Diário Eletrônico

PODER JUDICIÁRIO

TRIBUNAL REGIONAL FEDERAL DA 3ª REGIÃO

D.E.

Publicado em 21/09/2012
APELAÇÃO CRIMINAL Nº 0005161-98.2011.4.03.6106/SP
2011.61.06.005161-8/SP
RELATOR : Desembargador Federal ANTONIO CEDENHO
APELANTE : ELEOMAR BORGES DA SILVA reu preso
: FRANCIS DOUGLAS DE SAO JOSE DE OLIVEIRA reu preso
ADVOGADO : EWERTON SOARES DE OLIVEIRA
APELANTE : DEOCELY OLIVEIRA DA SILVA reu preso
ADVOGADO : JULIA SOLANGE SOARES DE OLIVEIRA
APELADO : Justica Publica
No. ORIG. : 00051619820114036106 4 Vr SAO JOSE DO RIO PRETO/SP

EMENTA

PENAL. TRÁFICO TRANSNACIONAL DE DROGAS (COCAÍNA E MACONHA) E IMPORTAÇÃO DE MEDICAMENTO SEM REGISTRO NA ANVISA ( PRAMIL): ART. 33, CAPUT, C/C 40, I, DA LEI 11.343/06 E ART. 273, § 1º, B-1, DO C.P. EM CONCURSO FORMAL: MATERIALIDADE, AUTORIA E DOLO COMPROVADOS. ALEGAÇÕES DE USO PRÓPRO DOS MEDICAMENTOS E DESCONHECIMENTO DE SEU TRANSPORTE E DAS DROGAS DISSONANTES DAS CIRCUNSTÂNCIAS FÁTICAS E DE PROVA TESTEMUNHAL. DESCLASSIFICAÇÃO DE CRIME DO ART, 33 DA LEI DE DROGAS PARA O ART. 28: INVIABILIDADE. CONDENAÇÕES MANTIDAS. DOSIMETRIA DA PENA: PRIMARIEDADE E BONS ANTECEDENTES. QUANTIDADE E NATUREZA DA DROGA: FUNÇÃO DETERMINANTE: ART. 42 DA LEI 11.343/06: PREVALÊNCIA: PENAS - BASE MANTIDAS ACIMA DO MÍNIMO LEGAL. TRANSNACIONALIDADE CONFIGURADA. CAUSA DE REDUÇÃO DE PENA DO § 4º DO ART. 33 DA LEI DE DROGAS: APLICAÇÃO NO GRAU MÁXIMO AOS "MULAS": IMPOSSIBILIDADE. SUBSTITUIÇÃO DA PENA PRIVATIVA DE LIBERDADE POR RESTRITIVAS DE DIREITOS NEGADA.
1 . Comprovadas nos autos a materialidade e autoria dos crimes de tráfico transnacional de drogas e importação de medicamentos sem registro na Anvisa praticado pelos réus, dois deles presos em flagrante quando transportavam, em um veículo, 15.170 kg de cocaína, 2.080 kg. de maconha e 60 comprimidos de Pramil, medicamento e substâncias cuja comercialização e uso são vedados no país. O terceiro réu, embora não estivesse dentro do veículo em que as drogas e os medicamentos foram apreendidos, concorreu para a prática do delito, já que serviu de "batedor" para o outro automóvel.
2 . É imprescindível que a defesa comprove a ausência de consciência da ilicitude da conduta, não sendo suficiente meras alegações de que os réus desconheciam a existência de drogas e medicamentos, sem correspondência com as demais provas e indícios constantes nos autos.
3 . Impossibilidade de desclassificação da conduta do réu Deocely do art. 33 para o art. 28 da 11.343/06, diante da grande quantidade de droga apreendida (ainda que parte fosse destinada a uso próprio), além das circunstâncias da viagem dos réus e da prisão.
4 . Embora o correu Eleomar também tenha assumido a responsabilidade pela aquisição dos medicamentos, não restam dúvidas quanto à participação de todos os réus na internação dos medicamentos, que se encontravam ocultos junto às drogas no interior do painel do veículo.
5 . A versão do correu de que os medicamentos eram para uso próprio, não se sustenta. Ainda que seja considerada como média a quantidade de comprimidos de Pramil apreendida (sessenta), que existam similares desse medicamento no Brasil, normalmente vendidos a preços mais altos do que os que são vendidos no Paraguai, a internação no País para uso pessoal dos medicamentos registrados apenas seria possível caso estivesse acompanhada do respectivo receituário médico, nos termos do Regulamento Técnico de Vigilância Sanitária de Mercadorias Importadas nº 350 da ANVISA. Caso em que o réu também não comprovou documentalmente a alegada cirurgia que tivesse causado a necessidade do uso do medicamento para disfunção erétil.
6 . Condenações mantidas.
7 . O art. 42 da Lei 11.343/06, que configura norma especial em relação ao artigo 59 do Código Penal, orienta o Magistrado a dar maior importância aos critérios que estabelece, dentre eles a quantidade da droga, em relação às demais circunstâncias judiciais, por ser de fundamental importância na distinção entre o pequeno e o grande traficante, bem como a natureza da droga (cocaína), de conseqüências altamente maléficas. Ainda que os réus sejam primários e de bons antecedentes, tal fato não induz, necessariamente, à fixação da pena-base no patamar mínimo, pois subsistem circunstâncias legais especiais (ar. 42 da lei de drogas) aptas para justificar a fixação da pena acima do mínimo legal, para a suficiente prevenção e repressão do crime. Manutenção das penas-base de Francis e Eleomar acima do mínimo legal.
8 . Transnacionalidade do tráfico comprovada. As mercadorias, drogas e medicamentos apreendidos foram adquiridos no Paraguai, para serem introduzidos em território nancional, mais precisamente no Distrito Federal, para onde os réus se dirigiam quando foram abordados. Mantida, na dosimetria das penas, a causa de aumento prevista no inciso I, do artigo 40, da Lei 11.343/06.
9 . Ressalvado o entendimento deste Relator, bem como o de parte dos integrantes desta Turma, no sentido de que não deve ser aplicada a causa de redução de pena prevista no § 4º do artigo 33, da Lei de Drogas, aos "mulas" do tráfico primários que agem a mando de uma organização criminosa, ainda que eventualmente, pois assim agindo integram a organização, embora não se dediquem a atividades ilícitas. Contudo, trata-se de recurso exclusivo da defesa. Porém, não merece prosperar o pleito pela aplicação do benefício previsto no § 4º do artigo 33, da Lei 11.343/06 no patamar máximo, que deve ser reservada aos casos de tráfico eventual para usuários de pequenas quantidades de droga, nos casos em que também forem totalmente favoráveis as circunstâncias judiciais do artigo 59 do CP. Não cabe a redução no patamar máximo, tendo em vista que a conduta dos réus se insere em estágio intermediário da cadeia do tráfico, já que não estavam vendendo a droga aos usuários, mas sim introduzindo em nosso país expressiva quantidade de cocaína e de maconha, que seria pulverizada entre vários vendedores no mercado de consumo. Embora sejam primários e de bons antecedentes e não possam ser considerados como membros efetivos do crime organizado, há que se considerar que não atuavam sozinhos na prática delitiva, não merecendo a aplicação dessa causa de redução no patamar máximo. Mostra-se razoável e suficiente, em termos de repressão e prevenção penal, a aplicação da redução da pena prevista no artigo 33, § 4º, da Lei 11.343/06 no patamar de um sexto nas penas de Francis e Eleomar.
10 . Penas dos apelantes mantidas nos exatos termos da sentença.
11 . Impossibilidade de substituição da pena privativa de liberdade por restritiva de direitos. A conversão não se mostra como medida social recomendável, diante do estímulo para a prática do tráfico de drogas, crime que causa grave lesão ao bem jurídico tutelado (saúde pública), sendo insuficiente para a prevenção e repressão do delito.
12 . O Plenário do STF declarou, através do "habeas corpus" 97256, pela via incidental, a inconstitucionalidade da expressão "vedada a conversão em penas restritivas de direitos" contida no parágrafo 4º do art. 33, da Lei nº 11.343/06, bem como da expressão "vedada a conversão de suas penas em restritivas de direitos", constante do art. 44 da mesma lei. Contudo, a ordem não foi concedida para assegurar ao paciente a imediata substituição , mas sim para remover o óbice contido na Lei 11.343/06, devolvendo ao Juízo das Execuções Criminais a tarefa de auferir o preenchimento das condições objetivas e subjetivas para a concessão.
13 . Apelações a que se nega provimento.







ACÓRDÃO

Vistos e relatados estes autos em que são partes as acima indicadas, decide a Egrégia Quinta Turma do Tribunal Regional Federal da 3ª Região, por unanimidade, negar provimento às apelações, nos termos do relatório e voto que ficam fazendo parte integrante do presente julgado.


São Paulo, 10 de setembro de 2012.
Antonio Cedenho
Desembargador Federal


Documento eletrônico assinado digitalmente conforme MP nº 2.200-2/2001 de 24/08/2001, que instituiu a Infra-estrutura de Chaves Públicas Brasileira - ICP-Brasil, por:
Signatário (a): ANTONIO CARLOS CEDENHO:10061
Nº de Série do Certificado: 07ED7848D1F21816
Data e Hora: 14/09/2012 17:35:19



APELAÇÃO CRIMINAL Nº 0005161-98.2011.4.03.6106/SP
2011.61.06.005161-8/SP
RELATOR : Desembargador Federal ANTONIO CEDENHO
APELANTE : ELEOMAR BORGES DA SILVA reu preso
: FRANCIS DOUGLAS DE SAO JOSE DE OLIVEIRA reu preso
ADVOGADO : EWERTON SOARES DE OLIVEIRA
APELANTE : DEOCELY OLIVEIRA DA SILVA reu preso
ADVOGADO : JULIA SOLANGE SOARES DE OLIVEIRA
APELADO : Justica Publica
No. ORIG. : 00051619820114036106 4 Vr SAO JOSE DO RIO PRETO/SP

VOTO

O EXCELENTÍSSIMO SENHOR DESEMBARGADOR FEDERAL ANTONIO CEDENHO:


DO TRÁFICO TRANSNACIONAL DE DROGAS:


MATERIALIDADE DELITIVA:


Está consubstanciada pelo auto de apreensão (fls. 47/52), laudos de constatação (fls. 22/23) e laudos de Exame Toxicológico ( fls. 88/97), segundo os quais os testes realizados nas substâncias entorpecentes apreendidas foram positivos para cocaína, no peso bruto de 15.170 kg. e para maconha, no peso bruto de 2.080 kg.


AUTORIA DELITUOSA:


Tampouco restam dúvidas acerca da autoria dos réus.


Conforme consta dos autos, policiais rodoviários federais prenderam em flagrante os correus Eleomar e Francis, que estavam no veículo Fiat/Idea, proveniente do Paraguai, onde foram encontrados, além de mercadorias estrangeiras e medicamentos de comercialização e uso vedados no país, cocaína e maconha.


Logo após, o réu Deocely, que agia como batedor do veículo utilizado para a prática criminosa, após perder contato com os corréus em razão da abordagem policial, compareceu à base da Polícia Rodoviária Federal de São José do Rio Preto/SP a fim de procurá-los, ocasião em que foi encontrado em seu poder comprovantes de pagamento de pedágios de rodovias do estado do Paraná e um papel com diversas anotações sobre controle de gastos da respectiva viagem, no qual constava o prenome "DEREK", o mesmo que consta do contrato de locação do veículo interceptado pela Polícia, que fora alugado em Brasília/DF, razão pela qual Deocely também foi preso em flagrante.


Tais fatos foram devidamente comprovados durante a instrução criminal.


Não restam dúvidas acerca da autoria do réu Eleomar Borges da Silva, diante de sua confissão, onde assumiu totalmente a autoria dos crimes de tráfico de drogas e de medicamentos.


E os depoimentos das testemunhas de acusação, em Juízo, (mídia- fls. 322), narraram os fatos tais como descritos na denúncia, bem como no auto de prisão em flagrante. Confira-se trechos das declarações:



"... efetuavam fiscalização na Rodovia BR-153... na altura do KM 98 da mesma rodovia, abordaram o veículo Fiat/Idea Attrative... o automóvel era conduzido por Eleomar Borges da Silva e ocupado por Francis Douglas de São José Oliveira... observaram que o veículo estava carregado com algumas mercadorias características de serem oriundas do Paraguai... os abordados afirmaram que estavam vindo de Foz do Iguaçu/PER e tinham como destino a cidade de Brasília/SDF... ao serem entrevistados, passaram a dar versões desconexas sobre sua ocupações e mostravam-se nervosos... encontraram, acondicionados dentro do painel do veículo, invólucros aparentado ser de substância entorpecente e um invólucro pequeno de cor preta que continha três cartelas do medicamento PRAMIL, contendo vinte comprimidos cada cartela, duas ampolas do medicamento HORMOTROP e duas ampolas de Diluente... no veículo estavam ocultados 15 invólucros marrons de substância aparentando ser cocaína na forma de "crack" e quatro invólucros amarelos de substância aparentando ser "maconha", todas acondicionadas no painel do veículo... foi necessário desmontar o painel do veículo para ter acesso a toda droga escondida....identificou-se que o veículo foi alugado na Localiza em Brasília/DF, conforme contrato que estava no interior do mesmo, em nome de Orencio Barbosa da Silva como "usuário" e Derek Alexsandro Generoso Simon, como "condutor"... já nesta Delegacia, o PRF Renato recebeu uma ligação da base da PRF, sendo informado que um homem teria comparecido naquele lugar, chegando de taxi, se identificando como "Célio" e informado que estaria procurando por alguns amigos... solicitaram o documento da referida pessoa e esta, inicialmente, afirmou que não estava portando os seus documentos... a referida pessoa apresentava-se muito nervosa e reafirmou estar atrás de alguns amigos dos quais havia desencontrado...não soube explicar o motivo de estar naquele local, nem de onde estava vindo e para onde estaria indo... ao procederem uma revista pessoal, identificou-se tratar de Deocely Oliveira da Silva, sendo localizados sua CNH, dois celulares e um papel com diversas anotações sobre controle de gastos, inclusive com alguns nomes, entre eles "Derek"... por não ser um nome comum e coincidir com o que consta no contrato de locação do veículo apreendido, Deocely Oliveira da Silva foi conduzido a esta Delegacia... analisando as últimas ligações efetuadas por Deocely Oliveira da Silva, em um de seus celulares, foram identificadas várias tentativas de contato com os ocupantes do veículo, através do celular apreendido com os mesmos... as chamadas partiram do telefone de Deocely Oliveira da Silva com a identificação "branquelo" e constavam as "não atendidas" no aparelho apreendido com os ocupantes do veículo, nestes identificadas como "morango"... foram identificadas outras ligações mantidas entre os presos, antes da abordagem policial..."
Roberto Guimarães dos Santos (policial rodoviário federal- fls.02/04).

No mesmo sentido foi o depoimento do outro policial rodoviário federal, Renato Exposito Lima ( fls. 05/06):



" os abordados deram versões desconexas sobre suas ocupações e mostravam-se nervosos, fato que despertou a desconfiança dos Policiais... já nessa delegacia, o depoente recebeu uma ligação da base da PRF local informando-o que uma pessoa teria comparecido naquele lugar, chegando de táxi, teria se identificado como "Célio" e que estaria procurando por alguns amigos... o depoente e o condutor Roberto compareceram na base da PRF para averiguarem possível participação nestes crimes... na base da PRF, solicitaram o documento da referida pessoa e esta, inicialmente, afirmou que estava sem seus documentos e que estaria atrás de alguns amigos que havia desencontrado... nervoso, não soube explicar o real motivo de estar ali e nem de onde estava vindo e para onde estaria indo..."

Confira-se a seguir trechos dos depoimentos dos réus:



ELEOMAR BORGES DA SILVA- na fase policial (fls. 08-10):


"...o veículo Fiat Idea, placas GUP- 7922, conduzido pelo interrogado e também ocupado por FRANCIS DOUGLAS DE SÃO JOSÉ OLIVEIRA, foi abordado... no automóvel havia algumas mercadorias que foram adquiridas no Paraguai, alguns remédios e as substâncias entorpecentes, cocaína em pasta base e maconha... as mercadorias estrangeiras, entre elas, bebidas alcoólicas, perfumes e vestuário, pertenciam ao interrogado, a FRANCIS e a DEOCELY OLIVEIRA DA SILVA... as mesmas foram apreendidas... não informou aos servidores da receita federal de que parte da mercadoria pertencia a FRANCIS e a DEOCELY... em relação aos medicamentos, esclarece que os comprimidos de PRAMIL eram para uso pessoal, e também eram para uso pessoal as ampolas do medicamento HORMOTROP SOMATROPINA... quanto a este último, afirma que é utilizado para redução de gordura localizada... as mercadorias e os medicamentos foram adquiridas em Ciudad Del Este... em relação as substâncias entorpecentes encontradas acondicionadas no interior do painel do veículo, 15.030 Kg de pasta-base de cocaína e 2.070 Kg de maconha, o interrogado afirma que foi contratado por uma pessoa residente em Santa Maria/DF para realizar o transporte das mesmas... receberia R$ 5.000,00 (cinco mil reais) pela empreitada criminosa... foi contratado por "Japão", pessoa que conheceu há pouco tempo... não possui qualquer dado que possa identificar "Japão"... seria procurado em sua residência por "Japão" para a entrega do veículo com a droga... o carro foi entregue ao interrogado diretamente pelo "Japão" ,,, não conhece as pessoas de ORENCIO BARBOSA SILVA e DEREK ALEXSANDRO GENEROSO SIMON... no dia 31/07/2011, seguiu viagem de Santa Maria/DF com destino a Foz do Iguaçu/PR... já em Foz do Iguaçu o interrogado procurou por uma pessoa, em relação ao qual não possui qualquer dado, em um hotel da cidade... a referida pessoa ficou responsável por atravessar o carro para o lado paraguaio e acondicionar a droga no mesmo... recebeu o carro de volta e empreendeu viagem de retorno a Santa Maria/DF... indagado sobre o fato de os medicamentos também estarem acondicionados no interior do painel do veículo, ao contrário do que afirmou acima, teria solicitado para que a pessoa responsável pelo acondicionamento da droga também comprasse o medicamento para o interrogado e acondicionasse no interior do painel do veículo... ainda em 02/08/2011, o interrogado encontrou DEOCELY OLIVEIRA DA SILVA na ponte da amizade... DEOCELY informou ao interrogado que havia perdido parte de suas mercadorias, solicitando para que este trouxesse o restante... em contrapartida, DEOCELY, acompanhado de outras pessoas que o interrogado desconhece e ocupando um veículo Corsa Prata, outros dados desconhecidos, serviu de batedor durante o caminho, informando-o sobre eventuais fiscalizações policiais... não sabe informar o motivo pelo qual DEOCELY estaria sozinho em São José do Rio Preto/SP... DEOCELY e FRANCIS DOUGLAS não tinham ciência da droga que estava acondicionada no veículo... ficou hospedado no Hotel Del Rey em Foz do Iguaçu/PR... FRANCIS também estava hospedado no mesmo hotel... o interrogado e FRANCIS realizaram compras juntos em Ciudad Del Este... não comentou com FRANCIS sobre a droga que seria acondicionada no veículo, acreditando que FRANCIS não teria dado falta do veículo durante os dias que permaneceram em Foz do Iguaçu/PR..."

Em Juízo, apesar de continuar assumindo a responsabilidade pelos crimes, inocentando os corréus Deocely e Francis, Eleomar mudou ligeiramente a versão, declarando que fora um indivíduo identificado por "Fernando" quem lhe pedira para transportar as mercadorias de Deocely até Brasília (mídia fls. 322).


FRANCIS DOUGLAS DA SILVA, na fase inquisitorial, declarou (fls. 11/13):



"... é proprietário de uma casa de shows em Santa Maria/DF, denominada "Manda Ver"... durante o dia no local funciona um lava a jato arrendado para Joaquim, outros dados desconhecidos... o veículo Fiat Idea, placas GUP 7922, conduzido por ELEOMAR BORGES DA SILVA, e também ocupado pelo interrogado, foi abordado ... no automóvel havia algumas mercadorias que foram adquiridas no Paraguai... não tinha ciência da existência de remédios e substâncias entorpecentes, cocaína em pasta base e maconha, acondicionadas no interior do painel do veículo... em relação aos medicamentos e as substâncias entorpecentes apreendidas, afirma o interrogado que não as pertence, não sabendo informar como foram acondicionadas no interior do painel do veículo... na data de ontem, 02/08/2011, o interrogado foi até Ciudad del Este e adquiriu suas mercadorias... durante as compras não estava acompanhado de ELEOMAR e de DEOCELY OLIVEIRA DA SILVA ... não sabe informar a quem pertence as substâncias entorpecentes apreendidas... não conhece a pessoa apelidada de "Japão" e que residia em Santa Maria/DF ... não conhece as pessoas de ORENCIO BASRBOSA SILVA e DEREK ALEXSANDRO GENEROSO SIMON, as quais constam como "usuário" e "condutor", respectivamente, no contrato de locação do veículo, localizado no interior do mesmo... esclarece ter encontrado na data de ontem, 02/08/2100, DEOCELY OLIVEIRA DA SILVA, perto da Ponte da Amizade... não conhecia DEOCELY... não sabe informar se DEOCELY manteve contato com ELEOMAR durante o trajeto... apenas foi informado por ELEOMAR de que DEOCELY receberia um dinheiro para "vir na frente"... DEOCELY informava ELEOMAR sobre eventuais fiscalizações da Receita Federal..."

DEOCELY OLIVEIRA DA SILVA prestou as seguintes declarações no auto de prisão em flagrante (fls. 14/16):


"...é estudante de Direito... faz estágio na 1ª vara Cível da Justiça distrital de gama/DF... saiu de Brasília/CF com destino a Foz do Iguaçu/PR, acompanhado de "Fernando", outros dados desconhecidos... conduzia um veículo Corsa... "Fernando" é conhecido de alguns conhecidos seus, uma turma de jovens que dedicam-se a realizar viagens para o Paraguai e trazer mercadorias para revendê-las em Brasília... chegaram em Foz do Iguaçu/PR no dia 1º/08/2011 ... no mesmo dia atravessou para o lado paraguaio em Ciudad del Este realizou compras... parte das mercadorias eram para uso próprio e parte para serem revendidas... não declarou as mercadorias perante a Receita Federal e quando passava para o lado brasileiro e perdeu parte das mercadorias... não possui qualquer documentação que demonstre a ocorrência da apreensão ... na data de ontem encontrou com ELEOMAR BORGES DA SILVA e FRANCIS DOUGLAS DE SÃO JOSÉ OLIVEIRA, ambos amigos de "Fernando"...conversou com ELEOMAR, sendo oferecido para este que colocasse o resto de suas mercadorias no veículo de ELEOMAR, sendo que em troca o interrogado, juntamente com "Fernando" serviriam como batedor... ELEOMAR teria oferecido R$ 500,00 para "Fernando" para que esse funcionasse como batedor... no automóvel de "Fernando" havia produtos eletrônicos pertencentes ao mesmo, cerca de R$ 3.000,00... durante o caminho "Fernando" passava informações sobre a existência de eventual fiscalização policial para ELEOMAR... o telefone LG apreendido em seu poder pertence a "Fernando" e o telefone Nextel também apreendido pertence ao interrogado... após perderem o contato com o carro que escoltavam, o interrogado e "Fernando" resolveram entrar em São José do Rio Preto/SP... "Fernando"ficou desesperado e resolveu ir embora e largou o interrogado perto da rodoviária local... o interrogado. Por engano, ao descer do carro pegou o telefone celular de "Fernando"... a partir desse momento ligou por diversas vezes para o celular de ELEOMAR para ver o que tinha ocorrido... o contato de ELEOMAR estava identificado como "branquelo"... sem resposta, pegou um taxi na rodoviária local e pediu para levá-lo até a base da Polícia Rodoviária Federal para ver se tinha acontecido alguma coisa com ELEOMAR e FRANCIS ... se apresentou como "Célio" aos policiais e disse que estava sem os documentos... logo após esclareceu que o seu nome Deocely e apresentou sua CNH que estava em bolso... também foi localizado um papel com anotações, sendo o interrogado conduzido a esta delegacia... afirma que não tinha de que o automóvel que estava transportando transportava 15.030 Kg de pasta-base de cocaína e 2.070 Kg de maconha... também não tinha ciência de que no automóvel havia medicamentos de importação proibida... não conhece pessoa apelidada de "Japão"... indagado sobre o teor das anotações que constam do papel apreendido e que estava em seu poder, afirma não saber quem seja "Camelo", "Bode" e "Derek"... ainda em relação ao conteúdo do documento apreendido em seu poder e que possui manuscritos sobre gastos de "Deocely", "Camelo", "Bode" e "Derek", afirma ser um extrato dos gastos da viagem, porém, reafirma não conhecer as demais pessoas relacionadas no mesmo... afirma não conhecer as pessoas de ORENCIO BARBOSA SILVA e DEREK ALEKSANDRO GENEROSO SIMON... os custos com a viagem seriam rateados entre o interrogado e "Fernando"... não sabe informar se "Fernando" possui algum apelido... indagado por qual motivo teria optado por colocar suas mercadorias em um automóvel de um terceiro, afirma que o que motivou foi o medo de perder suas mercadorias..."

Os defensores requerem a absolvição de Deocely e Francis quanto ao crime de tráfico de drogas e para tanto, afirmam que ambos não sabiam da existência de entorpecentes no veículo dirigido por Eleomar.


Ainda segundo a defesa, não estaria comprovada a existência de vínculos dos corréus com Deocely para a prática desse crime, pois este estava agindo como "batedor" do veículo que continha suas mercadorias entregues a Eleomar para transportá-las, tendo comparecido ao posto policial à procura dos corréus por ser ingênuo e inexperiente, sendo corriqueiro, na ponte da amizade entre o Paraguai e o Brasil, que pessoas passem mercadorias umas às outras para que sejam transportadas.


Afirma ainda que Deocely não se negou a apresentar documentos ao comparecer no posto policial, não se podendo ainda basear a condenação apenas porque portava um papel onde havia anotações de nomes, cuja origem não soube explicar.


Todas essas afirmações não se sustentam, e foram exaustivamente rebatidas pela acusação e na fundamentação da sentença.


É certo que parte dos delitos são praticados tendo como causa erros, juízos falsos, que levam seus autores a realizar condutas tipificadas como crime, e que muitas vezes tais enganos não são espontâneos, mas provocados por terceiras pessoas que se interpõem na mesma relação.


Decorre, portanto, a necessidade de se apreciar cuidadosamente os fatos para verificar o dolo, elemento subjetivo, a fim de solucionar a questão da forma mais adequada, prevista na Lei Penal.


Porém, sabe-se ser imprescindível que a defesa comprove a ausência de consciência da ilicitude da conduta, não sendo suficiente meras alegações do réu acerca do desconhecimento da existência da droga.


No caso, essas alegações, além de inverossímeis, não tem correspondência com as demais provas e indícios constantes nos autos.


De fato, embora neguem a autoria do tráfico de drogas, não restam dúvidas quanto à participação dos apelantes Francis Douglas de São José Oliveira e Deocely Oliveira da Silva nesse delito, pois os fatos e os depoimentos dos policiais desmentem sua versão.


Em primeiro lugar, Francis ocupava o veículo que estava transportando as substâncias entorpecentes. Ao ser questionado pelos policiais sobre a existência de outros bens, além das mercadorias, demonstrou nervosismo e apresentou respostas desconexas, o que não deveria ocorrer caso desconhecesse o transporte da droga no veículo.


Francis também afirmou que não conhecia Eleomar. Contudo, conforme relatado, Francis é proprietário de um estabelecimento que, à noite, funciona como casa de shows e, durante o dia, como um lava-jato, onde Eleomar trabalhava, sendo, portanto, óbvio que se conheciam.

Ademais, restou comprovado, durante as fases inquisitiva e processual, que Francis e Deocely são pessoas instruídas e de posses. Consoante bem ressaltado pelo Ministério Público Federal, financiaram a defesa de Eleomar, realizada por uma advogada (Julia Solange Soares de Oliveira- fls. 137/147), que tem relação de parentesco ou conjugal com seu advogado ( Ewerton Soares de Oliveira- fls. 148/163), o mesmo que acompanhou Derek e Orêncio ( que constam do contrato de locação do veículo) quando foram ouvidos por precatória (fls. 165/182).


Segundo se infere das anotações dos boletins de vida pregressa dos réus, Eleomar declarou que recebia aproximadamente setecentos reais mensais como lavador de veículos e que pagava aluguel de quatrocentos reais, enquanto Francis alegou possuir renda aproximada de dez mil reais e morar em casa própria e Deocely ter alegado ser estudante de direito em faculdade particular, fazer estágio no fórum e morar com os pais (fls. 31, 34 e 37).


Há ainda que se observar que os acusados entraram em contradições em seus depoimentos.


Com efeito, Eleomar declarou em Juízo que foi o indivíduo identificado por Fernando que lhe pediu para transportar as mercadorias de Deocely para Brasília, enquanto Deocely afirmou também em Juízo que Eleomar se ofereceu para transportar suas mercadorias.


Eleomar afirmou ao policial que havia entregado o carro para que uma terceira pessoa o levasse para o lado paraguaio e acondicionasse as drogas e os medicamentos, e ainda que teria realizado compras em Ciudad del Este, juntamente com Francis, enquanto este declarou que durante as compras não estava acompanhado dos corréus.


Por outro lado, a versão do réu Francis também se mostra dissonante da realidade, pois o mesmo possui veículo próprio novo- ano 2011 (fls. 34 v.), de forma que não haveria motivos para que viajasse em veículo alugado por um terceiro, e conduzido por Eleomar.


Assim, restou claro que o réu Francis tinha plena consciência das drogas que estavam sendo transportadas no veículo, motivo pelo qual deve-lhe ser imputada a conduta de "importar, ter em posse e transportar" drogas ilícitas descrita no caput do artigo 33 da Lei 11.343/06.

Tampouco restaram dúvidas acerca da participação do réu Deocely na empreitada criminosa.


Em primeiro lugar, consoante relataram os policiais, estava muito nervoso quando compareceu na base da Polícia Rodoviária à procura dos corréus e mentiu, sim, acerca de seu nome, negando-se inicialmente a apresentar documento de identificação, não arrolando sequer como testemunha alguma pessoa que pudesse comprovar que o nome com que se apresentou (Célio) fosse seu apelido.


Por outro lado, consoante destacado pelo Ministério Público Federal (fls. 612 v.), a testemunha Nelson Rodrigues dos Santos, motorista de táxi que conduziu Deocely à base da Polícia Rodoviária Federal de São José do Rio Preto/SP, declarou em Juízo que DEOCELY disse que era amigo dos policiais, mas que quando chegou na base, DEOCELY falou para o declarante passar direto e não parar, mas ele, com medo de que se tratava de um assalto, parou e jogou o carro na guarita (fls. 316 e 322).


Ademais, conforme já relatado, DEOCELY trazia consigo um papel com anotações, com referências à sua pessoa e à de "Derek", que, não por mera coincidência, figurou como condutor no contrato de locação do veículo usado para a prática do crime (fls. 110/111).


Corrobora ainda a afirmação de que todos tinham conhecimento da existência de entorpecentes e medicamentos no veículo, bem como o planejamento prévio do crime, o fato de que no referido papel apreendido com DEOCELY (fls. 111), tal como nos celulares apreendidos com os ora apelantes (fls. 198/206) utilizou-se codinomes como, respectivamente, "Camelo", e "Bode"; "Morango" e "Branquelo".


Merece ser transcrita parte da fundamentação da sentença, onde foi devidamente analisado o elemento subjetivo na conduta do correu Deocely e que afasta todas as alegações de sua participação no delito em tela.



"... Deocely Oliveira da Silva:
A autoria em relação ao crime descrito no artigo 33 da Lei nº 11.343/2006 restou comprovada nos autos para o réu Deocely.
Embora não estivesse dentro do veículo em que as drogas foram apreendidas, ou seja, não estivesse transportando as mercadorias ilícitas o réu concorreu para a prática do delito, já que serviu de "batedor" para o outro automóvel, fato esse corroborado pela afirmação do próprio réu. A controvérsia reside no conhecimento ou não das drogas que estavam no veículo com os demais corréus.
O réu negou as acusações que lhe foram impostas, admitindo apenas a aquisição das mercadorias descaminhadas, mas desconhecendo os outros produtos que estavam no carro apreendido.
Negou conhecer os demais réus, até a véspera da viagem ao Paraguai para o Brasil, quando, "temendo perder mercadorias, havia solicitado que o correu Eleomar transportasse suas mercadorias". A realidade, contudo, não se coaduna com a versão apresentada pelo réu.
Em primeiro lugar, é estranho que alguém entregue uma mercadoria para um terceiro que não conhece. A alegação de que os demais corréus possuíam um amigo em comum, chamado Fernando, não afastou a realidade dos fatos, pois não foram dadas informações suficientes sobre a existência deste Fernando, que comprovassem as narrativas.
O réu Deocely foi procurar os demais corréus no posto da polícia federal e negou seu nome completo (alegando que havia dado um apelido), bem como negou estar de posse de documentos pessoais, sendo que, apenas após ser revistado, conforme depoimento dos policiais, verificou-se que estava com a carteira de motorista.
Na mesma oportunidade, foi encontrado com o réu um papel com anotações que, conforme o próprio afirmou, relacionavam as despesas da viagem. Neste papel, além do nome do réu, estava escrito o nome "Derek", que é justamente o primeiro nome da pessoa que consta como condutor do veículo apreendido;
(...)
Tais fatos demonstram que Deocely já conhecia os demais correus e não que os conheceu apenas no Paraguai, portanto, tinha plena consciência do verdadeiro motivo daquela viagem. Como explicar que o réu estava de posse de um papel de um sujeito que constava como condutor de um veículo, sendo que este veículo era dirigido pelo correu Eleomar, que só viria a conhecer depois.
Não se trata de afastar o princípio da presunção da inocência, mas aplicar o princípio da verdade real, que prevalece no processo penal. Assim, a versão apresentada pelo MPF não foi afastada pela defesa, que não conseguiu explicar, de maneira convincente, o motivo do papel em poder de Deocely.
Além disso, o réu fez várias ligações para o correu Eleomar, chegando a alertá-lo, com mensagem de texto, sobre "encontro no trevo e distância a ser mantida"- fls.202.
O fato do réu não estar presente no veículo, em que se encontravam as drogas não afasta a sua participação no delito, já que, ao seguir na frente dos demais coreus, poderia avisá-los de eventuais barreiras policiais,visando justamente a assegurar o sucesso do ilícito.
O comportamento do réu no posto policial, procurando os demais correus não afasta sua culpa, mas apenas atesta sua ingenuidade e inexperiência, situações que serão aferidas no momento da dosimetria.
(...)
(fls. 428).


Incabível ainda o pleito da defesa do réu Deocely para que sua conduta seja desclassificada para aquela prevista no artigo 28, da Lei 11.343/06.


Esse artigo dispõe:



Art. 28. Quem adquirir, guardar, tiver em depósito, transportar ou trouxer consigo, para consumo pessoal, drogas sem autorização ou em desacordo com determinação legal ou regulamentar será submetido às seguintes penas:
I - advertência sobre os efeitos das drogas;
II - prestação de serviços à comunidade;
III - medida educativa de comparecimento a programa ou curso educativo.
(...)
§ 2o Para determinar se a droga destinava-se a consumo pessoal, o juiz atenderá à natureza e à quantidade da substância apreendida, ao local e às condições em que se desenvolveu a ação, às circunstâncias sociais e pessoais, bem como à conduta e aos antecedentes do agente.

No caso, a grande quantidade de droga apreendida ( adquirida diretamente de regiões produtoras onde tem maior grau de pureza, sendo multiplicada após o preparo antes de ser utilizada), ainda que parte fosse destinada a uso próprio, somada às circunstâncias da viagem dos réus e da prisão, é incompatível com tal alegação, o que indica claramente a intenção dos réus em realizar o comércio dos entorpecentes, não havendo que se falar na desclassificação para o delito descrito no artigo 28, da Lei 11.343/06.



DO CRIME DO ARTIGO 273, § 1º-B, I, DO CÓDIGO PENAL:


Os réus também foram condenados pela prática desse crime porque, durante a averiguação policial, constatou-se que estava oculto, no interior do painel do veículo dirigido por Eleomar, três cartelas contendo o medicamento PRAMIL (Sildenafil 50 mg), contendo cada uma vinte comprimidos, duas ampolas de HORMOTROP (Somatropina 12 UI) e duas ampolas de Diluente bacteriostático (Álcool Benzílico 09%).


A defesa de Deocely e Francis afirma que os réus devem ser absolvidos da prática desse crime porque não tinham conhecimento de que havia medicamentos de importação proibida no veículo dirigido por Eleomar, que inclusive assumiu inteiramente que os medicamentos eram seus, enquanto a defesa deste também requer a absolvição afirmando que o crime não se configurou porque o medicamento era para uso próprio.


Não prosperam essas alegações, porquanto não há nos autos quaisquer provas que a corrobore.


Em primeiro lugar, a materialidade delitiva está comprovada pelo laudo pericial de fls. 124/128, atestando que o produto PRAMIL, fabricado pela empresa Novophar- División de La Química Farmacêutica S/A- Assunção/Paraguai, não possui registro junto à Agência Nacional de Vigilância Sanitária (ANVISA) , sendo proibidas a importação, comércio e uso em todo o território nacional, nos termos das resoluções RE 766, de 06/05/2002 e RE 2997, de 12/07/2006, da mencionada agência.


Embora o correu Eleomar também tenha assumido a responsabilidade pela aquisição dos medicamentos, pelos mesmos motivos já expostos na análise da autoria do crime de tráfico de substâncias entorpecentes, não restam dúvidas quanto à participação de todos os réus na internação dos medicamentos, que se encontravam ocultos junto às drogas no interior do painel do veículo em que estavam os réus Eleomar e Francis, e que vinha precedido de outro, onde o correu Deocely agia como "batedor", não prosperando as alegações de que Deocely e Francis não tinham conhecimento de que medicamentos de importação e uso proibido estavam sendo transportados no veículo.


A versão de Eleomar, de que os medicamentos eram para uso próprio, não se sustenta.


Ainda que seja considerada como média a quantidade de comprimidos de Pramil apreendida (sessenta), que existam similares desse medicamento no Brasil, normalmente vendidos a preços mais altos do que os que são vendidos no Paraguai, a internação no País para uso pessoal dos medicamentos registrados seria possível caso estivesse acompanhada do respectivo receituário médico, nos termos do Regulamento Técnico de Vigilância Sanitária de Mercadorias Importadas nº 350 da ANVISA. Assim sendo, a defesa deveria ter juntado esse documento para comprovar a alegação, com fundamento no artigo 156 do CPP, o que não foi feito.


Assim sendo, tudo indica que , assim como a cocaína e a maconha, os medicamentos destinavam-se à revenda.


Consoante bem observado e ressaltado nas contrarrazões ministeriais (fls. 616):



" Quanto à tese de que os medicamentos apreendidos eram para uso próprio, esta também não merece acolhida.
Alega o apelante que, devido a uma cirurgia, passou a ter problemas de ereção, necessitando, portanto, do medicamento "Pramil".
Ocorre que o apelante não trouxe, em momento algum, quaisquer provas que pudessem corroborar tal versão.
Por certo, não apresentou maiores detalhes sobre citada cirurgia, ou ainda, qualquer exame que pudesse comprová-la. Ademais, o problema de saúde do apelante, se existente, poderia ter sido facilmente comprovado por meio de um exame médico-pericial, não requerido pela defesa... "

Por todos esses motivos, mantenho a condenação dos apelantes também pela prática do crime previsto no artigo 273, § 1º-B, I, do Código Penal.


DOSIMETRIA DAS PENAS:



O MM. Juiz, antes de fixar as penas, deixou consignado:



" ... a pena para o crime de tráfico vai de 5 a 15 anos, enquanto o delito atribuído à importação de medicamento proibido possui penas proibido possui penas que variam de 10 a 15 anos. Assim, caso seguido à risca a lei, se aplicarmos a pena mínima, o sujeito que importou uma cartela de "Pramil" ficará 10 anos na cadeia, enquanto que aquele que importa 1 Kg de cocaína, ficará apenas 5 anos.
Houve nítida ofensa ao princípio da proporcionalidade no caso, já que a variação entre a pena mínima e a máxima possui um intervalo bastante reduzido, o que ofende o princípio constitucional da individualização da pena.
Assim, entendo que, embora deva existir um controle sobre a entrada de medicamentos, deve ser aplicada de maneira analógica, a pena prevista para o delito de tráfico de drogas (art. 33 da Lei 11.343/06), já que posterior àquela norma do Código Penal e mais benéfica aos réus.
Considerando que os dois delitos foram praticados através de uma única ação, deve ser aplicada a regra do concurso formal, fazendo-se a dosimetria do ilícito mais grave, em seguida, aumentar-se proporcionalmente em relação ao outro delito, nos termos do art. 70 do CP. Assim, farei a dosimetria separada para ambos os delitos para, em seguida, aplicar a regra do concurso formal.
(...)"
(fls. 432)

As penas dos réus foram assim fixadas:


ELEOMAR BORGES DA SILVA:


Pelo crime de tráfico de drogas:


1ª fase: Pena-base: 5 (cinco) anos e 6 (seis) meses de reclusão e 550 (quinhentos e cinquenta) dias-multa, considerando a quantidade e natureza da droga,


2ª fase: aplicou a atenuante do artigo 65, III, "d", do CP, pelo fato de o réu ter confessado o crime, reduzindo a pena para 5 (cinco) anos de reclusão e 500 (quinhentos) dias-multa;


3ª fase: aplicou a causa de aumento derivada da transnacionalidade do tráfico (art. 40, I, da Lei 11.343/06) no patamar de um sexto, totalizando a pena provisória de 5 (cinco) anos e 10 meses de reclusão e 583 (quinhentos e oitenta e três) dias-multa, bem como a causa de diminuição prevista no § 4º do artigo 33 da mesma lei no mínimo legal (um sexto), o que totalizou a pena definitiva de 4 (quatro) anos, 10 (dez) meses e 10 (dez) dias de reclusão, a ser cumprida em regime inicial fechado e 486 (quatrocentos e oitenta e seis) dias-multa, no valor unitário de 1/30 do salário mínimo.


Pelo crime do artigo 273, § 1º-B, I, do CP:


1ª fase: Pena-base: mínimo legal de cinco anos de reclusão e dez dias-multa.


Não foram consideradas agravantes ou atenuantes, tampouco causas de aumento ou de diminuição.


Considerando o concurso formal de crimes ( artigo 70 do CP), deixou de aplicar a pena referente ao tráfico, e aplicou apenas a do artigo 273, § 1º-B, I do CP, aumentada em um sexto, resultando na pena definitiva de 5 (cinco) anos e 10 (dez) meses de reclusão, a ser cumprida em regime inicial fechado e 496 (quatrocentos e noventa e seis dias-multa, no valor de 1/30 do salário mínimo.



FRANCIS DOUGLAS DE OLIVEIRA:


Pelo crime de tráfico de drogas:

1ª fase: Pena-base: 5 (cinco) anos e 6 (seis) meses de reclusão e 550 (quinhentos e cinquenta) dias-multa, considerando a quantidade e natureza da droga,


2ª fase: considerou ausentes atenuantes ou agravantes;


3ª fase: aplicou a causa de aumento derivada da transnacionalidade do tráfico (art. 40, I, da Lei 11.343/06) no patamar de um sexto, totalizando a pena provisória de 6 (seis) anos e 5 (cinco) meses de reclusão e 641 (seiscentos e quarenta e um) dias-multa, bem como a causa de diminuição prevista no § 4º do artigo 33 da mesma lei no mínimo legal (um sexto), o que totalizou a pena definitiva de 5 (cinco) anos, 4 (quatro) meses e 5 (cinco) dias de reclusão, a ser cumprida em regime inicial fechado e 535 (quinhentos e trinta e cinco) dias-multa, no valor unitário de um salário mínimo.


Pelo crime do artigo 273, § 1º-B, I, do CP:


1ª fase: Pena-base: mínimo legal de cinco anos de reclusão e dez dias-multa.


Não foram consideradas agravantes ou atenuantes, tampouco causas de aumento ou de diminuição.


Considerando o concurso formal de crimes ( artigo 70 do CP), deixou de aplicar a pena referente à importação de medicamento proibido, para aplicar a pena do tráfico, aumentada em um sexto, resultando na pena definitiva de 6 (seis) anos, 2 (dois) meses e 25 (vinte e cinco) dias de reclusão, a ser cumprida em regime inicial fechado e 496 (quatrocentos e noventa e seis dias-multa, no valor de um salário mínimo.



DEOCELY OLIVEIRA DA SILVA:


Pelo crime de tráfico de drogas:


1ª fase: Pena-base: 5 (cinco) anos de reclusão e 500 (quinhentos) dias-multa. Apesar de considerar desfavoráveis a natureza e a quantidade da droga, afirmou que a culpabilidade do réu deveria ser reduzida por não ter participado diretamente do crime, fixando a pena no mínimo legal;


2ª fase: considerou ausentes atenuantes ou agravantes;


3ª fase: aplicou a causa de aumento derivada da transnacionalidade do tráfico (art. 40, I, da Lei 11.343/06) no patamar de um sexto, totalizando a pena provisória de 5 (cinco) anos e 10 (dez) meses de reclusão e 583 (quinhentos e oitenta e três) dias-multa, bem como a causa de diminuição prevista no § 4º do artigo 33 da mesma lei no máximo legal (dois terços), considerando sua menor participação no delito, já que não transportava diretamente as drogas, além da ter agido ingenuamente ao se apresentar no posto policial, o que totalizou a pena definitiva de 1 (um) ano, 11 (onze) meses e 10 (dez) dias de reclusão, a ser cumprida em regime inicial fechado e 195 (cento e noventa e cinco) dias-multa, no valor unitário de 1/30 do salário mínimo.


Pelo crime do artigo 273, § 1º-B, I, do CP:


1ª fase: Pena-base: mínimo legal de cinco anos de reclusão e dez dias-multa.


Não foram consideradas agravantes ou atenuantes, tampouco causas de aumento ou de diminuição.


Considerando o concurso formal de crimes ( artigo 70 do CP), deixou de aplicar a pena referente ao tráfico , para aplicar a pena do crime de importação de medicamento proibido aumentada em um sexto, resultando na pena definitiva de 5 (cinco) anos e 10 (dez) meses de reclusão, a ser cumprida em regime inicial fechado e 205 (duzentos e cinco) dias-multa, no valor de 1/30 do salário mínimo.


Ao contrário do requerido pelos réus Eleomar e Francis, as penas-base não merecem ser redimensionadas.


O MM. Juiz agiu com acerto ao fixar a pena-base desses réus acima do mínimo legal, ao valorar desfavoravelmente a expressiva quantidade da droga, atendo-se aos parâmetros expressamente previstos no artigo 42 da Lei 11.343/06, que configura norma especial em relação ao artigo 59 do Código Penal, orientando o Magistrado a dar maior importância aos critérios que estabelece, dentre eles a quantidade da droga, em relação às demais circunstâncias judiciais, por ser de fundamental importância na distinção entre o pequeno e o grande traficante, bem como a natureza da droga (cocaína), de conseqüências altamente maléficas.


De fato, não pode ser considerada de pequena monta a quantidade de drogas apreendidas nestes autos, ainda mais quando comparada às quantidades normalmente portadas pelo criminoso no tráfico urbano de varejo, quando é vendida diretamente aos consumidores pelos pequenos traficantes. Por outro lado, a cocaína que é normalmente exportada possui grau de pureza altíssimo, sendo misturada a outras substâncias antes da entrega ao consumidor para elevar o rendimento.


Assim, ainda que os réus sejam primários e de bons antecedentes, tal fato não induz, necessariamente, à fixação da pena-base no patamar mínimo, pois subsistem circunstâncias legais especiais (ar. 42 da lei de drogas) aptas para justificar a fixação da pena acima do mínimo legal, para a suficiente prevenção e repressão do crime.


Nesse sentido, os seguintes precedentes do STJ e desta Turma:



"HABEAS CORPUS. TRÁFICO ILÍCITO DE DROGAS. PENA-BASE FIXADA ACIMA DO MÍNIMO LEGAL. CIRCUNSTÂNCIAS JUDICIAIS DESFAVORÁVEIS. GRANDE QUANTIDADE DE DROGA APREENDIDA (17 KG DE MACONHA). DECISÃO FUNDAMENTADA. APLICAÇÃO DA MINORANTE DO ART. 33, § 4.º, DA LEI N.º 11.343/06. IMPOSSIBILIDADE. DEDICAÇÃO À ATIVIDADE CRIMINOSA. ORDEM DENEGADA.
1. O art. 42 da Lei n.º 11.343/2006 impõe ao Juiz considerar, com preponderância sobre o previsto no art. 59 do Código Penal, a natureza e a quantidade da droga, tanto na fixação da pena-base quanto na aplicação da causa de diminuição de pena prevista no § 4.º do art. 33 da nova Lei de Drogas.
2. Na hipótese, o Juízo sentenciante, no que foi referendado pelo Tribunal a quo, examinando as circunstâncias judiciais do caso concreto, afirmou que a grande quantidade de droga apreendida (17 kg de maconha) trouxe maior grau de censurabilidade a conduta da Paciente, razão pela qual fixou a pena-base acima do mínimo legal, com fundamentos válidos.
(...)"
(STJ, HC 201001463647, Relator(a) LAURITA VAZ, QUINTA TURMA, DJE DATA:01/02/2011)
"PENAL - TRÁFICO INTERNACIONAL DE ENTORPECENTES - LEI 11.343/2006 - AUTORIA E MATERIALIDADE DO DELITO AMPLAMENTE COMPROVADAS - DIMINUIÇÃO DA PENA BASE AO MÍNIMO - IMPOSSIBILIDADE - INAPLICABILIDADE DO REDUTOR PREVISTO NO ARTIGO 33, §4º DA REFERIDA LEI - DELAÇÃO PREMIADA - NÃO RECONHECIMENTO - REGIME INICIAL FECHADO MANTIDO - RECURSO DA DEFESA IMPROVIDO.
1. A autoria e a materialidade do delito restaram amplamente demonstradas por meio do Auto de Prisão em Flagrante, do Laudo Preliminar de Constatação, do Laudo de Exame Químico Toxicológico, com resultado positivo para cannabis sativa linneu - maconha.
2. Considerando que o réu transportava 20,060 kg (vinte quilos e sessenta gramas) de maconha, concluo que a pena-base foi fixada acertadamente acima do mínimo legal, ou seja, 06 (seis) anos de reclusão e 600 (seiscentos) dias-multa.
3. Além disso, a exasperação da sanção acima do mínimo legal se justifica, na hipótese, pelo conjunto das circunstâncias judiciais que desfavorece o acusado, ou seja, pelo fato de possuir personalidade voltada para a prática de delitos, pela vultosa quantidade da droga, que não pode ser considerada de pequena monta como pretende a defesa, e pela sua natureza também, já que sua nocividade é flagrante, pois além de determinar dependência física e psíquica, causa sérios danos à saúde do usuário, vez que seus efeitos se prolongam no tempo, critérios preponderantes previstos no art. 42 da Lei 11.343/06. "
(TRF 3, ACR 200760060007053, Relator(a) JUIZA RAMZA TARTUCE, QUINTA TURMA, DJF3 CJ2 DATA:11/12/2008 PÁGINA: 295 )

As alegações lançadas pelos apelantes, de que não estaria comprovada a transnacionalidade do tráfico, não prosperam, já que comprovado, pelos depoimentos dos policiais rodoviários federais, bem como do réu Eleomar, que as mercadorias, drogas e medicamentos apreendidos foram adquiridos no Paraguai, para serem introduzidos em território nancional, mais precisamente no Distrito Federal, para onde os réus se dirigiam quando foram abordados, de forma que deve ser mantida, na dosimetria de suas penas, a causa de aumento prevista no inciso I, do artigo 40, da Lei 11.343/06.


Não conheço dos pedidos dos apelantes referentes à exclusão da causa de aumento de pena pela interestadualidade do tráfico, pois não foi reconhecida pela sentença, tampouco do pedido de aplicação da confissão na dosimetria da pena do apelante Eleomar, já devidamente aplicada pelo Juiz "a quo".


Não há ainda como acolher o pedido da defesa dos réus Eleomar e Francis, para que seja aplicado o benefício do § 4º do artigo 33 da lei de drogas no grau máximo.


Nesse aspecto, ressalvo meu entendimento, assim como o de parte dos integrantes desta Turma, no sentido de que não deve ser aplicada a causa de redução de pena prevista no § 4º do artigo 33, da Lei de Drogas, aos "mulas" do tráfico primários que agem a mando de uma organização criminosa, ainda que eventualmente, pois assim agindo integram a organização, embora não se dediquem a atividades ilícitas.


Contudo, tratando-se de recurso exclusivo da defesa, também entendo que não merece prosperar o pleito pela aplicação do benefício previsto no § 4º do artigo 33, da Lei 11.343/06 no patamar máximo, que deve ser reservada aos casos de tráfico eventual para usuários de pequenas quantidades de droga, nos casos em que também forem totalmente favoráveis as circunstâncias judiciais do artigo 59 do CP.


O parâmetro para a graduação da redução deve ser extraído da razão que motivou a edição da lei e da causa de diminuição, ou seja, o tratamento privilegiado ao traficante de primeira viagem e o recrudescimento do tratamento do tráfico em geral, aliado às disposições contidas nos artigos 42 da Lei 11.343/06 e do artigo 59 do CP.


Deve-se ainda considerar a quantidade da droga, elemento decisivo também para o estabelecimento do "quantum" da redução da pena, nos casos em que for aplicado o artigo 33, § 4º, da Lei 11.343/2006.


Na hipótese dos autos, não cabe a redução no patamar máximo, tendo em vista que a conduta dos réus se insere em estágio intermediário da cadeia do tráfico, já que não estavam vendendo a droga aos usuários, mas sim introduzindo em nosso país expressiva quantidade de cocaína e de maconha, que seria pulverizada entre vários vendedores no mercado de consumo, conduta esta que, se bem sucedida, possibilitaria o abastecimento de diversos pontos de venda de tóxicos distintos, sendo potencialmente mais gravosa que o mero abastecimento no mercado interno.


Ademais, embora sejam primários e de bons antecedentes e não possam ser considerados como membros efetivos do crime organizado, há que se considerar que não atuavam sozinhos na prática delitiva.


Nessa ordem de idéias, não merecem a diminuição da pena no patamar máximo. Para tanto, além das condições já consideradas, haveriam de concorrer outras circunstâncias relevantes, como a situação de miserabilidade, a baixa instrução e a pouca inserção no meio social, a condição de dependentes, o desempenho de atividade lícita, a tenra ou avançada idade e tantas outras, que não restaram comprovadas.


A lei previu índice de redução em escala variável (de um sexto a dois terços), de maneira que concedeu ao Juiz, diante das peculiaridades de cada caso, discricionariedade (que não se confunde com arbitrariedade) na determinação do quantum da redução, para que se concretize uma pena que atenda, de forma coerente, às finalidades de repreensão e prevenção em cada caso, e que são bastante diversificadas nos casos de tráfico de drogas.


Essa liberdade concedida ao Magistrado se encontra em consonância com o sistema da relativa determinação da pena, adotado pelo Código Penal, segundo o qual a individualização legislativa é complementada pela judicial.


Assim sendo, não se aplicará a redução da pena no grau máximo indiscriminadamente, a todo e qualquer traficante, pois, caso assim fosse, estar-se-ia comparando os chamados "mulas" aos traficantes individuais que transportam pequena quantidade de droga para os usuários e estimulando os chefes das grandes organizações transnacionais a praticar cada vez mais o tráfico ilícito de entorpecentes.


Sabe-se, também, que o tipo da substância entorpecente indica o grau de nocividade para a saúde pública, e a quantidade, quase sempre, aponta para o grau de envolvimento do infrator com o comércio e a medida de sua personalidade perigosa e voltada para a prática criminosa.


Portanto, mostrou-se razoável e suficiente, em termos de repressão e prevenção penal, a aplicação da redução da pena prevista no artigo 33, § 4º, da Lei 11.343/06 no patamar de um sexto nas penas de Francis e Eleomar.


Por fim, não prospera o pedido de substituição da pena privativa de liberdade por restritivas de direitos.


A Lei nº 9.714/98 alterou os artigos 43, 44, 45, 46, 47, 55 e 77 do Código Penal, introduzindo, em nosso sistema, a substituição da pena privativa de liberdade por restritiva de direitos e determina, no artigo 44:


"As penas restritivas de direitos são autônomas e substituem as privativas de liberdade, quando:
I - aplicada pena privativa de liberdade não superior a 4 (quatro) anos e o crime não for cometido com violência ou grave ameaça à pessoa ou, qualquer que seja a pena aplicada, se o crime for culposo;
II - o réu não for reincidente em crime doloso;
III - a culpabilidade, os antecedentes, a conduta social e a personalidade do condenado, bem como os motivos e as circunstâncias indicarem que essa substituição seja suficiente".

Portanto, para se conceder a substituição da pena privativa de liberdade por restritiva de direitos, faz-se necessário que o réu preencha requisitos objetivos e subjetivos, o que não se verifica na presente hipótese, em primeiro lugar porque o "quantum" das penas extrapola o limite estabelecido no inciso I do referido artigo, de maneira que os réus não preenchem o requisito objetivo.


Ainda que assim não fosse, há que se considerar que, no caso, não estão preenchidos os requisitos subjetivos, considerando-se que o motivo do crime de tráfico foi a obtenção de dinheiro de maneira fácil, à custa de vício alheio.


Levando-se em consideração os motivos e as circunstâncias do crime, observa-se que a substituição da pena privativa de liberdade não se mostra suficiente para impedir que os réus voltem a traficar drogas, refreando o desejo de ganho irrefletido de dinheiro. Por outro lado, a concessão do benefício poderá levá-los a prestar serviços em instituições públicas, onde haverá o risco de dar continuidade ao crime de tráfico de drogas.


Assim, entendo não ser socialmente recomendável a substituição da pena privativa de liberdade.


Por fim, a vedação tem fundamento nos artigos 33, parágrafo 4º e 44, ambos da Lei nº 11.343/06, que proíbem expressamente que a pena privativa de liberdade cominada, embora possa ser objeto de redução, seja convertida em restritiva de direitos, em atenção à função preventivo-repressiva da pena privativa de liberdade como instrumento eficaz ao combate das atividades relacionadas ao tráfico de entorpecentes.


Ressalto ainda que o Plenário do STF recentemente declarou, através do "habeas corpus" 97256, pela via incidental, a inconstitucionalidade da expressão "vedada a conversão em penas restritivas de direitos" contida no parágrafo 4º do artigo 33, da Lei nº 11.343/06, bem como da expressão "vedada a conversão de suas penas em restritivas de direitos", constante do artigo 44 da mesma lei. Contudo, a ordem não foi concedida para assegurar ao paciente a imediata substituição , mas sim para remover o óbice contido na Lei 11.343/06, devolvendo ao Juízo das Execuções Criminais a tarefa de auferir o preenchimento das condições objetivas e subjetivas para a concessão.


Confira-se o seguinte julgado acerca desse tema:



"HABEAS CORPUS. ART. 10, § 2º, DA LEI N. 9.437/97. ATIPICIDADE DA CONDUTA. ABOLITIO CRIMINIS TEMPORÁRIA. PRETENDIDO RECONHECIMENTO. SUPRESSÃO DE INSTÂNCIA. WRIT NÃO CONHECIDO.
(...)
SUBSTITUIÇÃO DA PENA PRIVATIVA DE LIBERDADE POR RESTRITIVAS DE DIREITOS. REQUISITOS OBJETIVO E SUBJETIVO. AUSÊNCIA DE PREENCHIMENTO. IMPOSSIBILIDADE DE PROCEDER-SE À PERMUTA.
Inviável substituir-se a pena privativa de liberdade por restritivas de direitos, haja vista a ausência de preenchimento do pressuposto objetivo previsto no art. 44 do CP e a desfavorabilidade de 2 (duas) circunstâncias judiciais, o que evidencia que, in casu, a conversão da pena privativa de liberdade por restritivas de direitos não se mostrará suficiente para a prevenção e repressão dos delitos denunciados. (...)"
(STJ, HC 200901593924, Relator(a) JORGE MUSSI, QUINTA TURMA, DJE DATA:01/02/2011)


Por esses motivos, também deixo de substituir a pena corporal dos réus por restritivas de direitos.


Diante do exposto, NEGO PROVIMENTO às apelações.


É o voto.


Antonio Cedenho
Desembargador Federal


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