Diário Eletrônico

PODER JUDICIÁRIO

TRIBUNAL REGIONAL FEDERAL DA 3ª REGIÃO

D.E.

Publicado em 10/09/2013
APELAÇÃO CRIMINAL Nº 0001938-44.2005.4.03.6108/SP
2005.61.08.001938-8/SP
RELATOR : Desembargador Federal JOSÉ LUNARDELLI
APELANTE : CIRINEU FEDRIZ
ADVOGADO : CIRINEU FEDRIZ
APELADO : Justica Publica
EXCLUIDO : LUIZ CARLOS BARBOSA JUNIOR
No. ORIG. : 00019384420054036108 3 Vr BAURU/SP

EMENTA

PENAL. APELAÇÃO CRIMINAL. RÁDIO PIRATA SEM AUTORIZAÇÃO DA ANATEL. INCIDÊNCIA NO ARTIGO 183 DA LEI 9.472/97. ARTIGO 70 DA LEI 4.117/92 NÃO REVOGADO, MAS INAPLICÁVEL AO CASO. PRINCÍPIO DA INSIGNIFICÂNCIA. INAPLICABILIDADE. OFENSA AO PRINCÍPIO DA AMPLA DEFESA EM RAZÃO DA NOVA CLASSIFICAÇÃO DO DELITO. INOCORRÊNCIA. ILEGITIMIDADE DE PARTE. INOCORRÊNCIA. MATERIALIDADE E AUTORIA COMPROVADAS. DOLO CONFIGURADO. DOSIMETRIA. DE OFÍCIO, PENA DE MULTA REDUZIDA PARA 13 (TREZE) DIAS-MULTA E PRESTAÇÃO PECUNIÁRIA DESTINADA À UNIÃO FEDERAL. APELAÇÃO DESPROVIDA.
1. O acusado operava a Rádio Mais FM, em 89,7 MHz. Desenvolvia clandestinamente atividade de telecomunicação sem a devida licença concedida pelo órgão competente (ANATEL).
2. Enquanto o delito do art. 70 da lei nº 4.117/62 incrimina o desenvolvimento de telecomunicação, inclusive de rádio comunitária, em desacordo com os regulamentos, embora com a devida autorização para funcionar, o delito insculpido no artigo 183 da Lei nº 9.472/97 tipifica a operação clandestina de tal atividade, ou seja, sem a devida autorização, como no caso dos autos.
3. Inaplicável o princípio da insignificância à espécie, tendo em vista que o crime previsto no artigo 183 da Lei nº 9.472/97 é formal e de perigo abstrato, isto é, se consuma independentemente de causar danos.
4. Não há que se falar em prejuízo à defesa do réu, tendo em vista que ele se defende dos fatos alegados, e não da capitulação constante da denúncia. Ademais, foram devidamente respeitados os limites fixados no artigo 383 do Código de Processo Penal.
5. Afastada a alegação de ilegitimidade de parte, pois o próprio acusado declarou, quando de seu interrogatório, que os fatos descritos na denúncia são verdadeiros.
6. A materialidade delitiva do crime previsto no artigo 183 da Lei 9.472/97, em razão de ter o réu desenvolvido atividade de telecomunicação sem a devida licença da ANATEL, foi demonstrada através do auto de prisão em flagrante delito, dos autos de apresentação e apreensão, pareceres técnicos, relatório fotográfico, relatórios técnicos, autos de infração e termos de apresentação da ANATEL.
7. Afastada a alegação de desconhecimento da legislação específica, tendo em vista que restou demonstrado que o réu sabia da necessidade de autorização do Ministério das Comunicações para o funcionamento da rádio comunitária.
8. A autoria restou inconteste. A prova coligida aos autos a demonstra.
9. A pena-base foi mantida em 03 (três) anos de detenção, nos termos do artigo 59 do CP, considerando a intensa culpabilidade do réu, tendo em vista que já havia sido preso em flagrante quatro vezes, pelo cometimento do mesmo delito.
10. Presente a atenuante prevista no artigo 65, III, 'd' do CP, a pena foi diminuída para 02 (dois) anos e 09 (nove) meses de detenção.
11. Não restou configurada a atenuante prevista no artigo 65, III, 'a', do CP, pois não foi comprovado nos autos que o réu cometeu o delito em razão de relevante valor social.
12. Ausentes agravantes bem com causas de diminuição ou de aumento, a pena restou definitiva em 02 (dois) anos e 09 (nove) meses de detenção.
13. Mantida a substituição da pena privativa de liberdade por 01 (uma) pena pecuniária, no valor de 02 (dois) salários mínimos.
14. Mantido o regime inicial aberto, nos termos do art. 33 do CP.
15. Quanto à pena de multa, não foi aplicada aquela estabelecida na lei 9.472/97, por violar o princípio da individualização da pena. Tal se embasa na Arguição de Inconstitucionalidade Criminal nº 00054555-18.2000.4.03.6113, em que o Órgão Especial desta Corte, em Sessão de Julgamento realizada em 29 de junho de 2011, declarou a inconstitucionalidade da expressão "de R$ 10.000,00".
16. Em obediência à proporcionalidade que a pena de multa deve guardar com a pena privativa de liberdade foi fixada em 13 (treze) dias-multa, no valor unitário de 1/30 (um trigésimo) do salário mínimo, tendo em vista que o réu declarou receber R$ 500,00 (quinhentos reais) por mês, conforme consta do boletim de vida pregressa (fls. 19/20).
17. A prestação pecuniária foi destinada, de ofício, à União Federal, conforme entendimento desta Turma.
18. Preliminar de nulidade por ilegitimidade de parte rejeitada. Apelação desprovida. De ofício, pena de multa fixada em 13 (treze) dias-multa, no valor unitário de 1/30 do salário mínimo, e prestação pecuniária destinada à União Federal.


ACÓRDÃO

Vistos e relatados estes autos em que são partes as acima indicadas, decide a Egrégia Primeira Turma do Tribunal Regional Federal da 3ª Região, por unanimidade, rejeitar a preliminar de ilegitimidade de parte, negar provimento à apelação e, de ofício, fixar a pena de multa em 13 (treze) dias-multa, no valor unitário de 1/30 do salário mínimo, e destinar a prestação pecuniária à União Federal, nos termos do relatório e voto que ficam fazendo parte integrante do presente julgado.


São Paulo, 03 de setembro de 2013.
JOSÉ LUNARDELLI
Desembargador Federal


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APELAÇÃO CRIMINAL Nº 0001938-44.2005.4.03.6108/SP
2005.61.08.001938-8/SP
RELATOR : Desembargador Federal JOSÉ LUNARDELLI
APELANTE : CIRINEU FEDRIZ
ADVOGADO : CIRINEU FEDRIZ
APELADO : Justica Publica
EXCLUIDO : LUIZ CARLOS BARBOSA JUNIOR
No. ORIG. : 00019384420054036108 3 Vr BAURU/SP

RELATÓRIO

O EXCELENTÍSSIMO SENHOR DESEMBARGADOR FEDERAL JOSÉ LUNARDELLI:


O Ministério Público Federal denunciou Cirineu Fedriz como incurso nas penas do art. 70 da Lei nº 4.117/62, c.c o art. 71 do Código Penal e requisitou certidões de antecedentes criminais em relação a Luiz Carlos Barbosa Júnior, bem como a designação de audiência para oferta de transação penal, nos termos da Lei nº 9.099/95.

Narra a denúncia que (fls. 435/438):


"01. Aos 29 de março de 2005, agentes da Polícia Federal de Bauru, em cumprimento ao mandado de busca e apreensão nº 35/2005-SC03 (fl. 25), surpreenderam LUIZ CARLOS BARBOSA JÚNIOR operando, na Rua Luciene Avalone, 5-17, Parque Jaraguá, Bauru/SP, a rádio de propriedade de CIRINEU FEDRIZ, denominada "Canal Mais FM"
02. CIRINEU, que já havia sido fiscalizado anteriormente, pela ANATEL e preso em flagrante quatro vezes, respondendo a processos crime e inquéritos policiais, pelo mesmo crime - informação à fl. 43 (2a Vara Federal Bauru: 2002.61.08.009287-0, 2003.61.08.006529-8 e 2004.61.08.000057-0/-1 3a Vara Federal Bauru: 2004.61.08.003895-0, 2004.61.08.007846-7 e 2004.61.08.010286-0), foi chamado na oportunidade e compareceu ao local, logo após a abordagem policial, sendo preso em flagrante delito - Auto de fls. 02/06, mas livrou-se solto, mediante pagamento de fiança, no valor de R$ 380,00 - fls. 23/24.
03. A busca e apreensão, judicialmente autorizada, tinha também como objeto o endereço residencial de CIRINEU - Avenida Gabriel Rabelo de Andrade, nº 7-44, onde também foram encontrados equipamentos típicos para utilização em funcionamento de rádiodifusão. Assim, foram lavrados dois autos de apresentação e apreensão. Um relativo aos equipamentos apreendidos no endereço onde uma rádio efetivamente funcionava e, outro, referente ao encontrado na residência do denunciado (fls. 07/08 e 09/10, respectivamente).
04. Na data da apreensão, faziam-se presentes os agentes da ANATEL Waldemar Cordiolli e Edson de Oliveira Souza, que confirmaram a materialidade delitiva, fls. 26/32, constatando que a rádio operava na frequência 89,7 Mhz. O respectivo laudo técnico atestando a materialidade do delito se encontra acostado às fls. 410/418.
05. Mas não é só, pois no dia 07 de abril de 2005, representa a Autoridade Policial (fls. 42/44) pela decretação da quebra da fiança e expedição de mandado de prisão (art. 341, CPP) contra CIRINEU, bem como busca e apreensão em seu endereço residencial, pois ele novamente colocava em funcionamento a clandestina rádio, conforme se comprovou com 02 (duas) fitas magnéticas, com gravação da programação da rádio, no dia 05 de abril de 2005 (fls. 39/41).
06. Após manifestação do Ministério Público Federal (fls. 47/49) e do defensor de CIRINEU (fls. 52/60), determinou esse r. Juízo (fl. 68) , aos 13 de maio de 2005, que a Autoridade Policial procedesse nova constatação da prática clandestina de radiodifusão, o que foi atendido à fl. 71, com nova juntada de gravação de uma parte da programação da rádio, agora do dia 01 de junho de 2005, o que redundou nas decisões de fls. 100/101 e 107/110, vazadas aos 25 de julho de 2005 e 02 de agosto de 2005, respectivamente, que decretaram a quebra da fiança, expedição de mandado de prisão (fl. 103), bem como expedição de outro mandado de busca e apreensão (nº 96/200S-SC03 - fl. 112).
Cumprida a busca e apreensão, aos 05 de agosto de 2005, CIRINEU foi novamente surpreendido, na Av. Gabriel Rabelo de Andrade, nº 7-44 (fl. 120), praticando atividades de radiodifusão sem a devida autorização da ANATEL, oportunidade em que, no imóvel da Rua Luciene Avalone, 5-19, também objeto da busca, encontrou-se alguns materiais da rádio, como quadro de avisos e fotografias, além de uma antena transmissora previamente instalada, mas que não estava em funcionamento (fl. 119). Como resultado, lavrou-se Auto de Apreensão de equipamentos e Termo Circunstanciado nº 7-0004/2005 (fls. 116/143), apensado a este feito, com toda a sequência do atos no dia da apreensão. (sic)
08. No mesmo dia 05 de agosto de 2005, cumpriu-se ainda busca e apreensão no imóvel da Rua José Gimenez Campanha, 4-78, oportunidade em que foi localizada outra antena com aparelhos periféricos, ainda em funcionamento, mas até identificar-se a proprietária e esta autorizar a entrada na casa, alguns objetos foram retirados (fls. 121/123). No ato estava presente Manoel José Alvarez, que freqüentava a casa de CIRINEU, mas não atuava na execução da radiodifusão clandestina (fl. 09 dos autos n.º 2005.61.08.007575-6, apensado).
09. Três dias após, a rádio voltou a operar na mesma freqüência, tendo então sido deferida, judicialmente, nova busca e apreensão, em atendimento à representação da autoridade policial, nos mesmos endereços e ainda na Rua Mariano Hernandez, nº 2-11, Parque Roosevelt (fls. 145/149), pelos motivos de novamente reiterar na prática de radiodifusão clandestina. Cumprido mais este mandado de busca e apreensão (n.º 102/2005-SC03), aos 11 de agosto de 2005, arrecadou-se outros equipamentos de radiodifusão (fls. 170/173), nas Ruas José Gimenez Campanha, nº 4-78 e Luciene Avalone, 5-19 e, a ANATEL elaborou o competente parecer técnico, fls. 261/277, atestando novamente a materialidade delitiva. E, conforme se observa nas declarações e documentos juntados às fls. 289/408, o fim comercial preponderava no funcionamento da rádio.
10. Em que pese este panorama fático e mesmo com a discordância do Ministério Público Federal (fl. 164), foi revogada, aos 16 de agosto de 2005, a prisão de CIRINEU, pela decisão de fls. 181/183. Aliás, em segunda instância foi negada liminar em Habeas Corpus (HC 2422 - Proc. 2005.03.00.063993-6 - 1ª Turma TRF 3a R. - fls. 209/222 e 226/238), onde se propugnava pela revogação da prisão de CIRINEU.
11. Posto isto, é oferecida a presente DENÚNCIA, dando os denunciados como incursos nas penas do art. art. 70 da Lei nº 4.117/62, com a majorante do art. 71 do Código Penal, relativamente a CIRINEU FEDRIZ, requerendo que, em relação a ele (CIRINEU), seja instaurada a necessária ação penal, com citação e intimação para interrogatório e demais atos processuais, até final julgamento, já que, ante tudo o aqui relatado, não atende aos requisitos subjetivos para fazer jus ao oferecimento de proposta de transação penal.
Outrossim, considerando a pena máxima em abstrato, privativa de liberdade, prevista para a conduta delituosa em comento não ultrapassa dois anos, requer-se não seja recebida, por ora, a presente denúncia, em relação a LUIZ CARLOS BARBOSA JÚNIOR, requisitando-se apenas as certidões de antecedentes aos órgãos de praxe (IIRGD, INI, DIPO 2.3 e Justiça Federal), bem como designada audiência para oferta de proposta de transação penal - art. 2º, par. único da Lei nº10.259/2001 e arts. 61 e 76 da Lei nº 9099/95."

A denúncia foi recebida em 28/04/2008, apenas em relação a Cirineu Fedriz (fl. 503).

Após regular instrução, foi proferida sentença (fls. 618/625) que condenou o acusado Cirineu Fedriz à pena de 02 (dois) anos e 09 (nove meses) de detenção e ao pagamento de multa no valor de R$ 10.0000,00 (dez mil reais), por infração ao artigo 183, da Lei 9.472/97.

A pena privativa de liberdade foi substituída por uma pena restritiva de direitos, consistente no pagamento de 02 (dois) salários mínimos, através de depósito em Juízo, em duas parcelas, equivalentes cada uma delas a um salário mínimo vigente ao tempo dos recolhimentos, os quais serão destinados a entidade pública ou privada, com finalidade social, a ser identificada pelo Juízo da Execução Penal.

O acusado Cirineu Fedriz apelou (fls. 649/653), pleiteando a sua absolvição, alegando:

1) que a elementar telecomunicação não pode englobar a radiodifusão;

2) que a prova carreada aos autos demonstra que a emissora era organizada e mantida pela própria comunidade, possuindo baixa freqüência e finalidade estritamente social e de interesse de toda a comunidade;

3) ausência de dolo e de potencialidade lesiva.

Contrarrazões do Ministério Público Federal, às fls. 655/664, pelo desprovimento do recurso.

Parecer da Procuradoria Regional da República em prol de ser desprovido o recurso (fls. 667/669).

Às fls. 683 foi proferido acórdão que, por unanimidade, anulou, de ofício, a sentença recorrida, a fim de que fosse sanada a omissão consistente na não fixação do regime de pena.

Foi proferida nova sentença, às fls. 691/698, que condenou Cirineu Fedriz à pena de 02 (dois) anos e 09 (nove meses) de detenção, em regime inicial aberto, e ao pagamento de multa no valor de R$ 10.0000,00 (dez mil reais), por infração ao artigo 183, da Lei 9.472/97.

A pena privativa de liberdade foi substituída por uma pena restritiva de direitos, consistente no pagamento de 02 (dois) salários mínimos, através de depósito em Juízo, em duas parcelas, equivalentes cada uma delas a um salário mínimo vigente ao tempo dos recolhimentos, os quais serão destinados a entidade pública ou privada, com finalidade social, a ser identificada pelo Juízo da Execução Penal.

O réu Cirineu Fedriz apelou (fls. 703/749), alegando, em síntese, atipicidade da conduta, eis que a atividade por ele desenvolvida é a de radiodifusão, e não de telecomunicações, sendo a Lei nº 9.472/97, portanto, inaplicável ao caso. Alternativamente, pediu a aplicação do princípio da insignificância, alegando que a rádio operava em baixa potência, não causando danos a terceiros. Em caso de entendimento diverso, pediu que fosse aplicado o artigo 70 da Lei 4.117/62, com suas atenuantes, sustentando, ainda, que:

1) o Juiz não poderia ter dado nova classificação ao crime imputado, pois causou prejuízo à defesa do réu;

2) os artigos que tipificam a conduta de radiodifusão clandestina (artigo 70 da Lei 4.117/62 e artigo 183 da Lei 9.472/97) foram, ambos, derrogados pelo advento da Lei 9.612/98 (Lei das Rádios Comunitárias), que discriminalizou as infrações relativas ao Serviço de Radiodifusão Comunitária;

Pediu, ainda, a nulidade do processo por ilegitimidade de parte, alegando que a Associação de Ação e Participação Comunitária do Parque Jaraguá é a verdadeira proprietária da rádio em questão;

Em caso de entendimento diverso, requer a aplicação da excludente de ilicitude com base no fato de que exerceu a atividade com respaldo comunitário ou o reconhecimento das atenuantes previstas nos artigos 65, II, e III, 'a' do CP.

Caso mantida a condenação, requer a aplicação da pena no mínimo legal.

Contrarrazões do Ministério Público Federal, às fls. 767/784.

Às fls. 796, o Ministério Público Federal manifestou-se no sentido de reiterar o parecer de fls. 667/669 e incorporar como seu fundamento aditivo as contrarrazões de fls. 767/784.

É o relatório.

Dispensada a revisão, na forma regimental.



JOSÉ LUNARDELLI
Desembargador Federal


Documento eletrônico assinado digitalmente conforme MP nº 2.200-2/2001 de 24/08/2001, que instituiu a Infra-estrutura de Chaves Públicas Brasileira - ICP-Brasil, por:
Signatário (a): JOSE MARCOS LUNARDELLI:10064
Nº de Série do Certificado: 337FE89C4195D7A1
Data e Hora: 19/06/2013 11:58:11



APELAÇÃO CRIMINAL Nº 0001938-44.2005.4.03.6108/SP
2005.61.08.001938-8/SP
RELATOR : Desembargador Federal JOSÉ LUNARDELLI
APELANTE : CIRINEU FEDRIZ
ADVOGADO : CIRINEU FEDRIZ
APELADO : Justica Publica
EXCLUIDO : LUIZ CARLOS BARBOSA JUNIOR
No. ORIG. : 00019384420054036108 3 Vr BAURU/SP

VOTO

O EXCELENTÍSSIMO SENHOR DESEMBARGADOR FEDERAL JOSÉ LUNARDELLI:


O recurso não comporta provimento.


1. Da tipificação.


No caso dos autos, a conduta delitiva imputada ao apelante subsume-se ao artigo 183 da Lei nº 9.472/97, conforme adequadamente capitulado na sentença recorrida.

A conduta típica descrita no artigo 70 da Lei nº 4.117/62, com redação mantida pelo Decreto-lei nº 236 de 28/02/1967, não se encontra revogada. Consiste na instalação ou utilização de telecomunicações, sem observância do disposto em lei e nos regulamentos, apenada com detenção de 1 (um) a 2 (dois) anos, aumentada da metade se houver dano a terceiro.

Conforme se depreende do aresto colacionado, o artigo 70 da Lei nº 4.117/62 continua vigente:


PENAL E PROCESSO PENAL. AGRAVO REGIMENTAL NO RECURSO ESPECIAL. (1) NEGATIVA DE VIGÊNCIA AO ART. 70 DA LEI 4.117/62. RÁDIO COMUNITÁRIA. AUSÊNCIA DE AUTORIZAÇÃO. HABITUALIDADE NA INSTALAÇÃO OU UTILIZAÇÃO CLANDESTINA DE TELECOMUNICAÇÕES. INCIDÊNCIA DO ART. 183 DA LEI 9.472/97. ACÓRDÃO EM CONFORMIDADE COM A JURISPRUDÊNCIA DESTA CORTE. SÚMULA 83/STJ. (2) PRINCÍPIO DA INSIGNIFICÂNCIA. PRECEDENTE DO PRETÓRIO EXCELSO. APLICABILIDADE. NÃO RECONHECIMENTO.
1. Encontra-se vigente o artigo 70 da Lei 4.117/62, contudo o fato narrado na inicial, responsabilidade pelo funcionamento clandestino de uma emissora, denominada Rádio Comunitária Fortes, não se subsume a este primeiro artigo, mas sim ao artigo 183 da Lei 9.472/97, haja vista a clandestinidade e a habitualidade da conduta.
2. Não há falar em incidência do princípio da insignificância, tendo em vista a ausência de demonstração de ínfima lesão ao bem jurídico, não se aplicando precedente o Pretório Excelso que contemplo hipótese flagrantemente distinta.
3. Agravo regimental a que se nega provimento.
(AgRg no REsp 1113795/SP, Rel. Ministra MARIA THEREZA DE ASSIS MOURA, SEXTA TURMA, julgado em 02/08/2012, DJe 13/08/2012)

Mas o delito do artigo 183 da Lei nº 9.472/97, por sua vez, consiste em desenvolver clandestinamente atividades de telecomunicação, ao que é cominada a pena de detenção de dois a quatro anos, aumentada da metade se houver dano a terceiro.

Conforme previsão constitucional, a radiodifusão sonora, de sons e imagens são serviços explorados diretamente pela União, ou mediante concessão, permissão ou autorização do Poder Executivo (artigo 21, inciso XII, alínea "a", com redação dada pela Emenda nº 8, de 15/08/95, e do artigo 223, ambos da Constituição Federal).

Permanece assente o entendimento de que a radiodifusão é espécie do gênero telecomunicações. Todavia, necessita de prévia autorização da ANATEL para funcionamento.

O tipo penal definido no artigo 183, da Lei nº 9.472/97 reafirmou a ilicitude da atividade de radiodifusão clandestina, sendo até então prevista no artigo 70 da Lei n° 4.117/62 a utilização de telecomunicação sem observância do disposto em lei e nos regulamentos.

Desse modo o delito da lei nº 4.117/62 incrimina o desenvolvimento de telecomunicação, inclusive de rádio comunitária, em desacordo com os regulamentos, embora com a devida autorização para funcionar, ao passo que o delito previsto no artigo 183 da Lei nº 9.472/97 tipifica a operação clandestina de tal atividade, ou seja, sem a devida autorização, como no caso dos autos, em que acusado mantinha em funcionamento emissora clandestina de Rádio FM (Rádio Comunitária Mais FM 89,7 MHz), sem autorização da ANATEL.

Os julgados do Superior Tribunal de Justiça corroboram este entendimento:


PENAL E PROCESSO PENAL. AGRAVO REGIMENTAL NO RECURSO ESPECIAL. PRINCÍPIO DA COLEGIALIDADE. ART. 557, CAPUT, DO CPC. RECURSO MANIFESTAMENTE INADMISSÍVEL E IMPROCEDENTE. OFENSA AO ART. 619 DO CPP. AUSÊNCIA DE OMISSÃO, CONTRADIÇÃO OU OBSCURIDADE NO ACÓRDÃO EMBARGADO. EFEITO INFRINGENTE. INVIABILIDADE. NEGATIVA DE VIGÊNCIA AO ART. 70 DA LEI 4.117/62. DIVERGÊNCIA JURISPRUDENCIAL. NÃO OCORRÊNCIA. RÁDIO COMUNITÁRIA. AUSÊNCIA DE AUTORIZAÇÃO. HABITUALIDADE NA INSTALAÇÃO OU UTILIZAÇÃO CLANDESTINA DE TELECOMUNICAÇÕES. INCIDÊNCIA DO ART. 183 DA LEI 9.472/97. ACÓRDÃO EM CONFORMIDADE COM A JURISPRUDÊNCIA DESTA CORTE. SÚMULA 83/STJ. AGRAVO REGIMENTAL A QUE SE NEGA PROVIMENTO.
1. Não há se falar em ofensa ao princípio da colegialidade, quando a decisão monocrática é proferida em obediência ao artigo 557 do Código de Processo Civil, que franqueia ao relator a possibilidade de negar seguimento ao recurso, quando manifestamente inadmissível e improcedente.
2. Não está o magistrado obrigado a responder à totalidade das dúvidas suscitadas pelo embargante, quando for possível inferir das conclusões da decisão embargada a inviabilidade do seu acolhimento.
Dessarte, não há se falar, nessas hipóteses, em violação ao artigo 619 do Código de Processo Penal.
3. Encontra-se vigente o artigo 70 da Lei 4.117/62, contudo o fato narrado na inicial, responsabilidade pelo funcionamento clandestino de uma emissora, denominada Rádio Vitória de Salvador, não se subsume a este primeiro artigo, mas sim ao artigo 183 da Lei 9.472/97, haja vista a clandestinidade e a habitualidade da conduta.
4. Agravo regimental a que se nega provimento.
(AgRg no REsp 1103166/BA, Rel. Ministra MARIA THEREZA DE ASSIS MOURA, SEXTA TURMA, julgado em 16/08/2011, DJe 29/08/2011)

CONFLITO DE COMPETÊNCIA ENTRE JUIZADO ESPECIAL FEDERAL E VARA FEDERAL. PROCESSUAL PENAL. ESTAÇÃO DE RÁDIO CLANDESTINA. CONDUTA QUE SE SUBSUME NO TIPO PREVISTO NO ART. 183 DA LEI 9.472/97 E NÃO AO ART. 70 DA LEI 4.117/62. COMPETÊNCIA DA JUSTIÇA FEDERAL COMUM. PARECER DO MPF PELA COMPETÊNCIA DO JUÍZO FEDERAL COMUM. CONFLITO CONHECIDO PARA DECLARAR COMPETENTE O JUÍZO FEDERAL DA 2A. VARA DE PELOTAS - SJ/RS, ORA SUSCITADO.
1. A prática de atividade de telecomunicação sem a devida autorização dos órgãos públicos competentes subsume-se no tipo previsto no art. 183 da Lei 9.472/97; divergindo da conduta descrita no art. 70 da Lei 4.117/62, em que se pune aquele que, previamente autorizado, exerce a atividade de telecomunicação de forma contrária aos preceitos legais e aos regulamentos. Precedentes do STJ.
2. Conflito conhecido para declarar competente o Juízo Federal da 2a. Vara de Pelotas - SJ/RS, ora suscitado, em conformidade com o parecer ministerial.
(CC 101.468/RS, Rel. Ministro NAPOLEÃO NUNES MAIA FILHO, TERCEIRA SEÇÃO, julgado em 26/08/2009, DJe 10/09/2009)

CONFLITO DE COMPETÊNCIA. PENAL E PROCESSUAL CRIMINAL. ESTAÇÃO DE RADIODIFUSÃO CLANDESTINA. CAPITULAÇÃO. ART. 70 DA LEI 4.117/62 OU ART. 183 DA LEI 9.472/97. JUIZADO ESPECIAL E VARA FEDERAL. NÃO CONFIGURAÇÃO DE CRIME DE MENOR POTENCIAL OFENSIVO. COMPETÊNCIA DO JUÍZO DA VARA FEDERAL CRIMINAL.
1. O art. 70 da Lei 4.117/62 não foi revogado pelo art. 183 da Lei 9.472/97, já que as condutas neles descritas são diversas, sendo que no primeiro pune-se o agente que, apesar de autorizado anteriormente pelo órgão competente, age de forma contrária aos preceitos legais e regulamentos que regem a matéria, e no segundo, aquele que desenvolve atividades de telecomunicações de forma clandestina, ou seja, sem autorização prévia do Poder Público.
2. In casu, verifica-se que o indiciado, em tese, explorou serviço de telecomunicação sem autorização, ou seja, de forma clandestina, subsumindo-se o modo de agir ao tipo descrito no art. 183 da Lei nº 9.472/97, cuja pena máxima cominada é superior a 2 (dois) anos, não se configurando, assim, em delito de menor potencial ofensivo.
3. Conflito conhecido para declarar-se competente o Juízo Federal da 2ª Vara da Seção Judiciária do Estado do Tocantins, o suscitado.
(CC 200800550921, JORGE MUSSI, STJ - TERCEIRA SEÇÃO, DJE DATA:18/12/2008 RJP VOL.:00026 PG:00120.)

Na mesma linha jurisprudência desta Primeira Turma:


PENAL. RECURSO EM SENTIDO ESTRITO. ARTIGO 183 DA LEI 9.472/97. RADIO CLANDESTINA. ARTIGO 70 DA LEI 4.117/92. SUCESSIVIDADE DE LEIS NO TEMPO. INDÍCIOS DE AUTORIA E PROVA DA MATERIALIADE. RECEBIMENTO DA DENÚNCIA. RECURSO PROVIDO. Os recorridos foram denunciados pela suposta prática do crime tipificado no artigo 183, caput, da Lei nº 9.472/97 c.c artigo 29 do Código Penal. A MMª. Juíza a quo antes de receber a denúncia, alterou a capitulação jurídica do crime narrado na peça acusatória, por entender que a conduta descrita se subsumia ao delito previsto no artigo 70 da Lei nº 4.117/62. Remessa dos autos ao Ministério Público Federal para se manifestar sobre eventual proposta de transação penal prevista no artigo 76 da Lei nº 9.099/95. O caso dos autos se amolda à hipótese prevista no inciso I do artigo 581 do Código de Processo Penal. A decisão que dá nova capitulação jurídica à conduta criminosa descrita na exordial equivale à rejeição da denúncia. Precedentes desta Turma. A radiodifusão sonora, de sons e imagens são serviços explorados diretamente pela União, ou mediante concessão, permissão ou autorização do Poder Executivo, nos exatos termos do artigo 21, inciso XII, alínea "a", (cuja redação foi dada pela Emenda nº 8, de 15/08/95), e do artigo 223, ambos, da Constituição Federal. A Emenda Constitucional nº 8/95 tão somente regulamentou os serviços de telecomunicações (inciso XI) e os de radiodifusão (inciso XII) de forma separada, fato que não autoriza afirmar que se trata de institutos diversos. Radiodifusão é espécie do gênero telecomunicações. A matéria controvertida é hipótese de sucessão de leis no tempo. O tipo penal definido no artigo 183, da Lei nº 9.472/97, recepcionado pela Constituição Federal, reafirmou a ilicitude da atividade de radiodifusão clandestina, que anteriormente era prevista no artigo 70 da Lei n° 4.117/62. Precedentes desta Primeira Turma. Narra a peça acusatória que a suposta conduta criminosa ocorreu no período de setembro de 2003 a agosto de 2007, época em que vigia a Lei nº 9.472/97. Os acusados foram corretamente denunciados como incursos nas sanções do artigo 183 da referida lei. Há nos autos indícios suficientes da autoria e prova da materialidade. Recebimento da denúncia é de rigor. Recurso em sentido estrito a que se dá provimento. Remessa dos autos à primeira instância para o regular processamento do feito, nos termos do artigo 396 e seguintes do Código de Processo Penal.
(RSE 00063605520074036120, DESEMBARGADORA FEDERAL VESNA KOLMAR, TRF3 - PRIMEIRA TURMA, TRF3 CJ1 DATA:10/01/2012.)

2. Do princípio da insignificância.


Inaplicável o princípio da insignificância à espécie, tendo em vista que o crime previsto no artigo 183 da Lei nº 9.472/97 é formal e de perigo abstrato, isto é, se consuma independentemente de causar danos.


Nesse sentido, transcrevo o seguinte julgado deste Tribunal:


"PENAL. TELECOMUNICAÇÕES. LEI N. 4.117/1962. RÁDIO CLANDESTINA. LEI N. 9.472/1997. RADIODIFUSÃO COMUNITÁRIA. LEI N. 9.612/1998. PRINCÍPIO DA INSIGNIFICÂNCIA. INAPLICABILIDADE. RECURSO DE APELAÇÃO. IMPROVIMENTO.
(...) 7. Os crimes em referência são de perigo abstrato, cujo bem jurídico tutelado é a segurança dos meios de comunicação, por isso que a instalação e utilização de aparelhagem em desacordo com as exigências legais, ou de forma clandestina, sem a observância de requisitos técnicos (casamento de impedância entre transmissor e sistema irradiante etc.), podem causar sérias interferências prejudicias em serviços de telecomunicações regularmente instalados (polícia, ambulâncias, bombeiros, aeroportos, embarcações, bem como receptores domésticos - TVs e rádios - adjacentes à emissora), pelo aparecimento de freqüências espúrias.
8. Recurso de apelação provido.
(TRF 1ª Região, ACR 200333000060845/BA, 4ª T., DJ 16/06/2008)"

3. Da suposta ofensa ao princípio da ampla defesa em razão da nova classificação dada ao crime.


Não há que se falar em prejuízo à defesa do réu, tendo em vista que ele se defende dos fatos alegados, e não da capitulação constante da denúncia. Por outro lado, foram devidamente respeitados os limites fixados no artigo 383 do Código de Processo Penal.


4. Da alegação de ilegitimidade de parte.


Tal alegação também deve ser afastada, pois o próprio acusado declarou, quando de seu interrogatório, que "(...) os fatos descritos na denúncia são verdadeiros" e que "(...) estava à frente da rádio Canal Mais FM".


5. Da materialidade.


A materialidade delitiva do crime previsto no artigo 183 da Lei 9.472/97, em razão de ter o réu desenvolvido atividade de telecomunicação sem a devida licença da ANATEL, vem demonstrada através do auto de prisão em flagrante delito (fls. 02/06), autos de apresentação e apreensão (fls. 07/10, 127/143), pareceres técnicos da ANATEL (fls. 261/262 e 270/271), relatório fotográfico da ANATEL (fls. 263), relatórios técnicos da ANATEL (fls. 264 e 272), Autos de infração da ANATEL - entidade não outorgada (fls. 265 e 273) e termos de apresentação da ANATEL (fls. 266/267 e 274/275).

A sustentada atipicidade da conduta ante a ausência de potencialidade lesiva não prospera.

Isso porque, conforme o laudo de exame em aparelho eletrônico de fls. 421/423 "qualquer equipamento que opere com transmissão de rádio freqüência é capaz de emitir sinais indesejáveis fora do canal de operação normal, os quais, não sendo devidamente atenuados por filtros elétricos internos ao aparelho, podem causar interferência em outras telecomunicações, inclusive de aeronaves, polícia, bombeiros etc."

Descabe falar, ademais, em irrelevância penal da ausência de licença governamental, pois esta não configura mero requisito formal, restrito às empresas do ramo, mas abrange todas as hipóteses de radiodifusão. Nisso não se viola a garantia constitucional de liberdade de expressão, prevista também no Pacto de San José da Costa Rica, apenas são delimitados os seus contornos com vistas à proteção aos interesses de toda a coletividade. O controle prévio, mediante a outorga de licença de exploração da radiodifusão, também se justifica tendo em vista que a escassez e limitação do espectro de radiofreqüência, o que exige ordenação no seu uso racional.


6. Da autoria. A autoria restou inconteste, pois o réu declarou em Juízo que os fatos narrados na denúncia são verdadeiros. Confira-se, às fls. 531/533:


"Trabalho com publicidade, com gravações musicais, coisas pequenas (...) Os fatos descritos na denúncia são verdadeiros, 'efetivamente, nos dias 29/03, 07/04, 01/07 e 05/08, todos do ano de 2005, eu estava à frente das operações da rádio Canal Mais FM, interrompidas pelas (sic) ação da Polícia Federal. Esclareço, apenas, que no dia 05 de agosto de 2005 eu não estava mais na direção da rádio, em razão das prisões anteriores.' 'Eu sempre estive à frente das atividades da rádio, que eram desenvolvidas pela Associação de Ação e Participação Comunitária do Parque Jaraguá.' 'No dia 05/08, quando da ação da polícia, eu estava em casa, e os equipamentos lá encontrados eram apenas de um estúdio de gravação. Não havia transmissor.' 'A associação fez o pedido de autorização, ao Ministério das Comunicações, mas esse pedido até hoje não foi apreciado. Inclusive conforme documento que ora exibo, não há data para apreciação do pedido de autorização para o funcionamento da rádio.' 'O Ministério das Comunicações fez uma campanha falsa, incentivando a exploração de rádios comunitárias, conforme cartaz que ora exibo.' 'Eu nunca quis afrontar a Justiça, mas a rádio ganhou uma dimensão social importante, na comunidade do Parque Jaraguá, que é muito carente.' 'Há um projeto de Lei - nº 4.459/1998 - atualmente em curso na Câmara dos Deputados, cujo objeto é anistiar os autores de crime como o presente.' 'Nos últimos meses de funcionamento da rádio, houve a venda de espaços comerciais, mas o dinheiro era utilizado apenas em favor da comunidade, para atender pedidos de doações."

Dessa forma, inegável a autoria do acusado.


7. Do dolo.


Não procede a alegação de desconhecimento da legislação específica, tendo em vista que restou demonstrado que o réu sabia da necessidade de autorização do Ministério das Comunicações para o funcionamento da rádio comunitária e que, sem tal autorização, a rádio não poderia funcionar. É o que se depreende do seguinte trecho de seu interrogatório (fls. 533):


"(...) A associação fez o pedido de autorização, ao Ministério das Comunicações, mas esse pedido até hoje não foi apreciado. (...) Eu nunca quis afrontar a Justiça, mas a rádio ganhou uma dimensão social importante, na comunidade do Parque Jaraguá, que é muito carente.' 'Há um projeto de Lei - nº 4.459/1998 - atualmente em curso na Câmara dos Deputados, cujo objeto é anistiar os autores de crime como o presente.(...)"


8. Da dosimetria.


A pena-base deve ser mantida em 03 (três) anos de detenção, nos termos do artigo 59 do CP, considerando a intensa culpabilidade do réu, tendo em vista que já havia sido preso em flagrante quatro vezes, pelo cometimento do mesmo delito.

Presente a atenuante prevista no artigo 65, III, 'd' do CP, a pena foi diminuída para 02 (dois) anos e 09 (nove) meses de detenção.

Não restou configurada a atenuante prevista no artigo 65, III, 'a', do CP. Segundo os ensinamentos de Guilherme de Souza Nucci, in Código Penal Comentado, 9ª edição, Ed. Revista dos Tribunais, pág 430: "relevante valor é um valor importante para a vida em sociedade, tais como patriotismo, lealdade, fidelidade, inviolabilidade de intimidade e de domicílio, entre outros. Quando se tratar de relevante valor social, levam-se em consideração interesses não exclusivamente individuais, mas de ordem geral, coletiva." e não restou comprovado nos autos que o réu tenha cometido o delito em questão em razão de valor social. Aliás, como bem ressaltou o Delegado de Polícia Federal em seu relatório (fls. 426): "(...) foi apurado, de maneira muito superficial, que em um pequeno período de tempo a rádio obteve quase R$ 9.000,00 de receita, o que demonstra a profissionalidade da atividade, explicando também, em parte, o porquê do estranho interesse do preso e (sic) multi-reincidir nesta conduta."

Ausentes agravantes bem com causas de diminuição ou de aumento, a pena restou definitiva em 02 (dois) anos e 09 (nove) meses de detenção.

Mantida a substituição da pena privativa de liberdade por 01 (uma) pena pecuniária, no valor de 02 (dois) salários mínimos.

Mantenho o regime inicial aberto, nos termos do art. 33 do CP.

Quanto à pena de multa, deixo de aplicar aquela estabelecida na lei 9.472/97, por entender que viola o princípio da individualização da pena. Tal se embasa na Arguição de Inconstitucionalidade Criminal nº 00054555-18.2000.4.03.6113, em que o Órgão Especial desta Corte, em Sessão de Julgamento realizada em 29 de junho de 2011, declarou a inconstitucionalidade da expressão "de R$ 10.000,00".

Em obediência à proporcionalidade que a pena de multa deve guardar com a pena privativa de liberdade, passo a fixar aquela trazida no Código Penal, em 10 (dez) dias-multa, elevados para 15 (quinze) dias-multa e reduzidos para 13 (treze) dias-multa, no valor unitário de 1/30 (um trigésimo) do salário mínimo, tendo em vista que o réu declarou receber R$ 500,00 (quinhentos reais) por mês, conforme consta do boletim de vida pregressa (fls. 19/20).


De ofício, destino a prestação pecuniária à União Federal, conforme entendimento desta Turma.

Com tais considerações, rejeito a preliminar de nulidade por ilegitimidade de parte, nego provimento à apelação e, de ofício, reduzo a pena de multa para 13 (treze) dias-multa, no valor unitário de 1/30 (um trigésimo) do salário mínimo, e destino a prestação pecuniária à União Federal.


JOSÉ LUNARDELLI
Desembargador Federal


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