Diário Eletrônico

PODER JUDICIÁRIO

TRIBUNAL REGIONAL FEDERAL DA 3ª REGIÃO

D.E.

Publicado em 16/07/2013
APELAÇÃO/REEXAME NECESSÁRIO Nº 0027114-10.2009.4.03.6100/SP
2009.61.00.027114-0/SP
RELATORA : Desembargadora Federal CECILIA MARCONDES
APELANTE : Uniao Federal (FAZENDA NACIONAL)
ADVOGADO : JULIO CÉSAR CASARI E CLAUDIA AKEMI OWADA
APELADO : DEVIR LIVRARIA LTDA
ADVOGADO : JOSE EDUARDO SILVERINO CAETANO e outro
REMETENTE : JUIZO FEDERAL DA 19 VARA SAO PAULO Sec Jud SP
No. ORIG. : 00271141020094036100 19 Vr SAO PAULO/SP

EMENTA

AÇÃO ORDINÁRIA. APELAÇÃO. IMUNIDADE. ART. 150, VI, d, CF. CARDS. CONCEITO DE LIVRO.
1. Para fins do reconhecimento da imunidade tributária em questão, não se pode determinar livro unicamente a reunião de folhas de papel unidas entre duas capas, ainda mais se for levado em consideração que, nos dias atuais, são incontáveis os recursos tecnológicos disponíveis.
2. O que torna determinado produto imune, com perfeita adequação ao quanto disposto na alínea d do inciso VI do art. 150 da CF, são os fins a que se destina, independentemente da forma sobre a qual se apresenta.
3. A razão de ser da imunidade aqui debatida é difundir a educação, a informação, a cultura e a livre manifestação do pensamento, de modo a permitir amplo acesso aos veículos utilizados, sejam eles escritos, sejam meramente ilustrativos, para esta finalidade.
4. Observa-se, no caso em tela, que os cards YU-GI-OH, importados pela ora apelada (fls. 74/83), complementam o livro Estampas Ilustradas Yu-Gi-Oh, apresentando personagens e outros elementos retirados de histórias de ficção infanto-juvenil por eles veiculadas ("No Egito antigo havia uma força tão poderosa, que teve de ser trancada por um milênio. Agora um garoto libertou o poder! É hora do duelo! - fls. 84/85), razão pela qual não fogem à categoria de livro.
5. Precedentes desta Corte e do E. Supremo Tribunal Federal (RE nº 221239).
6. Apelação e remessa oficial a que se nega provimento.

ACÓRDÃO

Vistos e relatados estes autos em que são partes as acima indicadas, decide a Egrégia Terceira Turma do Tribunal Regional Federal da 3ª Região, por unanimidade, negar provimento à apelação e à remessa oficial, nos termos do relatório e voto que ficam fazendo parte integrante do presente julgado.


São Paulo, 04 de julho de 2013.
CECÍLIA MARCONDES
Desembargadora Federal Relatora


Documento eletrônico assinado digitalmente conforme MP nº 2.200-2/2001 de 24/08/2001, que instituiu a Infra-estrutura de Chaves Públicas Brasileira - ICP-Brasil, por:
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Data e Hora: 04/07/2013 18:14:07



APELAÇÃO/REEXAME NECESSÁRIO Nº 0027114-10.2009.4.03.6100/SP
2009.61.00.027114-0/SP
RELATORA : Desembargadora Federal CECILIA MARCONDES
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REMETENTE : JUIZO FEDERAL DA 19 VARA SAO PAULO Sec Jud SP
No. ORIG. : 00271141020094036100 19 Vr SAO PAULO/SP

RELATÓRIO

Trata-se de apelação e remessa oficial em ação ordinária na qual pretende a autora obter provimento que declare a inexistência de relação jurídico-tributária entre as partes no tocante à importação da mercadoria cards YU-GI-OH, reconhecendo-se a garantia da imunidade constitucional prevista no art. 150, VI, d da Constituição Federal, por inexistir hipótese de incidência tributária que permita a ação do Fisco.

A ação foi proposta em 18/12/09, tendo sido atribuído à causa o valor de R$ 10.000,00.

A União apresentou contestação e juntou documentos às fls. 360/430.

Tendo em vista os depósitos judiciais correspondentes aos tributos devidos, o d. juízo a quo deferiu a liberação das mercadorias importadas objeto da Declaração de Importação (DI) nº 10/0714422-1 (fls. 465, 491/493 e 604/605).

Réplica às fls. 524/534.

A sentença julgou o pedido procedente para reconhecer a imunidade tributária dos cards YU-GI-OH, prevista no art. 150, VI, d da Constituição Federal. Condenou a União ao pagamento de honorários advocatícios fixados em R$ 2.000,00, na forma dos §§ 3º e 4º do art. 20 do CPC.

A autora opôs embargos de declaração, os quais foram rejeitados.

Apelou a União requerendo a reforma da sentença, aos seguintes argumentos: os produtos importados representam cartas para jogo, não se confundindo com livros ou papel destinado à sua impressão, além de não representarem veículo de difusão de cultura ou informação; a imunidade do art. 150, VI, d da CF é objetiva, relacionada a produtos específicos e determinados, alcançando, portanto, somente os produtos na norma referidos.

Com contrarrazões, subiram os autos a esta Corte.

É o relatório.


CECÍLIA MARCONDES
Desembargadora Federal Relatora


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APELAÇÃO/REEXAME NECESSÁRIO Nº 0027114-10.2009.4.03.6100/SP
2009.61.00.027114-0/SP
RELATORA : Desembargadora Federal CECILIA MARCONDES
APELANTE : Uniao Federal (FAZENDA NACIONAL)
ADVOGADO : JULIO CÉSAR CASARI E CLAUDIA AKEMI OWADA
APELADO : DEVIR LIVRARIA LTDA
ADVOGADO : JOSE EDUARDO SILVERINO CAETANO e outro
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No. ORIG. : 00271141020094036100 19 Vr SAO PAULO/SP

VOTO

Trata-se de apelação e remessa oficial em ação ordinária na qual pretende a autora obter provimento que declare a inexistência de relação jurídico-tributária entre as partes no tocante à importação da mercadoria cards YU-GI-OH, reconhecendo-se a garantia da imunidade constitucional prevista no art. 150, VI, d da Constituição Federal, por inexistir hipótese de incidência tributária que permita a ação do Fisco.

Alega a autora, em síntese, ser empresa do ramo editorial, cujo objeto é o comércio, importação e exportação de mercadorias consideradas imunes, nos termos do art. 150, VI, d da Constituição Federal.

Informa ter importado, nos anos de 2003 e 2007, vários cards denominados YU-GI-OH, objeto das Declarações de Importação (DIs) nºs 03/0251375-7, 03/0304895-0, 03/0479160-6 e 07/0819229-1.

Afirma que os produtos em questão, por gozarem de imunidade, sempre foram classificados na posição NCM nº 4901.99.00, relativo a livros, brochuras e impressos semelhantes.

Entretanto, conquanto sempre tenha sido esta a classificação, a Receita Federal do Brasil, em relação às DIs citadas, passou a entender que os cards não são imunes, devendo ser classificados na posição NCM nº 9504.40.00, referente a cartas de jogar.

Sustenta a autora que a ré confere imunidade tributária aos cards nacionais, permitindo a classificação na posição NCM nº 4901.99.00, mas quanto aos cards por ela importados exige a classificação na posição NCM nº 9504.40.00, postura esta que fere o princípio da isonomia.

Defende que, ainda que a Administração Pública possa rever seus atos administrativos, manter as mencionadas divergências de entendimento é inadmissível, gerando insegurança para os contribuintes.

A resolução da controvérsia restringe-se a saber se as mercadorias importadas pela autora estariam ou não albergadas pela imunidade do art. 150, VI, d da Constituição Federal, cujo teor é o seguinte:


Art. 150. Sem prejuízo de outras garantias asseguradas ao contribuinte, é vedado à União, aos Estados, ao Distrito Federal e aos Municípios:
(...)
VI - instituir impostos sobre:
(...)
d) livros, jornais, periódicos e o papel destinado a sua impressão.

Há que se ressaltar, inicialmente, que, para fins do reconhecimento da imunidade tributária em questão, não se pode determinar livro unicamente a reunião de folhas de papel unidas entre duas capas, ainda mais se for levado em consideração que, nos dias atuais, são incontáveis os recursos tecnológicos disponíveis.

Assim, o que torna determinado produto imune, com perfeita adequação ao quanto disposto na alínea d do inciso VI do art. 150 da CF, são os fins a que se destina, independentemente da forma sobre a qual se apresenta.

A razão de ser da imunidade aqui debatida é difundir a educação, a informação, a cultura e a livre manifestação do pensamento, de modo a permitir amplo acesso aos veículos utilizados, sejam eles escritos, sejam meramente ilustrativos, para esta finalidade.

Observa-se, no caso em tela, que os cards YU-GI-OH, importados pela ora apelada (fls. 74/83), complementam o livro Estampas Ilustradas Yu-Gi-Oh, apresentando personagens e outros elementos retirados de histórias de ficção infanto-juvenil por eles veiculadas ("No Egito antigo havia uma força tão poderosa, que teve de ser trancada por um milênio. Agora um garoto libertou o poder! É hora do duelo! - fls. 84/85).

Assim, não fogem à categoria de livro os cards YU-GI-OH, importados, consoante entendimento da jurisprudência deste E. Tribunal Regional Federal.

Confira-se:


"CONSTITUCIONAL E TRIBUTÁRIO. IMPORTAÇÃO DE ÁLBUNS ILUSTRADOS E CROMOS ADESIVOS. IMUNIDADE TRIBUTÁRIA. ART. 150, VI, "D" DA CONSTITUIÇÃO FEDERAL. APLICABILIDADE. INTERPRETAÇÃO TELEOLÓGICA. PRECEDENTES. 1. A imunidade prevista no art. 150, VI, alínea "d", da Constituição Federal prestigia diversos valores, tais como a liberdade de comunicação e de manifestação do pensamento; a expressão da atividade intelectual, artística e científica; o acesso e difusão da cultura e da educação; dentre outros. 2. Conquanto a imunidade tributária constitua exceção à regra jurídica de tributação, não parece razoável atribuir-lhe interpretação exclusivamente léxica, em detrimento das demais regras de hermenêutica e do "espírito da lei" exprimido no comando constitucional. 3. É bem verdade que, segundo as regras de hermenêutica, o direito excepcional deve ser interpretado literalmente. Todavia, interpretar restritivamente o art. 150, VI, "d" da Constituição, atendo-se à mera literalidade do texto e olvidando-se da evolução do contexto social em que ela se insere, implicaria inequívoca negativa de vigência ao comando constitucional. 4. Em alguns casos, a melhor opção é a interpretação teleológica, buscando aferir a real finalidade da norma de molde a conferir-lhe a máxima efetividade, privilegiando, assim, aqueles valores implicitamente contemplados pelo constituinte. 5. Os livros, jornais e periódicos são veículos de difusão de informação, cultura e educação, independentemente do suporte que ostentem ou da matéria prima utilizada na sua confecção e, como tal, fazem jus à imunidade postulada. 6. In casu, verifica-se que os álbuns e cards importados pela autora difundem e complementam os livros de literatura "Magic The Gathering" e demais livros desse segmento, já que apresentam personagens e outros elementos retirados dessas histórias de ficção e aventura. Assim, é cabível atribuir elastério interpretativo ao disposto no art. 150, inc. VI, alínea "d" da Constituição Federal, de modo a estender a benesse nele contemplada a figurinhas para colecionar e aos respectivos álbuns que compõem a coleção trazida aos autos. 7. Apelação e remessa oficial improvidas" (TRF3, APELREEX 00115144620094036100, 6ª Turma, relatora Desembargadora Federal Consuelo Yoshida, e-DJF3 02/02/11).
"TRIBUTÁRIO. IMUNIDADE. IMPOSTO DE IMPORTAÇÃO. IPI. IMPORTAÇÃO DE "CARDS" ("COLLECTIBLE CARD GAMES" - CCG E YU-GI-OH). APLICAÇÃO DO ART. 150, VI, "d" DA CONSTITUIÇÃO FEDERAL. PRESTÍGIO À LIBERDADE DE PENSAMENTO E COMUNICAÇÃO, À CULTURA E EDUCAÇÃO. 1. A imunidade tributária em questão possui roupagem do tipo objetiva, pois atribui a benesse a determinados bens, considerados relevantes pelo legislador constituinte, em razão da intenção de resguardar as liberdades de pensamento e de comunicação, assim como a cultura, a informação e a educação. 2. Conquanto a imunidade tributária constitua exceção à regra jurídica de tributação, não parece razoável atribuir-lhe interpretação limitada, em detrimento das demais regras de hermenêutica e do "espírito da lei" expresso no comando constitucional. 3. O vocábulo "livro" contido no art. 150, VI, "d" da CF não se restringe à convencional coleção de folhas de papel, cortadas, dobradas e unidas em cadernos, mas sim em qualquer suporte (disco, disquete, cartões, vídeos e outros), nos quais seja possível antever a divulgação de material literário. 4. Da simples leitura das cópias dos "cards" importados juntadas aos autos, depreende-se a sua caracterização de cartões que difundem não só imagens de personagens, mas também fragmentos descritivos das características e aventuras relativas a eles, as quais, juntas, completam o todo de tais histórias de ficção infanto-juvenil. 5. Não é relevante o fato de que, além de se prestar a transmitir conhecimento, mesmo que lúdico, o material se preste a outra finalidade, como a de jogo de competição, pois isso não lhe retira a característica de assemelhado a obra literária. 6. Precedentes do STF e desta Corte. 7. Apelação a que se dá provimento" (TRF3, AMS 00093007720034036105, 3ª Turma, relator Juiz Federal convocado Rubens Calixto, e-DJF3 20/07/12).

Ademais, de acordo com entendimento já manifestado pelo E. Supremo Tribunal Federal, em voto proferido pela Exma. Ministra Ellen Gracie, relatora do RE nº 221239, ao se pronunciar acerca da incidência da imunidade trazida pelo art. 150, VI, d da Constituição Federal em relação ao álbum de figurinhas, "o Constituinte, ao instituir a imunidade ora discutida, não fez ressalvas quanto ao valor artístico ou didático, à relevância das informações divulgadas ou à qualidade cultural de uma publicação...

(...)

Em outras palavras, não cabe ao aplicador da norma constitucional em debate afastar este benefício fiscal, instituído para proteger direito tão importante ao exercício da democracia, pro força de um juízo subjetivo acerca da qualidade cultural o do valor pedagógico de uma publicação destinada ao público infanto-juvenil" (STF, 2ª Turma, RE 221239/SP, relatora Ministra Ellen Gracie, DJ 06/08/04).

Ante o exposto, nego provimento à apelação e à remessa oficial.

É como voto.




CECÍLIA MARCONDES
Desembargadora Federal Relatora


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Data e Hora: 04/07/2013 18:13:59