D.E. Publicado em 30/09/2013 |
|
|
|
|
|
EMENTA
ACÓRDÃO
Vistos e relatados estes autos em que são partes as acima indicadas, decide a Egrégia Primeira Seção do Tribunal Regional Federal da 3ª Região, por maioria, negar provimento aos embargos infringentes, nos termos do relatório e voto que ficam fazendo parte integrante do presente julgado, sendo que os Desembargadores Federais Paulo Fontes e André Nekatschalow acompanharam o Relator pela conclusão, vencidos os Desembargadores Federais José Lunardelli, Cotrim Guimarães e Cecília Mello, que lhes davam provimento.
Documento eletrônico assinado digitalmente conforme MP nº 2.200-2/2001 de 24/08/2001, que instituiu a Infra-estrutura de Chaves Públicas Brasileira - ICP-Brasil, por: | |
Signatário (a): | ANTONIO CARLOS CEDENHO:10061 |
Nº de Série do Certificado: | 07ED7848D1F21816 |
Data e Hora: | 25/09/2013 16:22:01 |
|
|
|
|
|
RELATÓRIO
O EXCELENTÍSSIMO DESEMBARGADOR FEDERAL ANTONIO CEDENHO:
Trata-se de Embargos Infringentes interpostos por Emmanuel Okeke em face do v. Acórdão de fls. 327/336, proferido pela E. 1ª Turma desta Corte que, por unanimidade, conheceu em parte da apelação do réu e, na parte conhecida, por maioria, negou-lhe provimento, nos termos do voto do relator Juiz Federal Convocado Dr. Márcio Mesquita, acompanhado pelo voto da Desembargadora Federal Dra. Vesna Kolmar, vencido o Desembargador Federal Dr. José Lunardelli que lhe dava parcial provimento para, aplicando a causa de diminuição do art. 33, § 4º, da Lei n.º 11.343/06, no percentual mínimo de 1/6 (um sexto), fixar as penas em 04 (quatro) anos, 10 (dez) meses e 10 (dez) dias de reclusão, no regime inicial semiaberto, e 486 (quatrocentos e oitenta e seis) dias-multa; por maioria, deu parcial provimento à apelação do Ministério Público Federal para majorar a pena-base para 05 (cinco) anos e 06 (seis) meses anos de reclusão e 550 (quinhentos e cinquenta) dias-multa, fixando as penas definitivas em 06 (seis) anos e 05 (cinco) meses de reclusão e 641 (seiscentos e quarenta e um) dias-multa, nos termos do voto do relator Juiz Federal Convocado Dr. Márcio Mesquita, acompanhado pelo voto da Desembargadora Federal Dra. Vesna Kolmar, vencido o Desembargador Federal Dr. José Lunardelli, que lhe negava provimento, mantendo a pena-base no mínimo legal nos termos da sentença, e, por unanimidade, determinou a expedição de ofícios ao Juízo das Execuções Criminais e ao Ministério da Justiça.
A ementa foi lavrada nos seguintes termos:
"PENAL. APELAÇÃO CRIMINAL. TRÁFICO INTERNACIONAL DE DROGAS. ERRO DE TIPO: NÃO CARACTERIZAÇÃO. FIXAÇÃO DA PENA-BASE ACIMA DO MÍNIMO LEGAL: POSSIBILIDADE. CAUSA DE AUMENTO DA TRANSNACIONALIDADE. FIXAÇÃO ACIMA DO PATAMAR MÍNIMO: IMPOSSIBILIDADE. CAUSA DE DIMINUIÇÃO DE PENA DO ART. 33, § 4º, DA LEI 11.343/2006: DESCABIMENTO. SUBSTITUIÇÃO DA PEA RECLUSIVA POR RESTRITIVAS DE DIREITO: IMPOSSIBILIDADE. |
1. Apelações da Defesa e da Acusação contra sentença que condenou o réu como incurso no artigo 33, caput, c/c o artigo 40, inciso I, ambos da Lei nº 11.343/06, à pena de cinco anos e dez meses de reclusão. |
2. O pedido de aguardar o julgamento do recurso em liberdade fica prejudicado com o julgamento da apelação. Ainda que assim não se entenda, não tem direito de apelar em liberdade o réu que, justificadamente, respondeu preso ao processo. Precedentes do Supremo Tribunal Federal e do Superior Tribunal de Justiça. |
3. Materialidade e autoria delitivas demonstradas pelas provas produzidas nos autos, sob o crivo do contraditório e ampla defesa. |
4. Demonstrado o conhecimento do réu de que transportava drogas. A mera alegação de desconhecimento da existência de drogas na bagagem, sem apoio em suporte probatório, não implica em reconhecimento de erro de tipo. Precedentes. |
5. O objeto jurídico tutelado no crime de tráfico de entorpecente é a saúde pública e, portanto, quanto maior a quantidade da droga traficada maior o potencial lesivo e o perigo de dano à saúde pública, a justificar uma maior reprovabilidade da conduta empreendida e, conseqüentemente, a elevação da pena-base. Precedentes. |
6. A potencialidade lesiva inerente à natureza da droga apreendida, aliada à expressiva quantidade (1.710 gramas de cocaína) justificam a exasperação da pena-base além do patamar mínimo. |
7. A alegação de que o acusado aceitou voluntariamente atuar com a associação criminosa e de que não agiu de inopino, mas teve tempo de refletir a respeito da conduta e persistir no intento criminoso constitui circunstância elementar do tipo, não podendo ser considerado como circunstância desfavorável. |
8. O apelante foi surpreendido quando se preparava para embarcar para o exterior, portanto bilhete aéreo com destino à Douala/Camarões, com escala em Joanesburgo/África do Sul, levando drogas em sua bagagem. Patente a intenção do apelante de internar a droga em território estrangeiro, justificando a aplicação da causa de aumento do artigo 40, inciso I, da Lei nº 11.343/06. Configura-se a internacionalidade do tráfico quando o agente está transportando o entorpecente e prestes a sair do território nacional. Precedentes. |
9. Improcede o argumento de que constitui bis in idem a aplicação da causa de aumento da internacionalidade porque as condutas "importar" e "exportar" do artigo 33 da Lei nº 11.343/2006 já revelam, de forma ínsita, a transnacionalidade do delito. O argumento suscitado é absolutamente desconexo com a denúncia e a condenação. O réu foi denunciado e condenado definitivamente por "trazer consigo" cocaína, oculta em sua bagagem. |
10. O artigo 40 da Lei nº 11.343/2006 apresenta um rol de sete causas de aumento para o crime de tráfico, a serem fixadas em patamar de um sexto a dois terços. Cada uma das causas de aumento descreve circunstâncias de fato que não são mutuamente excludentes (com exceção talvez das constantes dos incisos I e V, cuja aplicação cumulativa é duvidosa). A aplicação da causa de aumento em patamar superior ao mínimo deve ser reservada quando caracterizado o concurso de causas de aumento constantes do aludido artigo. Cogitando-se apenas da transnacionalidade, é de rigor a fixação da causa de aumento em seu patamar mínimo. Precedentes. |
11. O §4° do artigo 33 da Lei n° 11.343/06 não deve ser interpretado de modo a possibilitar a sua aplicação às assim chamadas "mulas" do tráfico de drogas, porquanto tal interpretação favoreceria sobremaneira a operação das organizações criminosas voltadas para o tráfico internacional, o que certamente contraria a finalidade do citado diploma legal, que visa à repressão dessa atividade. |
12. A atividade daquele que age como "mula", transportando a droga de sua origem ao destino, na verdade pressupõe a existência de uma organização criminosa, com diversos membros, cada qual com funções específicas. Quem transporta a droga em sua bagagem, ou em seu corpo, cumpre uma função dentro de um esquema maior, que pressupõe alguém para comprar, ou de alguma forma obter a droga na origem, e alguém para recebê-la no destino, e providenciar a sua comercialização. |
13. Se aquele que atua como "mula" desconhece quem sejam os integrantes da organização criminosa - circunstância que não põe esta em risco de ser desmantelada - e foi aliciado de forma aleatória, fortuita e sem qualquer perspectiva de ingressar na "associação criminosa", muitas vezes em face da situação de miserabilidade econômica e social em que se encontra, outras em razão da ganância pelo lucro fácil, não há como se entender que faça parte do grupo criminoso, no sentido de organização. Mas o certo é que é contratado por uma organização criminosa para servir como portador da droga, e portanto integra essa organização. |
14. Ainda que se entenda que o traficante que atue como "mula" não integra a organização criminosa, é certo que o benefício não alcança aqueles que se dedicam à atividades criminosas, ou seja, aqueles que se ocupam do tráfico, como meio de subsistência, ainda que de forma não habitual. |
15. Se o agente, sem condições econômicas próprias, despende vários dias de viagem, para obter a droga, e dirigir-se ao exterior, com promessa de pagamento pelo serviço de transporte, sem que comprove ter outro meio de subsistência, forçoso é concluir que faz do tráfico o seu meio de subsistência, não fazendo jus portanto à aplicação da causa de diminuição da pena. |
16. O réu não faz jus à substituição da pena de reclusão por penas restritivas de direitos, uma vez que não preenchido o requisito do inciso I do artigo 44 do Código Penal. |
17. O Supremo Tribunal Federal declarou a inconstitucionalidade do §1º do artigo 2º da Lei nº 8.072/1990, na redação dada pela Lei nº 11.464/2007, que estabelecia o regime inicial fechado para cumprimento da pena para os condenados por crime de tráfico de drogas. O entendimento pela inconstitucionalidade do referido dispositivo legal firmado pelo STF, não beneficia o acusado. |
18. Foram consideradas desfavoráveis as circunstâncias do artigo 59 do CP, em relação às conseqüências do crime, fixando a pena-base em patamar superior ao mínimo legal. Não há que se falar em flagrante ilegalidade no estabelecimento do regime inicial fechado. |
19. Apelação do réu conhecida em parte, e improvida. Apelação do Ministério Público Federal parcialmente provida." |
Em suas razões recursais (fls. 345/352), o embargante requer a prevalência do voto vencido, que manteve a pena-base no mínimo legal nos termos da sentença e aplicou a causa especial de diminuição de pena prevista no artigo 33, §4º, da Lei nº 11.343/06, fixando as penas em 04 (quatro) anos, 10 (dez) meses e 10 (dez) dias de reclusão e 486 (quatrocentos e oitenta e seis) dias-multa, bem como fixou o regime inicial semiaberto para o cumprimento da pena privativa de liberdade.
Os embargos foram admitidos por decisão do Juiz Federal Convocado Dr. Márcio Mesquita (fl. 354).
A Procuradoria Regional da República requer seja negado provimento aos embargos infringentes (fls. 357/360).
É o relatório.
À revisão.
Documento eletrônico assinado digitalmente conforme MP nº 2.200-2/2001 de 24/08/2001, que instituiu a Infra-estrutura de Chaves Públicas Brasileira - ICP-Brasil, por: | |
Signatário (a): | ANTONIO CARLOS CEDENHO:10061 |
Nº de Série do Certificado: | 07ED7848D1F21816 |
Data e Hora: | 30/07/2013 14:10:14 |
|
|
|
|
|
VOTO
O EXCELENTÍSSIMO DESEMBARGADOR FEDERAL ANTONIO CEDENHO:
Consta da denúncia que Emmanuel Okeke foi preso em flagrante, no dia 02.08.2010, no aeroporto internacional de Guarulhos/SP, quando tentava embarcar em vôo com destino a Duala/Camarões, trazendo consigo, para fins de comércio ou entrega de qualquer forma a consumo de terceiros, no exterior, 1.710g (um mil, setecentos e dez gramas) da substância entorpecente cocaína, sem autorização legal ou regulamentar.
O ora embargante requer a prevalência do voto vencido do Desembargador Federal Dr. José Lunardelli, que manteve a pena-base no mínimo legal nos termos da sentença e aplicou a causa especial de diminuição de pena prevista no artigo 33, §4º, da Lei nº 11.343/06, fixando as penas em 04 (quatro) anos, 10 (dez) meses e 10 (dez) dias de reclusão e 486 (quatrocentos e oitenta e seis) dias-multa, bem como fixou o regime inicial semiaberto para o cumprimento da pena privativa de liberdade, nos seguintes termos:
"A divergência restringe-se à dosimetria da pena. |
Na primeira fase da dosimetria, entendo deva ser mantida a pena-base fixada na sentença recorrida, ou seja, no mínimo legal de 5 (cinco) anos de reclusão e 500 (quinhentos) dias-multa, verbis: |
"Pela análise das certidões de antecedentes criminais e de distribuição de ações acostadas aos autos (fls. 62, 67, 68, 69, 76/77, 138 e 189), verifico inexistirem quaisquer inquéritos policiais ou feitos criminais em trâmite contra o réu, a evidenciar tratar-se de pessoa sem antecedentes. Dessa forma, em atenção às circunstâncias judiciais e do artigo 42 da Lei n.º 11.343/06 fixo a pena-base em seu mínimo legal." |
Isso porque se trata de réu primário, que não ostenta maus antecedentes, bem como as circunstâncias judiciais do art. 59 do Código Penal não lhe são desfavoráveis. Também a quantidade de droga apreendida (1.710 gramas de cocaína) não é considerada de grande monta para os padrões de tráfico internacional de entorpecentes (art. 42 da Lei n.º 11.343/02), razão pela qual deve a pena-base ser mantida no mínimo legal. |
Na segunda fase da dosimetria, estão ausentes atenuantes e agravantes. |
Na terceira fase da dosimetria da pena, fica mantida a causa de aumento decorrente da transnacionalidade do delito, prevista no art. 40, inciso I, da Lei n. 11.343/06, no percentual de 1/6 (um sexto), pois presente uma única causa de aumento, pelo que fica a pena fixada em 5 (cinco) anos e 10 (dez) meses de reclusão e 583 (quinhentos e oitenta e três) dias-multa. |
Nesse sentido, decisão desta Corte: (...) O emprego do acréscimo de 2/3 (dois terços) decorrente da internacionalidade do tráfico é nitidamente excessivo, eis que presente uma única causa de aumento, devendo o percentual de majoração ser reduzido ao mínimo legal. Na esteira do entendimento do Egrégio Superior Tribunal de Justiça, há de se admitir a retroatividade benéfica do artigo 40, inciso I, da Lei nº 11.343/06, que abriga o percentual mínimo de 1/6 (um sexto), resultando a pena privativa de liberdade definitivamente fixada em 04 (quatro) anos e 08 (oito) meses de reclusão, e a pena pecuniária em 77 (setenta e sete) dias-multa, mantido o valor unitário mínimo." (ACR 2005.61.19.0069763, rel. Des. Fed. Johonsom Di Salvo, DJF3 27.05.10) grifei. |
Ainda na terceira fase de aplicação da pena, não foi aplicada a causa de diminuição, prevista no artigo 33, §4º, da Lei n.º 11.343/06, a qual entendo deva ser aplicada. |
O artigo 33, § 4º, da Lei de Drogas, prevê a redução de 1/6 a 2/3 para o agente que seja primário, possua bons antecedentes e não se dedique a atividades criminosas nem integre organização criminosa. |
O dispositivo foi criado a fim de facultar ao julgador ajustar a aplicação e a individualização da pena às múltiplas condutas envolvidas no tráfico de drogas, notadamente o internacional, porquanto não seria razoável tratar o traficante primário, ou mesmo as "mulas", com a mesma carga punitiva a ser aplicada aos principais responsáveis pela organização criminosa que atuam na prática deste ilícito penal. |
Dos elementos coligidos nos autos, constata-se que a conduta do acusado se enquadra no que se convencionou denominar no jargão do tráfico internacional de droga de "mula", isto é, pessoa que funciona como agente ocasional no transporte de drogas, pois não se subordina de modo permanente às organizações criminosas nem integra seus quadros. Trata-se, em regra, de mão-de-obra avulsa, esporádica, de pessoas que são cooptadas para empreitada criminosa sem ter qualquer poder decisório sobre o modo e o próprio roteiro do transporte, cabendo apenas obediência às ordens recebidas. Pouco ou nada sabem a respeito da organização criminosa. |
Sobre o papel das "mulas" no narcotráfico e sua hipotética integração em organizações criminosas, bem apreciou essa questão o TRF- 5ª Região, asseverando que: |
"A etimologia do léxico "integrar" remete a íntegro, inteiro, conjunto. Muitas são as acepções da palavra, mas na frase objeto do nosso estudo, pertine àquela de incluir-se como elemento do conjunto, como membro da quadrilha. |
O apelante - ficou claro - foi utilizado como "mula". |
No âmbito do tráfico, o termo "mula" não foi adotado à toa. Nomeou-se assim o indivíduo que se faz de correio de drogas, especialmente em viagens internacionais. Para tanto é remunerado e apenas segue ordens. São tão menosprezados pelos escalões superiores das organizações criminosas do tráfico que não raro os próprios traficantes que contratam as "mulas" as denunciam aos órgãos de segurança e imigração, com intuito de, para efetuarem a prisão, os policiais não poderem revistar outros indivíduos, também "mulas", estes transportando maiores quantidades de entorpecentes. |
São pessoas aliciadas, que participam do fato delituoso em condição vexatória e com grande risco para a vida, quando conduzem a droga dentro de suas próprias vísceras. |
Reconheço que o só fato de ser o responsável pelo transporte da droga não importa, necessariamente, não integrar a organização criminosa. Todavia, alguém que exerce esse papel pela primeira vez, como é o caso, segundo a própria sentença, não deve ser considerado membro da organização criminosa, que na verdade "terceirizou" a arriscada atividade." (TRF - 5ª R. - APELAÇÃO CRIMINAL Nº 2007.81.00.007277-3 - rel. JOSÉ MARIA LUCENA - j. 13.11.2008 - DJU 02.12.2008) |
Em suma, do fato puro e simples de determinada pessoa servir como "mula" para o transporte de droga não é possível, por si só, inferir a inaplicabilidade da causa de diminuição de pena prevista no § 4º do artigo 33 da Lei 11.342/2006, por supostamente integrar organização criminosa. |
Emmanuel Okeke é primário, não ostenta maus antecedentes e não há prova nos autos de que se dedica a atividades criminosas, nem elementos para concluir que integra organização criminosa, apesar de encarregado do transporte da droga. Certamente, estava transportando a droga para bando criminoso internacional, o que não significa, porém, que fosse integrante dele. |
Sendo assim, faz jus à aplicação da causa de redução de pena, prevista no § 4º do art. 33 da Lei n.º 11.343/06, entretanto, no percentual mínimo de 1/6 (um sexto), devido às circunstâncias objetivas e subjetivas do caso concreto, em que o acusado, nigeriano, pretendia embarcar, na cidade de Guarulhos, em voo com destino a Duala/Camarões, mediante escala em Joanesburgo/África do Sul, trazendo consigo 1.710g (mil e setecentos e dez gramas - peso líquido) de cocaína. |
Com a redução de 1/6 (um sexto), a pena passa a ser, definitivamente, fixada em 4 (quatro) anos, 10 (dez) meses e 10 (dez) dias de reclusão, pagamento de 486 (quatrocentos e oitenta e seis) dias-multa. |
Considerando que o Plenário do Supremo Tribunal Federal, no julgamento do Habeas Corpus n.º 111840, em 27 de junho de 2012, deferiu, por maioria, a ordem e declarou incidenter tantum a inconstitucionalidade do § 1º do artigo 2º da Lei nº 8.072/90, com a redação dada pela Lei nº 11.464/2007, deve ser fixado o regime inicial de cumprimento de pena, nos termos do art. 33, § 2º, "b", do Código Penal, verbis: |
"Art. 33 - A pena de reclusão deve ser cumprida em regime fechado, semi-aberto ou aberto. A de detenção, em regime semi-aberto, ou aberto, salvo necessidade de transferência a regime fechado. |
(...) |
§ 2º - As penas privativas de liberdade deverão ser executadas em forma progressiva, segundo o mérito do condenado, observados os seguintes critérios e ressalvadas as hipóteses de transferência a regime mais rigoroso: |
a) o condenado a pena superior a 8 (oito) anos deverá começar a cumpri-la em regime fechado; |
b) o condenado não reincidente, cuja pena seja superior a 4 (quatro) anos e não exceda a 8 (oito), poderá, desde o princípio, cumpri-la em regime semi-aberto; |
c) o condenado não reincidente, cuja pena seja igual ou inferior a 4 (quatro) anos, poderá, desde o início, cumpri-la em regime aberto. |
§ 3º - A determinação do regime inicial de cumprimento da pena far-se-á com observância dos critérios previstos no art. 59 deste Código. Grifei. |
No caso dos autos, trata-se de réu primário, que não ostenta maus antecedentes, cuja pena-base foi fixada no mínimo legal, por não existirem circunstâncias judiciais desfavoráveis, nos termos do art. 59 do Código Penal, e a pena definitiva em 4 (quatro), 10 meses e 10 (dez) dias de reclusão, razão pela qual deve ser fixado o regime inicial semiaberto para o cumprimento da pena. |
Diante do exposto, nego provimento à apelação do Ministério Público Federal e dou parcial provimento à apelação da defesa para, aplicando a causa de diminuição do art. 33, § 4º, da Lei n.º 11.343/06, no percentual mínimo de 1/6 (um sexto), fixar a pena definitiva em 4 (quatro) anos, 10 (dez) meses e 10 (dez) dias de reclusão, no regime inicial semiaberto, e pagamento de 486 (quatrocentos e oitenta e seis) dias-multa, no valor unitário mínimo legal." (fls. 338/340). |
Em que pese o entendimento manifestado pelo Desembargador Federal Dr. José Lunardelli, entendo que deva prevalecer o entendimento esposado pelo voto vencedor.
Sabe-se que o julgador, na individualização da pena, deve examinar detidamente os elementos que dizem respeito ao fato, segundo os critérios estabelecidos pelo artigo 59, do Código Penal. No caso de tráfico de drogas, há ainda que observar o comando expresso no artigo 42, da Lei nº 11.343/06, o qual determina expressamente que o Juiz, na fixação da pena, deve considerar, com preponderância sobre as circunstâncias judiciais previstas no artigo 59, do Código Penal, a natureza e a quantidade da droga, bem como a personalidade e a conduta do agente.
No caso, não pode ser considerada de pequena monta a quantidade apreendida nestes autos (quase dois quilos), ainda mais quando comparada às quantidades normalmente portadas pelo criminoso no tráfico urbano de varejo, quando é vendida diretamente aos consumidores pelos pequenos traficantes.
É certo, também, que, como no caso, não foi o réu, na qualidade de "mula" do tráfico, que decidiu acerca da quantidade da droga que transportaria. Contudo, é inegável que evidentemente possuía consciência, por agir mediante promessa de pagamento, que estava colaborando com a atuação de uma organização voltada ao tráfico de entorpecentes, e não como os denominados "aviõezinhos", que repassam pequenas quantidades de drogas aos usuários.
Tampouco deve prevalecer o argumento de que a natureza da droga (cocaína) não é tão maléfica ao organismo quanto as demais que são usualmente traficadas (crack, ecstasy, anfetamina, heroína, LSD, etc). De fato, sabe-se que a cocaína é uma droga que vicia facilmente, sendo alta sua lesividade à saúde dos usuários, pois pode levar a óbito ainda que consumida em pequena quantidade.
Ademais, a cocaína que é normalmente exportada possui grau de pureza altíssimo, sendo misturada a outras substâncias antes da entrega ao consumidor para elevar o rendimento.
Por fim, deve-se levar em conta que o bem jurídico tutelado pela Lei nº 11.343/06 é a saúde pública. Portanto, as consequências do crime de tráfico de drogas são extremamente nefastas, já que objetiva o fornecimento de expressivo numerário aos controladores da mercancia internacional de entorpecente, em prejuízo da saúde e do patrimônio honesto de milhares de cidadãos. Não se pode olvidar também que é um crime que está diretamente vinculado a outras práticas delitivas, em especial os crimes contra a pessoa.
Portanto, ainda que o réu seja primário e não possua antecedentes, considerando-se a natureza (cocaína) e a significativa quantidade da droga apreendida nos autos (1.710g), bem como a larga faixa de graduação da reprimenda corporal prevista pelo preceito secundário do tipo descrito no artigo 33, da Lei nº 11.343/06 (de cinco a quinze anos de reclusão), entendo que se mostra justa e suficiente para a prevenção, a reprovação e a repressão do crime, a fixação da pena-base em 05 (cinco) anos e 06 (seis) meses anos de reclusão e 550 (quinhentos e cinquenta) dias-multa.
Nesse sentido, julgados desta E. 1ª Seção:
"PENAL - CRIME DE TRÁFICO INTERNACIONAL DE ENTORPECENTES - DOSIMETRIA DA PENA - PENA-BASE ACIMA DO MÍNIMO LEGAL - ART. 42 DA LEI Nº 11.343/06 - QUANTIDADE E NATUREZA DA DROGA - PREPONDERÂNCIA - ART. 59 DO CÓDIGO PENAL - CIRCUNSTÂNCIAS DESFAVORÁVEIS - PENA JUSTA ESTABELECIDA NO ACÓRDÃO - CAUSA DE DIMINUIÇÃO - ART. 33, § 4º, DA LEI Nº 11.343/06 - REDUÇÃO EM METADE - REPRIMENDA QUE NÃO ATINGIRIA OS FINS DA PENA - MANUTENÇÃO DO ACÓRDÃO - IMPROVIMENTO DOS EMBARGOS INFRINGENTES. |
1.A pena-base merece ser fixada mais acima do mínimo legal, ao comando do disposto no art. 42 da Lei nº 11.343/06, tendo como circunstâncias preponderantes a quantidade e natureza da droga. O réu transportava no aparelho digestivo mais de um quilo de cocaína em forma de cápsulas, cuja quantia era de quase cem invólucros, quantidade significativa de substância nefasta que poderia ser disseminada entre muitos usuários e de alta potencialidade lesiva. |
2.Sem dúvida, a quantidade e natureza do entorpecente, bem como as circunstâncias do art. 59 do Código Penal, delas integrantes o motivo de lucro com a ilicitude, ofensividade da conduta, as consequências do crime, bem como a personalidade desabonadora do réu todos esses fatores reconhecidos pelo MM. Juiz na sentença quando do balizamento da pena-base não autorizam, nem justificam o estabelecimento da pena-base no mínimo legal, tendo resultado incongruente essa pena-base mínima por ele fixada, diante da pluralidade das circunstâncias desfavoráveis na sentença apontadas. |
3.Justificada a majoração operada no voto vencedor, em 06 anos e 06 meses de reclusão para esse réu, considerando os fatores elencados, totalizando a pena final de 05 (cinco) anos e 10 (dez) meses de reclusão pouco acima do mínimo legal da pena abstratamente prevista para o crime, reprimenda que reputo proporcional, adequada e suficiente à prevenção e repressão do crime, em observância aos fins da pena, de acordo com o estabelecido no art. 59, in fine, do Código Penal. |
4. Também para a ré, conquanto levasse consigo a quantia de 326gs da droga, em menor escala que o correu, verifico que a sentença reputou desfavoráveis a natureza da substância entorpecente cocaína, considerando seu alto poder lesivo, delito que desencadeia outros, inclusive de natureza violenta, com vistas a angariar recursos para o sustento de incontrolável vício, atingindo uma variedade incalculável de pessoas, a personalidade e conduta desabonadora da ré que ocultou em suas vestes íntimas a substância entorpecente, a culpabilidade consubstanciada na reprovação social, os motivos que lhes são desfavoráveis, o lucro fácil obtido com a narcotraficância e as consequências de efeitos deletérios da conduta, todos esses fatores foram reconhecidos na sentença. |
5. Verifica-se que somente a quantidade e os antecedentes, restaram isolados como mais favoráveis, não parecendo justa a pena-base mínima imposta, o que não se coaduna com a adoção de todos esses fatores aqui e na sentença relacionados, a autorizar ter-se por acertada a fundamentação do voto vencedor com dimensionamento da reprimenda pouco acima do mínimo legal em cinco anos e seis meses de reclusão. |
6.É excessiva a redução em metade da pena aplicada na sentença e no voto vencido para essa ré, por força do art. 33, § 4º, da Lei nº 11.343/06, o que resultaria, no meu sentir, em pena muito abaixo do mínimo legal previsto para o crime, ou seja, pena definitiva de 2 anos e 11 meses de reclusão, não se mostrando razoável esse quantum da pena. |
7.Beneficiando-se a ré com redução de pena em grau médio não haveria suficiência para a prevenção (compreendendo-se dissuasão da conduta em relação a si própria e a outros futuros agentes) e repressão do crime, A curta permanência no cárcere estaria na contramão do necessário combate ao tráfico transnacional de entorpecentes, crime que assola e arruína toda a sociedade e que, inclusive é objeto de cooperação internacional visando sua erradicação. |
8.Justa, adequada e necessária a pena final imposta a corré fixada no voto vencedor em 4 anos, 10 meses e 10 dias de reclusão. |
9.Mantido o voto vencedor e o acórdão proferido. |
10.Improvimento dos embargos." |
(EIFNU 00129351420094036119, rel. Desembargador Federal Luiz Stefanini, e-DJF3 Judicial 1 de 02/10/2012) |
|
"PENAL. EMBARGOS INFRINGENTES E DE NULIDADE. TRÁFICO INTERNACIONAL DE ENTROPECENTES. DOSIMETRIA. APELO DA DEFESA. REFORMATIO IN PEJUS. APLICABILIDADE DO ARTIGO 42 DA LEI Nº 11.343/06. PENA-BASE REDUZIDA AO PATAMAR ESTABELECIDO NA SENTENÇA. RECURSO PARCIALMENTE PROVIDO. |
1 - O embargante foi denunciado como incurso nas sanções do delito previsto no artigo 33, caput, c.c artigo 40, I, da Lei nº 11.343/06. |
2 - Sentença condenatória. Pena-base fixada em 6 (seis) anos de reclusão e 600 (seiscentos) dias-multa, com base nas circunstâncias, consequências e motivo do delito, na natureza e quantidade da substância entorpecente e no comportamento da vítima (vitimização difusa). Majorada a pena para 7 (sete) anos de reclusão e 700 (setecentos) dias-multa, dada a transnacionalidade do delito. |
3 - Apelação da defesa julgada, por maioria de votos, parcialmente procedente para reduzir a pena em razão da atenuante da confissão. |
4 - Pena-base fixada acima do mínimo legal, em 6 (seis) anos e 8 (oito) meses de reclusão e 666 (seiscentos e sessenta e seis) dias-multa, consideradas a quantidade e natureza do entorpecente, com fundamento no art. 42 da Lei n. 11.343/06. Reduzida a pena para 5 (cinco) anos, 6 (seis) meses e 20 (vinte) dias de reclusão e 555 (quinhentos e cinquenta e cinco) dias-multa, em razão da confissão. Majorada a pena para 6 (seis) anos, 5 (cinco) meses e 23 (vinte e três) dias de reclusão e 647 (seiscentos e quarenta e sete) dias-multa, pela transnacionalidade. |
5 - Voto vencido. Pena-base fixada no mínimo legal. Inaplicabilidade do artigo 42 da Lei nº 11.343/06. Não incidência da atenuante da confissão espontânea, pela irredutibilidade da pena-base. Majoração da pena em razão da internacionalidade, para 5 (cinco) anos e 10 (dez) meses de reclusão e 583 (quinhentos e oitenta e três) dias-multa. |
6 - O E. Relator fixou a pena-base acima da estabelecida na sentença, e considerando que houve recurso somente da defesa está configurada a reformatio in pejus. |
7 - Pena-base reduzida para 6 (seis) anos de reclusão e 600 (seiscentos) dias-multa, consoante fixado da sentença. |
8 - Cabe ao juiz, no caso concreto, examinar o grau de reprovação da conduta delitiva do réu, levando em consideração além dos requisitos previstos no artigo 59 do Código Penal, também aqueles dispostos no artigo 42 da Lei Especial. |
9 - Não deve o magistrado recusar a aplicação deste dispositivo de lei sob o fundamento de sua insuficiência no concernente à regulamentação de quais são as substâncias mais ou menos nocivas à saúde. A norma é clara, válida e não está a depender de norma regulamentar para exprimir a sua plena eficácia. Para sua aplicação, basta que, diante do caso sub examine, pondere o aplicador da lei o grau de prevenção e censurabilidade que a sociedade, por meio do legislador, impõe a determinada conduta, considerada esta sob o espectro da natureza e da quantidade de substância entorpecente que se buscava traficar. Assim quis o legislador não para deixar ao talante do magistrado quando e como considerar os requisitos previstos em lei, mas porque somente ele terá condições de avaliar no caso concreto a nocividade da conduta perpetrada. |
10 - Cocaína apreendida em quantidade expressiva. Substância entorpecente com efeitos deletérios. Alta capacidade de gerar dependência química e, inclusive, levar a óbito. Destinada ao tráfico internacional, tem alto potencial lesivo, dado que, em geral, é muito concentrada, o que propicia a multiplicação da quantidade da substância entorpecente e, por consequencia, do número de vítimas. |
11 - Mantida a pena-base tal qual fixada na sentença, sobre a qual incide a atenuante da confissão como estabelecida no Acórdão e, aplicada a causa de aumento pela internacionalidade, o que totaliza a pena definitiva de 5 (cinco) anos e 10 (dez) meses de reclusão e 583 (quinhentos e oitenta e três) dias-multa. |
12 - Embargos a que se dá parcial provimento." |
(EIFNU 00000661920094036119, relª. Desembargadora Federal Vesna Kolmar, e-DJF3 Judicial 1 de 18/07/2012) |
|
"PENAL. PROCESSUAL PENAL. EMBARGOS INFRINGENTES. TRÁFICO INTERNACIONAL DE ENTORPECENTE. FIXAÇÃO DA PENA-BASE. NATUREZA E QUANTIDADE DA DROGA. POSSIBILIDADE DE FIXAÇAO DA PENA ACIMA DO MÍNIMO LEGAL. RECURSO DESPROVIDO. |
1. No que se refere à questão referente à fixação da pena-base, como se observa do auto de apreensão, laudo preliminar de constatação e do laudo de exame em substância, foi apreendida, em poder da acusada, grande quantidade de substância entorpecente altamente deletéria, com enorme poder de criar vício e dependência (cocaína) e em montante considerável (2.230 gramas - peso líquido), o que denota, sem dúvida, uma maior culpabilidade e lesão mais intensa ao bem jurídico tutelado (saúde pública), justificando o recrudescimento da sanção penal, atendendo, inclusive, o comando normativo inserto no art. 42 da Lei nº 11.343/06: O juiz, na fixação das penas, considerará, com preponderância sobre o previsto no art. 59 do Código Penal, a natureza e a quantidade da substância do produto, a personalidade e a conduta social do agente (grifei). |
2. Saliente-se que, mesmo antes da vigência da Lei nº 11.343/06, sob a égide da antiga Lei Antidrogas, o E. Superior Tribunal de Justiça já entendia que a quantidade significativa de substância estupefaciente já era suficiente para a majoração da reprimenda penal: A grande quantidade de substância entorpecente apreendida é circunstância judicial que justifica o aumento da pena-base acima do mínimo legal (Precedentes do STJ e do STF) (HC 102032/PE - 5ª Turma - rel. Min. Felix Fischer - DJe 04.08.08). |
3. Deve-se, ainda, levar em consideração que as penas fixadas para o delito descrito no artigo 33, do Código Penal dirigem-se a coibir, da mesma forma, tanto o tráfico interno de drogas como o internacional, sendo certo que a pena mínima prevista para um pequeno traficante preso comerciando, seja 40 ou 50 gramas de maconha, ou dois ou três frascos de lança perfume, é de 05 (cinco) anos de reclusão, mais 500 (quinhentos) dias multa. |
4. O tratamento mais enérgico adotado pelo legislador decorre da constatação dos inúmeros malefícios trazidos pelo comércio ilegal de drogas, que vão desde a sobrecarga à Saúde Pública, do desmantelamento da família, pilar de sustentação do Estado, até o cometimento de diversos outros crimes patrimoniais, violentos ou não, praticados por usuários em busca de recursos para adquirir substâncias entorpecentes. |
5. Assim, a conduta da ré demonstra uma culpabilidade mais intensa e maior lesão, ou ameaça de lesão, ao bem jurídico tutelado, se mostrando merecedora de uma reprimenda estatal mais intensa, em homenagem ao princípio da individualização da pena. |
6. Desta forma, a pena-base, considerando a culpabilidade e as conseqüências do crime (art.59 CP), deve ser mantida em patamar superior ao mínimo legal, e no montante fixado no acórdão. |
7. Embargos infringentes desprovidos. Julgado mantido, em seu inteiro teor." |
(EIFNU 00029891820094036119, relª. para acórdão Desembargadora Federal Ramza Tartuce, e-DJF3 Judicial 1 de 13/12/2011) |
O benefício previsto no § 4º do artigo 33 da Lei nº 11.343/06 exige a presença de quatro requisitos, que devem ser preenchidos cumulativamente, ou seja, que o agente "seja primário, de bons antecedentes, não se dedique a atividades criminosas nem integre organização criminosa".
Como a lei utilizou a conjunção "NEM", deduz-se que há uma diferença substancial entre "se dedicar a atividades criminosas" e "integrar uma organização criminosa". A dedicação a atividades criminosas exige habitualidade, permanência, conjunção de propósitos, divisão de tarefas, ou seja, que o réu faça do crime seu meio de vida. Por outro lado, para que se afirme que o réu integra uma organização criminosa, basta a prova de que participou da empreitada criminosa de alguma forma.
Assim, quando o parágrafo 4º do artigo 33 da Lei nº 11.343/06 exige que o agente não integre organização criminosa, significa que não é necessário, para esse fim, que esteja incurso no crime de associação para o tráfico. A reiteração de condutas criminosas no passado, ou o ânimo de reiterá-las futuramente, é elemento caracterizador da estabilidade e permanência, exigíveis para a configuração do crime autônomo de associação para o tráfico (antigo artigo 14 da Lei nº 6.368/75 e atual artigo 35, da Lei nº 11.343/06). Contudo, no parágrafo 4º do artigo 33, da Lei nº 11.343/06, não é necessário esse ânimo para que se caracterize a integração em organização criminosa, já que está presente em outro requisito, que é o "não se dedicar a atividades criminosas". Repito: se a lei exigisse que a prática reiterada de delitos, ou a vontade de praticá-los reiteradamente fosse elemento essencial para a integração a uma atividade criminosa, não teria inserido como requisito da causa de redução de pena a exigência de que o agente também não se dedique a atividades criminosas.
Feitas tais considerações, e passando à análise do caso concreto, é certo que Emmanuel Okeke, ora embargante, é primário e sem antecedentes.
O acusado afirmou, em Juízo, que veio ao Brasil fazer um tratamento médico em razão de acidente sofrido na Nigéria, sendo que as despesas da viagem foram custeadas por um nigeriano chamado Obina. Embora tenha negado o conhecimento acerca do conteúdo, disse que recebeu as latas de pêssego (contendo cocaína) de uma pessoa chamada Fernandes e que entregaria a bagagem a Obina no exterior (cf. mídia digital - fl. 172). Ademais, como bem apontado no voto vencedor, depreende-se da certidão de movimentação migratória (fls. 187) que o réu já havia tentando ingressar no Brasil em 31/03/2010 com o passaporte nº EK261, sendo impedido o seu ingresso no território brasileiro, sob a justificativa que "não dispõe de recursos suficientes para estadia no Brasil". O acusado providenciou novo passaporte nº A01797099 datado de 14/04/2010 (fls. 183), ingressando novamente em julho de 2010, para buscar a droga no Brasil.
Embora não possa ser considerado como membro efetivo de uma quadrilha, não há como negar que efetivamente figurou, ainda que de forma eventual, em uma ponta da organização criminosa voltada ao tráfico internacional de drogas, a ela prestando serviços e colaborando para a distribuição mundial do entorpecente cocaína, ao exercer a função de transportá-la para o exterior.
Note-se que o réu integraria a organização ainda que fosse a primeira vez que dela participasse, ou que não tivesse o ânimo de delinquir, já que sua atuação seria condição imprescindível para o sucesso da narcotraficância internacional.
Ressalto que tal assertiva não deriva de mera presunção, de uma criação judicial baseada em critérios subjetivos em desfavor do direito de liberdade, ou ainda de usurpação da função legislativa, mas sim de uma reflexão ponderada e imparcial, baseada na realidade do mundo em que vivemos. Isso porque é notório e incontestável que, em uma operação típica de tráfico de drogas, como na hipótese, há necessariamente a atuação de uma organização criminosa internacional atuando em dois ou mais países. Em uma ponta, há o fornecimento da droga no país de origem às pessoas que se dispõem a transportá-la e, em outra, outros membros da organização, que recebem o entorpecente no país de destino, preparando-o para o consumo.
Por esses motivos, entendo que a causa de diminuição prevista no parágrafo 4º do artigo 33 da Lei nº 11.343/06 não está voltada àquele que pratica o tráfico com uma autêntica estrutura logística voltada para importação/exportação de grandes quantidades de droga, estrutura essa que recruta pessoas economicamente desfavorecidas, todos em condições sabidamente deploráveis, que recebem consideráveis quantias em dinheiro, telefones celulares locais e internacionais, roupas, passaportes, às vezes até acompanhantes ("olheiros"), unicamente para transportar o entorpecente, conforme previamente contratado. A pessoa que se dispõe a viajar transportando grande quantidade de entorpecente em prol de uma organização criminosa, proprietária da droga e detentora da logística de seu deslocamento, atua como um elo entre seus participantes.
Penso, ainda, que essa causa de diminuição de pena está voltada ao tráfico de menor expressão, que não possui tamanha estrutura e poderio econômico, nem envolve quantidades tão expressivas de entorpecente, tais como pequenos distribuidores que comercializam a droga em pequenas quantidades, diretamente aos usuários.
Assim sendo, discordo do entendimento de que, para "integrar a organização criminosa" seja necessária vinculação perene ou prolongada, muito menos saber quem são os donos do entorpecente, os produtores e fabricantes, a função ou identidade de cada elemento que compõe a organização criminosa.
Assim, mesmo sem a estabilidade e permanência, o papel exercido pelo ora embargante na atividade criminosa, fazendo a atividade essencial de transportar o entorpecente de um país para outro, o qualifica como integrante de organização criminosa e impede a concessão do benefício legal do § 4º do art. 33 da Lei nº 11.343/2006.
Ressalto que a aplicação indiscriminada dessa causa de redução de pena aos "mulas" do tráfico transnacional de drogas certamente servirá como incentivo para que o Brasil se torne, muito em breve, a principal rota para o transporte de drogas provenientes dos países vizinhos para o exterior, fato incompatível com os vários acordos internacionais sobre o combate às drogas firmados pelo nosso País.
É esse o entendimento de parte dos integrantes desta E. Corte. Confira-se:
"PENAL - PROCESSUAL PENAL - TRÁFICO INTERNACIONAL DE ENTORPECENTES - LEI 11.343/2006 - LIBERDADE PROVISÓRIA - IMPOSSIBILIDADE DE CONCESSÃO - RÉU PRESO DURANTE TODO O PROCESSO - ARTIGO 312 CPP - PRESENTES OS REQUISITOS PARA A PRISÃO CAUTELAR - PRELIMINAR REJEITADA - AUTORIA E MATERIALIDADE DO DELITO AMPLAMENTE COMPROVADAS - INTERNACIONALIDADE DEMONSTRADA - AUSÊNCIA DE "BIS IN IDEM" - PENA BASE FIXADA ACIMA DO MÍNIMO LEGAL - CONDIÇÕES JUDICIAIS DESFAVORÁVEIS - CONFISSÃO - OCORRÊNCIA - CAUSA DE DIMINUIÇÃO PREVISTA NO § 4º, DO ARTIGO 33, DA LEI 11.343/06 - INAPLICABILIDADE - RECURSO DA ACUSAÇÃO PROVIDO - RECURSO DA DEFESA IMPROVIDO. |
(...) |
O apelante, de forma habitual ou não, integrava associação criminosa, participando, como transportador da droga, de esquema criminoso voltado para o comércio ilícito de entorpecentes, impossibilitando a aplicação do benefício legal previsto no § 4º do art. 33 da Lei nº 11.343/06. |
(...)" |
(TRF 3, ACR 200861190080255, Relª. Des. Federal Ramza Tartuce, 5ª Turma, DJF3 CJ1 de 15/06/2010 ) |
|
"PENAL - PROCESSUAL PENAL - TRÁFICO INTERNACIONAL DE ENTORPECENTES - LEI 11.343/2006 - AUTORIA E MATERIALIDADE DO DELITO AMPLAMENTE COMPROVADAS - INTERNACIONALIDADE DEMONSTRADA - PENA BASE FIXADA ACIMA DO MÍNIMO LEGAL MANTIDA - CAUSA DE DIMINUIÇÃO PREVISTA NO § 4º, DO ARTIGO 33, DA LEI 11.343/06: INAPLICABILIDADE - RECURSO DA DEFESA IMPROVIDO. |
7. O apelante, de forma habitual ou não, dedicava-se à atividade criminosa de tráfico de entorpecentes, participando, como transportador da droga, de esquema criminoso voltado para o comércio ilícito de entorpecentes, impossibilitando a aplicação do benefício legal previsto no § 4º do art. 33 da Lei nº 11.343/06. Nesta trilha já decidiu o Tribunal Regional Federal da 3a. Região que: "(...) Incabível a aplicação do art. 33, §4º, da Lei nº 11.343/06, frente às circunstâncias que norteiam a prática delitiva, a natureza e a grande quantidade de droga apreendida, bem como diante as declarações do réu, que seguramente transportava a droga por conta e ordem de organização criminosa, exercendo a função de mula" (ACR nº 29658 - Proc. nº 2006.61.19.008219-0 - 2ª T. - Rel. Desembargadora Cecília Mello - DJF3 12.06.08). |
8. O benefício não é, pois, cabível, dada a notória lesividade do entorpecente e sua significativa quantidade, e o fato de o recorrente, no mínimo, estar colaborando diretamente com as atividades de organização criminosa voltada para o comércio ilícito de drogas. Além disso, como se verifica da certidão de fls. e do próprio interrogatório judicial do acusado, constata-se que este já responde a processo criminal por crime de descaminho, dedicando-se, pois, ao desenvolvimento de atividades delituosas, não fazendo jus, também por essa razão, ao benefício legal previsto no § 4º do art. 33 da Lei Antidrogas. |
9. Recurso da defesa improvido. |
(TRF 3, ACR 2009.60.06.000074-2/MS , Rel. Juiz Federal Convocado em Auxilio Helio Nogueira, 5ª Turma, DJF3 CJ1 de 13/09/2010) |
E, ainda, julgados desta E. 1ª Seção:
"PROCESSUAL PENAL. EMBARGOS INFRINGENTES EM APELAÇÃO CRIMINAL. TRÁFICO TRANSNACIONAL DE DROGAS: ART. 33, CAPUT, C/C ART. 40, I DA LEI 11.343/06: CAUSA DE REDUÇÃO DE PENA PREVISTA NO § 4º DO ART. 33 DA LEI 11.343/06: INAPLICABILIDADE AOS "MULAS" DO TRÁFICO QUE TRANSPORTAM GRANDE QUANTIDADE DE EMTORPECENTES, AINDA QUE DE FORMA EVENTUAL: PROVAS DE INTEGRAÇÃO INTEGRAÇÃO EM ORGANIZAÇÃO CRIMINOSA. |
1. Embargos infringentes com pretensão ao acolhimento do voto vencido que aplicou, na dosimetria da pena do embargante, pela prática do crime de tráfico transnacional de drogas, a causa de redução de pena prevista no § 4º do art. 33, da Lei nº 11.343/06. |
2. O embargante, cidadão boliviano, afirmou em Juízo que, em Corumbá/MS, foi abordado por um indivíduo de nome Raul, que lhe propôs o pagamento de quinhentos dólares norte-americanos para transportar a droga até São Paulo. |
3. O benefício previsto no § 4º do art. 33 da Lei 11.343/06 exige que o agente seja primário, de bons antecedentes, não se dedique às atividades criminosas nem integre organização criminosa. Como a lei utilizou a conjunção "nem", deduz-se que há diferença substancial entre "se dedicar a atividades criminosas" e "integrar uma organização criminosa". Integrar não exige habitualidade e permanência, a reiteração de condutas criminosas ou o ânimo de reiterá-las, que está presente em outro requisito, que é o não se dedicar a atividades criminosas. |
4. Ainda que o embargante seja primário, de bons antecedentes e que não existam provas de que se dedique a atividades criminosas, se figurou, ainda que de forma eventual, na ponta de uma organização criminosa a ela prestando serviços e colaborando para a distribuição mundial de entorpecentes ao exercer a função de "mula" de grande quantidade de drogas para o exterior mediante remuneração, integrou a organização criminosa, não preenchendo, pois, de forma cumulativa os requisitos exigidos para a aplicação desse benefício. |
5. Embargos infringentes a que se nega provimento." |
(EIFNU 00082576120094036181, rel. Desembargador Federal Cotrim Guimarães, rel. para acórdão Desembargador Federal Antonio Cedenho, e-DJF3 Judicial 1 de 11/06/2012) |
|
"PROCESSUAL PENAL. EMBARGOS INFRINGENTES. TRÁFICO INTERNACIONAL DE DROGAS. CAUSA DE DIMINUIÇÃO DE PENA DO "TRAFICANTE OCASIONAL": INAPLICABILIDADE. |
1. Embargos infringentes em que se pretende fazer prevalecer o voto vencido que aplicava a causa de diminuição da pena do §4º do artigo 33 da Lei 11.343/06 e, ato seguinte, em virtude da quantidade da pena resultante, substituía a pena corporal por restritivas de direito. |
2. A nova lei de drogas instituiu causa de diminuição de pena para o "traficante de primeira viagem", - denominação do Professor Guilherme de Souza Nucci - no artigo 33, §4º. De acordo com o dispositivo em comento, é necessário o preenchimento simultâneo de todos os requisitos: a) primariedade, b) boa antecedência, c) não dedicação a atividades criminosas e d) não integração de organização criminosa, para a obtenção da redução da pena. |
3. Na hipótese em tela, o embargante não preenche os requisitos legais, pois constituía elo entre o fornecedor da droga no Brasil e o receptor na Nigéria, integrando a organização criminosa internacional voltada à prática do tráfico de cocaína. |
4. Johnson foi impedido em virtude de prisão em flagrante de empreender viagem de longa distância, transportando droga oculta nos sapatos, mediante paga, ficando à disposição da associação criminosa por todo o período da viagem, com deliberada integração no "jogo" do tráfico, dedicando-se ao êxito da empreitada. |
5. Embargos desprovidos." |
(EIFNU 00125515120094036119, relª. Juiza Federal Convocada Silvia Rocha, e-DJF3 Judicial 1 de 22/03/2012) |
|
"PROCESSUAL PENAL. EMBARGOS INFRINGENTES. TRÁFICO INTERNACIONAL DE DROGAS. IMPOSSIBILIDADE DE APLICAÇÃO RETROATIVA DA LEI 11.343/2006, EM COMBINAÇÃO COM A LEI 6.368/76. CAUSA DE DIMINUIÇÃO DE PENA DO "TRAFICANTE OCASIONAL": INAPLICABILIDADE. |
(...) |
6. Mesmo que se entenda aplicável retroativamente a Lei n° 11.343/06, quanto ao §4° do artigo 33, a ré não faria jus à causa de diminuição de pena do tráfico ocasional. |
7. Dispõe o artigo §4° do artigo 33 sobre a possibilidade de redução da pena no crime de tráfico de drogas, de um sexto a dois terços, "desde que o agente seja primário, de bons antecedentes, não se dedique às atividades criminosas nem integre organização criminosa". Tais requisitos são exigíveis cumulativamente, e portanto, a ausência de qualquer deles implica na inexistência de direito ao benefício da diminuição da pena . |
8. No caso dos autos, restou evidenciado que a ré agia como transportadora de expressiva quantidade de droga, destinada ao exterior. Agia, como se diz no jargão policial, como "mula". Embora não haja nos autos elementos para se concluir que a ré não seja primária ou ostente maus antecedentes, não faz jus ao benefício. |
9. O §4° do artigo 33 da Lei n° 11.343/06 não deve ser interpretado de modo a possibilitar a sua aplicação às assim chamadas "mulas" do tráfico de drogas, porquanto tal interpretação favoreceria sobremaneira a operação das organizações criminosas voltadas para o tráfico internacional, o que certamente contraria a finalidade do citado diploma legal, que visa à repressão dessa atividade. |
10. A atividade daquele que age como "mula", transportando a droga de sua origem ao destino, na verdade pressupõe a existência de uma organização criminosa, com diversos membros, cada qual com funções específicas. Quem transporta a droga em sua bagagem, ou em seu corpo, cumpre uma função dentro de um esquema maior, que pressupõe alguém para comprar, ou de alguma forma obter a droga na origem, e alguém para recebê-la no destino, e providenciar a sua comercialização. |
11. Ainda que se entenda que o traficante que atue como "mula" não integra a organização criminosa, senão que é a pena s contratado por ela, o benefício não alcança àqueles que se dedicam à atividades criminosas, ou seja, aqueles que se ocupam do tráfico , como meio de subsistência, ainda que de forma não habitual. |
12. No caso dos autos há elementos que permitem concluir que a ré se dedicava à atividades criminosas. A quantidade da droga apreendida, a remuneração pelo transporte, o tempo dedicado à viagem desde a origem até o destino, a inexistência de prova de ocupação lícita, todas essas circunstâncias conduzem à conclusão de que a ré se dedicava à atividades criminosas, e portanto não faz jus à causa de diminuição de pena prevista no artigo 33, §4° da Lei n° 11.343/06. Precedentes. |
13. Embargos desprovidos." |
(EIFNU 2006.61.19.006726-6, Rel. Juiz Federal Convocado Márcio Mesquita; Data do Julgamento: 16/10/2008) |
Assim, no caso, deve ser afastada a incidência da causa especial de diminuição de pena prevista no artigo 33, § 4º, da Lei 11.343/06.
A fixação de regime inicial fechado de cumprimento de pena encontrava supedâneo no artigo 2º, § 1º, da Lei dos Crimes Hediondos (Lei nº 8.072/90), por ser o tráfico de drogas crime a eles equiparado, conforme previsão constitucional (art. 5º, XLIII, CF).
Ocorre que, em sessão realizada em 27.06.2012, o Plenário da Suprema Corte, ao analisar o Habeas Corpus nº 111.840/ES, de relatoria do Ministro Dias Toffoli, por maioria, declarou, incidenter tantum, a inconstitucionalidade do § 1º do art. 2º da Lei nº 8.072/90, com a redação dada pela Lei nº 11.464/2007, verbis:
"Habeas corpus. Penal. Tráfico de entorpecentes. Crime praticado durante a vigência da Lei nº 11.464/07. Pena inferior a 8 anos de reclusão. Obrigatoriedade de imposição do regime inicial fechado. |
Declaração incidental de inconstitucionalidade do § 1º do art. 2º da Lei nº 8.072/90. Ofensa à garantia constitucional da individualização da pena (inciso XLVI do art. 5º da CF/88). Fundamentação necessária (CP, art. 33, § 3º, c/c o art. 59). Possibilidade de fixação, no caso em exame, do regime semiaberto para o início de cumprimento da pena privativa de liberdade. Ordem concedida. |
1. Verifica-se que o delito foi praticado em 10/10/09, já na vigência da Lei nº 11.464/07, a qual instituiu a obrigatoriedade da imposição do regime inicialmente fechado aos crimes hediondos e assemelhados. |
2. Se a Constituição Federal menciona que a lei regulará a individualização da pena, é natural que ela exista. Do mesmo modo, os critérios para a fixação do regime prisional inicial devem-se harmonizar com as garantias constitucionais, sendo necessário exigir-se sempre a fundamentação do regime imposto, ainda que se trate de crime hediondo ou equiparado. |
3. Na situação em análise, em que o paciente, condenado a cumprir pena de seis (6) anos de reclusão, ostenta circunstâncias subjetivas favoráveis, o regime prisional, à luz do art. 33, § 2º, alínea b, deve ser o semiaberto. |
4. Tais circunstâncias não elidem a possibilidade de o magistrado, em eventual apreciação das condições subjetivas desfavoráveis, vir a estabelecer regime prisional mais severo, desde que o faça em razão de elementos concretos e individualizados, aptos a demonstrar a necessidade de maior rigor da medida privativa de liberdade do indivíduo, nos termos do § 3º do art. 33, c/c o art. 59, do Código Penal. |
5. Ordem concedida tão somente para remover o óbice constante do § 1º do art. 2º da Lei nº 8.072/90, com a redação dada pela Lei nº 11.464/07, o qual determina que "[a] pena por crime previsto neste artigo será cumprida inicialmente em regime fechado". Declaração incidental de inconstitucionalidade, com efeito ex nunc, da obrigatoriedade de fixação do regime fechado para início do cumprimento de pena decorrente da condenação por crime hediondo ou equiparado." |
Desse modo, restou superada a obrigatoriedade de início do cumprimento de pena no regime fechado aos condenados por crimes hediondos ou a eles equiparados.
Contudo, para determinar o regime inicial de cumprimento da pena, o magistrado deve se valer, além do quantum de pena imposta (art. 33, §2º, CP), dos critérios previstos no artigo 59, do Código Penal, conforme exegese do artigo 33, §3º, do mesmo codex.
Em se tratando de crime de tráfico de drogas, as circunstâncias judiciais para fixação da pena-base incluem, ainda, a natureza e a quantidade da droga, nos termos do artigo 42, da Lei nº 11.343/2006.
No caso concreto, a fixação de regime semiaberto para o início do cumprimento da pena mostra-se absolutamente insuficiente para a prevenção e a repreensão do crime, em razão da natureza (cocaína) e da quantidade da droga (quase dois quilos), além de ser absolutamente incompatível com o tratamento mais gravoso que o legislador atribuiu aos crimes hediondos e equiparados.
Nesse sentido, recente julgado desta E. 1ª Seção:
"PENAL. EMBARGOS INFRINGENTES. TRÁFICO INTERNACIONAL DE ENTORPECENTES. REGIME INICIAL SEMIABERTO. IMPOSSIBILIDADE. EXPRESSIVA QUANTIDADE DE DROGA. SAÚDE E VIDA HUMANA AMEÇADOS. EMBARGOS IMPROVIDOS |
1. É cediço que no momento da fixação do regime inicial de cumprimento da pena deve o magistrado sopesar todas as circunstâncias judiciais, à luz dos artigos 33, § 3º e 59, ambos do Código Penal, e, no caso do crime de tráfico de drogas, a tais circunstâncias somam-se também, com preponderância, aquelas previstas no artigo 42 da Lei nº 11.343/2006 - quantidade e natureza da substância entorpecente objeto do tráfico. |
2. No caso dos autos, trata-se de 3.135g (três mil, cento e trinta e cinco gramas) de cocaína, quantidade expressiva de droga (cocaína) com potencial de causar consequências gravíssimas a relevante número de pessoas e de famílias, de maneira que, ainda que primário o réu e com bons antecedentes, não poderia ser outro o regime inicial de cumprimento de pena senão o fechado, único compatível com a prática de crimes extremamente gravosos à sociedade, e que possibilita sejam cumpridos os escopos preventivo, repressivo e ressocializador da pena privativa de liberdade. |
3. Embargos desprovidos." |
(EIFNU 0005758-28.2011.4.03.6119/SP, rel. Desembargador Federal Luiz Stefanini, e-DJF3 Judicial 1 de 29/04/2013) |
Por esses motivos, deve ser mantido o regime inicial fechado para o cumprimento da pena do acusado.
Com tais considerações, NEGO PROVIMENTO aos embargos infringentes.
É o voto.
Documento eletrônico assinado digitalmente conforme MP nº 2.200-2/2001 de 24/08/2001, que instituiu a Infra-estrutura de Chaves Públicas Brasileira - ICP-Brasil, por: | |
Signatário (a): | ANTONIO CARLOS CEDENHO:10061 |
Nº de Série do Certificado: | 07ED7848D1F21816 |
Data e Hora: | 25/09/2013 16:21:47 |