Diário Eletrônico

PODER JUDICIÁRIO

TRIBUNAL REGIONAL FEDERAL DA 3ª REGIÃO

D.E.

Publicado em 15/02/2013
AGRAVO LEGAL EM APELAÇÃO/REEXAME NECESSÁRIO Nº 0008726-91.2002.4.03.6104/SP
2002.61.04.008726-6/SP
RELATOR : Desembargador Federal COTRIM GUIMARÃES
AGRAVADO : Uniao Federal
ADVOGADO : TÉRCIO ISSAMI TOKANO e outro
AGRAVANTE : UNAFISCO SINDICAL SINDICATO DOS AUDITORES FISCAIS DA RECEITA FEDERAL
ADVOGADO : OLAVO ZAMPOL e outro
REMETENTE : JUIZO FEDERAL DA 2 VARA DE SANTOS > 4ªSSJ > SP

EMENTA

AGRAVO LEGAL. ADMINISTRATIVO. DECISÃO MONOCRÁTICA. ARTIGO 557 DO CPC. POSSIBILIDADE. AÇÃO ORDINÁRIA. SINDICATO NACIONAL DOS AUDITORES FISCIAIS DE SANTOS. ADICIONAL DE PERICULOSIDADE. TRABALHO COM HABITUALIDADE E EM CONTATO PERMANENTE COM SUBSTÂNCIAS TÓXICAS, RADIOATIVAS OU COM RISCO DE VIDA. DECRETO-LEI N.º 1.873/81, LEI 8.112/90 E LEI N.º 8.270/91. PERÍCIA POR AMOSTRAGEM. ATRIBUIÇÕES DOS AUDITORES FISCAIS. MEDIDA PROVISÓRIA N.º 1.971/2000. ATIVIDADES INTERNAS E ADMINISTRATIVAS. AUSÊNCIA DE RISCO DE VIDA. DESCARACTERIZAÇÃO DA HABITUALIDADE E PERMANÊNCIA. IMPROCEDÊNCIA DO PEDIDO. NÃO VINCULAÇÃO DO JUÍZO APENAS À PERÍCIA. CONTEXTO PROCESSUAL COMO UM TODO. PRINCÍPIO DO LIVRE CONVENCIMENTO DO JUÍZO. ARTIGO 436 DO CPC. NÃO APLICAÇÃO DO ARTIGO 437 DO CPC. RECURSO IMPROVIDO.
I. Admissível o julgamento do recurso de apelação nos moldes do artigo 557 do Código de Processo Civil uma vez que a análise das questões abordadas nos autos foi amparada em jurisprudências dominantes desta E. Corte e do colendo Superior Tribunal de Justiça, o que, por si só, já afasta qualquer irregularidade a respeito. Ademais, eventual violação aos princípios do contraditório e da inafastabilidade do controle jurisdicional, decorrente da aplicação do art. 557 do CPC, fica superada, desde logo, com a apreciação do presente agravo legal pelo órgão colegiado.
II. Trata-se de ação ajuizada pelo Sindicato Nacional dos Auditores Fiscais da Receita Federal objetivando a condenação da ré ao pagamento, em favor de seus filiados, do adicional de periculosidade, no percentual de 10% (dez por cento) sobre o vencimento básico do cargo efetivo de cada um deles.
III. Nos moldes do disposto no Decreto-lei n.º 1873/81 (art. 1º) e nas Leis n.ºs 8.112/90 (arts. 68 a 70) e 8.270/91 (art. 12), aos servidores que trabalhem com habitualidade em locais insalubres ou em contato permanente com substâncias tóxicas, radioativas ou com risco de vida, é devida a percepção de um adicional sobre o vencimento do cargo efetivo, cujo percentual, no caso de periculosidade, é de 10%.
IV. In casu, a perícia realizada nos autos se deu por amostragem, levando em conta a situação de apenas dois auditores fiscais que prestavam serviços junto a uma determinada empresa. As atividades dos demais vinte e seis auditores relacionados pelo sindicato, os seus locais de prestação de serviço e as condições a eles submetidas não foram objeto de análise pericial, o que impossibilita, por si só, a aplicação das conclusões expostas no referido laudo pericial, a todos os auditores filiados.
V. O artigo 6º da Medida Provisória n.º 1971/2000 dispõe sobre as atribuições dos auditores fiscais da Receita Federal lotados na Delegacia Federal de Santos, donde se constata que eventuais procedimentos de fiscalização ou conferência física de mercadorias armazenadas em depósitos, armazéns, terminais retro alfandegados, postos de gasolina, indústria e comércio são apenas algumas de suas atribuições. Várias outras encontram-se discriminadas naquela Medida Provisória, sendo elas: constituir, mediante lançamento, crédito tributário; elaborar e proferir decisões em processo administrativo fiscal; proceder orientação do sujeito passivo no tocante à aplicação da legislação tributária e supervisionar as atividades de orientação do sujeito passivo efetuadas por intermédio de mídia eletrônica, telefone e plantão fiscal - possuindo, estas últimas, caráter eminentemente administrativo/interno.
VI. O fato de a perícia constatar que os auditores fiscais quando exercem a fiscalização de mercadorias em armazéns, containers, pátios de empresas e outros, adentram em área de risco em decorrência de armazenamento de explosivos, trabalhando em condições de periculosidade, não enseja, por si só, o direito à percepção do referido adicional, considerando que essas não são as suas únicas atividades por eles exercidas.
VII. Ainda em conformidade com o constatado no laudo pericial, quando os auditores exercem atividades internas e de caráter administrativo junto à sede, não ficam expostos a qualquer risco de vida, o mesmo se dizendo no que tange a atividades junto a empresas que não estão localizadas em áreas de risco ou que não possuem armazenamento de explosivos e/ou substâncias perigosas.
VIII. A conclusão decorrente do laudo pericial - qual seja: que as atividades dos auditores fiscais estão enquadradas como perigosas - não pode prevalecer, considerando que o referido laudo foi elaborado (i) de forma genérica, (ii) sem observar as características individuais dos serviços prestados por cada auditor relacionado nos autos e (iii) constatou a diversidade das atribuições dadas aos auditores, os quais não se limitam a exercer apenas atividades de fiscalização, mas também de caráter administrativo, sem, nestas hipóteses, estarem expostos a risco de vida.
IX. Nos moldes do artigo 436 do CPC, o Juízo não está adstrito apenas ao laudo pericial, sendo-lhe facultado formar sua convicção com outros elementos constantes dos autos, ou seja, através do contexto processual como um todo.
X. A realização de nova perícia, nos moldes do artigo 437 do CPC, há de ser afastada, tendo em vista que um novo trabalho pericial só poderia ser determinado caso a matéria não estivesse suficientemente esclarecida, o que não é o caso dos autos. Ademais, cabe exclusivamente ao juiz avaliar a necessidade da realização de nova perícia. Precedentes do STJ (3ª T., Resp 1.070.772, Min. Nancy Andrighi, j. 22.6.10, DJ 3.8.10).
XI. Agravo legal improvido.



ACÓRDÃO

Vistos e relatados estes autos em que são partes as acima indicadas, decide a Egrégia Segunda Turma do Tribunal Regional Federal da 3ª Região, por unanimidade, negar provimento ao agravo legal, nos termos do relatório e voto que ficam fazendo parte integrante do presente julgado.



São Paulo, 05 de fevereiro de 2013.
COTRIM GUIMARÃES
Desembargador Federal


Documento eletrônico assinado digitalmente conforme MP nº 2.200-2/2001 de 24/08/2001, que instituiu a Infra-estrutura de Chaves Públicas Brasileira - ICP-Brasil, por:
Signatário (a): LUIS PAULO COTRIM GUIMARAES:10056
Nº de Série do Certificado: 7476B97B119CBD13
Data e Hora: 06/02/2013 16:47:37



AGRAVO LEGAL EM APELAÇÃO/REEXAME NECESSÁRIO Nº 0008726-91.2002.4.03.6104/SP
2002.61.04.008726-6/SP
RELATOR : Desembargador Federal COTRIM GUIMARÃES
AGRAVADO : Uniao Federal
ADVOGADO : TÉRCIO ISSAMI TOKANO e outro
AGRAVANTE : UNAFISCO SINDICAL SINDICATO DOS AUDITORES FISCAIS DA RECEITA FEDERAL
ADVOGADO : OLAVO ZAMPOL e outro
REMETENTE : JUIZO FEDERAL DA 2 VARA DE SANTOS > 4ªSSJ > SP

RELATÓRIO

Trata-se de agravo legal interposto pela UNAFISCO SINDICAL - SINDICATO NACIONAL DOS AUDITORES FISCAIS DA RECEITA FEDERAL em face de decisão que, nos autos da ação ordinária ajuizada em face da UNIÃO FEDERAL, deu provimento ao recurso de apelação interposto pelo ente público e ao reexame necessário para o fim de rejeitar a pretensão do autor e condená-lo ao pagamento de custas e honorários advocatícios, fixados em R$ 8.000,00 (oito mil reais), nos moldes do artigo 20, §4º do CPC.



Em suas razões, a agravante aduz, em apertada síntese: a) que o fato do relator ter se estendido na interpretação dos fatos e na análise das provas produzidas (pericial), não lhe permite a aplicação do artigo 557, §1º-A do CPC, motivo pelo qual o recurso deve ser submetido ao órgão colegiado ou ser considerado nulo; b) que a perícia é a prova técnica e específica necessária ao deslinde do feito, cujo trabalho não sofreu nenhuma impugnação técnica válida; c) que a aceitação da conclusão pericial é inevitável vez que a mesma não exibe matéria fática a esclarecer e não sofreu qualquer impugnação técnica; d) que não há que se invocar o princípio do livre convencimento para dispensar a perícia, vez que a mesma foi aceita pelas partes e não impugnada; e) que a perícia não pode ser afastada a não ser que novos elementos técnicos sejam produzidos; e f) que era de rigor a determinação de uma nova perícia para determinar que o expert especificasse suas conclusões, observadas as características individuais de cada um dos auditores


É o relatório.


Em mesa.




VOTO

De início, cumpre salientar que as questões abordadas no presente feito foram analisadas e fundamentadas não só com base nos entendimentos jurisprudenciais dominantes deste E. Tribunal, como também em jurisprudência proferida pelo colendo Superior Tribunal de Justiça, o que, por si só, já permite o julgamento monocrático, nos moldes do artigo 557 do Código de Processo Civil.


Ressalto, ainda, que a simples interposição do presente agravo legal submete a apreciação da matéria ao órgão colegiado, o que, por si só, afasta eventual alegação acerca de violação ao princípio da ampla defesa. Para corroborar tal entendimento, trago à colação aresto proferido por esta E. Corte:


"PREVIDENCIÁRIO. AGRAVO LEGAL INTERPOSTO CONTRA DECISÃO MONOCRÁTICA PROFERIDA NOS TERMOS DO ART. 557 DO CPC. AÇÃO AJUIZADA COM VISTAS À OBTENÇÃO DE APOSENTADORIA POR INVALIDEZ OU AUXÍLIO-DOENÇA. AGRAVO IMPROVIDO. - Recurso interposto contra decisão monocrática proferida nos termos do art. 557, do CPC. - Em homenagem ao princípio da ampla defesa, há de ser reconhecido o direito da agravante a ser periciada por médico endocrinologista e gastroenterologista, salvo se na região não houver especialistas nas referidas áreas, como reza o § 3º, do art. 145 do CPC, caso em que deverá ser nomeado profissional especializado em perícias médicas ou clínico geral. - A alegação de que não é cabível o julgamento monocrático no caso presente, resta superada, frente à apresentação do recurso em mesa para julgamento colegiado. - O caso dos autos não é de retratação - Agravo legal não provido."
(TRF 3ª REGIÃO, AI - AGRAVO DE INSTRUMENTO 409305, Processo: 201003000179295, Órgão Julgador: Oitava Turma, Rel. Vera Jucovsky, Data da decisão: 20/06/2011, DJF3 CJ1 DATA: 30/06/2011, pág. 1490)


Diante disso, não vejo qualquer ilegalidade no julgamento monocrático, com fulcro no artigo 557 do Código de Processo Civil e, ao contrário do quanto alegado pela agravante, entendo que a sua aplicação não viola o princípio da ampla defesa.


No mais, todos os argumentos aduzidos pelo agravante em suas razões recursais já foram apreciados por ocasião do julgamento monocrático, motivo pelo qual transcrevo o inteiro teor daquela decisão e adoto os seus fundamentos para julgar o presente recurso, verbis:



"Vistos, etc.

Descrição fática: UNAFISCO SINDICAL - SINDICATO NACIONAL DOS AUDITORES FISCAIS DA RECEITA FEDERAL ajuizou ação ordinária em face da UNIÃO FEDERAL objetivando a condenação da ré ao pagamento, em favor dos seus filiados, o adicional de periculosidade, no percentual de 10% (dez por cento) sobre o vencimento básico do cargo efetivo, aduzindo que restou constatado, através de perícia realizada pela Subdelegacia do Trabalho e Emprego, que os auditores fiscais lotados na Delegacia da Receita Federal de Santos trabalham em condições de periculosidade, de maneira habitual e permanente, fazendo jus ao respectivo adicional.

O pedido de tutela antecipada foi indeferido às fls. 361/363, decisão esta que foi objeto de Agravo de Instrumento, o qual restou prejudicado por perda de objeto, nos termos do artigo 33, inciso XII do Regimento Interno do E. TRF da 3ª Região.

Sentença: o M. M. Juízo a quo julgou procedente a presente ação, fundamentando-se, para tanto, nos seguintes argumentos: a) que, de acordo com o disposto nas Leis n.ºs 8.112/90 e 8.270/91, bem como no Decreto n.º 97.458/89, Decreto-lei n.º 1.873/81 e na CLT, a "habitualidade" e o "contato permanente" do trabalhador com substâncias ditas "perigosas", consolidam-se como sendo as duas hipóteses básicas e necessárias para o pagamento do adicional pleiteado, possibilitando a sua incorporação aos vencimentos do titular do cargo efetivo; b) que, no caso dos autos, o atestado no laudo pericial confeccionado pela Subdelegacia do Trabalho e Emprego em Santos foi corroborado pela perícia judicial, a qual concluiu que os auditores fiscais da Receita Federal adentram, de forma habitual, em áreas de risco, ficando expostos, mesmo que de maneira intermitente, a inflamáveis líquidos ou gasosos liquefeitos e materiais explosivos; e c) que, comprovada a exposição habitual a agentes agressivos, o adicional deve ser concedido desde 04/04/2000 - data da Portaria n.º 11/2000 expedida pela Delegacia da Receita Federal em Santos, a qual reconheceu em favor dos auditores fiscais da Delegacia da Receita Federal de Santos o direito ora vindicado. Assim, houve a condenação da União Federal a implantar em favor dos filiados relacionados às fls. 292/319, o adicional de periculosidade no percentual de 10% (dez por cento) sobre o vencimento básico do cargo efetivo, conforme previsto na Lei n.º 8.270/91, bem como a pagar-lhes as diferenças remuneratórias decorrentes da referida implantação, desde 04/04/2000, observando-se a prescrição qüinqüenal e os índices de atualização acolhidos no Provimento n.º 26, de 10/09/2001 da E. Corregedoria Geral da Justiça Federal da 3ª Região e Resolução n.º 561, de 02/07/2007 do E. CJF. Determinou, ainda, a incidência dos juros de mora de 1% ao mês sobre o valor da condenação devidamente corrigido, a contar da citação da ré, bem como condenou a ré ao pagamento dos honorários advocatícios, fixando-os em 10% (dez por cento) sobre o valor total da condenação, na forma do artigo 20, §3º do CPC (fls. 514/518).

Sentença sujeita ao reexame necessário.

Apelante: União Federal pretende a reforma da r. sentença, aduzindo, preliminarmente, que as documentações acostadas aos autos não comprovam o imprescindível registro da entidade sindical junto ao Ministério do Trabalho, o que culmina na ilegitimidade ativa ad processum do sindicato, a qual deve ser, de plano, declarada. No tocante ao mérito, aduz, em apertada síntese: a) que, nos moldes do Decreto n.º 97.458/89, para fazer jus ao adicional de periculosidade, necessário se faz que as atividades do servidor público impliquem em contato permanente com os agentes nocivos e perigosos, não justificando a sua concessão nos casos de contato em forma esporádica; b) que, in casu, os auditores fiscais não estão expostos de forma permanente a qualquer elemento inflamável ou explosivo, o que decorre da própria natureza das atividades empenhadas pelos referidos servidores, as quais possuem índole predominantemente interna, isto é, de serviços de gabinete, realizados dentre da sua sede; c) que a sede dos auditores fiscais deve ser objeto de perícia, já que lá é o local onde predominantemente os auditores exercem suas funções; d) que o próprio expert afirmou não considerar o laboratório utilizado pelos auditores da Receita Federal como área de risco, vez que as quantidades armazenadas não caracterizam condição de periculosidade; e) que o laudo pericial descreveu de forma genérica as características das atividades perigosas, limitando-se a remeter sempre as indagações nesse sentido ao item 3.3.2 do laudo judicial; f) que o laudo pericial não obedeceu aos requisitos exigidos no artigo 2º do Decreto n.º 97.458/89, sendo estritamente genérico e disperso; g) que o perito se equivocou ao afirmar que os auditores fiscais estão habitualmente expostos a áreas de risco, na medida em que estas ocorrem de forma excepcional, esporádica; h) que a real intenção do autor é obter aumento dos vencimentos de seus representados por meio de um ato jurisdicional, o que viola o disposto nos artigos 37, inciso X e 61, §1º, inciso II, alínea "a" da CF e na Súmula 339 do STF; i) que o TCU, na ATA n.º 36/87 - DOU 03/07 considera ilegal o pagamento do adicional de periculosidade de forma generalizada a determinada categoria, sobretudo para servidores com desempenho de atividade de gabinete de dirigente do órgão, fora da órbita de fiscalização externa; j) que o deferimento do pagamento do aludido adicional a contar de 04/04/2000, resulta em inexorável concretização do instituto ultra petita, tendo em vista que o pedido inicial veio desprovido de diferença remuneratória; k) que os juros moratórios devem ser aplicados com base no disposto no artigo 1º-F da Lei n.º 9.494/97, ou seja, no percentual de 6% (seis por cento) ao ano; e l) que a fixação dos honorários advocatícios em 10% do valor total da condenação não obedeceu ao disposto no artigo 20, §4º do CPC, motivo pelo qual tal percentual deve ser reduzido para 5% sobre o valor dado à causa (fls. 528/555).

Com contrarrazões (fls. 618/2627).

É o breve relatório.

DECIDO.

O feito comporta julgamento monocrático, nos moldes do art. 557, §1º-A do Código de Processo Civil, posto que a matéria em debate já foi sedimentada no âmbito da jurisprudência pátria.

Cuida-se de apelo da União Federal em face de sentença que julgou procedente ação ordinatória ajuizada pelo Sindicato Nacional dos Auditores Fiscais da Receita Federal, condenando-a a implantar em favor dos afiliados do autor - relacionados às fls. 292/3198 - o adicional de periculosidade no percentual de 10% (dez por cento) sobre o vencimento básico do cargo efetivo, nos moldes da Lei n.º 8.270/91, baseando-se, para tanto, no laudo pericial produzido às fls. 448/466.

Preliminarmente, afasto a alegação acerca da ilegitimidade ativa por parte do Sindicato, vez que o mesmo se encontra bem representado através dos documentos constantes nos autos. Ressalto, ainda, que, ao contrário do quanto sustentado pela apelante, a entidade sindical encontra-se registrada junto ao Ministério do Trabalho e Emprego (fls. 563), o que, por si só, denota a regularidade da sua representação.

No tocante ao mérito e no que tange à matéria em questão, transcrevo os seguintes dispositivos legais:

Decreto-lei nº 1.873/81
"Art 1º - Os adicionais de insalubridade e de periculosidade serão concedidos aos servidores públicos federais nas condições disciplinadas pela legislação trabalhista."
Lei 8.112/90
"Art.68. Os servidores que trabalhem com habitualidade em locais insalubres ou em contato permanente com substâncias tóxicas, radioativas ou com risco de vida, fazem jus a um adicional sobre o vencimento do cargo efetivo.
§ 1º O servidor que fizer jus aos adicionais de insalubridade e de periculosidade deverá optar por um deles.
§ 2º O direito ao adicional de insalubridade ou periculosidade cessa com a eliminação das condições ou dos riscos que deram causa a sua concessão."
(grifos nossos)
"Art. 69. Haverá permanente controle da atividade de servidores em operações ou locais considerados penosos, insalubres ou perigosos.
Parágrafo único. A servidor a gestante ou lactante será afastada, enquanto durar a gestação e a lactação, das operações e locais previstos neste artigo, exercendo suas atividades em local salubre e em serviço não penoso e não perigoso."
"Art. 70. Na concessão dos adicionais de atividades penosas, de insalubridade e de periculosidade, serão observadas as situações estabelecidas em legislação específica."
Lei nº 8.270/91
"Art. 12. Os servidores civis da União, das autarquias e das fundações públicas federais perceberão adicionais de insalubridade e de periculosidade, nos termos das normas legais e regulamentares pertinentes aos trabalhadores em geral e calculados com base nos seguintes percentuais:
I - cinco, dez e vinte por cento, no caso de insalubridade nos graus mínimo, médio e máximo, respectivamente;
II - dez por cento, no de periculosidade."

Por se tratar de matéria que exige prova pericial, restou determinado pelo Juízo a quo que a mesma fosse realizada através de perito devidamente nomeado às fls. 408, o qual, ao elaborar o laudo (fls. 448/466), atestou o que segue:

"(...)
Esteve o Perito na Receita Federal - Delegacia da Receita Federal de Santos no dia 05 de junho de 2006, localizada na Rua do Comércio nº 86, Centro, Santos/SP, bem como no dia 14 de junho de 2006, onde foram inspecionadas as atividades exercidas na empresa Petrocoque S/A, localizada na Rodovia Piaçaguera s/nº, Município de Cubatão.
Nestas ocasiões, encontravam-se no local para a participação na perícia os Srs. José Vicente de Carvalho e Valdir Lopes Marcon, Auditores Fiscais, que juntamente com paradigmas e funcionários da empresa Petrocoque prestaram as informações necessárias referentes às atividades e locais onde laboram os Autores (sic) Fiscais da Receita Federal."

Assim, da simples leitura das informações acima transcritas, depreende-se que a perícia foi realizada apenas por "amostragem", vez que levou em conta a situação de apenas dois auditores fiscais - Sr. José Vicente de Carvalho e Sr. Valdir Lopes Marcon - os quais estavam prestando serviços junto à empresa "Petrocoque". As atividades dos demais vinte e seis auditores fiscais relacionados às fls. 292/319, o local da prestação de serviço e as condições por eles submetidas não foram objeto de análise pelo perito judicial, o que, por si só, já impossibilita a aplicação das conclusões ali expostas, de forma genérica, para todos os demais auditores.

De se ressaltar que o direito à percepção de adicional de periculosidade não pode ser analisado em tese, de forma genérica. É imprescindível verificar, caso a caso, as condições e as atividades efetivamente realizadas pelos servidores públicos, identificando, de forma técnica e objetiva, a existência ou não de fatores de risco de vida a cada um deles.

Verifica-se, ainda, que no corpo do presente laudo, o expert fez referência ao artigo 6º da Medida Provisória n.º 1971 de 11 de janeiro de 2000, o qual dispõe sobre as atribuições dos Auditores Fiscais da Receita Federal lotados na Delegacia Federal de Santos.

Ao analisar o conteúdo do referido dispositivo, constata-se que eventuais procedimentos de fiscalização ou conferência física de mercadorias armazenadas em depósitos, armazéns, terminais retro alfandegados, postos de gasolina, indústria e comércio são apenas algumas de suas atribuições, tendo várias outras sido discriminadas na referida Medida Provisória, quais sejam: constituir, mediante lançamento, crédito tributário; elaborar e proferir decisões em processo administrativo fiscal; proceder orientação do sujeito passivo no tocante à aplicação da legislação tributária e supervisionar as atividades de orientação do sujeito passivo efetuadas por intermédio de mídia eletrônica, telefone e plantão fiscal - possuindo, estas últimas, caráter eminentemente administrativo/interno.

Assim, o fato do perito judicial afirmar que "(...) Os Auditores Fiscais quando da fiscalização de mercadorias em Armazéns, containers, pátios de empresas e outros, adentram na área de risco definida pelo armazenamento de materiais explosivos, principalmente dentro de containers. (...)", bem como que "(...) Os Auditores Fiscais trabalham em condições de Periculosidade nas atividades de fiscalização de mercadorias em Pátios de Containers, Armazéns de Mercadorias e outros Postos, adentrando na área de risco definidas pelos inflamáveis líquidos ou gasoso liquefeitos armazenados tanto dentro de containers, como de tanques ou em tambores. (...)", não enseja, por si só, o direito dos mesmos ao recebimento do adicional de periculosidade, vez que tais atividades não são as únicas por eles exercidas, não se prestando a atribuir caráter permanente e habitual às condições especiais de trabalho dos auditores.

Quando exercem as atividades internas e de caráter administrativo junto à sede (laboratório/sala administrativa situada na Rua do Comércio, n.º 86, Bairro Centro, Santos/SP), não estão expostos a qualquer risco de vida, o que se ratifica através da informação prestada pelo expert judicial: "(...) 5. Este Perito não considerou o laboratório como área de risco, pois as quantidades armazenadas não caracterizam condição de periculosidade." O mesmo se diz quando exercem atividades junto a empresas que não estão localizadas em áreas de risco ou que não possuem qualquer armazenamento de explosivos e/ou substâncias perigosas.

Portanto, considerando que a legislação que trata da concessão do respectivo adicional é clara ao estabelecer que este somente deve ser pago quando o trabalho em condições especiais for realizado de forma permanente e habitual, não há como se considerar que os auditores fiscais de Santos têm o direito de receber o referido adicional. Isso porque os serviços por eles prestados em áreas de risco não possuem o caráter de permanência e habitualidade, limitando-se às ocasiões em que exercem a função de fiscalização de mercadorias junto a armazéns, containers, pátios de empresas, postos de gasolina.

Destaca-se, ainda, que além de não exercerem apenas as atividades de fiscalização, os Auditores Fiscais da Receita Federal deslocam-se necessariamente para ambientes com os mais diversos graus de periculosidade, o que, de qualquer forma, não gera o direito à percepção do adicional de periculosidade, posto que a sua permanência em tais locais não vai além do tempo suficiente à ação fiscalizadora, que por sua natureza não é, e nem poderia ser, permanente a uma só atividade, mas direcionada ao universo de atividades econômicas existentes na região de Santos e adjacências, as quais, por sua vez, não podem ser consideradas, genericamente, como aquelas que sempre representam risco para os servidores.

Diante disso, entendo que a pretensão do autor não há que ser amparada nos termos do laudo de fls. 448/466, sob a conclusão do "expert", que afirmou "(...) que as atividades dos Auditores Fiscais da Receita Federal ESTÃO ENQUADRADAS COMO PERIGOSAS, conforme Portaria 3.214/78, Norma Regulamentadora nº 16, anexos 01 e 02." vez que o mesmo, repita-se, a) é genérico; b) não observou às características individuais dos serviços prestados por cada auditor relacionado nos autos; e c) constatou a diversidade das atribuições dadas aos auditores, os quais não se limitam a exercer atividades de fiscalização, mas também de caráter administrativo.

Por fim, com base no disposto no artigo 436 do Código de Processo Civil, o Juízo não está adstrito ao laudo pericial, sendo-lhe facultado formar sua convicção com outros elementos ou fatos provados nos autos. Compete exclusivamente ao magistrado à análise das provas para a solução do litígio, eis que é ele o destinatário da prova, pois, ao prestar a jurisdição, orienta-se pelo princípio do livre convencimento na apreciação da prova, não estando adstrito a qualquer elemento de convicção, senão ao contexto processual como um todo. A livre apreciação da prova, desde que a decisão seja fundamentada, considerada a lei e os elementos existentes dos autos, é um dos cânones do nosso sistema processual.

Para corroborar tal posicionamento, trago à baila os seguintes precedentes:

"PROCESSUAL CIVIL E PREVIDENCIÁRIO. AGRAVO REGIMENTAL NO AGRAVO DE INSTRUMENTO. BENEFÍCIO ACIDENTÁRIO. REQUISITOS AFASTADOS PELAS INSTÂNCIAS ORDINÁRIAS COM BASE NAS PROVAS DA CAUSA. PLEITO DE RENOVAÇÃO DA PROVA PERICIAL. DILAÇÃO PROBATÓRIA CONSIDERADA DESNECESSÁRIA PELA CORTE DE ORIGEM, TENDO EM VISTA A SUFICIÊNCIA DO LAUDO PRODUZIDO. FACULDADE DO JULGADOR. CERCEAMENTO DE DEFESA. NÃO CONFIGURAÇÃO. REVERSÃO DO JULGADO. IMPOSSIBILIDADE. SÚMULA N.º 07/STJ. AGRAVO DESPROVIDO. 1. Estabelece o art. 436 do Código de Processo Civil que "O juiz não está adstrito ao laudo pericial, podendo formar a sua convicção com outros elementos ou fatos provados nos autos". E, em seu art. 437, a lei processual não exige, mas, simplesmente, atribui ao juiz o poder de determinar a realização de nova perícia quando a matéria não lhe parecer suficientemente esclarecida. 2. Na hipótese em apreço, as instâncias ordinárias, após minuciosa análise das provas da causa, e com base no livre convencimento motivado, concluíram que o material probatório acostado aos autos é suficiente para o deslinde da controvérsia, e que não estão preenchidos os pressupostos legais necessários à concessão do auxílio-acidente. Sendo assim, não há como afastar a incidência da Súmula n.º 07/STJ sobre a espécie, tal como decidido pela decisão ora atacada. 3. Agravo regimental desprovido."
(STJ - AGA - AGRAVO REGIMENTAL NO AGRAVO DE INSTRUMENTO 1281365, Processo: 201000377884, Órgão Julgador: Quinta Turma, Rel. Laurita Vaz, Data da decisão: 29/04/2010, DJE DATA: 24/05/2010)
"ADMINISTRATIVO. SERVIDOR PÚBLICO. AUDITORES FISCAIS DO TRABALHO. ADICIONAL DE PERICULOSIDADE. PAGAMENTO SUSPENSO. NÃO SUBMISSÃO PERMANENTE NEM HABITUAL A CONDIÇÃO DE PERIGO. LAUDO PERICIAL EXTRAJUDICIAL. ELABORAÇÃO POR MÉDICO E ENGENHEIRO DO TRABALHO. PROVA RELATIVA. PRINCÍPIO DA LIVRE CONVICÇÃO DO JUIZ. NÃO CARACTERIZAÇÃO DE PERMANÊNCIA OU HABITUALIDADE A SITUAÇÃO DE PERIGO. APELAÇÃO E REMESSA OFICIAL PROVIDOS. SENTENÇA REFORMADA. PEDIDO IMPROCEDENTE. 1 - O ato que determina a suspensão do pagamento do adicional de periculosidade a agentes administrativos, por inexistir motivação fática que justifique o pagamento, gera efeitos próprios à presunção de legitimidade dos atos da Administração Pública. Inexigência, por isto, de que a Administração demonstrasse, previamente, inexistir os fatores determinantes do pagamento do referido adicional, para somente após determinar a suspensão do pagamento. Sendo a presunção de legalidade em favor do ato administrativo, a exigência é que se faça prova das condições determinantes do direito ao adicional de periculosidade para se aferir a ilegalidade do ato que determinou sua suspensão, e , por conseguinte, reconhecer o direito à percepção do respectivo valor. 2 - O direito ao adicional de periculosidade condiciona-se à exigência do art. 68 e § 2º da Lei n. 8.112/91, de contato permanente com substâncias tóxicas, radioativas ou com risco de vida. 3 - Os Auditores Fiscais do Trabalho, servidores cuja atribuição consiste no exercício de atividade policial administrativa, inerente à aplicação da legislação trabalhista, seja porque exercem sua função em relação a diferentes atividades e locais, seja porque a própria atividade policial, por sua natureza é esporádica e restrita à verificação do cumprimento da legislação do trabalho, não mantêm contato permanente, com os agentes agressivos, notadamente em caráter permanente ou habitual, nos termos em que exigidos pelo art. 68 da Lei n. 8.112/91. 4 - Laudo pericial elaborado por Medico e Engenheiro do Trabalho, concluindo pela submissão dos Autores, Auditores Fiscais do Trabalho lotados na DRT/AP, a situação de perigo que lhes assegura o direito ao adicional de periculosidade. Laudo extrajudicial, que não obstante sua fundamentação, não constitui base sólida à convicção de que, em razão do exercício do cargo, os Auditores Fiscais do Trabalho sujeitam-se, de forma permanente, à situação de perigo exigida pela lei de regência. 5 - O juiz, ao prestar a jurisdição, orienta-se pelo princípio do livre convencimento, na apreciação da prova, não estando adstrito a qualquer elemento de convicção, senão ao contexto processual como um todo. 6 - Apelação e remessa oficial providos. Pedido improcedente."
(TRF 1ª Região, AC - APELAÇÃO CÍVEL, Processo: 2000340000119265, Órgão Julgador: Primeira Turma, Rel. Itelmar Raydan Evangelista (conv.), Data da decisão: 24/08/2004, DJ DATA: 27/09/2004) (grifos nossos)

Desta forma, entendo deva ser reformada a r. sentença para o fim de rejeitar a pretensão dos autores, considerando não ter restado comprovado que os serviços por eles prestados em áreas de risco possuem o caráter de permanência e habitualidade. Por conseqüência, condeno o autor ao pagamento das custas e honorários advocatícios, fixando-os em R$ 8.000,00 (oito mil reais), com fulcro no artigo 20, §4º do Código de Processo Civil, vez que o caso concreto se enquadra nas causas em que não houve condenação.

Diante do exposto, dou provimento ao recurso de apelação da União Federal e ao reexame necessário, nos moldes do artigo 557, §1º-A, do Código de Processo Civil e nos termos da fundamentação supra."


De se dizer, ainda, que, ao contrário do quanto alegado pelo ora agravante, quando do julgamento do recurso de apelação, o i. julgador não levou em consideração o seu conhecimento pessoal, mas sim (i) as disposições contidas na legislação atinente aos auditores fiscais (Medida Provisória n.º 1971 de 11 de janeiro de 2000) - as quais discriminam as diversas atribuições dos Auditores Fiscais da Receita Federal lotados na Delegacia Federal de Santos - e (ii) os entendimentos jurisprudenciais proferidos a respeito da matéria.


Ressalto, também, que o laudo pericial foi devidamente considerado quando do julgamento do recurso de apelação, sendo que os elementos ali contidos serviram, inclusive, de base para a fundamentação adotada na decisão monocrática ora agravada. Contudo, não obstante a existência de perícia - a qual, inclusive, constatou a ausência de periculosidade nos laboratórios onde os auditores exercem as suas funções administrativas - entendo que o Juízo não está adstrito apenas a essa prova, mas também ao contexto processual como um todo, devendo ser orientado pelo princípio do livre convencimento.


Por fim, afasto a pretensão de realização de nova perícia, vez que, nos moldes do artigo 437 do CPC, a mesma só poderia ser determinada caso a matéria não estivesse suficientemente esclarecida, o que não é o caso dos autos. Ademais, cabe exclusivamente ao juiz avaliar a necessidade da realização de nova perícia (STJ- 3ª T., Resp 1.070.772, Min. Nancy Andrighi, j. 22.6.10, DJ 3.8.10), não cabendo a parte, em grau de recurso, formular requerimento nesse sentido.



Ante o exposto, voto por negar provimento ao agravo legal.



COTRIM GUIMARÃES
Desembargador Federal


Documento eletrônico assinado digitalmente conforme MP nº 2.200-2/2001 de 24/08/2001, que instituiu a Infra-estrutura de Chaves Públicas Brasileira - ICP-Brasil, por:
Signatário (a): LUIS PAULO COTRIM GUIMARAES:10056
Nº de Série do Certificado: 7476B97B119CBD13
Data e Hora: 06/02/2013 16:47:41