Diário Eletrônico

PODER JUDICIÁRIO

TRIBUNAL REGIONAL FEDERAL DA 3ª REGIÃO

APELAÇÃO CRIMINAL Nº 0005129-06.2010.4.03.6114/SP
2010.61.14.005129-1/SP
RELATORA : Desembargadora Federal RAMZA TARTUCE
APELANTE : Justica Publica
APELANTE : EDGAR GOMES SILVA reu preso
ADVOGADO : TADEU CORREA e outro
CODINOME : EDGAR GOMES DA SILVA
APELADO : OS MESMOS
No. ORIG. : 00051290620104036114 3 Vr SAO BERNARDO DO CAMPO/SP

EMENTA

PENAL. PROCESSUAL PENAL. PEDOFILIA. ARTS. 241-A E 241-B. ARMAZENAMENTO DE ARQUIVOS EM UM HD GUARDADO EM ARMÁRIO. COMPARTILHAMENTO DE OUTROS ARQUIVOS EM PERÍODO DISTINTO E POR MEIO DE OUTRO HD, INSTALADO NO COMPUTADOR. CARACTERÍSTICAS REVELAM CONDUTAS DISTINTAS. CONCURSO MATERIAL. ALEGAÇÃO DE APLICAÇÃO DA EXCLUDENTE DA ILICITUDE. NÃO DEMONSTRAÇÃO. MANUTENÇÃO DAS PENAS APLICADAS ACIMA DO MÍNIMO LEGAL. CONTINUIDADE DELITIVA NÃO DEMONSTRADA. RECURSOS IMPROVIDOS.
1. Autoria, materialidade e dolo restaram bem demonstrados pelo auto de prisão em flagrante, auto de apreensão, informação técnica, laudos periciais relativos ao exame dos HDs apreendidos, e testemunhas ouvidas.
2. O réu reconheceu o armazenamento dos arquivos com pornografia infantil e que compartilhou material ilícito. Sustenta que isso fazia parte de investigação, mas não trouxe dados efetivos a respeito, tampouco as testemunhas comprovaram ter ciência ou autorização para tanto.
3. As testemunhas de defesa confirmam o conhecimento do réu na área de informática.
4. Peritos confirmaram os delitos e afirmam a ineficácia da suposta linha de investigação apontada pelo acusado.
5. Armazenamento de 50 GB de arquivos, contendo pornografia infantil, em um HD, sem sistema operacional instalado ou qualquer programa, guardado em armário no escritório, revela o delito do art. 241-B.
6. Outro HD, instalado no computador em uso, com programa de compartilhamento e-Mule instalado e demonstrado o efetivo compartilhamento de arquivos, em época distinta dos arquivos armazenados na outra mídia, por meio daquele programa revelam o delito do art. 241-A.
7. Excludente da ilicitude prevista no § 2º do art. 241-B só se refere a este crime e não ao outro. Não demonstrada ciência ou autorização superior acerca da suposta investigação. Excludente afastada.
8. Circunstâncias do crime graves e periculosidade do agente, por ser escrivão da polícia civil, e já ter participado de investigações de crimes de pedofilia, ensejaram majoração da pena acima do mínimo legal.
9. Concurso material mantido. O crime do art. 241-B é permanente e não demonstrada a continuidade delitiva em relação ao do art. 241-A. Penas mantidas.
10. Incabível a conversão em penas restritivas de direitos.
11. Recursos improvidos.

ACÓRDÃO

Vistos e relatados estes autos em que são partes as acima indicadas, decide a Egrégia Quinta Turma do Tribunal Regional Federal da 3ª Região, por unanimidade, negar provimento aos recursos, nos termos do relatório e voto que ficam fazendo parte integrante do presente julgado.


São Paulo, 29 de outubro de 2012.
RAMZA TARTUCE
Desembargadora Federal


Documento eletrônico assinado digitalmente conforme MP nº 2.200-2/2001 de 24/08/2001, que instituiu a Infra-estrutura de Chaves Públicas Brasileira - ICP-Brasil, por:
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APELAÇÃO CRIMINAL Nº 0005129-06.2010.4.03.6114/SP
2010.61.14.005129-1/SP
RELATORA : Desembargadora Federal RAMZA TARTUCE
APELANTE : Justica Publica
APELANTE : EDGAR GOMES SILVA reu preso
ADVOGADO : TADEU CORREA e outro
CODINOME : EDGAR GOMES DA SILVA
APELADO : OS MESMOS
No. ORIG. : 00051290620104036114 3 Vr SAO BERNARDO DO CAMPO/SP

RELATÓRIO

Trata-se de APELAÇÕES CRIMINAIS interpostas pela JUSTIÇA PÚBLICA e por EDGAR GOMES SILVA, contra a sentença proferida pelo MM. Juiz Federal da 3ª Vara Federal de São Bernardo do Campo/SP, que condenou o réu às penas de 7 anos de reclusão, no regime inicial semi-aberto, e 30 dias-multa, no valor diário de 2 salários mínimos da época do crime, com correção monetária, pelas imputações contidas nos arts. 241-A e 241-B, do Estatuto da Criança e do Adolescente, e decretou a perda do cargo público, como efeito da condenação.

Narra a denúncia que:

"1º fato - do crime do artigo 241-B da Lei 8069/90
Em 16 de julho de 2010, no interior de sua residência, situada na Avenida Getúlio Vargas, 1.834, São Bernardo do Campo/SP, o denunciado foi surpreendido armazenando, de forma livre e consciente, em diversas mídias eletrônicas (em pelo menos dois HD's), pelo menos 383 (trezentos e oitenta e três) vídeos contendo cenas de sexo explícito e pornográficas envolvendo crianças e adolescentes.
O presente inquérito policial originou-se de desdobramento da "Operação MAX", deflagrada pela Interpol da Alemanha para reprimir a posse e a distribuição de material contendo pornografia infantil. Conforme os autos do procedimento criminal nº 0005216-59.2010.403.6114, em trâmite perante este R. Juízo, constatou-se que em 23/08/2005, às 12:42:48 UTC+2, o usuário do IP brasileiro 201.0.80.176 fez o download do vídeo "3DsMax_22.mpg", que continha inequivocamente cenas de estupro de uma criança de aproximadamente quatro anos de idade. O vídeo foi baixado para o Brasil de um servidor hospedado na Rússia.
Após a investigação, constatou-se que o IP que adquirira o vídeo havia se originado da residência do ora denunciado. Mediante tal informação, obteve-se o competente mandado de busca e apreensão por parte deste R. Juízo (fls. 09).
Na execução do mandado de busca e apreensão de fls. 09 os policiais responsáveis pela operação lograram encontrar na residência do acusado numerosas mídias com fotos e vídeos pornográficas envolvendo crianças e adolescentes. Foram apreendidas na residência do denunciado dois HDs (um da marca Samsung e outro da marca Seagate), três pen drives e sete CD's (fls. 11).
Até o momento, as mídias apreendidas não foram totalmente periciadas, tendo sido apresentados os laudos periciais parciais 206/2010 (fls. 32/44), 3.517/2010 e 3.593/2010 (anexos à denúncia).
O laudo 3.517/2010 apurou que o HD da marca Samsung era usado pelo denunciado apenas para guardar arquivos de usuário. No HD Samsung, o denunciado possuía 328 (trezentos e vinte e oito) arquivos de vídeo contendo cenas de sexo explícito e pornográficas envolvendo crianças e adolescentes. Destes arquivos, 304 (trezentos e quatro) estavam na pasta "\SOUL" e 24 (vinte e quatro) na pasta "\SOUL\PEDO".
No HD da marca Seagate, totalmente operacional, o denunciado possuía pelo menos 55 (cinquenta e cinco) vídeos contendo cenas de sexo explícito e pornográficas envolvendo crianças e adolescentes, na pasta "\Users\BRAVO\Downloads\[soul]", conforme os laudos parciais nº 3.593/2010 anexo e de fls. 32/44.
Conforme o quadro 1 de fl. 42 e o laudo pericial anexo à denúncia, os vídeos apurados até agora foram, em sua maioria, adquiridos pelo denunciado entre os anos de 2004 e 2010. No HD Samsung, as datas de criação dos arquivos são do período entre 16.11.2009 e 18.12.2009, indicando que foi nesse período que o denunciado criou o seu disco de armazenamento. As datas de última modificação, que indicam quando o denunciado adquiriu os arquivos, se compreendem entre 13.05.2004 e 19.12.2009. Por fim, o último acesso dos arquivos do HD Samsung se situa entre 15.12.2009 e 19.12.2009. Já no HD Seagate, conforme fls. 42/43, os arquivos com nome que remete a pornografia infantil se situam entre 16/05/2010 e 09/07/2010. As datas, e o download do servidor hospedado na Rússia que deu origem à investigação, evidenciam a intenção do denunciado em permanecer com o material pornográfico, e que vinha adquirindo os vídeos contendo cenas de sexo explícito e pornográficas envolvendo crianças e adolescentes desde maio de 2004.
Assim, cometeu EDGAR GOMES SILVA o crime tipificado no artigo 241-B, caput, do Estatuto da Criança e do Adolescente, por pelo menos 383 (trezentas e oitenta e três) vezes em continuidade delitiva.
2º fato - do crime do artigo 241-A da Lei 8.069/90
Entre 12 de abril de 2010 e 16 de julho de 2010, a partir de sua residência, situada na Avenida Getúlio Vargas, 1.834, em São Bernardo do Campo/SP, o denunciado ofereceu, disponibilizou, transmitiu, distribuiu e divulgou, inclusive para terceiros situados no exterior, por meio de sistema de informática e telemática, pelo menos 277 (duzentos e setenta e sete) vídeos contendo cenas de sexo explícito e pornográficas envolvendo crianças e adolescentes.
Conforme o laudo pericial parcial nº 3.593/2010 anexo à presente denúncia, o denunciado fazia uso de um popular programa de compartilhamento de arquivos denominado e-Mule para fazer o download de arquivos de foto e vídeo de pornografia infantil e, simultaneamente, disponibilizar os arquivos para que outros usuários descarregassem os arquivos para seu computador. Esse programa foi instalado em 12 de abril de 2010 no HD da marca Seagate.
Por meio do e-Mule o denunciado disponibilizava para acesso e aquisição por outros usuários, inclusive no exterior, pelo menos 55 (cinquenta e cinco) arquivos de vídeo contendo cenas de sexo explícito e pornográficas envolvendo crianças e adolescentes. Todos esses arquivos se encontravam na pasta "\Users\BRAVO\Downloads\[soul]" do HD Seagate apreendido. Dos pelo menos cinquenta e cinco arquivos de pornografia infantil que o denunciado disponibilizava, 27 (vinte e sete) foram efetivamente transmitidos para terceiros pela Internet.
O 55 (cinquenta e cinco) vídeos de sexo explícito e pornografia envolvendo crianças e adolescentes que foram encontrados pela perícia parcial faziam parte de um conjunto de 277 (duzentos e setenta e sete) vídeos que denunciado havia disponibilizado pelo e-Mule, conforme registros mantidos pelo próprio programa de compartilhamento. Os 222 arquivos ainda não localizados podem ter sido apagados no tempo da busca e apreensão, ou podem estar em pastas ainda não localizadas, mas é certo que o denunciado os disponibilizou para aquisição por terceiros no passado, sendo que vários foram efetivamente transmitidos. A listagem transcrita no laudo pericial parcial nº 3.593/2010 indica que todos esses 277 (duzentos e setenta e sete) vídeos continham cenas de sexo explícito e pornográficas envolvendo crianças e adolescentes, como indicam o uso, no nome dos arquivos, da nomenclatura típica da pornografia pedófila, como por exemplo "7años", "9yo" (yo = years old), "lolita", "pthc" (pre teen hardcore) etc., além de diversos arquivos com nome explicitamente pedófilo.
Assim, cometeu EDGAR GOMES SILVA o crime tipificado no artigo 241-A, caput, do Estatuto da Criança e do Adolescente, por pelo menos 277 (duzentas e setenta e sete) vezes em continuidade delitiva.
Materialidade e autoria
A materialidade delitiva comprova-se pelos laudos periciais parciais, que esclarecem com detalhes a busca e apreensão, bem como o depoimento dos policiais que participaram da prisão do denunciado e pelo CD com amostras de vídeos que acompanha o laudo parcial nº 3.517/2010.
A autoria delitiva por sua vez mostra-se incontroversa, uma vez que o acusado era o único usuário dos computadores que tinham os vídeos espúrios, e não negou a posse do material apreendido. O denunciado tentou justificar que o material por ele armazenado seria necessário para suas investigações como escrivão da Polícia Civil, fatos estes negados por seus superiores hierárquicos e colegas de trabalho em fls. 54/55, e pela documentação juntada aos autos nº 0005216-59.2010.403.6114. Reforçam a autoria a prova de que em 23/08/2005 o IP na residência do denunciado fez o download noticiado pela Interpol Alemã, a informação do laudo pericial parcial nº 3.593/2010 anexo que demonstra que o denunciado fazia frequentes pesquisas por arquivos no e-Mule por temos ligados à pedofilia como "pthc" e "lolita", e a constatação de que os arquivos referentes a pornografia infantil estavam bem organizados pelo denunciado em pastas identificadas pelo código "soul".
Conclusão
Ante o exposto, o Ministério Público Federal denuncia EDGAR GOMES SILVA como incurso por 383 (trezentas e oitenta e três) vezes em continuidade delitiva no crime do art. 241-B da Lei nº 8.069/1990 (Estatuto da Criança e do Adolescente), e por 277 (duzentas e setenta e sete) vezes em continuidade delitiva no crime do art. 241-A da mesma Lei nº 8.069/1990. (...)" - fls. 175 verso/177 verso

A denúncia foi recebida em 06.08.2010 (fl. 179).

Certidões de Distribuição, relativas a antecedentes, juntadas a fls. 191/192.

O MPF requereu a juntada do laudo nº 3.593/2010 (fls. 193/214), e do CD contendo o conteúdo da caixa postal do e-mail de titularidade do acusado, enviados pela empresa IG (fls. 215/217).

Foi determinado o sigilo da ação (fl. 218).

O acusado foi citado em 11.08.2010 (fls. 222/224).

Determinado o desentranhamento de folhas dos autos do Inquérito Policial nº 00006989-76.2009.403.6114 e seu desapensamento (fl. 225).

A determinação foi parcialmente cumprida, conforme certidão de fl. 226, pois algumas folhas eram cópias cujos originais já estavam encartados nestes autos (fls. 226/305), e foram desapensados os autos dos de nº 0006989-76.2009.403.6114 (fl. 306).

Dada vista ao Ministério Público Federal (fl. 307), manifestou-se a fls. 308/310, requerendo que os autos desapensados ficassem à disposição das partes, em Secretaria, pois estão intrinsecamente ligados os fatos, além de complementação de ofício já encaminhado à Corregedoria da Polícia Civil, informando a denúncia feita nestes autos, e solicitou fossem reiterados os ofícios para a vinda de folhas de antecedentes criminais, já encaminhados ao IIRGD, Polícia Federal e distribuidor estadual, além dos antecedentes funcionais e disciplinares. Reiterou, também, o pedido de perícia psiquiátrica e a requisição de eventuais avaliações psicológicas pelas quais o réu tenha passado no âmbito da Polícia Civil. Juntou ofício do provedor Globo.com em que é informado o bloqueio de endereço eletrônico (fl. 311).

Juntado a fls. 313/314, ofício da Polícia Civil acerca da ficha funcional do acusado.

Certificado que o réu não apresentou defesa escrita (fl. 315), foi determinado pelo juízo que a advogada constituída fosse intimada para apresentar a defesa preliminar sob pena de abandono e multa (fl. 317).

Foi expedido mandado de intimação (fls. 317 verso/318), cumprido em 02.09.2010 (fls. 323/324).

Aberta vista dos autos ao advogado do réu, em 02.09.2010, conforme certificado a fl. 319, em seguida, a fl. 320, foi determinada a expedição de mandado de busca e apreensão destes autos, porque, através de contato com a OAB, foi informado que a advogada estava suspensa.

Expedido o mandado de busca e apreensão, foi cumprido em 03.09.2010 (fls. 321/322).

A fl. 325 foi juntado ofício da OAB indicando advogada para defender os interesses do réu (original a fl. 342).

O juízo, considerando que a advogada constituída estava com a inscrição na OAB suspensa, o que implicava nulidade dos atos praticados, nomeou defensora dativa ao acusado, mas determinou que antes de sua intimação, fosse expedida precatória para intimar o réu do ocorrido, oferecendo-lhe oportunidade para constituir outro defensor, no prazo de 3 dias. Ainda, determinou expedição de ofício à OAB-Acre com cópia dos atos praticados pela advogada suspensa nos presentes autos (fl. 326).

Expedidos o ofício e carta precatória (fls. 326/328).

Foi juntada nova procuração pelo réu (fls. 330/331).

Juntado ofício da Polícia Federal encaminhando relatório de missão policial (fls. 333/334).

Folhas de antecedentes juntadas a fls. 335/341.

Defesa preliminar apresentada a fls. 343/347 sustentando a inocência do acusado e requerendo expedição de alvará de soltura, absolvição sumária ou concessão do relaxamento do flagrante, e pleiteando a oitiva de testemunhas, cujo rol foi juntado a fl. 348.

O juízo (fls. 349/verso) deixou de absolver sumariamente o acusado, mantendo o recebimento da denúncia e designou audiência de instrução e julgamento. Indeferiu a prova pericial psiquiátrica, para avaliar semi-imputabilidade, diante do interrogatório policial, da linha de defesa adotada e dos demais elementos constantes dos autos, mas determinou que se oficiasse à Polícia Civil, buscando informações acerca de avaliações psicológicas do acusado, conforme pleiteado pelo MPF. Revogou a nomeação da defensora dativa, comunicando-se à OAB/SP, e determinou fosse dada vista ao MPF para se manifestar sobre o pedido de liberdade provisória.

Foram expedidos os ofícios (fls. 350/360) e aberta vista ao MPF (fl. 361).

O Parquet Federal (fls. 362/363) se manifestou contrariamente ao pedido de liberdade feito pelo réu.

Ressaltou que entendia importante a realização da perícia psiquiátrica para embasar a pena a ser aplicada, todavia, em face da celeridade processual contraposta à qualidade da instrução, requereu fosse intimada a defesa a dizer se concordava com a realização da perícia, pois, havendo concordância, ficaria afastada a hipótese de excesso de prazo.

Apontou que faltava folha de antecedentes do IIRGD e que pendia de apreciação um dos itens formulados em manifestação anterior.

Por fim, requereu fossem oficiadas as Seções da OAB do Acre e de São Paulo para que remetessem cópia da decisão que suspendeu a advogada, a fim de verificar a necessidade de extração de cópias para a persecução penal pelo crime do art. 205 do Código Penal, que restou deferido, conforme decisão de fls. 369/370, em que também foi indeferido o pedido de liberdade provisória, até a realização da audiência, e determinado que o Parquet se manifestasse sobre o ofício da Polícia Federal (de fl. 367) em que informou-se que uma das testemunhas estava em missão no Paraná até 07.11.2010, sobrevindo requerimento de desistência de sua oitiva (fl. 372).

Certificado o apensamento dos autos do pedido de quebra de sigilo nº 0005973-53.2010.403.6114 (fl. 384).

Na audiência realizada em 14.10.2010, foram ouvidas duas testemunhas de acusação e quatro de defesa, bem como interrogado o réu, conforme mídia de fl. 391-A (fls. 391/397).

A defesa desistiu da oitiva de testemunha faltante e não apresentou diligências. O MPF, de seu turno, desistiu da perícia psiquiátrica anteriormente requerida, e pleiteou a complementação da perícia técnica ainda restante no HD e nas outras mídias apreendidas, e pediu a vinda aos autos das folhas de antecedentes faltantes e de eventuais avaliações psicológicas da polícia civil já requisitadas nos autos.

Foram homologadas as desistências de testemunha e de perícia, e deferido prazo para encerramento do trabalho de perícia no HD e mídias apreendidas e determinado que se verificasse o cumprimento dos ofícios relacionados aos antecedentes e avaliações psicológicas. Em seguida, fossem apresentadas as alegações finais.

Foram juntados ofícios da OAB, a fl. 401, encaminhando cópias do processo disciplinar em face da advogada (fls. 402/405); da testemunha que faltou à audiência, em que explica a razão da ausência (fl. 407); e da Polícia Federal (fl. 408), encaminhando os laudos periciais (fls. 409/422 e 423/432).

Em alegações finais (fls. 435/443), o Parquet pugna pela procedência da ação penal, com a condenação do réu pelos crimes descritos na denúncia, em concurso material e com os respectivos aumentos de continuidade delitiva.

Folha de antecedentes juntada a fl. 444.

A defesa, de seu turno (fls. 447/451), sustenta a inocência do acusado, buscando sua absolvição.

O MPF requereu a juntada de novo laudo (fls. 451/457).

Dada nova vista à defesa (fl. 460), ratificou e reiterou as alegações já apresentadas (fls. 472/474).

Ofício da OAB (fl. 462), encaminhando cópia da decisão aplicando pena à advogada (fls. 463/466).

Foi proferida sentença (fls. 476/484), que julgou procedente a ação penal para condenar o réu nas sanções previstas nos arts. 241-A e 241-B do ECA.

Em relação ao delito do art. 241-A do ECA, foi fixada a pena-base em 4 anos e 6 meses de reclusão e 15 dias-multa, em face da gravidade das circunstâncias delitivas, revelada pela quantidade de vídeos disponibilizados e número de requisições para transmissão, recebidas e aceitas, pela periculosidade revelada pela condição de policial que teve contato com investigações de pedofilia, além dos fortes indícios de que tem personalidade voltada a prática desses delitos.

E em relação ao delito do art. 241-B do ECA, foi fixada a pena-base em 2 anos e 6 meses de reclusão e 15 dias-multa, em face da gravidade das circunstâncias delitivas, revelada pela quantidade de vídeos e imagens armazenados, pela periculosidade revelada pela condição de policial que teve contato com investigações de pedofilia, além dos fortes indícios de que tem personalidade voltada a prática desses delitos.

Sem agravantes ou atenuantes e sem causas de aumento ou diminuição, em ambos os delitos. O valor do dia-multa foi fixado em 2 salários mínimos vigentes à época do crime, considerando a renda de escrivão de polícia.

Diante do concurso material, nos termos do art. 69 do Código Penal, as penas somadas totalizaram 7 anos de reclusão e pagamento de 30 dias-multa, fixado o regime inicial semi-aberto.

Determinada a expedição de guia de recolhimento provisório.

Anotou não haver possibilidade do réu recorrer da sentença em liberdade, por ter respondido ao processo preso e mantidas as condições de cautelaridade para sua permanência na prisão, em face não apenas da gravidade das condutas, mas o modo de vida e a reprimida inserção social do acusado, somados às imagens, vídeo e escritos apreendidos, apresentando personalidade voltada à prática desses crimes e risco à ordem pública.

Nos termos do art. 92, inc. I, alínea "b", do Código Penal, em vista da quantidade de pena fixada e da prática de ilícito incompatível com as atribuições do cargo de escrivão de polícia civil, decretou a perda do cargo público como efeito da condenação.

Deixou de aplicar o art. 387, inc. IV, do CPP, ante a inexistência de elementos concretos para tanto.

Determinou que fosse encaminhada cópia da sentença à Corregedoria da Polícia Civil em São Paulo para as providências que entender cabíveis.

Sentença publicada em 07.12.2010 (fl. 485).

Expedida Guia de Recolhimento Provisória (fls. 486/487), e ofícios à Polícia Civil (fls. 488/489).

O Ministério Público Federal apelou (fls. 493/499) buscando a reforma da sentença em relação à fixação da pena-base atribuída em ambos os crimes, quanto à continuidade delitiva e ao regime inicial de cumprimento de pena.

Argumenta que a autoria e materialidade restaram induvidosas e a culpabilidade do réu é intensa, pois sua formação e atuação profissional revelam se tratar de pessoa informada, esclarecida, e ademais o exercício de função pública que tem por essência o combate ao crime, fazem concluir que se esperava comportamento diametralmente distinto do efetivamente verificado.

Assim, deve ser considerado o artigo 59 do Código Penal como bastante desfavorável ao réu, determinando a imposição rigorosa e acentuada de pena.

A posse de cada um dos arquivos e o compartilhamento de cada um deles constitui crime autônomo, de modo que não deveria ter sido afastada a aplicação da regra da continuidade delitiva, inclusive considerando-se o período em que se compreende a ação, no mínimo de 12.04.2010 a 09.07.2010, da data da instalação do programa e-Mule até a data da última publicação virtual de grande parte dos vídeos ilícitos.

E as circunstâncias são absolutamente desfavoráveis ao réu, de modo que deveria ter sido fixado regime de cumprimento de pena mais severo, o fechado, observando-se os critérios previstos no art. 59 do CP.

Juntada jurisprudência a fls. 500/504.

Constituídos novos defensores pelo réu, conforme fls. 506/508 e 516/517.

Ofício da Polícia Civil (fl. 511) encaminhando informações sobre inexistência de avaliações psicológicas e atendimentos médicos do réu, no âmbito daquele órgão (fl. 512).

Folhas de antecedentes juntadas a fls. 513/515.

O acusado foi intimado da sentença (fls. 520/522).

Apelação do réu (fls. 524/533) buscando a reforma da sentença, para reconhecer sua inocência, sob argumento de que não houve crime, pois o acusado agiu no cumprimento de dever legal, qual seja, investigando o crime em questão. Alternativamente, pleiteia seja considerada a prática de um único delito de forma continuada.

Contrarrazões da acusação a fls. 535/538 e da defesa a fls. 545/556.

Solicitado pela Corregedoria da Polícia Civil o envio de cópias de alguns depoimentos e de laudos (fls. 543/544), o pedido restou deferido pelo juízo (fls. 557/558).

Subiram os autos a esta Egrégia Corte, onde o Ministério Público Federal opinou pelo desprovimento do recurso da defesa e pelo provimento do recurso da apelação (fls. 560/566).

O feito foi submetido à revisão, na forma regimental.

É O RELATÓRIO.


RAMZA TARTUCE
Desembargadora Federal


Documento eletrônico assinado digitalmente conforme MP nº 2.200-2/2001 de 24/08/2001, que instituiu a Infra-estrutura de Chaves Públicas Brasileira - ICP-Brasil, por:
Signatário (a): RAMZA TARTUCE GOMES DA SILVA:10027
Nº de Série do Certificado: 3B67D3BD5A079F50
Data e Hora: 24/10/2012 14:07:01



APELAÇÃO CRIMINAL Nº 0005129-06.2010.4.03.6114/SP
2010.61.14.005129-1/SP
RELATORA : Desembargadora Federal RAMZA TARTUCE
APELANTE : Justica Publica
APELANTE : EDGAR GOMES SILVA reu preso
ADVOGADO : TADEU CORREA e outro
CODINOME : EDGAR GOMES DA SILVA
APELADO : OS MESMOS
No. ORIG. : 00051290620104036114 3 Vr SAO BERNARDO DO CAMPO/SP

VOTO

A materialidade dos crimes restou demonstrada pelo auto de prisão em flagrante (fls. 02/03), pelo auto de apreensão (fls. 10/13), pela informação técnica nº 206/2010-NUCRIM/SETEC/SR/DPF/SP (fls. 32/44), e pelos laudos periciais relativos ao exame dos HDs apreendidos: nº 3517/2010 (fls. 132/149 e 259/276), nº 3593/2010 (fls. 151/171 - original a fls. 194/214 e 277/280), complementado pelo de nº 4901/2010 (fls. 409/421).

No material apreendido foram encontrados arquivos de vídeos e fotos, com conteúdo pornográfico envolvendo crianças e adolescentes, foi identificado o programa de compartilhamento e-Mule, localizado o arquivo que armazena dados dos arquivos que foram compartilhados, cuja análise permitiu a identificação de registro de compartilhamento de arquivos que continham material pornográfico envolvendo crianças e adolescentes, e ainda em outro arquivo, de configuração do programa e-Mule, que memoriza os termos utilizados pelo usuário para fazer a busca de arquivos, foram identificados diversos termos relacionados à pornografia infantil que foram efetivamente utilizados em buscas efetuadas.

Ademais, os próprios nomes da maioria dos arquivos localizados contendo pornografia infantil já revelam o conteúdo do material.

Há dois crimes, e são distintos, diversamente do sustentado pela defesa, dado que a materialidade foi identificada em dois HDs, com conteúdo diferente. Um deles estava instalado no computador, continha o programa e-Mule instalado e foi constatado que, por meio deste programa é que se deu o compartilhamento de dados envolvendo o material ilícito. O outro estava guardado em um armário, não continha programas ou sistema operacional instalado, somente arquivos, sua capacidade quase completamente utilizada, e o material arquivado era quase todo relativo à pornografia, dentre o qual, o material relativo à pedofilia.

Ademais, a previsão legal está disposta em dois tipos penais distintos e, no caso, verifica-se que a conduta do réu também foi distinta.

O auto de apreensão descreve os dois HDs apreendidos, no campo discriminação da tabela, pela marca, modelo e número de série, conforme se confere a fl. 11:

"DISCRIMINAÇÃO
HD DA MARCA SEAGATE, MODELO BARRACUDA 7200.10, S/N 9QH0APKA (...)
HD DA MARCA SAMSUNG, MODELO HD201LJ, S/N S0MUJ1FP938229 (...)" - fl. 11

Na informação técnica nº 206/2010, o perito que acompanhou a diligência de busca e apreensão, esclarece onde cada um dos HDs foi encontrado e como foi realizado o exame que identificou o material ilícito, conforme se confere do quanto transcrevo:

"I- HISTÓRICO
Às 10h 30min do dia 16 de julho de 2010, o Perito Criminal Federal AYRTON MONTEIRO CRISTO FILHO compareceu, acompanhado dos demais membros da equipe policial, a Av. Getúlio Vargas, 1834, São Bernardo do Campo/SP, residência de EDGAR GOMES SILVA, a fim de prestar apoio técnico no cumprimento de mandado de busca e apreensão relacionado à investigação de crime de pornografia infantil via Internet.
No escritório da residência foram encontrados 04 (quatro) computadores do tipo desktop e diversas mídias de armazenamento: discos rígidos, pendrives e mídias ópticas. Um dos computadores se encontrava ligado, os demais estavam desligados.
Encerrada a diligência, o Perito, juntamente com a equipe policial, retornou a Superintendência.
II- MATERIAL
A presente informação técnica refere-se ao seguinte material:
1. 01 (um) disco rígido (HD) da marca SEAGATE, modelo BARRACUDA 7200.10, número de série 9QH0APKA, removido do computador que se encontrava ligado no escritório.
2. 01 (um) disco rígido da marca (HD) da marca SAMSUNG, modelo HD501LJ, número de série S0MUJ1FP938229, encontrado num armário do escritório.
3. 02 (dois) pendrives da marca KINGSTON, modelo DATA TRAVELER, com capacidade nominal de 16GB, de cor predominante preta, encontrados no escritório.
4. 01 (um) pendrive da marca RAZZO, com capacidade nominal de 2GB, de cor predominante azul, encontrado no escritório.
5. 07 (sete) mídias ópticas do tipo CD-RW, encontradas no escritório.
III - EXAME
O perito examinou primeiramente o computador que estava ligado, em busca de material relacionado com pornografia infanto-juvenil que se encontrassem sendo transmitidos ou compartilhados por meio computacionais no momento. Foi constatado que havia material de pornografia infanto-juvenil no computador, no entanto, não foram encontradas transmissões em andamento ou compartilhamentos ativos naquele momento. O computador foi então desligado e procedeu-se a análise das mídias de armazenamento.
Foi utilizado o equipamento ImageMaster Solo III Forensics como bloqueador de escrita para analisar todos os discos rígidos encontrados, em busca de arquivos relacionados à apuração. Dessa forma, garante-se que os conteúdos dos discos tenham sido preservados sem alterações.
O perito encontrou diversos arquivos de vídeo com crianças ou adolescentes em cenas com nudez ou sexo no disco rígido do item 1 da seção II - Material (disco rígido com número de série 9QH0APKA). O perito copiou então alguns arquivos de amostra deste disco rígido para confecção desta informação técnica. As figuras de 1 a 8 mostram quadros (frames) extraídos de alguns dos arquivos de vídeo encontrados. O quadro 1 mostra a listagem dos arquivos da pasta "\Users\BRAVO\Downloads\[soul]" do disco em questão. Cabe esclarecer que no computador original, esta pasta corresponde a "C:\Users\BRAVO\Downloads\[soul]", enquanto na listagem ela aparece como "E:\Users\BRAVO\Downloads\[soul]", pois o disco rígido estava conectado ao computador do perito com o bloqueador de escrita.
O perito analisou as demais mídias, inclusive as contidas nos computadores desligados, encontrando mais vídeos com conteúdo de pornografia infanto-juvenil no disco rígido de número de série S0MUJ1FP938229 (item 2 da seção II - Material), o qual possuía a inscrição "soul".
Foram encontrados 07 (sete) mídias ópticas do tipo CD-RW com a inscrição "soul", as quais o perito recomendou que fossem apreendidas, pois foi confirmado pelo morador EDGAR GOMES SILVA que o mesmo utilizava a palavra "soul" para identificar arquivos contendo pornografia. Como as mídias são regraváveis, é possível que algum arquivo previamente apagado ou ocultado possa ser encontrado em exames mais detalhados.
O perito recomendou ainda a apreensão dos pendrives, uma vez que os mesmos podem ser utilizados para a cópia de arquivos e quem esmo arquivos apagados podem ser eventualmente recuperados em certas condições.
(...)
Ressalta-se que, devido à limitação de tempo, das ferramentas e dos equipamentos disponíveis no local, o exame realizado nas mídias encontradas não foi exaustivo.
IV - CONCLUSÃO
Utilizando equipamentos e técnicas adequadas, o Perito realizou pesquisas nas mídias computacionais encontradas no local, de forma a verificar a existência de arquivos que pudessem conter imagens de nudez ou pornografia envolvendo crianças ou adolescentes, bem como evidências de transmissão ou compartilhamento desses arquivos. Foi constatado que o material analisado continha arquivos relacionados à pornografia infanto-juvenil.
Ressalta-se, porém, que, devido à limitação das ferramentas e equipamentos disponíveis no local, o exame realizado nas mídias encontradas não foi exaustivo, de forma que se faz imprescindível exame pericial posterior, o qual poderá recuperar evidências não encontradas nos exames realizados." - fls. 32/34 e 44

Deste modo, já é possível identificar que os dois HDs não se destinavam à mesma função, até por sua localização física no momento da apreensão. O que se pode extrair é que o HD da marca Samsung tinha por função o armazenamento de arquivos, visto que sequer continha qualquer programa instalado, ao passo que o HD da marca Seagate estava instalado no computador, que estava ligado na ocasião do flagrante, e continha o programa utilizado para o compartilhamento dos arquivos contendo pornografia infantil.

O laudo nº 3517/2010 analisou o HD da marca Samsung, cuja função dada pelo usuário foi de armazenar dados, já que naquele não foi instalado sistema operacional, e cuja capacidade de 500GB estava quase esgotada, conforme anotado pelo perito:

"I - MATERIAL EXAMINADO
Em razão da quantidade de itens e do volume de dados a serem examinados, os signatários consideraram conveniente dividir a análise do material encaminhado em vários laudos periciais. Desta forma, o presente laudo refere-se a:
- 01 (um) disco rígido da marca Samsung, modelo HD5O1LJ, número de série S0MUJ1FP938229 e capacidade nominal de 500 (quinhentos) GB, correspondente ao item 02 do Auto Circunstanciado de Busca e Apreensão encaminhado em anexo ao memorando de solicitação de exames (referência interna do material: 3133/2010 - SETEC/SR!DPF/SP).
O disco rígido foi recebido acondicionado em envelope de segurança lacrado com número 02000094848, no qual estava outro disco rígido, da marca Seagate e número de série 9QH0APKA, que será objeto de laudo pericial específico.
II - OBJETIVO DOS EXAMES
Os exames têm por objetivo analisar e extrair o conteúdo do material descrito na seção anterior, atendendo à solicitação contida nos expedientes supracitados.
III - EXAMES
Inicialmente foi realizado o levantamento e a identificação do material enviado para exame, cujo resultado encontra-se na seção I - MATERIAL EXAMINADO. Adicionalmente foram incluídas fotografias digitais do material examinado na mídia anexa ao laudo.
Em seguida, as informações do disco rígido examinado foram duplicadas por meio de técnicas apropriadas e, como medida de segurança, os exames periciais foram realizados na cópia do material questionado, preservando-se o original.
Procedeu-se então a análise e extração de conteúdo do material examinado. Cabe salientar que este processo atinge não apenas os arquivos diretamente acessíveis, mas também aqueles previamente apagados que pudessem ser recuperados.
No disco rígido examinado havia apenas uma participação ativa, utilizando o sistema de arquivos NTFS, com a identificação "SOUL" e ocupando todo o espaço do disco. No disco examinado não havia sistema operacional instalado, apenas arquivos do usuário, que ocupavam cerca de 96% do disco, restando apenas 17 GB de espaço livre.
Entre os arquivos ativos presentes no disco examinado só havia arquivos de vídeo, organizados na estrutura de pastas mostradas na Tabela 1:
Pasta  Quantidade de Arquivos  Volume de Dados Aproximado (em Gigabytes) 
\SOUL  4166  348,0 
\SOUL\BDSM  353  17,5 
\SOUL\GAY  26  5,0 
\SOUL\HARD  993  76,5 
\SOUL\PEDO  32  2,5 
\SOUL\SOFT  187  4,5 
Tabela 1 - Resumo da estrutura de pastas encontrada no disco rígido examinado.
Na sequência foram selecionados os arquivos de vídeo de interesse do apuratório. Foram localizados então 328 (trezentos e vinte e oito) arquivos de vídeo contendo pornografia envolvendo indivíduos com aparência de criança ou adolescente. Destes arquivos, 304 (trezentos e quatro) estavam na pasta "\SOUL" e 24 (vinte quatro) na pasta "\SOUL\PEDO". O volume de dados total ocupado pelos arquivos com pornografia infantil no disco era de 50,0 (cinquenta) GB.
Como exemplos, nas Figuras 1 a 5 a seguir são mostradas imagens com cenas extraídas de cinco destes vídeos encontrados no disco rígido examinado.
No relatório gravado na mídia anexa ao presente laudo está disponível a lista completa de arquivos de pornografia infantil encontrados, na qual consta o nome do arquivo acompanhado de suas propriedades (tamanho, data de criação, modificação e acesso, entre outras). Para permitir uma visualização rápida dos vídeos selecionados foram incluídas imagens com cenas extraídas dos vídeos na mídia anexa.
Devido ao volume de dados dos arquivos de vídeo encontrados, foram gravados na pasta "Videos" da mídia anexa ao laudo apenas 100 (cem) destes arquivos. Como os vídeos possuem formatos diversos é necessário utilizar programas específicos para visualização dos mesmos, tais como Windows Media Player e VLC. Além da variedade de formatos, alguns dos vídeos requerem a instalação de Codecs (complementos utilizados para codificação/decodificação de arquivos de vídeo) específicos. Como forma alternativa, sugere-se a visualização das imagens com cenas extraídas que foram incluídas no relatório presente na mídia anexa.
Cabe salientar ainda que, em diversos dos vídeos de pornografia infantil localizados, o nome do arquivo continha expressões comumente encontradas em arquivos com tal conteúdo, tais como "PTHC", "PEDO", "HUSSYFAN", "LOLITA" e "KINGPASS".
(...)
Salienta-se ainda que do restante dos arquivos de vídeo presentes no disco examinado, a maioria possuía conteúdo pornográfico, porém sem envolvimento aparente de crianças ou adolescentes e, em parte destes vídeos, havia cenas de sadomasoquismo. Observou-se ainda que na pasta "\SOUL", que continha a maioria dos arquivos gravados no disco, havia vídeos de pornografia infantil misturados com vídeos de pornografia adulta, sadomasoquismo e outros, em menor número, sem teor pornográfico.
(...)
Foram recuperados ainda 41 (quarenta e um) arquivos de imagem no formato JPEG, envolvendo indivíduos com aparência de criança ou adolescente em cenas de nudez ou pornográficas. (...)
(...)
b) Há, no material apreendido, fotografias ou imagens com pornografia ou cenas de sexo explícito envolvendo criança ou adolescente? Qual sua natureza (filmes, fotos, etc)?
Sim. Conforme descrito na seção III do laudo foram localizados 328 (trezentos e vinte e oito) arquivos de vídeo contendo pornografia envolvendo indivíduos com aparência de criança ou adolescente.
Os dados referentes a tais arquivos, incluindo, nome, tamanho, localização no disco, data de modificação, criação e acesso, estão disponíveis em relatório gravado na mídia anexa ao presente laudo. Também foram incluídas no relatório imagens com cenas extraídas dos vídeos geradas durante a realização dos exames visando facilitar a visualização dos mesmos. Devido ao grande volume de dados - cerca de 50 GB - foram gravados apenas 100 (cem) destes vídeos na pasta "Vídeos" da mídia anexa.
Além dos arquivos de vídeos de pornografia infantil mencionados, que estavam ativos no disco, foram recuperadas 41 (quarenta e uma) imagens que haviam sido previamente apagadas nas quais há indivíduos com aparência de criança ou adolescente em cenas de nudez ou pornográficas.
c) É possível afirmar que houve divulgação de fotografias ou imagens com pornografia ou cenas de sexo explícito envolvendo criança ou adolescente destes computadores para outros usuários da Rede Mundial? Qual o material enviado? Para quem esse material foi enviado?
Conforme detalhado na seção III, o disco rígido examinado não possuía sistema operacional instalado, servindo apenas como um disco de armazenamento de dados. No disco examinado não foram localizados dados referentes ao recebimento ou envio de tais arquivos.
(...)
f) É possível recuperar arquivos ou mensagens eletrônicas apagadas dos computadores? Em caso afirmativo, há arquivos ou mensagens recuperadas contendo fotografias, vídeos ou imagens com pornografia ou cenas de sexo explícito envolvendo criança ou adolescente?
Sim, de maneira geral é possível recuperar arquivos previamente apagados que não tenham sido sobrescritos. A análise do material questionado incluiu a recuperação de arquivos utilizando ferramentas forenses. Conforme descrito na seção III, foram recuperadas 41 (quarenta e uma) imagens envolvendo indivíduos com aparência de criança ou adolescente em cenas de nudez ou pornográficas.
(...)
6) Quantos arquivos virtuais com conteúdo de cena de sexo explícito ou pornográfica envolvendo criança ou adolescentes o investigado possuía, no mínimo? E no máximo?
Conforme descrito na seção III do laudo, foram identificados 328 (trezentos e vinte e oito) arquivos de vídeo ativos e 41 (quarenta e uma) imagens previamente apagadas no disco rígido examinado envolvendo pessoas com aparência de criança ou adolescente em situações pornográficas.
7) Quando o arquivos com conteúdo de cena de sexo explícito ou pornográfica envolvendo criança ou adolescentes começaram a ser adquiridos pelo investigado? Até quando essa conduta perdurou?
No disco examinado não há informação sobre a forma e o data de obtenção (download, cópia, etc) dos arquivos. No entanto estavam disponíveis as datas de criação, modificação e último acesso dos arquivos de pornografia infantil encontrados. As datas de criação dos arquivos, que supostamente armazenam a data que o arquivo foi copiado no disco, são todas referentes ao período entre 16/11/2009 e 18/12/2009. Já as datas de última modificação estão compreendidas entre de 13/05/2004 e 18/12/2009. Finalmente, as das de último acesso estão contidas no período entre 15/12/2009 e 19/12/2009. Cabe salientar que as datas dos arquivos são atualizadas pelo sistema operacional em situações diversas e devem ser analisadas em conjunto com outros elementos. No relatório gravado na mídia anexa ao laudo constam as datas disponíveis para cada um dos arquivos de interesse localizados." - fls. 135/136 e 141/146.

Quanto ao outro HD, da marca Seagate, foi objeto de perícia que resultou no laudo nº 3593/2010, complementado posteriormente pelo laudo nº 4901/2010, restando constatado o compartilhamento de material que continha pornografia infantil, conforme transcrevo:

Laudo nº 3593/2010:
"I - MATERIAL EXAMINADO
Em razão da quantidade de itens e do volume de dados a serem examinados, o signatário considerou conveniente dividir a análise do material encaminhado em vários laudos periciais. Desta forma, o presente laudo refere-se a:
- 01 (um) disco rígido da marca Seagate, modelo ST3400620A, número de série 9QH0APKA e capacidade nominal de 400 (quatrocentos) GB, correspondente ao item 01 do Auto Circunstanciado de Busca e Apreensão encaminhado em anexo ao memorando de solicitação de exames (referência interna do material: 3132/2010 - SETEC/SRJDPF/SP).
(...)
II - OBJETIVO DOS EXAMES
Os exames têm por objetivo analisar o conteúdo do material descrito na seção anterior, buscando evidências do compartilhamento de arquivos de pornografia infantil através do programa e-Mule e com isso atender parcialmente à solicitação contida nos expedientes supracitados. A análise completa do disco rígido e eventual extração dos arquivos de interesse serão realizadas em laudo complementar a ser elaborado.
III - EXAMES
Inicialmente foi realizado o levantamento e a identificação do material enviado para exame, cujo resultado encontra-se na seção 1. MATERIAL EXAMINADO.
Em seguida, as informações do disco rígido examinado foram duplicadas por meio de técnicas apropriadas e, como medida de segurança, os exames periciais foram realizados na cópia do material questionado, preservando-se o original.
Procedeu-se então a análise e extração de conteúdo do material examinado. Cabe salientar que este processo atinge não apenas os arquivos diretamente acessíveis, mas também aqueles previamente apagados que pudessem ser recuperados.
No disco rígido examinado havia apenas uma participação ativa, utilizando o sistema de arquivos NTFS, com a identificação "BRAVO" e que ocupava todo o espaço do disco. Foi identificada em condição ativa no disco rígido examinado instalação do sistema operacional Microsoft Windows 7 Ultimate com os seguintes atributos:
(...)
Na sequência foi identificada a presença do programa de compartilhamento Peer-to-Peer (ponto a ponto) de arquivos e-Mule na pasta "\Program Files (x86)\eMule". Analisando os arquivos de configuração do e-Mule, presentes na pasta "\ProgramData\eMule", foram obtidas informações do usuário, sintetizadas na Tabela 3 a seguir:
(...)
Entre os arquivos de configuração do e-Mule localizados na pasta "\ProgramData\eMule\config" do disco examinado estava o arquivo "known.met". Este arquivo é mantido pelo próprio programa e armazena dados dos arquivos de foram compartilhados desde a instalação do programa, inclusive depois que o arquivo em si tenha sido removido do disco. Neste arquivo "known.met" localizado havia registro de compartilhamento de 277 (duzentos e setenta e sete) arquivos, listados na Tabela 4 a seguir.
(...)
A grande maioria dos arquivos com registro de compartilhamento encontrado possui nos nomes relacionados a pornografia infantil, como pode ser observado na primeira coluna da Tabela 4.
Na sequência, para cada um dos 277 arquivos com registro de compartilhamento foi verificado se o mesmo estava presente no disco e se continha pornografia envolvendo crianças ou adolescentes. Sendo identificados então 55 (cinquenta e cinco) arquivos (linhas destacadas na Tabela 4) que estavam presentes na pasta "\Users\BRAVO\Downloads\[soul]". Todos os 55 arquivos eram vídeos e continham cenas pornográficas envolvendo indivíduos com aparência de criança ou adolescente.
(...)
Ainda sobre os dados de compartilhamento de arquivos constantes na Tabela 4, cabe detalhar o significado das colunas que armazenam informações sobre o compartilhamento de arquivos:
- Total de Requisições: número de vezes que determinado arquivo foi solicitado por outro usuário da rede, ou seja, outro usuário da rede localizou um arquivo de interesse e requisitou o download do mesmo.
- Requisições Aceitas: número de vezes que uma solicitação de arquivo foi efetivamente atendida. O programa e-Mule gerencia automaticamente uma fila com as requisições recebidas e, através de critérios de prioridade, atende um número determinado de requisições simultâneas. Este mecanismo existe devido ao volume de dados transmitido simultaneamente ser limitado pela velocidade de conexão à Internet, não sendo possível atender, de forma razoável, a um número excessivo de transmissões simultâneas.
- Dados Enviados (Kbytes): quantidade total de dados efetivamente enviados do computador local para outros usuários que requisitaram o arquivo.
- Data da Última Publicação: data mais recente em que o arquivo foi "publicado", ou seja, que o e-Mule informou para outros usuários da rede que um determinado arquivo estava disponível para transmissão ("compartilhado").
Salienta-se ainda que, em condições normais de funcionamento, o programa eMule disponibiliza para envio os dados parciais mesmo durante o processo de download do arquivo e que a transmissão do arquivo é feita em partes, sendo que um mesmo arquivo pode ser obtido de origens diversas.
Todos os arquivos da Tabela 4 que possuem a coluna "Data da Última Publicação" preenchida foram compartilhados em algum momento através do material examinado. Além disso, aqueles que possuem uma quantidade de "Requisições Aceitas" e "Dados Enviados" maior que zero, foram efetivamente transmitidos. Ou seja, dos arquivos de vídeo pornografia infantil encontrados, 27 (vinte e sete) tiveram dados efetivamente transmitidos para outros usuários da rede.
A partir das informações apresentadas na Tabela 4, foram obtidos os seguintes totais, relativos aos vídeos de pornografia infantil encontrados:
- Total de requisições recebidas: 5.711;
- Total de requisições aceitas: 437;
- Volume de dados enviados para outros usuários da rede: 996.900 KBytes;
Na pasta "\ProgramData\eMule\config" foi identificado outro arquivo de configuração do e-Mule que contém informações relevantes: "AC_SearchStrings.dat". Este arquivo memoriza os termos utilizados pelo usuário para procurar arquivos. No arquivo localizado no material examinado os termos armazenados eram:
- sf lolita;
- sf1 lolita;
- clu ptsc;
- clu pthc;
- pthc 2010;
- evelyn pthc;
- sdpa;
- model sf;
- children sf;
- lolita sf;
- sf man;
- pthc 2008;
- pthc 2009;
- evelin 12;
- pthc;
- evelin dedo;
- evelin 13;
- evelin pthc;
- evelin;
- amateur;
- caiu net;
- orkut;
- whipped pthc;
- whipping pthc;
- spank pthc;
- spanked pthc;
- torture pthc;
- tortured pthc;
- raped pthc;
- l2yo latin littleboy.
Cada item da lista acima corresponde a uma busca realizada e é composto por um ou mais termos separados por espaços. Os temos informados pelo usuário são utilizados pelo programa e-Mule para localizar arquivos cujo nome contenha referidos os termos. Nota-se que o usuário do disco examinado utilizou diversos termos relacionados a pornografia infantil para buscar arquivos, tais como "PTHC" (que é um acrônimo da expressão em Inglês "PreTeen HardCore") e "Lolita".
(...)
b) Há, no material apreendido, fotografias ou imagens com pornografia ou cenas de sexo explícito envolvendo criança ou adolescente? Qual sua natureza (filmes, fotos, etc)?
Sim. Conforme descrito na seção III do laudo foram localizados 55 (cinquenta e cinco) arquivos de vídeo contendo pornografia envolvendo indivíduos com aparência de criança ou adolescente na pasta "\Users\BRAVO\Downloads\[soul]" do disco rígido examinado. Como exemplo do conteúdo encontrado nos referidos arquivos, nas Figuras 1 a 3 são mostradas cenas extraídas de três destes vídeos.
Conforme descrito na seção II do laudo, o disco rígido ainda será examinado mais detalhadamente. Ou seja, o conteúdo relacionado a pornografia infantil presente no disco rígido pode não estar restrito aos 55 arquivos encontrados até o presente momento.
c) É possível afirmar que houve divulgação de fotografias ou imagens com pornografia ou cenas de sexo explícito envolvendo criança ou adolescente destes computadores para outros usuários da Rede Mundial? Qual o material enviado? Para quem esse material foi enviado?
Sim. Conforme detalhado na seção III, através do programa e-Mule, foram compartilhados diversos arquivos de vídeo contendo pornografia infantil. Além disso, os registros presentes no disco examinado permitem concluir que houve transmissão efetiva de dados de diversos dos referidos arquivos. O programa e-Mule não registra informações referentes aos destinatários dos dados enviados que permitam identificá-los.
k) Há outras informações úteis para a elucidação do caso?
O usuário do disco rígido examinado realizou diversas buscas por arquivos através do programa e-Mule utilizando termos relacionados a pornografia infantil tais como "PTHC" e "Lolita".
Quesitos do Ofício PRM-SBC/SP-BANCA1-SSZ-nº 252/2010
1) O investigado dispunha de programas de compartilhamento de arquivos (E-Mule etc) ou de acesso a compartilhamento de arquivos por via remota (tipo Rapidshare), ou de outros meios eletrônicos para compartilhar arquivos com terceiros?
Sim, o programa e-Mule estava instalado no disco examinado, conforme descrito na seção III.
Salienta-se que a análise realizada até o presente momento foi focada na utilização do programa e-Mule, sendo que a existência de outros programas ou formas de compartilhamento de arquivos será apurada em laudo complementar a ser elaborado.
2) O investigado disponibilizou arquivos com conteúdo de cena de sexo explícito ou pornográfica envolvendo criança ou adolescentes para o acesso (ainda que potencial) de terceiros?
Sim. Vide resposta ao quesito "c".
3) Caso o investigado tenha disposto arquivos com conteúdo de cena de sexo explícito ou pornográfica envolvendo criança ou adolescentes para o acesso de terceiros, tal disponibilização era restrita ao Brasil? Os arquivos podiam ser acessados por usuários no exterior?
O compartilhamento de arquivos de pornografia identificado no material examinado foi realizado através do programa e-Mule. Este programa está disponível para ser obtido na Internet por pessoas de qualquer país e os arquivos compartilhados através do programa ficam disponíveis para todos os usuários da rede, independente da localidade na qual o programa esteja sendo executado.
6) Quantos arquivos virtuais com conteúdo de cena de sexo explícito ou pornográfica envolvendo criança ou adolescentes o investigado possuía, no mínimo? E no máximo?
A análise parcial realizada até o momento identificou 55 (cinquenta e cinco) arquivos de vídeo contendo pornografia infantil. Vide reposta ao quesito "b"" - fls. 154/155, 164 e 167/171, 197/198, 207 e 211/214
Laudo nº 4901/2010:
"Vídeos de Pornografia Infantil
No disco rígido foram identificados 55 (cinquenta e cinco) arquivos de vídeo contendo pornografia envolvendo crianças ou adolescentes na pasta "\Users\BRAVO\Downloads\[soul]". Estes arquivos já haviam sido descritos no Laudo 3593/2010-NUCRIM/SETEC/SR/DPF/SP, não sendo encontrados outros arquivos de imagem ou vídeo contendo pornografia infantil no disco examinado. Os vídeos foram gravados nas mídias anexas ao presente laudo (distribuídos em dois DVDs devido ao volume de dados).
E-Mule
O arquivo known.met localizado no disco, que armazena informações sobre arquivos compartilhados através do e-Mule, detalhado no Laudo 3593/2010- NUCRIM/SETEC/SR/DPF/SP, foi extraído e gravado na categoria "E-Mule", acompanhado de arquivo no formato XLSX (do Microsoft Excel), gerado durante os exames, com os dados extraídos do known.met, no formato de planilha para facilitar a visualização. Outros arquivos de configuração do e-Mule que contém dados de interesse (AC_SearchStrings.dat, shareddir.dat, preferences.ini e statistics.ini) encontrados no disco examinado foram incluídos na mesma categoria da primeira mídia anexa.
Arquivos Texto
Na pasta "Meus Documentos" do usuário "Bravo", armazenada em "\User\Bravo\Documents" do disco examinado, foram encontrados 04 (quatro) arquivos texto contendo dados relacionados ao e-Mule e a serviços de armazenamento remoto de arquivos Rapidshare e Hotfile, incluindo links ED2K (usados pelo E-Mule) e HTTP (no caso dos arquivos armazenados no Rapidshare e Hotfile).
Entretanto, os links contidos nos referidos arquivos que puderam ser verificados (arquivos ainda disponíveis durante a realização dos exames) eram de jogos de computador. Também não havia expressões comumente encontradas em arquivos de pornografia infantil nos links.
No arquivo "rapidshare.txt" estavam presentes as credenciais (nome do usuário e senha) para acesso aos sítios de armazenamento remoto de arquivos Rapidshare e Hotflle: usuário "exatamente" e senha "yeagar".
Também não foi identificado nenhum registro de recebimento ou envio para os referidos sítios de armazenamento dos arquivos contendo pornografia infantil encontrados no disco, nem de outros cujos nomes contivessem expressões comumente encontradas em arquivos de pornografia infantil.
Imagens Adolescente
Na pasta "Users\BRAVO\Downloads\[soul]\goerg" do disco examinado foram encontrados 134 (cento e trinta e quatro) fotografias digitais de um indivíduo do sexo masculino com aparência de adolescente. Estes arquivos foram gravados na categoria "Imagens Adolescente".
Outros Arquivos
Foram feitas diversas buscas, incluindo utilização de palavras-chave e inspeção direta dos arquivos do usuário, não sendo identificados outros arquivos de possível interesse do presente apuratório. Na pasta do usuário (\Users\bravo), que continha de cerca de 200 (duzentos) GB de dados, a grande maioria dos arquivos era composta de jogos de computador. Os arquivos de interesse do apuratório foram extraídos para as mídias anexas. Adicionalmente foi gerada uma planilha com a relação de todos os arquivos ativos no disco rígido, incluindo nome, pasta, data de modificação e tamanho dos mesmos. Esta listagem foi gravada na primeira mídia anexa, sob a identificação "Relação de Arquivos".
(...)
IV - RESPOSTAS AOS QUESITOS
(...)
b) Há, no material apreendido, fotografias ou imagens com pornografia ou cenas de sexo explícito envolvendo criança ou adolescente? Qual sua natureza (filmes, fotos, etc)?
Foram localizados 55 (cinquenta e cinco) arquivos de vídeo contendo pornografia envolvendo indivíduos com aparência de criança ou adolescente na pasta "\Users\BRAVO\Downloads\[soul]" do disco rígido examinado. Estes arquivos, que já haviam sido identificados no Laudo 3593/2010-NUCRIM/SETEC/SR/DPF/SP, foram extraídos e gravados nas mídias anexas ao presente laudo na categoria "Vídeos Pornografia Infantil".
c) É possível afirmar que houve divulgação de fotografias ou imagens com pornografia ou cenas de sexo explícito envolvendo criança ou adolescente destes computadores para outros usuários da Rede Mundial? Qual o material enviado? Para quem esse material foi enviado?
Apenas o compartilhamento através do programa e-Mule, já detalhado no Laudo 3593/2010-NUCRIM/SETEC/SR/DPF/SP, foi identificado.
(...)
1) O investigado dispunha de programas de compartilhamento de arquivos (E-Mule etc) ou de acesso a compartilhamento de arquivos por via remota (tipo Rapidshare), ou de outros meios eletrônicos para compartilhar arquivos com terceiros?
Sim, o programa e-Mule estava instalado no disco examinado e a análise da utilização do mesmo no material examinado foi detalhada no Laudo 3593/2010-NUCRIM/SETEC/SR/DPF/SP.
Foram localizadas também credenciais (nome de usuário e senha) de acesso aos serviços de armazenamento remoto de arquivos Rapidshare e Hotfile, porém não foram identificados registros de recebimento ou envio de arquivos relacionados a pornografia infantil para os referidos sítios.
2) O investigado disponibizou arquivos com conteúdo de cena de sexo explícito ou pornográfica envolvendo criança ou adolescentes para o acesso (ainda que potencial) de terceiros?
Sim. Vide resposta ao quesito "c".
3) Caso o investigado tenha disposto arquivos com conteúdo de cena de sexo explícito ou pornográfica envolvendo criança ou adolescentes para o acesso de terceiros, tal disponibilização era restrita ao Brasil? Os arquivos podiam ser acessados por usuários no exterior?
O compartilhamento de arquivos de pornografia identificado no material examinado foi realizado através do programa e-Mule. Este programa está disponível para ser obtido na Internet por pessoas de qualquer país e os arquivos compartilhados através do programa ficam disponíveis para todos os usuários da rede, independente da localidade na qual o programa esteja sendo executado.
4) Caso o investigado tenha disposto arquivos com conteúdo de cena de sexo explícito ou pornográfica envolvendo criança ou adolescentes para o acesso de terceiros, em quais datas essa disponibilização ocorreu?
No caso do compartilhamento identificado no disco examinado, feito através do programa e-Mule, não há um registro individual de cada transferência ou disponibilização de arquivo.
Entretanto, a partir da data de criação dos arquivos, a qual corresponde em condições normais ao início do download de arquivos obtidos através do e-Mule, momento em que os dados recebidos do arquivo, ainda que incompleto, já podem ser enviados para outros usuários, pode-se determinar a data inicial de disponibilização.
Além disso, o arquivo known.met, que armazena dados sobre os arquivos compartilhados através do e-Mule, detalhado no Laudo 3593/2010-NUCRIM/SETEC/SR/DPF/SP e gravado na primeira mídia anexa ao presente laudo, possuí a informação da data de última publicação da rede.
Ou seja, no intervalo entre a data de criação de cada arquivo e a respectiva data de última publicação da rede, em condições normais, o arquivo esteve disponível. No caso dos arquivos de pornografia infantil identificados no disco examinado a primeira data de criação é 16/05/2010 e a última data de disponibilização 09/07/2010. As referidas datas de cada um dos vídeos contendo pornografia infantil localizados no material examinado podem ser visualizadas no relatório presente na mídia anexa ao laudo.
5) Caso o investigado tenha disposto arquivos com conteúdo de cena de sexo explícito ou pornográfica envolvendo criança ou adolescentes para o acesso de terceiros, houve efetivo acesso de terceiros a esse material? Em caso positivo, quando esse acesso ocorreu?
Sim. Conforme detalhado no Laudo 3593/2010-NUCRIM/SETEC/SR/DPF/SP, a partir dos dados constantes no arquivo known.met localizado no disco, pode-se concluir que houve transferência efetiva de dados dos vídeos de pornografia infantil, totalizando 437 transmissões e um volume de dados enviados para outros usuários da rede de 996.900 KBytes.
6) Quantos arquivos virtuais com conteúdo de cena de sexo explícito ou pornográfica envolvendo criança ou adolescentes o investigado possuía, no mínimo? E no máximo?
A análise realizada identificou no disco rígido examinado 55 (cinquenta e cinco) arquivos de vídeo contendo pornografia infantil, que foram extraídos e gravados nas mídias anexas ao laudo.
7) Quando o arquivos com conteúdo de cena de sexo explícito ou pornográfica envolvendo criança ou adolescentes começaram a ser adquiridos pelo investigado? Até quando essa conduta perdurou?
Os arquivos de pornografia infantil localizados no disco examinado foram obtidos através do e-Mule no período de 16/05/2010 a 08/07/2010, segundo a data de criação dos mesmos, que, em condições normais, é atribuída no início do processo de download dos mesmos.
(...)" - fls. 412/417

Deste modo, não resta dúvida quanto à materialidade dos delitos.

A alegação da defesa no sentido de que o último laudo encartado nos autos descaracteriza as teses da acusação e nega a prática de ato ilícito, em face da divergência com os laudos anteriores, não procede.

Assim, cabe uma análise pormenorizada de todos os laudos encartados aos autos, o de nº 4798/2010 (fls. 423/432) se refere à perícia realizada nos outros objetos apreendidos por ocasião do flagrante, sendo que, nos 3 pendrives e 7 mídias ópticas CD-RW não foram localizados arquivos contendo pornografia infantil ou dados de possível interesse relacionados à pedofilia.

Ainda, foi objeto da mencionada perícia 64 folhas de papel comum com textos impressos e algumas anotações manuscritas.

O laudo nº 4987/2010 (fls. 454/457), a que se refere a defesa em suas razões de apelação, se refere à perícia realizada em um CD que continha os dados de mensagens eletrônicas do réu, recebidas e enviadas pela conta de e-mail exatamente@ig.com.br, em que não foram identificados registros de divulgação de arquivos contendo pornografia infantil.

No entanto, os dois laudos nº 4798/2010 e nº 4987/2010, diversamente do sustentado pela defesa, não ensejam conclusão diversa da alcançada com base nos laudos relativos aos HDs.

Cabe ressaltar que cada um dos laudos se refere a mídias diversas, com conteúdo diverso. A armazenagem do material ilícito poderia ser identificada em todas as mídias, ou apenas em uma, o que já bastaria para demonstrar a materialidade do crime. O fato de se encontrar o material de pedofilia em mais de uma mídia interfere nas características dos crimes, como a quantidade e meios de dispersão do material.

Ainda, é de se anotar que, em relação ao uso de e-mail, o fato de não ter sido identificada nas mensagens a divulgação de material com conteúdo pedófilo, não elide o compartilhamento efetuado por outro meio, no caso através do programa e-Mule, conforme constatado no outro laudo.

Assim, não há divergência entre os laudos e incabível a conclusão almejada pelo réu de que o laudo nº 4987/2010 nega a prática de ato ilícito.

Ademais, por tudo quanto demonstrado pelos laudos periciais, cuja análise deve ser feita em conjunto com os esclarecimentos prestados por seus autores, ouvidos como testemunhas, é possível concluir-se, com segurança, pela materialidade e autoria dos delitos.

E a avaliação desta prova, em conjunto com as demais provas dos autos, especialmente a testemunhal, ensejam o afastamento da tese defensiva de que o réu estaria investigando o crime em questão, escudado na excludente prevista no § 2º do art. 241-B do ECA (Lei nº 8.069/90).

Argumenta a defesa no sentido de que o cumprimento das funções fora do local de trabalho era fato conhecido dos superiores do acusado, conforme depoimento do Dr. Fabiano, apontado pela defesa como o superior do réu.

Ocorre que, em primeiro lugar, diversamente do afirmado pela defesa, a testemunha Fabiano, delegado da polícia civil, não era o superior do réu na época dos fatos. Ainda, cabe ressaltar que a defesa não trouxe qualquer testemunha que demonstrasse sua tese de que o superior hierárquico do acusado tinha ciência e deu autorização para que o mesmo agisse da forma como alega.

Ainda, é esclarecedor o depoimento, prestado durante a fase inquisitorial, do Delegado Mitiaki, com quem o réu também trabalhou no Setor de Investigações Gerais - SIG, e superior do delegado Fabiano, em que afirmou não ser comum o policial fazer este tipo de investigação em casa, referindo-se a investigações sobre pedofilia.

Por fim, não cabe nesta fase processual determinar diligências para esclarecer a questão, dado que já houve oportunidade para tanto, durante toda a instrução processual e não houve qualquer pedido nesse sentido, tendo a defesa, inclusive, desistido da oitiva de uma testemunha, conforme se confere da assentada da audiência realizada em 14.10.2010 (fl. 389).

Quanto à tese de que o acusado assim agiu em face da precariedade do material disponível na Polícia Civil, o argumento é primário.

Ainda que seja de conhecimento geral a precariedade de equipamentos em muitos setores públicos, o Delegado Mitiaki, na fase inquisitorial, afirmou que o sistema de informática da polícia civil era bem atualizado. O relato do delegado Fabiano, de que o réu levou seu computador pessoal para o local de trabalho durante o período em que trabalharam juntos, não interfere na análise da questão, pois, ainda que diante da precariedade do material de trabalho, tal fato não autoriza qualquer agente público, incluindo-se o próprio delegado, a cometer crimes.

O argumento de que o réu só compartilhou os dados com o intuito de identificar possíveis criminosos, tampouco é factível, uma vez que grande parte do material ilícito tem origem estrangeira e, como não é possível só pelo registro do IP que acessou o material, que sequer foi identificado pelo réu, identificar o usuário que acessou os arquivos, resta totalmente ineficiente o suposto método de investigação utilizado, e que, dado o conhecimento do réu na área de informática, não permite sequer a aplicação da dúvida em seu favor.

Quanto à alegação de que as ações atribuídas ao réu, compartilhar e armazenar, são únicas no programa e-Mule, pois o contato e transferência de dados é automático, de forma que não se poderia imputar condutas diversas ao réu, tampouco procede.

Conforme já analisado, cada HD apreendido tinha funções distintas, o que já se poderia intuir em face da localização física de cada um, no momento da apreensão. O HD da marca Samsung tinha por função o armazenamento de arquivos, estava em um armário fechado, junto com diversas outras mídias, inclusive outros HDs, cujo conteúdo era de arquivos que não envolviam o crime em questão. Por outro lado, o HD da marca Seagate estava instalado no computador, possuía arquivos de material contendo pornografia infantil além do programa utilizado para o compartilhamento do material ilícito.

Ainda, conforme se extrai dos laudos que periciaram ambos os HDs, a diversidade de datas revela que se trataram de condutas distintas.

No HD Samsung, que tinha por função armazenar, na grande maioria, arquivos envolvendo pornografia, o perito localizou 328 arquivos de vídeo contendo pornografia infantil, em duas pastas distintas, uma delas com nome ligado especificamente ao crime, denominada "PEDO", e que totalizavam um volume de dados de 50 GB, e além destes arquivos de vídeo, que estavam ativos, também foram recuperadas 41 imagens que haviam sido apagadas, em que havia indivíduos com aparência de criança ou adolescente em cenas de nudez ou pornográficas (fl. 143).

Ainda, o perito anotou que não havia informação sobre a forma e data de obtenção dos arquivos, porém, como estavam disponíveis as datas de criação, modificação e último acesso dos arquivos encontrados, permite-se a conclusão de que se referiam a condutas praticadas no ano de 2009.

Por outro lado, a conduta de compartilhamento dos arquivos encontrados no outro HD, da marca Seagate, revelou-se que foi praticada no ano de 2010, havendo intervalo entre as condutas de meses, o que embasa a conclusão do juízo de primeiro grau ao entender tratar-se de crimes distintos e aplicar o concurso material, de modo que, tampouco o pedido alternativo da defesa, para que seja considerada a prática de um único delito de forma continuada, merece provimento.

A questão foi sucinta e coerentemente avaliada nas contrarrazões do Ministério Público Federal, que transcrevo:

"1) Da inexistência de investigação
A tese de que o réu realizava investigação criminal oficiosa e que a falta de informações sobre esta "investigação" seria pelo fato de que nenhum servidor público poderia autorizar oficialmente tal prática sob risco de danos à carreira por estar "se decretando a falência do Estado" não deve ser levada em consideração.
Primeiramente, não existe tal receio de danos à carreira. Não são raros nos inquéritos policiais manifestações de falta de estrutura e recursos, eventualmente com diligências feitas às expensas dos agentes públicos, mas mesmo nestes casos existe alguma formalização oficial da diligência; no presente caso, não existe nenhum documento e nenhum servidor que atestasse esta "investigação". Trata-se de uma ficção.
Este Parquet já demonstrou em suas alegações finais dez fatos que comprovam que o apelante guardava e retransmitia as imagens para simples satisfação pessoal, sem ligação alguma com seu trabalho na Polícia Civil. Tais razões foram repetidas na sentença e são reproduzidas aqui em síntese:
1) o mandado de busca e apreensão que deu origem à prisão em flagrante refere-se ao download, em 2005, de um vídeo de pornografia infantil que não guardava relação alguma com seu trabalho;
2) o estrito cumprimento do dever legal aplica-se apenas à posse de material pornográfico infantil para fins de denúncia, nunca podendo abranger o compartilhamento deste material;
3) se a investigação do réu buscava a descoberta dos autores dos vídeos, como alegado em sua defesa, não haveria razão para ele armazenar e compartilhar fotos e vídeos reconhecidamente produzidos no estrangeiro;
4) o método de investigação alegado pelo réu envolve a tentativa de descoberta dos autores dos arquivos de pedofilia por meio manifestamente inidôneo;
5) o réu não tem absolutamente nenhum registro de sua pretensa investigação;
6) o réu nunca revelou sua "investigação" a seus superiores hierárquicos, além de que a Polícia Civil tem equipamentos para investigar este tipo de crime, conforme o depoimento de fl. 51;
7) junto com os vídeos de pornografia infantil, eram também armazenadas fotos de crianças com poucas roupas, porém de caráter não pornográfico, demonstrando de que os arquivos não eram mantidos para fins de investigação criminal;
8) os arquivos de pedofilia estavam junto com outros arquivos de pornografia comum, classificados em pastas e separados por matéria ("PTHC", "gay", "hard", "soft");
9) o réu tem particular interesse em histórias de crianças em situações de caráter sexual, conforme o roteiro "No tempo das adolescências", por ele escrito (fls. 56/119);
10) o réu só alegou que armazenava as imagens de pornografia infantil depois que elas foram encontradas.
Como visto, tais práticas nem sequer se aproximam de algo que possa se chamar de investigação.
O apelante ainda alega no recurso que o que deveria ser considerado falta de técnica do apelante na investigação foi interpretado como forma de praticar o crime. Não se trata de falta de técnica: o conjunto probatório demonstrou que não houve investigação alguma, mas posse e divulgação escancarada de pornografia infantil, disfarçada neste processo criminal, sob uma falsa "investigação", usando em seu benefício o fato de o réu ser escrivão da Polícia Civil, para levar o Juízo a erro." - fls. 536 verso/537verso

Por fim, ainda em face das alegações da apelação do réu, cabe afastar o pedido de novas diligências a fim de esclarecer o uso do programa de computador que permitiu o compartilhamento do material ilícito.

O material apontado pela defesa, relativo a artigo de pesquisa sobre virtualização e emulador, é questão estranha aos autos, uma vez que a matéria não se aplica a programa de compartilhamento de arquivos, como o utilizado no caso.

Aparenta tratar-se de expediente protelatório e, por sua ineficácia em relação ao deslinde do caso, não merece qualquer providência nesta fase processual.

Ademais, além da prova da materialidade, houve a demonstração da autoria pelas testemunhas ouvidas em juízo, conforme mídia de fl. 391-A, em que os agentes que efetuaram a busca na residência do réu esclareceram que somente moravam no local o réu e sua genitora e somente ele utilizava o escritório em que estavam os computadores e mídias apreendidas.

E a alegação de que o réu teria agido de forma lícita ao acessar o material, pois estaria realizando uma investigação, atos que estariam acobertado pela previsão legal do § 2º do art. 241-B do ECA, conforme já analisado, não merece crédito, até pelo simples fato de ter efetuado o compartilhamento do material ilícito, uma vez que a excludente só se refere ao crime do art. 241-B.

O fato do programa de compartilhamento atuar automaticamente não elide de modo algum a ilicitude da conduta, pois o usuário escolhe as pastas que serão compartilhadas, conforme esclarecido pelas testemunhas.

Ademais, o próprio réu, em seu interrogatório, confirmou ter compartilhado os arquivos de pornografia infantil, ainda que sob a alegação de que assim agia para buscar informações acerca de possíveis criminosos, como parte de sua suposta investigação.

Deste modo, desmente-se a tese de que o compartilhamento era automático, pois o próprio acusado reconheceu que tinha ciência do funcionamento do programa e que optou por fazer uso do compartilhamento dos arquivos ilícitos.

Ainda, foi esclarecido pelos peritos que o programa tem mecanismos para evitar o compartilhamento de cada um dos arquivos baixados.

O réu, justamente por suas características de conhecer a área de informática, não pode ser beneficiado por um suposto desconhecimento disso, se para tudo o mais que envolvia a questão, inclusive de investigar os crimes cibernéticos, se valia de sua expertise, o que também é indicado pela quantidade de material de informática existente em seu escritório, onde apreendido o material ilícito, já que lá havia, segundo os depoimentos das testemunhas, pelos menos dois computadores em uso, mais outros dois, mais antigos, parados, além de, no armário, haver mais de 20 HDs.

Ainda é relevante ressaltar que a testemunha Ayrton, perito que acompanhou a diligência de busca e apreensão, relatou que os dois computadores em uso tinham uma gaveta, que identificou como hotplug, em que o HD comum é colocado e utilizado e que tinha "uns vinte e poucos HDs no armário".

Assim, a versão apresentada pelo réu em juízo, buscando o reconhecimento de excludente da ilicitude, não se coaduna com a prova produzida em sede inquisitorial, no momento da prisão em flagrante, e que restou ratificada em juízo, sob o crivo do contraditório, especialmente em face das testemunhas de defesa que relataram que o acusado era conhecido por sua intimidade com a área de informática.

Também demonstrado o dolo do réu pelo teor do depoimento dos agentes que acompanharam a diligência de busca e apreensão, Marco Antonio e Ayrton, ao relatarem que o acusado somente se referiu ao conteúdo do material relativo à pornografia infantil após aquele ter sido encontrado.

O relato de Ayrton é muito esclarecedor. Conforme o longo depoimento prestado em juízo, relatou que, ao localizar no programa e-Mule o histórico de buscas, apareceram os termos que haviam sido buscados e, dentre eles, havia alguns relacionados à pornografia infantil, recordando-se de um que é PTHC que significa preteen hardcore. Esclareceu que o acusado estava nesse momento e que perguntou-lhe o que eram aqueles termos, ao que o acusado respondeu "você sabe o que é isso". Ainda, mais à frente em deu depoimento, narrou que foi perguntado ao acusado se tinha mais alguma coisa, pois estava analisando o HD que estava instalado no computador, e ele disse que não, no entanto foi encontrado em outro HD, que estava no armário, mais arquivos com pornografia infantil. E mais adiante ainda, ao falar sobre os termos encontrados, disse que aprenderam a partir desse caso um novo termo relacionado à pedofilia que é SDPA, que seria a versão em espanhol para PTHC, mas não se recordava exatamente o que significava a sigla.

Mantida a condenação, cumpre verificar a dosimetria da pena.

Em relação a ambos os crimes, na primeira fase de fixação da pena, o juízo a quo já avaliou as circunstâncias do art. 59 do Código Penal para fixar a pena-base acima do mínimo legal.

Ponderou que, apesar do réu ser primário, ter bons antecedentes e nada o desabonar em sua conduta profissional, as circunstâncias delitivas eram graves.

Bem fundamentada a valoração do juízo a quo, pois apontou a grande quantidade de material ilícito, a condição de policial do réu, que teve contato com investigações de pedofilia, o que aumenta a periculosidade, pois dele era esperada conduta diametralmente oposta, pois como agente do Estado deveria proteger a sociedade e perseguir criminosos e não cometer ele próprio aqueles crimes. Ainda, anotado que o réu tinha total domínio dos termos de busca de pedofilia, inclusive apontado por um dos peritos que um dos termos buscados só teve conhecimento a partir desse caso, bem como há fortes indícios de que tenha personalidade voltada à prática desses delitos.

Assim, da pena prevista no tipo penal do art. 241-B, de 1 a 4 anos, foi aplicada pena-base de 2 anos e 6 meses de reclusão e 15 dias-multa, e no tipo penal do art. 241-A, da pena possível de 3 a 6 anos, foi aplicada pena-base de 4 anos e 6 meses de reclusão e 15 dias-multa.

As penas se tornaram definitivas em virtude da ausência de agravantes ou atenuantes, na segunda fase, e de causas de aumento ou diminuição, na terceira fase, de modo que, no total foi aplicada pena de 7 anos de reclusão e 30 dias-multa, cujo valor diário restou fixado em 2 salários mínimos da época do crime, tendo sido considerada a renda que o réu auferia como escrivão de polícia.

Ainda, foi fixado regime inicial de cumprimento de pena semi-aberto e decretada a perda do cargo público, como efeito da condenação, tanto em face da quantidade de pena fixada quanto pela prática de ilícito incompatível com as atribuições do cargo de escrivão de polícia civil.

Apesar das razões apontadas pelo Ministério Público Federal, entendo que a pena-base não deve se aproximar do máximo conforme disposto no art. 59 do Código Penal e, no caso, como bem anotado pelo juízo a quo, não são todos os fatores apontados naquele dispositivo legal que são desfavoráveis ao réu, de modo que, entendo que já bem avaliada a reprimenda no montante fixado e que deve ser mantido.

Anoto que não cabe a aplicação da causa de aumento pela continuidade delitiva, seja porque o crime do art. 241-B se alonga no tempo, enquanto armazenado o material ilícito, tratando-se de crime permanente e, no caso do crime do art. 241-A, o espaço de tempo em que o material foi compartilhado, parece-me, pelo testemunho dos peritos, tratar-se de conduta única, já que compartilhado enquanto se adquiria o próprio material e, dado o volume de arquivos adquiridos, foi uma parte bem menor que restou efetivamente transmitida apesar do grande número de solicitações.

Por fim, no que tange ao pedido alternativo da defesa, acerca da possibilidade de aplicação da conversão em pena restritiva de direitos, não é cabível tanto em face da quantidade da pena aplicada quanto pelas características dos delitos, o que impede a conversão da pena.

Diante do exposto, nego provimento a ambos os recursos, mantendo integralmente a sentença.

É COMO VOTO.


RAMZA TARTUCE
Desembargadora Federal


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