atividades criminosas". Repito: se a lei exigisse que a prática reiterada de delitos, ou a vontade de praticá-los reiteradamente fosse elemento essencial para a integração a uma atividade criminosa, não teria inserido como requisito da causa de redução de pena a exigência de que o agente também não se dedique a atividades criminosas.
Feitas tais considerações, e passando à análise do caso concreto, é certo que a acusada é primária, sem antecedentes e que não há provas de que se dedique a atividades criminosas.
Entretanto, ao ser interrogada, a ré declarou que uma amiga (Lívia) lhe propôs que viesse ao Brasil para buscar o entorpecente e entregá-lo no Japão, e que receberia pagamento pelo serviço. Declarou ainda que houve a atuação de uma terceira pessoa, de nome Jefrey, que lhe entregou a mala onde a droga estava oculta.
É evidente, pois, que integrou uma organização criminosa voltada ao tráfico transnacional de drogas que atua em vários países, na qual há a divisão de tarefas e em que cada integrante tem uma função específica, havendo sempre de um lado um membro da organização que fornece a droga, embala, prepara o local para ocultá-la, custeia as despesas dos "mulas", e de outro lado uma pessoa que recebe a droga, prepara para consumo e posteriormente fornece a pessoas que irão vendê-la, todos agindo com a mesma unidade de desígnios, qual seja, o tráfico de drogas.
Embora não possa ser considerada como membro efetivo de uma quadrilha, ou que não tivesse o ânimo de voltar a delinqüir, não há como negar que a ré efetivamente figurou, ainda que de forma eventual, em uma ponta da organização criminosa voltada ao tráfico internacional de drogas. Integrou a organização ao lhe prestar serviços na condição de "mula" transportando a droga de um para outro país mediante remuneração, ao promover a conexão entre seus membros e ao colaborar, como elemento essencial, para o sucesso da atividade ilícita e a distribuição mundial de entorpecentes.
Por esses motivos, comungo do entendimento de que a causa de diminuição prevista no parágrafo 4º do artigo 33 da Lei de drogas não foi criada a fim de ser aplicada a pessoas que, como a ré, participa de organizações criminosas de tráfico internacional de grande poder financeiro e logístico,que distribuem grandes quantidades de entorpecentes, plenamente cientes de que estão se envolvendo com pessoas que vivem do crime, mas sim ao tráfico de menor expressão, que não envolve quantidades tão expressivas de entorpecente; como no tráfico urbano de varejo, onde pequenos distribuidores comercializam drogas em quantidades menores, diretamente aos usuários.
Ressalto que a aplicação indiscriminada dessa causa de redução de pena aos "mulas" do tráfico transnacional de drogas certamente servirá como incentivo para que o Brasil se torne, muito em breve, a principal rota para o transporte de drogas provenientes dos países vizinhos para o exterior, fato incompatível com os vários acordos internacionais sobre o combate às drogas firmados pelo nosso País.
E não se há de falar que a negativa da aplicação do benefício não foi devidamente fundamentada, ou que a natureza e quantidade da droga não poderiam limitar a aplicação do benefício, já que, além dessas circunstâncias, foram várias as razões que levaram o Juiz "a quo" a deixar de aplicá-lo, consoante se pode observar pela extensa argumentação expendida pelo MM. Juiz "a quo" na sentença , que transcrevo: (fls. 158/159):
Esse é também o entendimento de parte dos integrantes desta Turma. Confira-se:
Por esses motivos, diante da prova inequívoca do narcotráfico transnacional patrocinado por organização criminosa à qual a acusada, livre e conscientemente aderiu, integrando-a a fim de realizar o transporte da droga, agiu com acerto o MM. Juiz ao deixar de aplicar o benefício previsto no § 4ª do artigo 33, da Lei 11.343/06, razão pela qual sua pena resta fixada provisoriamente em 7 (sete) anos, 9 (nove) meses e 10 (dez) dias de reclusão.
DELAÇÃO PREMIADA
Deve ser mantida a aplicação do benefício da delação premiada, previsto no artigo 41 da Lei 11.343/06 no patamar eleito pelo Juiz singular. Consoante consignado na sentença (fls. 160):
Portanto, a pena anteriormente fixada em 7 (sete) anos, 9 (nove) meses e 10 (dez) dias de reclusão, com a diminuição em metade pela aplicação do benefício da delação premiada, totaliza a pena definitiva de 3 (três) anos, 10 (dez) meses e 20 (vinte) dias de reclusão.
PENA PECUNIÁRIA:
A defesa requer o afastamento da pena pecuniária. Para tanto, afirma que os "mulas" do tráfico não dispõem de recursos financeiros, de forma que de nada adiantaria a aplicação de pena pecuniária de grande valor se não há bens a serem penhorados.
Sustenta também que, no caso de cumprir totalmente a pena a que foi condenada, a apelante apenas poderá retornar ao seu país de origem após a conclusão do processo de expulsão, que se concretiza com o pagamento integral da multa, que será impossível diante das condições financeiras da ré, o que fará com que permaneça presa por mais tempo do que realmente deveria.
Inicialmente, consigno que não há de se falar que a falta de pagamento da pena pecuniária se constituiria em ofensa à proibição constitucional de prisão civil por dívida (art. 5º, LXVII, da CF), uma vez que não se está punindo a inadimplência civil, mas sim a prática de um crime.
Por outro lado, a aplicação da pena pecuniária decorre do preceito secundário expresso no artigo 33 da lei de drogas, previsão legal e incondicional, como ocorre com tantos outros tipos penais, e que incide obrigatoriamente em cumulação com a pena privativa de liberdade, independentemente da situação econômica do réu, tendo em vista que não existe, na legislação penal ou processual penal, dispositivo que permita ao juiz isentar o réu do pagamento da pena de multa em razão de insuficiência financeira.
Também não está configurada qualquer afronta ao princípio da isonomia, pois, aqueles que optam pela prática de crimes não podem buscar igualdade com as pessoas que optaram por uma vida honesta, tampouco se podendo cogitar em desrespeito ao mesmo princípio dentre as várias espécies de agentes que cometem o crime de tráfico de drogas.
Deve-se considerar ainda que as "mulas" do tráfico agem sempre movidas pela cobiça, no sentido de obter recompensa financeira patrocinada pelos verdadeiros traficantes, motivo pelo qual a cumulação da pena pecuniária com privativa de liberdade se torna necessária para a prevenção e repressão desse crime.
Assim, se a ré não dispõe de recursos financeiros, tal fato não a isenta do pagamento de multa , justificando apenas a fixação do valor unitário no mínimo legal, como, aliás, acertadamente decidido na sentença.
Por outro lado, a exigibilidade ou não da cobrança da multa trata-se de matéria a ser apreciada em sede de execução.
Ademais, consoante dispõe o artigo 51 do Código Penal, a pena de multa é considerada dívida de valor após o trânsito em julgado da condenação, aplicando-se-lhe as normas da legislação relativa à dívida ativa da Fazenda Pública, de forma que a pena pecuniária prevista no preceito secundário de um tipo penal não pode ser convertida em pena privativa de liberdade caso não seja paga, cabendo sua execução na forma da legislação tributária, razão pela qual não há possibilidades de que a ré permaneça custodiada por período superior ao da condenação.
Portanto, se a aplicação da pena de multa cumulada com a privativa de liberdade está prevista em lei, respeita o princípio da legalidade e não ofende a Constituição, é de rigor sua aplicação.
Por esses motivos, mantenho a pena pecuniária em seiscentos dias-multa, no valor unitário fixado pela sentença.
REGIME DE CUMPRIMENTO DE PENA:
Não procede a pretensão da defesa, quanto à fixação de regime inicial de cumprimento de pena menos gravoso do que o fechado.
A Lei 8.072/90, em sua redação original, estabelecia que, no caso do delito de tráfico de entorpecentes, deveria ser imposto o regime integralmente fechado. Com a alteração da Lei 11.464/07, o artigo 2º, § 1º, dessa lei, passou a ter a seguinte redação:
Da interpretação desse artigo, denota-se que é imperativo legal que seja cumprida a pena desses crimes em regime inicial fechado, e não integralmente fechado, permitindo-se apenas que seja efetuada a progressão para o menos gravoso. Em outras palavras, foi apenas suprimida a vedação da progressão de regime prisional para os condenados pelos crimes citados.
Ademais, o § 3º do artigo 33 do Código Penal reporta-se expressamente aos critérios estabelecidos pelo artigo 59 do mesmo texto legal, de maneira que apenas a quantidade da pena não justifica que o réu tenha o direito de iniciar o cumprimento da pena em regime menos gravoso, já que as circunstâncias norteadoras da fixação da pena nos crimes de tráfico (art. 42 da Lei 11.343/06) repercutem diretamente na fixação do regime inicial de cumprimento da pena.
No caso concreto, a fixação de regime semi-aberto ou aberto para o cumprimento da pena mostra-se absolutamente insuficiente para prevenção e repreensão da conduta, ainda que não fosse legalmente vedada, por ser absolutamente incompatível com o tratamento mais gravoso que o legislador atribuiu aos crimes hediondos e equiparados.
Nesse sentido:
Por esses motivos, o regime inicial para o cumprimento da pena da acusada deve ser o fechado.
SUBSTITUIÇÃO DA PENA PRIVATIVA DE LIBERDADE POR RESTRITIVAS DE DIREITOS :
O MM. Juiz "a quo" substituiu a pena privativa de liberdade da ré por duas penas restritivas de direitos, fundamentando a concessão sob os argumentos de que a vedação expressa contida no artigo 44 da Lei 11.343/06 foi tida por inconstitucional pelo Supremo Tribunal Federal no julgamento do habeas corpus nº 97.256; que a condenação não foi superior a quatro anos e o crime não foi cometido com violência ou grave ameaça. Considerou a substituição favorável à ressocialização da acusada, afirmando que o único elemento que poderia ser cogitado em seu desfavor seria o envolvimento com organização criminosa, que está afastado tendo em vista que, sendo delatora, manifestou a intenção inequívoca de se desvincular dos co-autores e da prática criminosa, não podendo ainda ser afastada a concessão pelo fato de ser estrangeira.
Assiste razão ao Ministério Público Federal ao se insurgir quanto à substituição.
Em primeiro lugar, a vedação à substituição tem fundamento nos artigos 33, parágrafo 4º e 44, ambos da Lei nº 11.343/06, que proíbem expressamente que a pena privativa de liberdade cominada, embora possa ser objeto de redução, seja convertida em restritiva de direitos, em atenção à função preventivo-repressiva da pena privativa de liberdade como instrumento eficaz ao combate das atividades relacionadas ao tráfico de entorpecentes.
Em que pesem alguns entendimentos em contrário, entendo que a regra prevista no artigo 44 da Lei nº 11.343/2006, ao vedar a substituição da pena privativa de liberdade por restritivas de direitos, não fere a Constituição Federal. Ao contrário, a completa, porque tal substituição se mostra incompatível com a necessidade de maior repressão e prevenção aos crimes considerados mais gravosos à sociedade, tais como o de tráfico internacional de entorpecentes, que causa efeitos altamente maléficos aos usuários e à sociedade. Por esses motivos, não se há falar-se em afronta ao princípio da individualização da pena.
Reconheço ainda que o Plenário do STF recentemente declarou, através do "habeas corpus" 97.256, pela via incidental, a inconstitucionalidade da expressão "vedada a conversão em penas restritivas de direitos" contida no parágrafo 4º do artigo 33, da Lei nº 11.343/06, bem como da expressão "vedada a conversão de suas penas em restritivas de direitos", constante do artigo 44 da mesma lei. Contudo, a ordem não foi concedida para assegurar ao paciente a imediata substituição , mas sim para remover o óbice contido na Lei 11.343/06, devolvendo ao Juízo das Execuções Criminais a tarefa de auferir o preenchimento das condições objetivas e subjetivas para a concessão.
Ainda que seja adotado o entendimento do Supremo Tribunal Federal, há que se considerar que as penas restritivas de direitos dificilmente serão aptas a reprimir o tráfico ilícito de drogas e, portanto, além dos requisitos objetivos exigidos pelo art. 44 do Código Penal, deve haver outros elementos subjetivos altamente favoráveis ao réu para que possa ser concedida a substituição.
No caso, as particularidades não recomendam a substituição, tendo em vista que os elementos dos autos revelaram um grau elevado de culpabilidade da ré, com provas contundentes de que participou de uma organização criminosa complexa, coordenada de forma a aliciar "mulas" para transportar drogas.
Ademais, é estrangeira e não possui vínculos com o nosso país, de forma que facilmente poderá se evadir de permanecer solta, mais um motivo demonstrando não ser recomendável a substituição, por não se mostrar suficiente para a reprovação e a prevenção do crime, inclusive pela repercussão que terá sobre a aplicação da lei penal.
Destaco que esse fato de forma alguma fere o princípio da isonomia, que consiste em conceder tratamento diferenciado para situações distintas.
Ao contrário do que afirmou o MM. Juiz sentenciante, não se poderia afirmar com certeza que, pelo fato de ter delatado alguns participantes dessa organização, a ré deixaria de se envolver novamente no crime de tráfico de drogas, considerando-se que o motivo do crime de tráfico foi a obtenção de dinheiro de maneira fácil, à custa de vício alheio.
Levando-se em consideração os motivos e as circunstâncias do crime, observa-se que a substituição da pena privativa de liberdade não se mostra suficiente para impedir que a ré volte a traficar drogas, refreando o desejo de ganho irrefletido de dinheiro. Por outro lado, prestando serviços em instituições públicas, haverá o sério risco de dar continuidade ao crime de tráfico de drogas.
Assim, entendo não ser socialmente recomendável a substituição da pena privativa de liberdade, que deve limitar-se a crimes considerados de menor gravidade, sendo inadequada sua aplicação aos condenados pelo crime de tráfico de drogas por ser por demais branda e insuficiente para reprimir tão grave delito, em nosso país equiparado a hediondo, tendo em vista os terríveis malefícios que causam aos usuários e à sociedade como um todo.
Confira-se alguns julgados acerca desse tema:
Por esses motivos, afasto a substituição da pena privativa de liberdade da acusada por restritivas de direitos.
DIREITO DE RECORRER EM LIBERDADE
A sentença concedeu à ré o direito de recorrer em liberdade, nos seguintes termos (fls. 162/163):
Entendo que, na hipótese dos autos, a fundamentação exposta pelo MM. Juiz de primeiro grau não se mostrou suficiente a ensejar a concessão do apelo em liberdade.
Em primeiro lugar, consoante entendimento cediço nas Cortes Superiores, a proibição da liberdade provisória, nos casos de crimes hediondos e assemelhados, decorre da própria proibição de fiança, imposta pela Constituição Federal no artigo 5º, inciso XLIII.
E o artigo 2º, inciso II, da Lei nº 8.072/90, atendendo à norma constitucional, considerou inafiançáveis os crimes de tortura, tráfico ilícito de entorpecentes e drogas afins, o terrorismo e os crimes definidos como hediondos.
Por outro lado, a Lei nº 11.343/2006, que é específica para os crimes de tráfico ilícito de entorpecentes e drogas afins, no artigo 44 estabelece que os crimes previstos nos artigos 33, caput e § 1º e 34 a 37 são insuscetíveis de sursis, graça, indulto, anistia e liberdade provisória. Dispõe ainda o artigo 59 da mesma lei que, nos crimes de tráfico, o réu não poderá apelar sem recolher-se à prisão, salvo se for primário e de bons antecedentes, assim reconhecido na sentença condenatória.
Sabe-se, contudo, que não tem o direito de recorrer em liberdade o acusado que permaneceu justificadamente preso durante a instrução criminal, por força de prisão em flagrante ou preventiva, ainda que seja primário e de bons antecedentes e que, sobrevindo sentença penal condenatória, um de seus efeitos é a manutenção da custódia do réu para apelar, o que não constitui ofensa à garantia constitucional da presunção de inocência, nos termos da Súmula 09 do STJ, de forma que eventuais condições favoráveis do agente, como primariedade e bons antecedentes, não são garantidoras de direito subjetivo à liberdade provisória, quando outros elementos recomendarem a prisão.
Postas tais premissas, verifico que a ré Deborah foi presa em flagrante e assim permaneceu durante toda a instrução criminal e, no presente recurso, foi afastada a substituição da pena privativa de liberdade por restritivas de direitos. É estrangeira, sem vínculos com nosso país, com fortes possibilidades de se evadir para outro local do Brasil se for solta, já que possui total mobilidade do distrito da culpa, ainda que seu passaporte fique retido nos autos, razão pela qual sua prisão tem por finalidade assegurar a aplicação da lei penal e o próprio resultado do processo, com o cumprimento integral da pena.
Por outro lado, a mera circunstância de a ré integrar uma organização criminosa dedicada à prática do tráfico de drogas já é suficiente para que permaneça presa, pois sabe-se que essas organizações não se intimidam com ações repressoras no sentido de investigar e punir a ação do grupo, tanto é que a própria Lei nº 9.034/95, que trata das organizações criminosas, prevê expressamente no artigo 7º, que não será concedida liberdade provisória, com ou sem fiança, aos agentes que tenham tido intensa e efetiva participação na organização criminosa, como no caso.
Assim sendo, para a efetivação da ação repressora do Estado, é necessário que o grupo seja desestruturado, o que somente se obtém com a prisão de todos os seus integrantes, daí porque o principal fundamento para a custódia é a garantia da ordem pública.
Ademais, se a ré foi capaz de, em busca de lucro fácil, disseminar substância entorpecente extremamente nociva entre países, o fato de ter delatado alguns participantes da organização criminosa da qual participou não se constitui em garantia de que não se envolva no mesmo crime com outra organização, se permanecer em liberdade e ficar sujeita novamente aos mesmos estímulos, de maneira que sua prisão também se faz necessária para impedir a reiteração criminosa.
E ainda que não mais se justifique o requisito concernente à conveniência da instrução criminal, já que a instrução probatória já foi encerrada, remanesce também a necessidade da garantia da ordem pública e da necessidade de se garantir a aplicação da lei penal, razão pela qual não cabe o deferimento do benefício do apelo em liberdade, quer seja mediante termo de comparecimento (artigo 310, parágrafo único), ou mediante pagamento de fiança (artigo 324, inciso IV).
Nesse sentido:
Por esses motivos, deve ser cassada a concessão do direito de a ré apelar em liberdade.
Diante do exposto:
1 - nego provimento à apelação da defesa;
2 - dou parcial provimento à apelação ministerial, para aumentar a pena-base da ré em um terço, fixando-a definitivamente em 3 (três) anos, 10 (dez) meses e 20 (vinte) dias de reclusão e pagamento de 600 (seiscentos dias-multa, e para afastar a substituição da pena privativa de liberdade por restritivas de direitos e a concessão do direito de apelar em liberdade.
Expeça-se mandado de prisão.
Determino o envio de ofício ao Ministério da Justiça, com o escopo de verificação da conveniência e oportunidade da instauração de procedimento administrativo tendente à expulsão da ré DEBORAH GERHARD, a ser efetivada após o cumprimento da pena.
É o voto.
Documento eletrônico assinado digitalmente conforme MP nº 2.200-2/2001 de 24/08/2001, que instituiu a Infra-estrutura de Chaves Públicas Brasileira - ICP-Brasil, por: | |
Signatário (a): | ANTONIO CARLOS CEDENHO:10061 |
Nº de Série do Certificado: | 07ED7848D1F21816 |
Data e Hora: | 01/07/2012 19:38:04 |